quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Antes que 2015 acabe



                                                      
                            Cunha e Silva Filho


          Um ano  transcorrido para quem passou à velhice tem um valor  intenso, inestimável. Precisa ser bem  vivido em toda a plenitude do dia-a-dia, mas sem sobressaltos, sem afobamentos,  sem grande  planos.Deve ter a medida certa,   o equilíbrio, a harmonia dos que, bem ou mal,  aprenderam muita coisa da vida.
            O tempo psicológico de quem atingiu  essa fase da  existência é bem mais longo do que o presente frenético da juventude, da mocidade, sem se falar da infância, que é cercada de mil vidas,  de mil mágicas, invenções,  brincadeiras,  como se a vida  fosse uma eterna continuidade.
             No Brasil e  no mundo,  fazendo o balanço do que se viu, se viveu e do que se teve notícias, ninguém,  em plena consciência de suas  faculdades  mentais, há de afirmar que foi um ano bom,  alvissareiro. Em nosso país, dois exemplos nos marcaram  e nos  entristeceram:  o desastre da  política nacional e a tragédia  do Rio Doce, em Mariana, Minas Gerais.  
       No mundo,  a tragédia das vítimas inocentes  numa  casa de espetáculo parisiense,  barbarizada pelo nefando  Estado Islâmico e a situação  desumana por que têm passado os refugiados, sobretudo da Síria corridos  pelas guerra civil,  pela destruição de seus  bens, pela perda de seus empregos, pela derrocada de tantos lares e pela  perda de crianças  atravessando, em barcos infláveis,   por mar em direção sobretudo à Europa. Enquanto  os refugiados  saem às pressas de sua  própria  pária,  continua a infame guerra civil  num país  arrasado. Tudo por causa  sobretudo  da continuidade de um regime  ditatorial  que  provocou milhares de mortes desnecessárias. Desnecessárias, sim,   se os adversários  de Bashar Al-Assad pudessem  ter chegado a um acordo na disputa pelo poder.Nem o Conselho de Segurança da ONU  deu jeito na conflagração de sangue e de  matanças   covardes.
          Até parece que as grandes potências não  desejam   pôr termo a essa guerra civil interminável, insolúvel.  
         Vamos  ver até aonde  vai  esse conflito   em parte fratricida  entre rebeldes e o partido  do ditador Bashar Al-Assad, de mistura com outro personagem que também  entrou    em cena, o Estado Islâmico formado de terroristas  impiedosos  e  assassinos frios, anárquicos  e inimigos declarados dos valores  do Ocidente. A Síria virou um colcha de retalhos,  onde cada grupo adversário deseja  se apossar de um  região, de cidades, como se fossem  invasores    da Antiguidade Clássica,(século VIII a. C. até o século V d.C.), sobretudo do ponto de vista da civilização romana, por eles invadida, entre outros, os hunos,  francos, burgúndios, suevos,  vândalos,   visigodos, i.e.,   os bárbaros da pós-modernidade. Bárbaros para os romanos eram todos os povos que se situavam fora da sua civilização.
        Estado  Islâmico - grupo terrorista que  surgiu, em solo sírio,  para ainda mais   complicar a já  arrasada   estrutura  do Estado da Síria que,  nas condições atuais,  não é mais aquilo que se pode  chamar de  país, de nação,  em razão  da carnificina,  dos bombardeios,  das explosões, da convulsão  social,  dos destroços  em que  se  transformou  aquele país, em razão igualmente  da fuga  obrigatória dos seus  cidadãos que deixaram   as suas raízes, a sua família, os seus pais, a sua terra natal atravessando  as fronteiras  próximas em busca de paz  e de uma vida   sem opressão nem  medo. 
  O atrevimento  desse grupo terrorista é tão grande que se auto-intitula “Estado,”  tomando o termo  da Ciência Política para  definir  suas iniquidades,   matanças e degolas.  Não passa  de um bando formado até de  indivíduos de países ocidentais que  são para ele atraídos (brainwashing) com alguma promessa de livrar o mundo civilizado de todas as mazelas morais,  espirituais, consumistas, se esquecendo, contudo, de que  usam armas  fabricadas  também no Ocidente e são ainda acusados de receberem  ajuda financeira e bélica de potências  ocidentais (que mundo torpe?!) 
       De tanto a Humanidade  conviver com  guerras e derramamento  de sangue, os organismos  internacionais, que deveriam  priorizar  esses conflitos,   dão antes mostras de que bastam alguns  bombardeios  em determinadas  partes do território  sírio para que  deem satisfação ao mundo  de que estão   solucionando  alguma  coisa. Qual nada!
      A guerra civil prossegue inexorável na Síria. Os refugiados  continuam  sua saga  de humilhações   pedindo  abrigo a países da  Europa, sem  muitas vezes,  serem  atendidos. Aquelas imagens de levas de  refugiados  da Síria e de países africanos nos fazem lembrar os  trágicos  anos da Segunda Guerra Mundial.  Refugiados, a pé,  em  gigantescas fileiras, andam  quilômetros e quilômetros para chegarem a alguma fronteira  de um país que lhes possa estender a mão humanitária. Essa criaturas  que perderam  tudo parecem  sair de um documentário sobre   os horrores do Holocausto e dos destroços causados pela  duas  grandes guerras.
     Volto ao  Brasil, forço a memória e vejo  a barafunda em que  nos meteram   os donos atuais  do país. com mentiras,   falácias, simulacros, maquiagens,   dinheirama  roubada dos cofres  públicos  para fins de campanhas  de eleitorado  comprado  e vendilhão de suas (in)consciências aviltadas, propinas  pagas a parlamentares de vários  partidos (desmoralizando  a figura dos políticos, cuja cotação  está a zero na consciência de grande parte dos eleitores), Operação  Lava Jato,   Escândalo do Petrolão,   denúncias quase diárias  mostradas nos canais de TVs,  enlameando os últimos  resquícios de alguma moralidade  no Congresso  Nacional, tudo, enfim,   sob a proteção da impunidade crônica    e do  cinismo  deslavado  de parte a parte da politicagem,  cujas garras horripilantes, tentaculares    se espalham país adentro  em níveis  de governos   estaduais e municiais.
       Perdeu-se o rumo da moralidade  política,   dos ideais  democráticos,  da vontade  política de  fazer  o bem para a sociedade brasileira, agora dividida ente  prós e contras no cenário atual.
    Ora, se o governo federal  não anda bem, não funciona  com dignidade plena, o resultado não demora   a vir à tona:  quebradeira das finanças (A revista The Economist chamou, na primeira  capa, “A queda de Dilma Rousseff” Nem e preciso  ler-se a matéria  a fim de que  nos informemos sobre  todos os  percalços e tropelias  causados  pela  governança da presidente  Dilma),  colapso da saúde, educação fundamental   e média deteriorada, violência com impunidade  jamais  vista na história  brasileira  contemporânea,  onde bandidos  competem  em  armamentos com  as nossas forças  policiais, matam inocentes nas favelas  e morros,  assassinam  estudantes  por causa de um celular,  explodem  caixas eletrônicos de bancos privados e   públicos.   Esse fatos  escabrosos  não acontecem não apenas em São Paulo e Rio de Janeiro, mas se ramificam   pelo país inteiro.
     Não se pode compreender como  um país nestas condições desfavoráveis  vai sediar as Olimpíadas de 2016. Não seria este  o momento de sediar  um evento dessa magnitude com um país  visto de ponta  cabeça. Fomos imprevidentes nesse sentido, sobretudo  porque a situação  que  o Brasil atravessa,  nos campos social,  político e financeiro e institucional, é a pior  possível.  Só resta ao governo federal   tomar  decisões que  venham   reduzir  os prejuízos  espelhados na imagem do país no exterior. É tempo ainda de  reparar  grandes  erros e ações  tomadas  pelo governo federal   que redundaram  nessa  vexatória  situação de desarmonia  e hesitações  nos três poderes,  diante de dois fatos  que precisam  de  ser  resolvidos:  a normalidade  do Congresso Nacional e a questão do impeachment  da presidente  Dilma Rousseff.
     Da minha  parte,  somente  quero  desejar veementemente para 2016  um ano   sem tantas  aflições, sem  tanta violência (as mães de filhos  assassinados por  menores delinquentes ou  jovens adultos clamam aos quatro cantos da Nação  por justiça, justiça, justiça!). Deus proteja a nossa Nação!


sábado, 26 de dezembro de 2015

A propósito do artigo "Gênese dos meus 'Poemas Inéditos', de Elmar Carvalho"



   
              Cunha e Silva Filho
         


         No texto   acima referido no título deste artigo, à feição do que fez Manuel Bandeira, no conhecido  e indispensável  ensaio autobiográfico,  “Itinerário de Pasárgada, o poeta  piauiense Elmar Carvalho, expõe,  em muitos passos de forma bastante lírica, evocativa,  as razões das origens  de seus chamados "Poemas Inéditos.” O texto é abissal, e direi  por quê.
         O artista do verso tanto os de maior  grandeza quanto os de menor  qualidade,  no Brasil ou no exterior, em muitos ângulos, são autênticos críticos e intérpretes de suas obras. Poderia citar vários deles, entre os quais,  T.S.Eliot, Coleridge, Murilo Mendes,  Ezra Pound, Goethe, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Otávio Paz.
         A visão da poeticidade que  esses  artistas  da palavra têm, como se vê, é a do conhecimento  "interno" da estrutura do verso,  inclusive dos “mistérios’ que ultrapassam  o plano da lógica. E é Bandeira, exímio artífice do verso, que nos ensina: poemas há de sua lavra que só podem ser explicados pela tão denegrida  “inspiração, de fundo romântico. Por isso,  ele fala tanto em  alumbramentos.”
     Outros não, são frutos  do domínio  do verso, de seus segredos, de seus fundamentos  teóricos.  Para Ferreira Gullar,  os poemas, muitas  vezes, nascem provocados  pelo “espanto”  diante da vida, diante de algumas singularidades  que se colocam  ante a atenção do  artista.   Para o autor do Poema sujo (1976)  a vida não  basta no que é, ela necessita de um  complemento que justamente  está na Arte, enfim,  em  quaisquer de suas  manifestações. Em outros termos, seria  impensável viver-se sem   os valores artísticos. A vida seria uma esterilidade,  um vazio  enorme , irrespirável.
     A visão do  exegeta,  do crítico  militante ou não,   parte de fora para dentro do texto. É  uma visão alicerçada na experiência e convívio  das leituras  intensas e extensas da palavra  poética.
    Seu ponto de apoio analítico  se assenta na teoria, no estudo da linguagem e da "competência literária"( Vítor Manuel de Aguiar e Silva).  Ou seja,  não é a dos poetas que passaram  da ideia de um tema  para fins  de compor um poema, do influxo vibratório da "inspiração,"  para um trabalho   lúcido da transformação  do verso em poesia, visto que poesia pode estar igualmente na prosa, na ficção,   num belo discurso oratório e até na leitura em voz alta de uma emocionante   mensagem, quase silenciando  quem lê o texto  em virtude  da carga sonoro-semântica   de sua tessitura, porquanto   a nossas voz fica embargada, entrecortada, soluçante,  a ponto de chorarmos,  numa mutação psicofisiológica  tamanha que   o efeito do movimento da leitura   se transforma em quase impedimento de sua continuidade.   Não é isso  um momento  de  extremo  lirismo?
   A poesia no verso  é resultado de uma proficiência de conhecimentos  técnicos implícitos ou  explícitos (metapoesia, metalinguagem  literária)). Além disso,  poesia  é  um produto  da tradição com  a atualidade, não havendo nunca  um ruptura total com o passado, ou com os passados,   a não ser no caso  da poesia antidiscursiva, do poema concreto, ideográfico, exclusivamente  verbo-voco-visual, que não se sustentaria  por muito tempo porque a discursividade, nos limites do lirismo, do poético de qualidade, é base de toda expressão  do  pensamento  poético contemporâneo.
    Os vanguardismos são úteis na medida em que  dão uma "mexida" nos exageros  da discursividade  do poema feito com palavras,  frases, que não se renovam, que se congelam esteticamente. Novas formas  poéticas,   novos temas, visões do mundo de hoje   são bem-vindos. Os  vanguardismos foram  , em  muitos pontos, fecundos e deixaram marcas  na comunicação poética, porém foram   passageiros, por demais tecnicistas.
   Suponho que o lirismo  da linguagem   na sua sintaxe poética nunca vai  desaparecer,  porquanto o homem se cansaria  se continuasse a ler  poemas absolutamente  sígnicos, icônicos,  geométricos,  matemáticos, cifrados, tipográficos, perfomáticos,  tendentes a ultrapassar  a linguagem  literária e trocá-la por outras linguagens de outras artes, o que  por si só,  aniquilaria   a condição da obra  poética nos seus fundamentos intrínsecos e irrecusáveis.
  O homem precisa   da estrutura sintática, da linguagem  literária,  do que antes se chamava "conteúdo," algo a ser dito  poeticamente com palavras e não com  sugestões   grafemáticas que afastariam  cada vez mais os leitores    do pequeno   número de aficionados da grande poesia  de todos os tempos. 
  Elmar Carvalho  recorda as várias  circunstâncias,  no tempo e no espaço,  que ensejaram  a fatura de alguns de seus poemas, alguns  urdidos depois de muito tempo, de muito suor, outros  surgidos na mente do poeta  em forma  quase  perfeita para  serem  impressos.
   Aquilo que o homem comum  pensa ser assim tão  simples ou mera inspiração -  elaborar  um poema  - não espelha a verdade e a paciência  que os  poetas tiveram  na composição  de seus versos.
   Alguns poemas, ou   senão quase todos os poemas de  uma obra,  têm  histórias curiosas  e jamais  pensadas por seus leitores, precisamente  porque  a escrita  de um poema pode tanto vir  de dentro  de sua  imaginação diante dos apelos  do mundo quanto  pode  vir de uma incidente ou fato  exterior,  cuja matéria  é retrabalhada  pelo  artista do verso  a fim de  o plasmar  em  poema.
   O que me leva a pensar  que,  nesta  ordem,   guardam  semelhanças todos os escritores em geral,  os romancistas, os contistas,  os  dramaturgos, os cronistas, até mesmo os  articulistas. É do  mundo  externo,  do momento  histórico,   do imprevisto de um  instante que pode nascer a ideia-máter  de uma obra, seja um romance, seja apenas um  poema.
  Por todas essas considerações, vejo como muito oportunas  que poetas  possam  indicar  as inúmeras fontes de como se originaram  seus  poemas.
  No texto de Elmar  pude  perceber  que os poemas   por ele elucidados, ganham  dimensões  novas,  auxiliam analistas,  repropõem outras leituras, corrigem, revelam e desvelam     camadas insuspeitadas  pelo  seus analistas.  
 Quer dizer, servem a  críticos,  ensaístas,  professores de literatura que, ao compararem  o poema  feito com   as motivações  circunstanciais que   os deflagraram como peças literárias, complementam  gaps  com que   por vezes  se deparam o analista e crítico no tocante a  algumas nuanças hermenêuticas  que o texto poético, mais do que o  ficcional,  sinaliza: opacidades, elementos de alta voltagem estética  sempre  presentes e resistentes  ao   entendimento do leitor, mesmo do leitor  especializado nos meandros da poíesis.
     O artigo-ensaio de Elmar Carvalho   renova a  minha    percepção  de que os poetas são os usuários da língua que mais,  talvez, próximos estejam  dos segredos e riquezas  multifárias do idioma.
      No poeta nada escapa da profundidade e dos  pormenores de língua literária, nos poetas  a língua  seria uma forma inusitada de como   melhor  estabelecer a passagem  da nossa existência tão  cumulada de referencialidades para um mundo, um cosmos que aos poetas se abre como   uma entrada  privilegiada no reino das palavra-imagem-símbolo, uma  espécie de ludismo  fecundo em tensão com o  imenso  potencial  da linguagem somente a eles  acessível e por eles melhor  compreendida.      

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

O negócio é cozinhar: a moda pegou no pais




                                           Cunha e Silva Filho


        O mundo se tornou uma cozinha, com copa e sem copa, porque esta última,  na política, nos palácios dos governos federal, estadual e municipal era locus  privilegiado para as fofocas e  conchavos  entre partidários  arquitetando  planos para derrubar  antagonistas, ou mesmo  fofocas da vida familiar  e íntima de políticos municipais,   estaduais ou federais.
      Por isso,  uma vez estranharam o título que meu  pai deu a um dos livros dele publicados, Copa & cozinha.( Teresina: Academia Piauiense de Letras/ Projeto Petrônio Portella, 1988,  127 p.). Imaginavam  que dizia respeito à arte culinária,  quando não tratava nada disso e sim de política, regional,  nacional e  internacional, de temas  sociais, de sistemas de governos, de aspectos  autobiográficos de um  jornalista político doutrinário e de fibra.
      Naturalmente,  algumas  páginas da obra  desviavma sua atenção  para  narrativas ou  exposições um tanto  satíricas, um veio de sua escrita  em que  era bem forte. Assim a obra  não deixa de nos propiciar  momentos    de  humor e de situações  engraçadas.
     Mas, o  assunto desta crônica não é  analisar  aquele  importante  livro de meu pai e sim  olhar em torno desse mundo  de espetáculo  que é o nosso, cheio de  uma dinâmica de acontecimentos e de novidades que mal nos damos conta de sua   velocidade e de suas mudanças.  
     A moda agora são os chefs de cozinha, alguns até importados, sobretudo da França, como um deles,  um conhecido gordinho do programa  da  TV Band,  Master Chef, que tem tido ótimo sucesso, desde a sua estreia com candidatos  jovens a ganhar prêmios e até  temporada em Paris  a fim de  aprimorar  seus métodos culinários. É sabido que os franceses, antes de tudo,  adoram  comer,  e não é gratuita a circunstância de que  a culinária francesa  é, de longe, a mais  apreciada do mundo.
      Depois do sucesso do primeiro Master Chef, a Band ofereceu aos telespectadores  o Master Chef Júnior,  onde  só meninos e meninas tomaram  parte   no  programa, mostrando as suas  qualidades e a sua precocidade em lidarem com  o preparo de pratos  deliciosos e de não menos  sobremesas  apetitosas. Li que alguém não  aprovou  tanto  o Master mirim quanto  o de jovens de mais idade. O concurso para galgar o primeiro e o segundo lugares é complicado,  exige determinação,  muita paciência,  engenhosidade  e mãos habilidosas, sem  contar com  a necessária  inclinação  e amor  à culinária.
     Este tipo de programa  já era, em parte,   apresentado  no Brasil, mas de forma mais simples, não como um show de brilhos e  de  momentos  emocionantes, em que  a assistência televisiva  se dividia entre os seus  candidatos  preferidos.  Esta forma  de  programa  voltada para a culinária, como quase tudo o mais de um pais  que ainda vive perifericamente dependente do universo cultural  do que aprende no exterior, com tal, não é original. Tudo se copia de fora  do lixo ao luxo.
    É bem provável que o aumento  de  programas  semelhantes   que seguramente vai  influenciar   outras canais de televisão, reforçará  estudos mais    aprofundados da culinária, com o advento de cursos  superiores  neste campo de atividade.
   O brasileiro  é um bom garfo e por isso não  faltarão  oportunidades  de empregos a futuros  especialistas  daqui  no mundo da cozinha. O momento de prestígio desses  programas   trará dividendos  para a economia do país e principalmente  para os níveis  sociais  mais elevados.  
   Sabe-se que o ser humano não pode deixar de se alimentar duas, três ou quase vezes  por dia. Ora,  isso  é uma alavanca fecundante  para  o crescimento  de  restaurantes  de melhor qualidade em todo o país  com chefs  formados em faculdades,  prontos a oferecerem  pratos  mais sofisticados  e  de refinado  sabor.
      A influência dessa novidade é tão  forte que os  maridos de hoje também  são atraídos para  o desejo  de aprender  a cozinhar, de modo que o casal moderno  estará mais   tranquilo no tocante  a quem vai  preparar o almoço  ou o jantar, ou uma boa sobremesa. Pode, assim, se  revezar,  poupando  a mulher  de ser o burro de carga  de  arcar sozinha com   o preparo da alimentação da família.
    Estamos a grande distância dos tempos em que nossas mães nos  repreendiam quando nos aproximávamos  da cozinha,  nos dizendo: “Meninos,  lugar de homem não é na cozinha. Saiam daqui.” Isso foi  comum  em  tempos  passados. Eram tão  comuns  em certos lares as advertências e proibições das mães  que, quem quebrava essas resistências,  era mal visto por  colegas  a ponto de duvidarem da  virilidade daquele jovem que  aprendesse a fazer  pratos   maravilhosos.
    Como  pertenço   a essa geração  de preconceitos contra  o homem que  cozinhava talvez  isso me tenha  afastado   dos mínimos  rudimentos  de  fazer  um bom  almoço agora. Só hoje  sinto  quanta falta  faz a quem, na condição de homem, não sabe  preparar um prato de feijão, um arroz,  entre outras  necessidades  da cozinha. Fazer bolos nem falar! Uma voz lá distante ainda  me ressoa nos ouvidos, não necessariamente  em minha casa,  mas na casa de amigos: “Cozinha não  é lugar  de homem.”
     Os tempos mudaram e, para alguns aspectos da vida,  para melhor. Tanto é assim que há, se não me engano, mais chefs  homens do que mulheres. Pura bobagem dos homens e mulheres do passado. Cozinha nada tem a ver com sexualidade. O machismo nesta área é coisa  ultrapassada. Cozinha à vista!


sábado, 19 de dezembro de 2015

DAS AMIZADES PERDIDAS



            


                                               
                                             [...]   
                                  Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
                                  O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
                                  A mão que afaga é a mesma que apedreja.
                                                         [..]
                                  AUGUSTO DOS ANJOS,  Eu e outros  poemas
                                                
                             

CUNHA E SILVA FILHO



        Poder-se-iam  citar a  mancheias as causas  das perdas das amizades. Não vou esgotar o tema,  principalmente porque este não é objetivo  dos comentários que farei neste artigo (crônica, sei lá, chamemos apenas “texto” para ficar  ao lado do poeta, tradutor,  ensaísta e crítico  José Paulo Paes (1926-1998).
        Menciono algumas is facilmente me   à tona, a que se situa no domínio da política, da literatura e mera convivência social, a que pode  estar no condomínio de um prédio,  no açougue,  na loja, na banca de jornal, no trabalho,  na família, entre familiares, nas instituições  culturais, nos clubes   nas academias  de letras e assim por diante.
       Vejamos a primeira, que é muito comum em nosso pais  e desde tempos bem recuados quando, numa cidade do interior,  dois partidos  dividem  as ambições de assumir a liderança  política local. Inúmeros são os desdobramentos  que de ordinário  surgem em meio às refregas: as famílias da situação e as da oposição  se tornam  inimigas,  por vezes chegam às vias de fato,  por vezes  cometem  desatinos entre si e até ao extremo de  cometer  atos  in desejáveis, como crimes.
     No campo amoroso,  membros das famílias não podem  namorar outros cujos pais lhe são  desafetos políticos. Daí pode  ressurgir, em alguns casos,  tragédia do tipo  Romeu e Julieta,  de William  Shakespeare (1564-1616). Nos anos 1920, 1930, 1940 1950, só para dar  um recorte no tempo,   eram  comuns  familiares  se tornarem  inimigas  quando  seus membros  escolhiam  seguir a  carreira política e se candidatavam a cargos eletivos, prefeitos,  deputados, vereadores. A política no  interior desse mesmo  país, pelo menos  antigamente, assim me contava meu pai,  começava a ser assunto mesmo entre   crianças, de adolescente, os quais  discutiam  suas posições, naturalmente  influenciados pelos adultos.
        Para espíritos muito  inclinados à política  militante,  não necessariamente aquela  voltada para  exercer  mandatos, e meu pai era um exemplo disso,  o fato   era bem  observado  pelos adultos.
    Uma tia-avó materna, a Aurora Cunha e Silva, há muito falecida, a quem chamávamos  carinhosamente de tia Lolosa, professora  primária  muito  respeitada na época em que  lecionou em Amarante, PI, e em Teresina,  certa feita me fez um comentário:  “Não sei, Francisco,   como você  não é chegado à política, seu pai foi, desde bem jovem,  tão interessado por   política, e você não me parece gostar  da discussão política”
      Razão tinha ela,   pois meu pai foi  tão um    jornalista  visceralmente político a vida inteira. Olhei para ela e apenas lhe sorri, sem lhe dar uma resposta   nem lhe apresentar argumento algum.
      Isso ficou  na minha  cabeça por muito tempo.  Só com a maturidade me veio  o interesse  político,  não para  ingressar  na política, mas como  campo de  análise, de discussão,  de reflexões  que me levaram logo a  escrever sobre assuntos,  os quais não eram  estreitamente  de cunho  político, no sentido técnico, de aprofundamento nas questões fundamentais  da vida política nacional, contudo estavam  muito  intimamente   conexionados com ela.Ou seja, os problemas que diziam  respeito  à vida do brasileiro, da nossa sociedade começaram a me  chamar a atenção e se tornar  até   temas  recorrentes  meus, o mesmo se estendendo para a situação  do mundo  político internacional, que passou a ser  objeto de minhas   discussões em jornais do Piauí e, depois,  em  meu blog “As ideias no tempo,”   sempre que  afetavam   as condições  injustas  vividas por países tanto das Américas  quanto do mundo em geral. 
   Em resumo,  a opção minha  de estimar  o debate político visando à defesa de minhas ideias e posições me custou  a perda de amizades que  supostamente  pensava que fossem verdadeiras,  visto que, quando são genuínas,   profundas,  elas não se   acabam   meramente  por  motivos  ideológicos, os quais – com somos tolos! -  não vão beneficiar nem a mim nem as minhas amizades  perdidas.
    O único beneficiário das polêmicas  entre  contendores é o próprio sistema dominante ou a oposição,  ambos, ao contrário dos humildes  discutidores  de política, ao final e ao cabo,   só lucrando com isso, ao receberem seus votos. Os briguentos – cá no espaço anônimo e  terra-a-terra – de lucros  só tiveram  prejuízos e a perda da amizade. Confuso mundo o nosso.
   Na  perda da amizade por motivações  literárias, o país tem uma longa tradição, sobretudo nos anos 1940, período em que  pipocaram  inúmeras combates nos jornais, muito acirrados dividindo escritores a favor ou contra  determinadas práticas  de visões literários. O  mais célebre, a meu ver, foi o travada entre o crítico Álvaro Lins (1912-1970) e o crítico  Afrânio Coutinho (1911-2000),  ambos  com  propostas  de militância  na crítica  inteiramente  diferentes, o que redundou  em  discussões  violentas entre eles, sobretudo  da parte  de Afrânio Coutinho, espírito mais    apaixonado  pelos seus ideário de   abordagem  do fenômeno literário, sobretudo  porque  Coutinho  almejava atingir um  alvo: o de  desalojar  da liderança  da crítica de rodapé o  famoso  autor de Os mortos de sobrecasaca(1963)
       Em várias obras, debatendo os seus pontos de vista no tocante à judicatura crítica,  Coutinho defendia   a crítica universitária,  através da qual  os estudos  literários poderiam  encontrar o seu locus  principal  de desenvolvimento  e de atualização  dos estudos  literários entre nós. Afrânio Coutinho saiu, de certa maneira,  vencedor; Álvaro Lins, desgostoso,  foi aos poucos se afastando  dos meios literários,  inclusive da Academia Brasileira de Letras de que era ilustre membro. Para ainda piorar sua vida de escritor, ainda morreu  antes de completar sessenta anos. A polêmica entre os dois  foi  o núcleo central  de minha pesquisa de pós-doutorado na UFRJ concluída em  2014.
       Mesmo tendo pessoalmente me  envolvido em curta polêmica no Piauí,  deploro certos arroubos das polêmicas sobretudo um lado que reputo deplorávael: os ressentimentos  que deixam marcas e que, a meu ver,  só prejudicam  o conjunto da vida literária entre pessoas que,  de outra forma,  poderiam  até, quem sabe,  terem feito boas amizades a fim de  tocar a marcha dos estudos da literatura  em nosso país. Para a literatura, sobretudo quando entram em jogo a objetividade  e seriedade da vida acadêmica,  o uso das citações  bibliográficas tendem a  subtrair  as obras de nossos   inimigos  no campo  teórico e vice-versa, o que é uma perda e um desserviço à mentalidade imparcial que deve presidir  o  trabalho acadêmico. Essa situação assim criada se me afigura uma violência, espécie de  tácita e desonesta   obnubilação do  espírito científico   na investigação  acadêmica. Espécie, em suma,  de crime capital  que ainda grassa  no meio  intelectual  e universitário brasileiro.  
    Quanto às inimizades convencionais que possamos  ter ao longo da vida,  elas também  não trazem  nenhuma vantagem a nenhuma das partes, malgrado reconheçamos que   algumas delas  devam  se manter no  ponto  em que as deixamos  por  absoluta incompatibilidade entre as partes. Outra podem ser refeitas, dependendo dos condicionamentos   que as geraram, os quais, podem, de repente,  por uma circunstância ou outra, se reabilitarem.      
     Porém, é muito pouco provável que haja reconciliações entre as pessoas, dado que o ser humano  é imprevisível,   rancoroso,   preferindo não abrir a guarda,  a qual   seria  a possibilidade da  volta da amizade.  Repito: é quase impossível  que as amizades  perdidas  refaçam o caminho da volta, tão necessário à vida em sociedade, à vida comunitária. A realidade, todavia,  é outra e nada tem a ver   com as nossas  específicas  subjetividades  tão arraigadas estão  ao  nosso  universo afetivo interior ultrajado.
    
   
    

    

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Amanhecer triste no "pais do faz de conta"




         Diante dos desdobramentos do processo de impeachment da presidente Dilma, sobretudo após a decisão aprovada pelo STF, fico sem palavras. e uma profunda decepção passo a ter com a política brasileira. Pouco tenho a afirmar sobre o que poderá acontecer com o destino do meu país. 
       Tudo indica que a oposição ao governo perderá força porquanto o que poderá acontecer tanto na Câmara Federal quanto sobretudo no Senado,pelo andar da carruagem, será o arquivamento do pedido de impeachment.
       Nada atingirá a Presidente nem a outros partidos aliados ao poder central. Mudará, em janeiro, o Ministro da Fazenda, ressurgirá a CPMF.O programa da Bolsa-Família não sofrerá solução de continuidade e este país paradisíaco e contrastivamente cheio de horrores morais e de impunidades dará prosseguimento ao segundo mandato de D. Dilma. "Nada de novo na frente ocidental." 
     O povo, desunido, será sempre vencido sob o império do individualismo, da cisão, da subserviência, do aulicismo nauseabundo, do fanatismo ideológico lulo-dílmico. "Que tudo mais vá pro inferno!" 
     A cena pequeno-burguesa será esta: famílias nos shoppings, filas nos restaurantes aos sábados e domingos, idas à academia de ginástica, prognóstico de como serão os Jogos Olímpicos, o próximo carnaval, muito samba, orgias, muito maracanã, muita mulher bonita de grandes curvas niemeyerianas rianas. Nos rincões pobres ou menos pobres da assimetria social, o populacho exibindo o cartão da Bolsa-Família, cada vez mais gordo à medida em que nascem novos vidas severinas. Os ricos? 
   Ora, esses vão jogar tênis nas quadras dos belos e luxuosos clubes, ou vão fazer turismo no exterior. De súbito surge uma PIZZA pantagruélica dos gigantes de Jonathan Swift (1667-1745) e, em volta dela, uma estrela muito conhecida do populismo brasileiro, tendo, ao lado dela, as chamadas bases do regabofe asqueroso da politicagem tupiniquim. Viva o Brasil! Viva! The end no telão do Planalto protegido pela Praça dos Três Poderes."Ai, que preguiça! Fuzilem o Policarpo Quaresma! Que mandou ele acreditar quixotescamente no país?

domingo, 13 de dezembro de 2015

A rede e os sonhos




                                     Cunha e Silva Filho


        Na distância temporal do presente da narrativa para  aquele  passado que, a qualquer momento,  vem à tona,  me descubro,   num dos cinco quartos da casa paterno-materno-familiar,  um rapazinho deitado na rede a sonhar acordado. Ninguém sabia que, ali relaxado na rede,  quase imóvel,  eu estava fazendo  planos  para o futuro.
       Eram muitos planos, amiúde difusos, e superpostos num desenrolar  de um novelo  da existência  que, muitas vezes,  me via chorando. Agora,  não consigo discernir bem  por que chorava. Mas chorava  ali em silêncio, afastado de todos que havia na grande casa da Rua São Pedro esquina com a Rua Arlindo Nogueira – rua que costumo  chamar de “rua do amor, às vezes “rua da adolescência.”  Pouco importa a minha hesitação em preferir uma ou outra. Ambas confluem para um período caro de minha vida.
      Hoje, tão distante no tempo e no espaço,  volto a refletir sobre a natureza daqueles sonhos   acordados. Medito  e alguma  réstia de luz  se lança sobre o meu  presente de escrita. Procuro alguma compreensão palpável que possa se transformar em algum  relato. Está difícil. As palavras me fogem, o entendimento  me escurece  a razão agora tão necessária.
      Tento mais uma vez me recordar de alguns instantes, de algumas situações dos sonhos despertos. Sei que um frincha do tempo  me fala que eu  chorava por alguma coisa  desagradável a ocorrer no futuro de adulto. Poderia ser a solidão,   a dor,  a saudade antecipada, os desatinos da vida, o amor desfeito, a vida profissional  escolhida. As situações eram múltiplas. Vinham, como disse, superpostas cheias de lances  tortuosos. Em nenhuma delas me parece  ter vislumbrado  muitas alegrias, mas  dificuldades,  lutas,  muitas lutas do homem adulto contra as contradições da existência. Por isso,  é  que chorava na rede acordado,  isolado de todos, ali, escondido  na rede.
       Será que alguém do meu tempo de adolescente  partilharia das mesma forma de experiência,  não  onírica, não  a do sonhos  mesmo,  mas a do sonho   acordado,  do sonho  consciente de que  não estava  delirando,  do sonho  da invenção, do imaginário possível que poderia ser premonitório,  vaticinador, demiúrgico, pois me dava a sensação de que eram  vários os lugares  em que  podia me encontrar, bastando para isso que me deslocasse forçando  o meu espírito a outras paragens  terrenas,  factíveis, ponderáveis.
     Não nego que, malgrado chorasse em silêncio, as sensações  provocadas pela imaginação  me eram agradáveis  e simultaneamente  hostis.  Doíam na alma,  mas tinha algum sentido  no plano  racional.  Ao meu redor,  não havia  ninguém  falando ou  fazendo algum barulho que me afastasse daquele escapismo  do meu  mundo exterior para o mundo da fantasia,    
    Me recordo de que esses fatos  me aconteceram  várias  vezes e nas mesmas condições: deitado na rede,  sozinho no quarto meio escuro, não necessariamente à noite, pois creio que aconteciam mais durante o dia,  talvez nas tardes calorentas de Teresina.
    Aqueles períodos de  fuga  da condição  de adolescente para zonas  indecifráveis  de um futuro  criado pelos meus pensamentos me martelam agora que me vêm à mente depois de tanto  tempo  corrido.
     É certo  que, ao rememorar aqueles sonhos  vividos que  se concentravam no  futuro  de forma  indefinida,  difusa, alguma analogia  poderia  ter com  o meu instante presente. Não é possível não conseguir estabelecer algumas analogias,  alguns  pontos de   contato, algumas coincidências  no presente desta escrita.
    Sim,  existem, no fundo de nosso ser de agora, alguns elos que me poderiam  esclarecer aqueles sonhos acordados,  sentidos,   vividos na variabilidade e nas súbitas mudanças  de  fatos e acontecimentos, de espaços físicos e temporalidades  múltiplas relativos a  experiências  e de situações  multifacetadas de minha fase  existencial de hoje. É impossível não detectar alguns sinais entre os sonhos  acordados e a realidade da minha travessia  ao futuro.
     Tudo me leva a crer que aqueles sonhos, não sonos,  anunciavam fases que iriam atravessar  com alguns sobressaltos e também  com algumas  alegrias. Não escondo que  os sobressaltos são maiores e mais  pesados do que as alegrias  de instantes  de bem-aventurança.
    Porém,  aqueles  sonhos  acordados  não me  ocorrem mais, uma vez  que o tempo em  que me encontro é tempo  de regresso não  mais  de,  sozinho,  acordado,  distante de todos,  sonhar  acordado no aconchego e no prazer de estar  deitado numa rede  em Teresina. Esse acontecimento  repetido na  puberdade levava nas minhas  lembranças  mas sem  a decisão voluntária  de algum dia  pô-los em forma de crônica.
     

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 Hoje, depois de ler  um artigo belíssimo de Márcio Tavares D’Amaral (Segundo  Caderno , O Globo, p.2, 12/12/2015), de título “E os que lutam com o Anjo” e de ler uma reportagem sobre os cem anos de nascimento de Frank Sinatra, saí da mesa da cozinha, onde costumo  ler jornais ou livros, e  fui para o meu computador  com a ideia de escrever sobre a minha ida ao Maracanã  assistir  à apresentação  de Frank Sinatra com meus dois filhos, Francisco Neto com nove anos, e Alexandre com sete anos.
    Era o ano de 1980. De ônibus saímos do bairro em que morei por vários anos, a Vila da Penha. A volta foi terrível. Encontrar ônibus para  o nosso bairro, em horas já adiantadas, foi uma aventura. As ruas  do bairro da Tijuca  estavam lotadas de carros particulares.O trânsito estava congestionado. Foi um perrengue conseguir o ônibus para regressarmos. Me lembro  de que pegamos dois ônibus para chegarmos  à Vila da Penha.
       Valeram as dificuldades de condução.  Valeu também  ouvir o cantor  dos olhos azuis, admiração  de gente jovem (eu, na época) e madura, como  umas senhoras idosas,  que estavam sentadas na arquibancada em que nos encontrávamos. Logo que  o artista-ator chegou ao palco,   cantado  umas das suas conhecidas músicas, em ritmo  de fala pausada em alguns passos, aquelas senhoras lançavam-lhe beijos levando uma das mãos aos lábios e  movimentando o braço em direção ao palco em que se encontrava o grande ídolo ítalo-americano  da canção romântica  que cativou várias gerações  de  fãs em muitas partes do mundo.


sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

O que faz a política brasileira atual: a clivagem entre petistas e não petistas




                                               Cunha e Silva Filho


            Existe algo para mim que paira além da compreensão no tocante à grande  divisão  que a política  suja brasileira está  provocando  entre brasileiros partidários do governo Dilma e outros  adversários desse mesmo governo.Na rede social Facebook,  se tem o quadro de  divisão  bipartida que vai  de um ainda certo diálogo  educado e até acadêmico a  um quadro de xingamentos,   ofensas, palavrões em linguagem de registro  chulo tal  é o ponto de efervescência  polêmica  entre petistas e anti-petistas.
             Me lembro de  que, nos anos 1940, 1950 e 1960, segundo  me informavam  os mais velhos,  inclusive meu pai,  destemido  jornalista piauiense,  essas práticas de baixo calão e de discussões  demolidoras   entre  partidos  da situação e da oposição a um governo  eram  também  muito aguerridas e iam  até à desmoralização  da intimidade e vida  privada  entre êmulos  políticos,  inclusive devassando  comportamento  sexual de homens e  mulheres  de adversários. Era um espécie de bacanal   de linguagem  por meio de vitupérios e achincalhes  entre  opositores. Isso havia no tempo da UDN e do PSD, para  dar apenas dois  exemplos históricos.
           Hoje, com os avanços das mídias,  a situação  de inimigos políticos se tornou mais visível, justamente  pelos recurso  audiovisuais,   montagens  e todo  um elenco de sofisticação  virtual que  é possível  movimentar  de forma instantânea.Além disso,  a comunicação  virtual tem uma intensidade tão  forte que  é retroalimentada  sem cessar, com  novas  imagens,  novas notícias,  novos  vídeos,  novas  montagens dos dois lados  de declarados  inimigos.Para aumentar essa intensidade acumulativa,  ainda se tem  a avalanche de notícias de toda a espécie vidas de outros países, sobretudo da América do Sul.
        É possível resistir  a esse nível de informações  de natureza político-partidária? Não. Posto que não  me agrade o emprego do palavrão  e da carnavalização excessiva de alguns mais afoitos,  vejo que a rede social,  do tipo do Facebook,  é um  dos poucos canais  de  o cidadão  reagir  livremente  contra erros e  indignidades  de políticos e de fatos   escabrosos  que enxameiam  o país nos últimos desde  a chegada do PT nos arraias da baixa política nacional.
        O que posso reafirmar  sem rebuços é que  o petismo, ou lulopetismo  conseguiu  inocular  em seus prosélitos de todos os níveis  de instrução  foi   uma forma    nunca vista  de  misto de cegueira  com   fanatismo   político. Ora, se existem  fanatismo  e cegueira  ideológica é bem  previsível  que  o petismo, agindo assim,  se arvora no mais  puro  e santo partido  brasileiro. uma simples   visada nos  aponta que  seus  prosélitos  sofreram de um obnubilação  do que é certo e do é é errado,  do que é ético e do que é  cumplicidade  total  com a corrupção  e com  o  os desacerto  e falcatruas  em série  ocorridas ao longo do petismo  no poder. 
      Seria  pura atitude  simplista  e  cinicamente   inocente   afirmara-se que  o governo  da presidente Dilma  é correto, íntegro e digno  de ser um modelo  de   comportamento  ético. Não compacto  tampouco com  o baixo clero  político de alguns partidos de oposição, e poderia  mencionar  o PSDB, O PMDB, em ter outros  de  maior ou menor   relevância. A desmoralização  da política brasileira  é estrutural  e corrói  praticamente  todos nela envolvidos. Daí  a indiferença e o repúdio  dos eleitores  por assuntos de política.
     Se o seguidores empedernidos e cegos do lulupetismo  não veem  a podridão  em que o país está  politicamente afundado, é porque  decerto  o vírus infestou    todos eles  a ponto de  enxergarem  só santidade nos atos  dos dois presidentes petistas. Seria o cúmulo da insensatez. Poder-se-ia  questionar: houve ações que beneficiaram  parte da  população humilde  brasileira? Sim, houve, a um preço, porém, descomunal, quer dizer,  ao  preço dos escândalos e desvios  do dinheiro  público e do sucateamento   de vários setores   da máquina do Estado.Ao preço –acrescentaria  -  da falta  de ética,   dos conchavos,  da corrupção  financeira  que pipocaram  tanto no  governo do  ex-presidente Lula quanto no atual.   
     A minha  tese  para  explicitar   a minha indignação  do que está  acontecendo  no governo  federal é que não se poderá   conviver com  um governo  que  perdeu   o seu compromisso com  a moralidade, com a compostura,  com  o respeito  que todo governo decente deve ter com a sociedade.
    Um governo como o atual  contaminado cronicamente   com   as desídias da era  Lula e com a sua continuidade na administração da presidente Dilma  de falhas e descalabros de escândalos   de ordem  financeira  nocivos às contas   públicas,  de tal sorte que culminaram com  a volta da inflação, carestia,  desemprego,  falências, achatamento salarial (com exceção  dos privilegiados  membros do governo: aumento do salários do ministros,  deputados, senadores,  presidente da República, poder judiciário), sem se falar da  convivência  da  sociedade com  um   estado de violência  e barbárie  sem precedentes,   não pode  se definir como   isento  de  culpas e de cumplicidade  com   a indecência  praticada no seio  de sua  própria   atuação desastrosa.  
      Fica, pois,  insustentável  defender  um governo  com  todos esses vícios  e  esse defeitos de natureza  ética. Umberto Eco, apesar de sua  imensa   cultura,  falou mal das redes sociais, alegando que  elas  inauguraram, em nosso tempo,   um espaço de imbecilidades. Não,   a meu ver,  ao contrário,  as redes sociais têm lá suas grandes  imperfeições,  mas não deixam de ser um  fecundo  e democrático   fórum  de debates e trocas de ideias.    

                                               

                                                                          

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A questão não é golpe: é a moralidade




                                      CUNHA E SILVA  FILHO



      Os partidos situacionistas, PT, PSOL, PC do B e alguns menos expressivos  contrários ao impeachment da presidente Dilma proclamam, como se fossem  donos da verdade, que os demais  partidos, DEM, PSDB, e PTB e outros menores, inclusive grande parte  da sociedade civil, querem o golpe.
     Não seria  um golpe, mas a deposição de uma  mandatária  do poder  por  absoluta   falta  de legitimidade.O que significaria isso? A rejeição do eleitorado   em geral  pela continuidade  de uma presidente que   perdeu  o favor do público, do povo,  ou, no mínimo, de uma parte não desprezível da sociedade brasileira.
       Não preciso  colher a opinião proveniente dos cálculos  estatísticos: basta auscultar a média  das pessoas, em conversas  nos bares,  nos restaurantes,  nas farmácias, nos supermercados,  nos botecos,  numa palavra, na rua – o grande termômetro  para medir, não a pressão arterial, mas a  grande indignação do eleitorado pela  forma como a presidenta  Dilma  tem conduzido  seu governo.
      É bem verdade que  a questão do suposto  golpe dividiu o mundo acadêmico da área jurídica em prós e contras no que tange ao governo  Dilma. Isso, na  minha opinião,  resulta  de uma gritante e inexplicável   falta de consenso entre  pessoas  de cultura e profundo  conhecimento do Direito  que se deixam contaminar  cegamente  por um lado  da política  brasileira atual  que, a olhos vistos,   está sendo conduzida por erros, omissões,  falta de ética,  empulhação,  cooptação política  cínica e deslavada. Diante da montanha  de desacertos administrativos,  de  recorrente   desrespeito às normas constitucionais  ainda não enxergam  tais doutos juristas claramente  o quanto  o nosso país  está  sendo  vítima  de uma governança  inepta e conluiada com  o que de   mais podre   existe  no lulo-petismo, cuja história  e fundamentos  se alicerçavam numa construção de um  país  mais justo  e menos excludente.
     Estes princípios  do petismo  sob os quais  se   pautava    a construção  político-institucional do  país tinham  raízes  assentadas na melhoria  dos trabalhadores   e na parcela  dos miseráveis  há longo tempo  esquecida    da sociedade. Com o tempo,  alguns  dos co-fundadores  do PT, o novo partido  com chumaços  de  vanguarda,  política  de   transformação  social  e de diminuição do fosso  de miséria  separando  secularmente  ricos e famintos, apostaram  na liderança  de um metalúrgico,  mas futuramente  se decepcionaram  com os rumos que o  partido  ia tomando, quer dizer,  rumos   que sinalizavam para   estratégias  eleitoreiras via  populismo,   salvacionismo e outros expedientes  escusos  que   fizeram alçar o ex-metalúrgico ao cargo mais   elevado  da Nação. Era o começo da era Lula, do político dublê  de sindicalista,  homem de origem humilde, sem o primário  completo,  mas  com talento de liderança,  homem de palavra fácil recheada de solecismos  mas que  reverberava  favoravelmente entre as camadas mais   sofridas  da população  brasileira. Além disso,  homem  fervoroso  nas suas ambições de conquistas do poder a todo custo.
    Tanto assim que tentou duramente  ser presidente da República e o conseguiu, Da minha parte,  nunca depositei confiança em suas  reais  intenções  de um propalado  grande presidente dado o seu  lado meio  malandro, meio  sinuoso,  de compor-se como  homem  público.
    Não deu outra. Procurou  conduzir-se com  boa desenvoltura  no poder nos dois mandatos, mas,  no subsolo de sua  presidência  já se  iniciava um processo  de   degenerescência  político-moral-institucional  que resultara  nos escândalos do Mensalão  duramente   criticado  por vários  grandes jornalistas brasileiros,  entre os quais   mencionaria Fausto Wolff do  saudoso  Jornal do Brasil. Os dois mandatos  do Lula foram  cumpridos  legalmente, contudo  sua popularidade já mal disfarçava  o que iria  pôr  a sua imagem  em xeque, a de um  político   sobre quem  já recaíam  suspeitas de  mau governança e corrupção nos altos escalões do poder no Planalto, a começar do seu chefe da Casa Civil,  José Dirceu, o homem forte do lulismo.
    Da passagem do  Lula para  Dilma aquela degenerescência que se iniciara com Lula iria    se agravar no mandato  primeiro de Dilma,  candidata preparada  doutrinariamente pelo seu  mentor-mor, o Lula. Ora, Dilma não teria  condições do líder petista e, além do mais,  não era  talhada para o cargo  de maior relevância  do país.
    Aguentou-se na presidência do primeiro mandato  a duras penas, mas já tendo atrás  de si   as nuvens negras  aprontadas pelo se antecessor  e  originadas  no campo minado  da corrupção  político-administrativa que recebera o nome de  Petrolão – esquema   engendrado  nas  fontes do poder  espúrio   com base na propina  e nos desvios  do dinheiro público  de estatais   mancomunadas com  grandes  empresários a fim de  dar vitória eleitoral  à custa  de  escambo: o governo  recebe propinas de vultosas   valores pecuniários  a fim de fazer  caixas milionárias  de campanhas  eleitorais  para  garantirem  a vitória  de petistas e sobretudo da eleição  presidencial.
      Esse, a meu ver,  é o cerne  da imoralidade que se plantou  em solo brasileiro  com  consequências deletérias para os cofres  públicos  e com irradiações  destrutivas  das finanças  dos estados e prefeituras  e sucateamento da máquina do Estado, cujas  consequências esperadas  foram   a quebradeira   das finanças públicas  e a deterioração da nossa economia e suas sequelas conhecidas lançadas no bolso  da sociedade: inflação de dois dígitos,  juros  altíssimos,   encarecimentos  do custo de vida  em todos os seus produtos,  desemprego,   fechamento de  firmas,  indústrias,  sucateamento  dos hospitais públicos,   crescimento  gigantesco da violência, entre tantos outros flagelos sociais que nos amedrontam dia a dia.
   Entretanto, a despeito disso,  os intelectuais do Direito, alguns sociólogos e cientistas políticos,  diplomatas  são contra literalmente  o afastamento  de Dilma. Qualquer tentativa de fazê-la sair  do governo  é por eles considerada um golpe contra as instituições democráticas.
   Ora, se não há, segundo esses juristas pró-Dilma,  nenhum sinal de que ela   cometeu alguma venalidade, um crime que a impedisse de continuar  mandando no país,  como fica, então,  o lado imoral  do seu governo,   do seu relacionamento com  o PT,  da sua fidelidade a esse partido,  das suas inverdades proferidas  no seu último   debate de campanha? 
  Prometendo mundos e fundos  visando a dar  continuidade ao seu programa de governo e, logo depois de empossada,  tendo a certeza de que saíra vitoriosa, saiu a campo  esquecendo as promessas e as propostas de governo com a validade  apenas até o derradeiro  instante de retórica vazia  e enganadora.
   Creio que isso  já é suficiente para  caracterizar o seu  segundo mandato como  uma quebra  de ética de um chefe de Estado. Todas as ações tomadas no segundo mandato  foram   determinantes    para a sua   acelerada  perda de popularidade,  uma vez que a sociedade logo  percebeu o quão tinha sido  engabelada pelos discurso eleitoreiro de D. Dilma.
     A par de não haver  cumprido  o que prometera,  um outro fator  crucial de sua queda de prestígio junto aos brasileiros foi   o recrudescimento  dos escândalos e denúncias  no seio de sua segunda  gestão, em especial  com  a operação  iniciada pela Lava Jato desdobrada em várias etapas de investigações  e consequentes  prisões de empresários e políticos  ligados ao governo federal  através do  esquema de propinas  pagas a membros do PT e de outros partidos aliados.
    Quer dizer,  revelações  bastante  comprometedoras do envolvimento do governo federal  em licitações  de obras de vulto   mediante o pagamento das referidas propinas que   entupiriam  de dinheiro   a direção  do PT  e de outros partidos  implicados no mesmo esquema a ponto de um  ilustre  membro do Supremo  Tribunal Federal, Gilmar Mendes, declarar  que, no país, se havia  formado  um  Estado  cleptocrático, cujos  dividendos  oriundos  de  esquema  com  grandes empresas renderiam  a vitória  do PT  em pelo menos  trinta anos.

    Fatos com esses não seriam suficientes para derrubar  um presidente da  República ?Daí se concluir  que a crise  política brasileira  tem seu  centro de gravidade no seio  do próprio governo, ou seja,  na pessoa  responsável  pela moralização  da rex publica. Não reconhecer  a  seriedade  desses argumentos  contra o atual governo  é querer  tapar o sol com  uma peneira ou  não   querer  enxergar que  o rei (ou rainha)  está nu (a) quando praticamente todo o país  vê claramente visto  a nudez  imperial e a moralidade   esfacelada.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Triste realidade atual dos autores brasileiros: escritores em perigo!





                                            Cunha  e Silva Filho



       A Cultura Brasileira, no geral, está também  decadente e por muitas razões: a explosão das mídias, hoje cada vez mais se  diversificando, a fragmentação  das áreas outrora  prestigiadas como veículos  de informação e transmissão de conhecimento não pasteurizados. Tudo isso  soma ainda, para  o bem ou para o mal,  o excessivo “excesso” de  autores de áreas não diretamente ligadas, por exemplo, à literatura,  procurando  também  produzir  ficção, já que, em poesia,  seria difícil  manejar a pena,  quer dizer,  o teclado,  para  criar   poesia de alto valor  estético - seara do gênero  para o qual  há que se ter talento e  competência linguístico-literária.
     As pessoas que passaram a vida toda labutando  na preparação de competências  que lhes  facultariam  a possibilidade  de ingresso  na criação literária  se veem desprestigiadas diante  da concorrência  de bons e maus  escritores ou de escritores que  procuram  as fórmulas fáceis de atraírem  leitores  intelectualmente rasos   que  estarão prontos a  digerir  literatura de segunda ou terceira linha.
      Os resultados dessa queda vertiginosa  de  prestígio, de valorização e atenção aos  escritores de raça, de talento genuíno aí estão  se manifestando  de várias formas  no tecido    esgarçado  cultural: os bons suplementos  de literatura estão desaparecendo, minguando,  se reduzindo a duas ou três páginas,  retirando de circulação  críticos  de mérito e experientes e impedindo também que outros críticos menos visíveis ou mais jovens  possam  ter acesso  às colunas  literárias.  
      Restarão como  alternativa  frouxamente  viáveis os blogs, os sites  coletivos ou  individuais que, bem ou mal,  continuam  produzindo, dentro de suas possibilidades,  matéria crítica ou  de outros  áreas culturais.
      Razão tem o  escritor Rogel Samuel que, em recente crônica, de título “Nós, os quase extintos,” em sua coluna  “Crônica de Sempre”do site Entretextos, em tom   melancólico e de desabafo,  constata  a situação   de desapreço  com que são  tratados os escritores brasileiros  que ele chama com muito acerto  de “independentes” – seres, segundo ele,  “quase extintos da face da Terra.”
       Ora,  tal  situação  em que  colocam  os  escritores  brasileiros   é, no mínimo, um  golpe duro e insensato    do editorialismo de cunho elitista e xenófilo que  só tem olhos  para os estrangeiros, ainda que  muitos destes  estejam  bem aquém de autores nacionais que  estão   implorando para que lhe deem atenção  e façam  circular  comercialmente  seus livros. No entanto, a cultura  apátrida,   imediatista, pragmática, com sumista  hoje pouco está se lixando para um  bom autor pouco divulgado.
. O que para os editores  mais  conhecidos  vale é o produto   da venda, não a qualidade  dos autores nacionais em todos os gêneros. Só tem vez uns poucos que caíram  no gosto  discutível  de leitores   ávidos  por  autores  de cenários  escapistas,  ou   voltados  para  as cenas picantes de sexo barato,   crime e corrupção, tanto quanto os filmes importados, em geral americanos.
    Soube por um amigo que um jovem crítico  brasileiro escreveu  ultimamente  um artigo   discutiu num artigo  a questão da realidade  da crítica   literária  nacional  que, segundo ele, não anda bem. Não anda bem  porque, diz ele, está havendo  profundas mudanças  de comportamento  de leitores  e de novas  alternativas  midiáticas   que tendem a  pôr em segundo  plano o  exercício    da análise e da interpretação de obra.
    Quero crer que  a perda da aura da antiga militância crítica se deveu  ao incremento  da força que  instrumentos  de publicidade  têm disponíveis a fim de  dispensar   o papel  de orientação  e doutrinação   de  críticos de jornais  ou de rodapés, que ficaram célebres nos anos 1940, 1950, 1960. Esses críticos militantes   foram,  por seu turno, substituídos, fora dos jornais,  pelos críticos  universitários, i.e.,  professores  de literatura,  teóricos, que  passaram  a ter  um papel de   destaque  na avaliação  e pesquisa sobre autores antigos e novos.
     O espaço  privilegiado dos estudos  literários  passou  assim a ser dentro da universidade, e a   militância crítica, que praticamente  se extinguiu ,  cedeu terreno à “crítica universitária,”confinada daí em diante  às revistas especializadas, às monografias,  dissertações,   teses, aos anais de congressos nacionais ou  internacionais, ao universo acadêmico especializado. Ao crítico de jornal coube apenas  o papel  secundário  de resenhista, de noticiador  de lançamentos  de livros.Ou seja, o papel  do agenciamento  da crítica   se instalou   de vez no seio  dos curso s de letras e em todos os níveis  de adiantamento.
    O antigo  acompanhamento  dos lançamentos de livros que iam surgindo  sofreu, portanto,  um inflexão. Já não se podia  produzir  crítica literária como  antigamente  em razão de que os livros eram muitos e o crítico não teria tempo  suficiente para lê-los logo que  fossem  colocados às livrarias. O processo da leitura  de novos  autores na  universidade era  bem mais  lento,  demandava  maior  aprofundamento  e aparato  crítico,  bibliográfico,   rigor  ensaístico, formatação  acadêmica. O velho   crítico dos rodapés, não,  era rápido,  produzia suas análises   no calor  da emoção da leitura, quiçá de um só leitura, e o seu artigo ou crítica iam logo para folha dos jornais.   
       Veja-se o exemplo da Folha de São Paulo, com  o seu atual  caderno  Ilustríssima. Veja os seus colaboradores e as suas áreas de atuação cultural: cartunista, reportagem, jornalista, tradutor, professores de diversas áreas, diplomatas e escritores. Dificilmente, se encontram entre eles críticos  literários A discussão do temas nesse caderno  sofreu  um  expansão ou diversidade    cultural  de tal sorte que  a literatura  passou  a  se inscrever   sem aquele  antiga posição de   realce  entre outras áreas. Deixou de ser a primeira dama; hoje é apenas mais uma  área da inteligência brasileira.
        São muitíssimos os blogs ou sites  que cuidam de  produzir  crítica e ensaios, ou mesmo  poesia e  ficção. 
        Voltando  ao que  declarou o  ficcionista  Rogel Samuel, há uma trecho  de seu texto que resume  a deplorável  posição – não merecida, é claro – do escritor  brasileiro  independente, que não  pertence aos grupos  de  poder da produção  literária distribuída em nichos  inexpugnáveis  de editoras  elitistas que  escolhem e repudiam  quem  lhes parece  não  estar à altura de seus lançamentos:”Ontem entrei na Livraria Saraiva no Shopping Rio Sul e vi que os autores nacionais sumiram. Só nas estantes laterais, marginais.” O cronista  se interroga, machadianamente  cético, se  os escritores independentes e os escritores  em geral  são “seres em extinção” e ainda lamenta  que, na mídia televisiva, “num domingo de tarde,”  não havia  nenhuma  notícia sobre um  poeta,  uma homenagem a um  escritor, um “cronista.” Seria preciso  alongar mais  este artigo?