terça-feira, 21 de abril de 2015

Explicação necessária

                      Cunha e Silva Filho


       A partir desta coluna faço modificações que alvitrei necessárias. A primeira é que, o título destas memórias,  na sequência, até agora, de 8 textos, Minha  formação,  passa a denominar-se Apenas memórias. Peço minhas desculpas ao leitor/a quando, tendo  lido  algum texto  meu deste blog, haja se deparado com  erros de digitação ou mesmo  algum  lapso de linguagem em  texto que se pretende   escrever com o melhor apuro  possível da  norma culta em língua portuguesa. Por outro lado,   não tenho  pejo de me permitir  empregar  formas  do uso  coloquial do português brasileiro que o espírito  intelectual  progressista  de Mário de Andrade (1893-1945) ) considerava  normal. Por exemplo, o uso da forma  "pra" e seus derivados, mesmo num ensaio,   assim como o fazia  na sua  obra  ficcional  e poética.
      Por conseguinte,  o leitor  inteligente  e ainda apegado aos exageros da normatividade   gramatical há de me entender e até de escusar-me por não parecer tão gramatiqueiro.Professores  que, graças a Deus, tive ou conheci  na universidade,  linguistas de renome nacional e internacional,  como  Mattoso  Câmara Jr. (1904-1970),  Aryon Dall'Igna Rodrigues, Sílvio  Edmundo  Elia (1913-1998)  e outros  mais jovens. – esses sábios  tão sintonizados com os avanços da linguística, me abriram  os olhos  para que não ficassem fechados  na  pura normatividade culta,  sabendo aqueles mestres que a língua é dinâmica no tempo e no espaço e o seu uso não pode virar absolutamente uma camisa  de força que, de resto,  tanto  emperra  a liberdade  criativa de um escritor.
    O poeta Manuel  Bandeira (1886-1968)), poeta  criativo  e progressista, tradutor e conhecedor de línguas,  além de profundo  conhecedor do vernáculo,   no seu tempo, já vislumbrava  a ineficácia e  o reacionarismo  dos puristas num poema famoso,  "Poética"  - signo de sua aderência ao modernistas de 1922: [...] “Abaixo os puristas// Todas as palavras, sobretudo os barbarismos universais/Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção/Todas os ritmos sobretudo os inumeráveis” [...] (1)
       Os leitores que me conhecem há tempos, especialmente os piauienses  de mais  idade,   seguramente  nunca  pensarão que um estudioso como eu  possa  cometer  erros palmares  após ter feito  uma carreira  acadêmica desde a graduação até o  pós-doutorado na UFRJ.  e carregando, atrás  de si,  há anos o tirocínio de conviver com  o exercício da língua portuguesa  no ensaio, na crítica,  no artigo doutrinário,  na crônica, enfim, em qualquer "texto" (aqui empregado no sentido que lhe dava o  tradutor, ensaísta e crítico literário  José Paulo Paes (1926-1998).
     Por outro lado, qualquer  professor, escritor está sujeito a cometer  erros gramaticais  que lhe escapam  muitas vezes inconscientemente e é por esta razão que existem  os revisores de textos de publicações  sérias, os quais  são  profissionais  conhecedores da língua  em que o  texto  está escrito e que, por sua vez, não podem nem devem ser tão  puristas  e  retrógrados na sua atividade   que reputo  das mais  importantes  na edição de uma obra, quer literária, quer científica ou técnica.
   O leitor/a  culto/a não pode cometer  a injustiça  se pensar  que  um   escritor  seja perfeito  qual um Deus da gramática normativa e, desta maneira, por pressa,  subestimar  ou  julgar mal  a reputação ou o valor  de um escritor  que, por um motivo ou outro,  possa “parecer” – não “ser’ -  mal interpretado, mais por falha do analista, naquilo que  escreve  com  elevada dedicação  e mais  genuíno  amor  às potencialidades  que o ato da escrita lhe pós à criatividade  e originalidade.
   Lembro, ademais,  a circunstância de que um texto postado não  está esgotado nas suas possibilidades de acréscimos, correções, limpezas gramaticais ou estilísticas,  assim como de  dados  referenciais. Me parece mais um  primeiro  rascunho, uma   versão  provisória suscetível dessas alterações. São inúmeros os escritores brasileiros que sempre fizeram  modificações,  por vezes, substanciais em suas obras.  
   Haja vista  o caso do   romancista  piauiense, O.G. Rego de Carvalho (1930-2013), o qual passou a vida  modificando sua obra, num sentido afirmativo, de atingir  a melhor  forma literária possível, tornando-se, assim, um  prato cheio para a crítica  genética.Se não tivesse optado  por estudar no Mestrado o poeta  Da Costa e Silva (1885-1950), teria feito  um  trabalho  exegético da obra  desse  brilhante ficcionista  de Oeiras, sua  terra natal.
   Ao bom  leitor,  lhe interessa mais o valor  intrínseco da obra. É com  esse dado que fará  um  juízo da  dimensão,  qualidade ou  fracasso   dela visto que,  numa escala  quádrupla,  há obras ótimas,  boas,  médias,  fracas ou falhadas.
   Lima Barreto (1881-1922) foi injustamente  muitas vezes tachado por críticos gramaticais, de “escritor desleixado” com a língua, com a gramática. Por miopia de  alguns críticos  literários, que não  souberam  interpretar  as intenções  estilísticas  do autor de O triste fim de Policarpo Quaresma (1909, edição feita em Lisboa) no período que se   convencionou denominar Pré-modernismo. Só mais tarde, uma crítica mais bem  aparelhada com  inovações  na análise literária, constatou os motivos  estéticos  da linguagem  renovadora  limabarretiana.  Aqueles críticos  gramaticais  ou filológicos  só tinham olhos para  escritores  ditos puristas, de linguagem  rebuscada,  à Coelho Neto (1864-1934) e à Rui Barbosa (1849-1923)..
  Peço vênia ao leitor/a  para fazer uso de um jargão  jurídico,  que não me tomem  por pretensioso  ao fazer estas ponderações, mas  seja indulgente com o fato de que,  se escrevo  meus textos, sobretudo se mais longos  ou em séries,  à semelhança do que, no século  XIX, faziam  os  escritores  de folhetins (feuilletons)  como  Manuel  Antonio de Almeida (1831-1861),  Joaquim Manuel Macedo (1820-1882),  José de Alencar (1829-1877) e outros, é bem  possível  e até  escusável  que algumas gralhas    escapem, mesmo  se forem  uma concordância errônea, um erro de regência. uma vígula mal colocada. São os “disparates de todos  nós” de que falava o  mordaz e brilhante  crítico impressionista  Agripino Grieco ( 1888-1973)

   Na próxima coluna,  darei  continuidade às memórias e, para não cansar o leitor/a,  intercalarei artigos de natureza vária.Até breve!

NOTA:

(1) BANDEIRA,  Manuel. "Poética" In: -- .Poesia completa e prosa.  Volume único. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986, p. 207.

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