terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Antes que termine o ano




                                        Cunha e Silva Filho


       Nesta mais  recente  crônica, não desejo empregar   os adjetivos  “derradeira” ou  “última.” O português, às vezes, nos constrange,  nos amedronta e nos põe em situação  de ambiguidade com tons   de superstição ao falarmos  de alguma  coisa   que fizemos por último.   Bom faz o inglês  que recorre à expressão “the latest”( “o mais  recente”)  ao invés de “the last”  (“o último”) e, assim,  evita o assombro,  o imprevisto, o não desejado,  o definitivo.
    “ Pois é”.  Esta expressão, que coloco aspeada, dá nome a um  livro  recentemente  publicado – não o li ainda -   pelo  grande  tradutor húngaro, naturalizado brasileiro, Paulo Rónai (1907-1992). O título do livro foi   tirado do nome de um sítio no estado do Rio de Janeiro,  onde o escritor, poliglota privilegiado, crítico literário, revisor,  ensaísta e  internacionalmente premiado tradutor, professor exímio  de latim  e francês no Colégio  Pedro II, autor didático, morou   nos últimos anos  de sua  brilhante  vida
    É com este  título  que imprimirei o tom  a  estas linhas  de fim de ano, de um ano  conturbado nos mais variados  sentidos,  notadamente no campo  político, na questão da violência combinada com  a  corrupção  do  petrolão  e seus tristes  e vergonhosos  desdobramentos.
    Pois é. O saldo do ano que nos  resta em dois dias, em muitos  setores,  não foi  nada alvissareiro e tudo perfeitamente  cronometrado  para  liberar   a caixa de Pandora logo após as  eleições, quando   o fato   estava  consumado   e a governante (ou será governanta? É melhor  perguntar ao  Marcos  Bagno que sabe de modernidades linguísiticas   e de oralidades  urbanas) certa e ancha  estava de que  tudo novamente  se achava   em suas mãos, inclusive a   segunda rodada  do cargo  máximo da  Nação. Da minha parte, assim o desejo, que aquela caixa, por exceção,  pelo menos  para  os próximos anos, liberte a esperança que, segundo  a mitologia grega,  no seu  fundo infelizmente  ficara.
  Pois é. Vieram , contra a vontade do povo, as notícias transmitidas  pela mídia  múltipla  e ubíqua: aumento  de gasolina,  de  impostos,   inflação  em  subida,   violência,   impunidades   pétreas. Ate cabe aqui o  “esquartejamento” – termo usado pela Venina da  Petrobrás. “Esquartejamento”, de resto,  me lembra a figura sacrificada de Tiradentes.    
 Falou-se também  dos  aumentos  dos  grupos dos altos  poderes, aumentos auto-concedidos e proclamados. E ainda os chefes das finanças nos vêm com  essa  conversa mole  de que  os gastos foram  grandes  e,  portanto,  há a conveniência  de  aumentar os juros,  os impostos,   os preços  de tudo, numa reação em cadeia.  Os americanos,  que tinham  investimentos  junto à Petrobrás,  se queixam de que, com  os rombos  gigantescos nas contas   de propinas e subornos  esquadrinhadas  pelos  órgãos  competentes do Estado, tiveram  prejuízos e,  por  esta razão,  vão processar  a Petrobrás  para  ressarci-los  com o peso  da lei. É bem possível  que o façam   porque americanos   nasceram  no epicentro  do capitalismo e não  abrirão mão  de seus  revenues.
        Pois é. O ano  de 2015 nem  acabou  e já contamos essa série de notícias desagradáveis. Porém,  não pense que tudo  foi   malfeito e mal administrado.  Por exemplo,  há muitas   repartições  federais,  órgãos do governo nos quais  a tecnologia  está avançada e  as coisas funcionam  bem. Por exemplo,  o serviço dos Correios. A Polícia Federal, entre outros.
         O  cerne dos males  do governo  federal é a politicagem,  os conluios,  os apadrinhamentos,   o “toma lá dá cá.”  O jogo  do poder  a qualquer preço,  inclusive com   a coexistência da  corrupção   ainda reinante  e endêmica.
       Se o governo  quiser realmente   receber o apoio do eleitor, das pessoas  esclarecidas, ele terá que  efetuar  uma mudança radical:  mostrar que vai    cortar  seus gastos,   quer pessoais, quer  do conjunto   das instituições   públicas. Quer dizer,  o governo federal  deve dar   o exemplo no seu próprio  seio, na escolha de homens  corretos, competentes nos setores cujas pastas irão ocupar, indivíduos  comprometidos  com  o bem do  povo e do país.
     O segundo mandato de D. Dilma  não poderia ter  um número gigantesco de ministérios que só darão  gastos  aos cofres  do Estado, ou  azo para  cabides de empregos  de  apadrinhados ou de natureza oligárquica.
    Não é justo que aumentos  astronômicos sejam   concedidos aos altos escalões federais  se o governo  não   der aumento   também  ao funcionalismo  em geral.  Tal  injustiça  cria indignação  no seio do  próprio funcionalismo   e prejudica   o desempenho  desejável  da parte  dele.   Ao conceder  aumentos a quem  já  ganha altos salários,  o governo   se torna  elitista  e se iguala  àquelas nações  discricionárias,  nas quais   há uma  ostensiva  divisão  de privilegiados e de explorados.  Diferenças entre salários tem que haver por razões de   responsabilidade de cargos  e de competências, mas não a ponto de   se tornarem  descabidas e  provocarem  a rebeldia   do povo contra os que detêm  o comando   do governo.
   Que, em  2015 D. Dilma  possa   repensar em profundidade  os grandes erros  cometidos  em seu governo e a passagem simbólica do ano e do novo   mandato  seja o momento  inadiável de  melhorar  o Brasil livrando-o   da feia imagem que seu governo  construiu aos olhos  do mundo  mais democrático, civilizado e justo.
    


quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

BRAZIL'S OVERVIEW CORNER: American policemen are wrong: black people will certainly claim their rights




[This Portuguese  translation of this article  is found at the end of  the English  text]
                                        
                                                                              By Cunha e Silva Filho

         
          If I remember correctly,  up to now,  three black youths and one adult have been  killed by the American  police. This  death toll is already  exceeding the  limits of brute force   and barbarous  actions  against  American-African   people in  the USA.  Something is  not  being  well administered  in the  policy of  violence  in a country  that should never  allow such  crimes   might be   commited by  those who  are paid  by the State  to defend  the  people of the USA  irrespective of  the color of their skin. In my view,  those actions  are  clearly   illegal and should accordingly  be  rigorously  punished by American   Justice,  in each   state of  the country.     
            In  a country  the   records of  which  have been  regrettable  along  policemen violence against  black  people, in a country  that  has  gone through  a historical bloody  past  brought  about   the stigma  of  racism, social  segregation  between  whites and blacks that culminated  with  the   battle  of  racism   by  great men like  Martins  Luther  King and a few other  leading    men   who  faced   the most disgusting  kind of  feeling represented by  the social  evils  caused by racism,  a fascist   conception  of  valuing  human  beings  by mere   skin  difference which  does not  find any  scientific   support from   science.
           I think   it is high time  President Obama, specially because  he himself is  half-bred  and a Nobel  Peace  Prize winner, and is so   morally  the  most  important    person  to   take the lead  and  once and  for all to   strive for putting  an   end to this  bloodshed people  the world over has  seen on  TV channels.  
        He is  vested with   all the weight of  his  influence and power  to   find a solution    for  the  successive   deaths  of  black  people  in the  country   he is  currently    ruling..  It up to  him  to endeavor all  his  efforts  with  the help  of  allied white  important  American   leaders to fight against racism with a steady   fist   and  with all the authority  he has been  entrusted with by  American Constitution.
         His  political  biography will  be scratched  if he  neglects  this  crucial   issue. I am sure he does not  wish  it to happen. Great men,   statesmen  of the past, including  Abe Lincoln,  have proven themselves,  by their  remarkable biographies,  that  there are enough   good examples which  Obama  can mirror  on  to  find an immediate   way  out    as far  this  serious   problem is concerned. In one of   President’s Obama  recent  speeches  he asked for  society  to be “calm”  concerning   the deaths of  black people, in my view,   by unprepared policemen. He is, so to speak,  on the horns of  two dilemmas: either the USA  humanizes  her   police  force, or there will  certainly be   days of  unprecedented   social turmoil  ahead.
       Therefore, President  Barack  Obama  will have to show  all  his   authority by  punishing   criminal  policemen anywhere in the USA.  What cannot  go on is the  form by which  black people are being  shot dead nowadays. For no  concrete  reasons, it seems to me,  a black human being  should be shot dead  at close range. In sound  conscience,  this is  not  the right way for a policeman  to  fire against   a supposed  criminal. Even a recognized  criminal  should  be treated   according to  right   forms  of  military procedures.
       I hope the American  people as a whole,  blacks and whites, will  join this  struggle, of course in  a peaceful  way,  hand and  hand   with President Obama. If  society  in  bulk  protests against the   barbarous – a shame on   modern times  for a civilized  nation which ranks first in the  world economy -  behavior shown  by some policemen  when  treating or  searching   a suspect just  because he is poor and black, I am  mostly sure  the  problem   will    result  favorable  for  black  people in general.
     Thus,  only  the  pressure of  civilian society  with the   authority  of the President  of the United States will  violence  against blacks  change for better or even  be reduced almost to nothing. The problem  is in the hands  of  American  people  of good will  who  know that   only through peaceful means  will  the country  get   his   best of  practising true democracy.
      I guess  this is one of the  strategies  that should at once  be  instrumental in tackling this  issue and so  avoid  those    abominable disproportionate   actions of  policemen in groups  trying to    shackle just one   unarmed man crying alone  in utter despair: “I can’t breathe”,  by repeating  his words   without   the  least sign of  mercifulness on the part of the  strong and  at the same time  coward  cops.  So was killed the black American  man, an American born  citizen   entitled to the same benefits granted  to any  citizen  living under  American  Civil  Rights guaranteed by  the American  Constitution.
        His  final   and  agonizing   cry, “I can’t breathe’,  if depended on this  columnist,  should  be  a meaningful  motto to be  echoed everywhere  in  the  country of George Washington and other  great  men  of  the USA. As a Brazilian writer,   from this column I am  expressing my deepest  sympathies to the  family of this innocent, perhaps one  among others in the same  situation.
      In conclusion of my  ideas about  these   very sad  incidents,  allow me  to  get inspiration   in the  four freedoms  proposed by  Franklin Delano Delano Roosevelt,  by the way cited in my previous  article in this  blog:  a fifth  freedom from   fear of being born  black in  the United States with the right of  walking,  go anywhere and live  in  peace like any other individual in  the world.

               
Policiais americanos  estão errados: a  população  negra seguramente usará de seus direitos

                                                        Cunha  e Silva Filho


             Se não incorro em  erro, até agora três americanos de cor negra e um adulto foram  assassinados  pela polícia  americana.  Este número de   homicídios já extrapolou  os limites   da violência e de ações bárbaras  contra afro-americanos nos Estados Unidos. Algo  não  se está  fazendo  corretamente  na administração  da  política  da violência usada por policiais no país  que não deveria  permitir  que  tais crimes  pudessem ser  cometidos  por aqueles  que são pagos pelo  Estado a fim de defender as pessoas independentemente  da cor da pele. Na minha  visão,  essas ações são claramente  ilegais e , com tal,  devem ser  punidas  com o rigor da Justiça  americana em cada    estado.
Um país cujo recorde de violência policial  contra negros tem sido  recentemente  deplorável,  num país sobretudo que já passou  por derramamento  de sangue  em períodos históricos  passados e que provocaram  o estigma do racismo, da segregação social entre  brancos e pretos,  culminando na batalha  contra o racismo.
Esta batalha  foi   conduzida por  eminentes homens como  Martin Luther King e poucas outras  figuras de destaque,  que enfrentaram o mais  detestável  tipo de  sentimento representado pelos males sociais  produzidos  pelo estigma do  racismo, uma concepção  fascista de  valorizar seres humanos meramente pela cor da pele, a qual  não  se sustenta  cientificamente.
Julgo que já era hora de o  Presidente Barack Obama enfrentar a questão do racismo e da causa do negro  pobre americano  de um  vez por todas, seja por ser ganhador do Prêmio Nobel da Paz, seja por ser  mestiço  e por ser, assim, moralmente a pessoa mais   proeminente   a fim de  pôr cobro    a este  derramamento de sangue a que  se tem  assistido  pelos  canais de TV do mundo  inteiro.
Obama está investido de todo o peso  pessoa de sua influência e poder a fim de  encontrar uma solução  para  as sucessivas  mortes  de  negros no país  que governa. Cabe a ele  esforçar-se ao máximo   com o apoio de  importantes  aliados líderes  brancos com o objetivo de  combater o racismo  com  pulso  firme e com toda a  autoridade que lhe outorga a Constituição americana.
Sua biografia política será arranhada se houver  desatenção dele sobre  esta intrincada  questão e estou  certo de que ele não  desejará isso  para si. Notáveis homens, estadistas do passado, incluindo Abe Lincoln,  demonstraram, através de suas   magníficas  biografias, que existem suficientes bons exemplos nos quais  Obama  pode se espelhar a fim de  encontrar  uma saída no que concerne a este sério  problema. Num dos mais   recentes   pronunciamentos  do Presidente Obama, ele pediu que a sociedade se “acalmasse” no que tange às mortes de negros,  a meu ver,  causadas  por  policias  despreparados. Ele,  por assim dizer,   se encontra diante de dois dilemas: ou  os EUA humanizam seus policiais, ou haverá  seguramente  dias  de turbulência sem  precedente pela frente.
Por  conseguinte,  O Presidente Obama terá que fazer valer toda a sua autoridade punindo  policiais criminosos em qualquer parte dos  EUA. O que não  pode  persistir é a forma pela qual  negros  estão sendo fuzilados atualmente. Por motivos  não claramente justificáveis,  um negro  abordado deve merecer ser executado à queima  roupa. Em sã consciência,  esta não é a maneira  correta de um policial atirar contra  um suposto   bandido. Até mesmo  indiscutíveis  criminosos  devem   merecer um  tratamento  consoante  modos  corretos  de ação militar.
Espero que  o  povo americano  como um todo , pretos e brancos, juntar-se-ão nesta luta, é claro,  por meios  pacíficos, de mãos dadas com o Presidente Obama. No caso de a sociedade em bloco protestar contra  a maneira  selvagem -  vergonha para  os tempos modernos de uma nação civilizada  que detém  o  primeiro  lugar na economia  mundial -  demonstrada  na abordagem por  alguns policiais de  suspeitos meramente  por serem  negros e pobres, não tenho dúvida de que o problema terá  efeitos favoráveis  aos negros em geral.
Desta maneira,  somente  a pressão da sociedade civil junto com a autoridade do Presidente  dos EUA fará com que a violência contra negros  melhore ou mesmo  se reduza  ao mínimo. A questão  fica nas mãos  do  povo americano de bons sentimentos, os quais sabem que,  somente  pela paz o pais  encontrara sua  melhor   e verdadeira  atuação democrática.
Creio  que esta  é uma das estratégias  que deveriam   de mediato  ser implementadas na  resolução   da questão e assim  evitar esses abomináveis  ações  desproporcionais de policiais em grupos procurando algemar um homem sozinho  e desarmado gritando em desespero: “Não consigo respirar”, repetindo suas  palavras sem a mínima  reação  de misericórdia da parte  de corpulentos  e ao mesmo tempo   covardes  policiais.
Assim  faleceu  este homem negro, um cidadão americano com direito  à mesma proteção  dos Lei  constitucional americana.Seu grito final e agonizante, “Não consigo  respirar”, se dependesse deste colunista,  bem  deveria   ser o lema emblemático ecoando   por todo  o país  de George Washington e outros ilustres  varões da América. Como  escritor brasileiro,  desta  coluna expresso minhas  sentidas  condolências  à família  deste inocente, talvez um entre outros na mesma  situação.


segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Fragmentos: memórias e outros temas




                                           Cunha e Silva Filho


1.            Um  vez um escritor meu amigo  me falou do que  pretendia  escrever durante  a parte mais ativa de sua vida e não o conseguiu por  encontrar um  obstáculo: a postergação  dos  planos, das  realizações,  das ações pensadas e  concretizadas. Me  incluiria neste caso. Paulo Mendes Campos (1922-1991), em crônica   notável,  já dizia que os brasileiros somos   pessoas   que estamos  sempre adiando o que  devíamos  fazer. Contudo,  neste fragmento,  venho relatar um fato que  ocorreu  comigo e meu  irmão  Evandro,  falecido  ainda já moço  faz dois anos.  Antes, contudo,  me perdoem os gramáticos  tradicionais pela colocação  pronominal proclítica empregada por mim, de forma assistemática.
               De resto,  já no tempo do erudito e sábio  João Ribeiro (1860-1934). Essa questão gramatical foi  por ele mesmo   observada como própria da índole do  português  brasileiro. Mário de Andrade ( e outros  modernistas de 22 já utilizavam  essa  colocação até no gênero ensaístico, no que foi criticado  pelo critico Álvaro Lins (1912-1970). Hoje em dia,  seu  uso  oral entre pessoas  instruídas ou não é também  visto com frequência. Entre os gramáticos  e linguistas mais novos,   como é exemplo, entre outros,  Marcos Bagno ( linguista que está bombando  atualmente  com  as suas  renovações  pedagógicas no ensino  do português), o registro oral e escrito urbano (só urbano?) da próclise no início do enunciado é democraticamente  acolhido.
              Em 1990, o meu irmão Evandro Setúbal da  Cunha da Silva (1947-2012), mencionado  acima,   após o sepultamento de nosso pai,  me dirigiu uma cartinha   datilografada que, até hoje,  tenho comigo. É uma carta em que  fala de um artigo  meu  sobre o passamento de  papai escrito à mão, depois  publicado em jornal  de Teresina e finalmente  reproduzido no meu livro As ideias no tempo.Ela dá a medida  justa do  hábito de postergação de nós brasileiros.
             Veja o teor da carta, excluída  uma parte de natureza confidencial:

                                                                                                     Te, 18-02-90

Francisco,

            Em anexo,  envio-lhe exemplar do jornal onde saiu a sua oportuna crônica de saudade.
           Editada, el se me apresentou mais sensibilizante, talvez por estar  relacionada graficamente com o que fazia o nosso pai através dos jornais de Teresina. Tocou-me e a muitos que conheceram o ‘Velho  Cunha.’
          [.................................................................................................................................]
        Você, como ele,  sabe dizer bem o que os outros  gostariam de dizer. Eis o segredo da palavra escrita. Nada de laboratórios literários, a boa arte está na maneira  natural  de se manifestar.
        Por hoje é só. Ainda haveremos  de manter  substanciosas correspondências. Aguarde.
                  Do amº, irm. e admor.
                              
                                Evandro
           .
 
          A correspondência, como se vê, data de vinte e quatro anos  atrás!  O não cumprimento    da parte dele e da minha, que lhe seria  interlocutor,  provocou um fosso de ausência  de  trocas de ideias mútuas e de uma maior intimidade  entre nós, sem cujo cultivo faz perder  entre dois  seres, irmãos ou amigos,  a naturalidade tão cara, tão necessária  aos relacionamentos  afetivos e fraternos.
         Talvez muita coisa tivesse sido  diferente entre nós. Só posso lamentar o lapso  vazio no tempo que já se foi. Toda  escrita é uma possibilidade entre outras,  um ato  em potência, uma rasura.

2.        Os EUA  estão  revivendo  cenas  do tempo  do apartheid  racial  norte-americano e, por  infeliz  coincidência,   quando na Casa Branca se tem um  presidente negro. Obma,  prêmio Nobel da Paz,  deve ser  firme no que  diz respeito  a uma esforço  hercúleo de pacificar os ânimos   aguerridos  dos afro-americanos. Não pode ceder  um milímetro  a resistências    retrógradas de brancos    racistas. Longe estamos  dos saudosos  tempos  de Mandela,  de Martin Luther King e de outros  menos conhecidos  combatentes, incluindo  brancos,  que  lutaram contra   a monstruosidade  do  racismo   na América.

3.     Fato estranho   o de  a presidente Dilma,  em  pronunciamento  no exterior,    afirmar que não há corrupção  no país, ou eu estou  enganado? Seria o cúmulo ou, com  diziam  antigamente os ingleses: “That’s the pink limit!  O depoimento  de uma funcionária graduada da Petrobrás à jornalista  Glória Maria, transmitida ontem na TV Globo  dá o que  pensar, e muito!  Há muita coisa  suja ainda   debaixo do tapete  da estatal  brasileira  do  petróleo.
       Ora,  quando  uma funcionária dessa empresa  se diz ameaçada e com medo de alguma coisa,  é porque há algum malfeito  no reino da Dinamarca, desculpe-me, do  Brasil. A coisa está ficando  preta,sobretudo para  o   o governo federal , à frente o poderes executivo e  legislativo.
4       Muito antes da véspera do Natal  alguns  brasileiros   já dão sinal de que  estão em férias ,  entram em recesso, fecham as portas e vão  fruir as delícias   do far-niente. O brasileiro gosta muito de  ganhar dinheiro, mas alguns  gostam mais é mesmo   de sombra e água fresca.

5.      Ainda se fala aqui no Rio de janeiro na possibilidade de uma invasão  tipo tsunami que  engoleria   a cidade. Longe de nós esse pensamento,  que me faz  vir à mente o tsunami   da Indonésia, o qual , de resto,  atingiu mais 13 países, dizimou  mais de duzentas mil  pessoas, uma tragédia   universal que não  queremos   ver mais.

6.     Como se tem  editado  no país! Pipocaram  escritores  nos quatros cantos da Nação.  Haja críticos e resenhistas para acompanharem essa montanha de livros  impressos  e  de e-books.A minha pergunta é  saber quanto    deles sobreviverão  para a história  da literatura brasileira.

7.   Publicar no  Brasil,  em algumas editoras   famosas, com tantas exigências  técnicas de formatação do texto  e  do uso   de  normas  específicas  editoriais,  dá cansaço e vontade de desistência   do pretendente a escritor. Por vezes, o processo  é tão complicado que autores há  que recorrem  aos préstimos de um  especialista em preparação  de originais para, então,  e só assim, enviar o  orignal ao editor.   É por isso que  há tantos  livros  escritos  guardados na gaveta, o que é lamentável  porque  muitos  dessas obras   têm valor  e  ficarão  no limbo   do ineditismo. Por outro lado,  outros gêneros   de  livros de fácil absorção são vendidos  como água.

8.   Entrar numa livraria sem  comprar um livro  é um tormento  para  este colunista. Por isso,  muitas vezes,  passo ao largo  das livrarias a fim de não cair em tentação.

9.  Para tempos tão instáveis, não obstante o Natal, que se aproxima, ser para mim sempre  radiante   como comemoração cristã, seguido  das festas do Ano Novo,  é preciso  ter um  coração paciente e ao mesmo  tempo atento à realidade  brasílica pouco propicia  às efusões  dos bons sentimentos.

10.  Sempre  é bom   recordar,  algumas palavras que   se ajustam   à  ausência  da austeridade  do governo  brasileiro. Vou-me socorrer das  palavras de Franklin Delano Roosevelt (1882-1945) sobre  o tema da “liberdade”(que deixo, abaixo, em  tradução  livre do colunista):

            “Em dias vindouros, que procuramos tornar realidade, antegozamos  um mundo alicerçado em quatro liberdades  essenciais.
             A primeira é a liberdade do discurso  e da expressão – em  todo o mundo.
             A segunda é a liberdade que cada pessoa  deve ter de adorar  Deus  à sua maneira – em todo o mundo.
             A terceira é a liberdade  de satisfazer   seus anseios, que,  traduzidos num sentido  universal,  significam  proporcionar condições econômicas  a cada nação a fim de que seus habitantes    desfrutem de uma vida saudável e  vivam em paz – em todo o mundo.
             A quarta liberdade é a de não sentir medo – que, traduzida em temos universais, significa uma redução, em escala mundial,   dos armamentos em tal  extensão e de  forma  tão perfeita  que  nenhuma nação  poderá ficar numa posição de cometer  um ato  de agressão física contra  qualquer  vizinho – em todo  o mundo.              

        Pelo visto,  qualquer leitor, em  qualquer país  democrático,  perceberá  a atualidade  do pensamento  daquele  grande estadista  americano.

Nota do Colunista: Aproveito a oportunidade para desejar ao  leitor um  Natal  com  muita paz,  saúde e harmonia e um Ano Novo de 2015  mais  feliz  e com mais paz  no mundo
Note of the columnist: I take this opportunity to wish a  Merry Xmas  full of  peace,  love,  health ,  harmony and the  happiest  2015  New Year with  a lot of peace  to my readers  all over the  world. 

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Brasília: a farra dos salários e Natal dos neo-marajás

      



                                                            Cunha e Silva Filho


         Quem me disser que o Brasil é uma democracia,  está  definindo uma meia-verdade, ou  um  verdade no plano do realismo  mágico.
         Antes das eleições para presidente e governadores, senadores  e deputados, o discurso dos candidatos a presidente da República eram meramente  marqueteiros,  sobretudo do  PT,  pois não  se   reportaram  ao que, depois do resultado das  eleições, já sabiam antecipadamente o que  se reservava ao povo que  elegeu a D. Dilma a um segundo  mandato, embora com   vitória  apertada, o que quer dizer com a reprovação  de praticamente a metade do número de eleitores  que votam.Tira-se daí uma  conclusão:  o eleitor brasileiro  é secularmente   esbulhado  pelo discurso politqueiro, de aparência , só para  inglês ver
      Ora, nos discurso  de D. Dilma o país semelhava a um  quase paraíso, um   “ilha da fantasia,”  onde não havia  inflação,  não havia  pobreza,  sem-teto e   hospitais,   escolas,   segurança  pública   sucateados,  enfim, todo  o  lodo ou lixo ou o que o valha foi  posto  debaixo do  tapete do cinismo e da  empulhação  deslavada. Além disso,  o chamado  déficit  público, i.e., a dívida  pública  foi   também  escamoteada  das discurseiras estéreis  e  enganosas   de palanques  mambembes. Tripudiaram  sobre os eleitores cordeirinhos  da classe média ou "mérdea" da “patuléia”, conforme costumava   definir  o  contista  João Antônio (1937-1996) ao  aludir  à massa ignara  de “humilhados e ofendidos.”  
       Passadas as eleições,  retomando  os  antigos assentos para mais um mandato, aí  incluindo  da presidente aos  deputados, o país “mostrou outra cara.” Os indicadores  econômicos  começaram a falar  em  inflação  em alta,  em  dívida interna   cavalar,  em  falta de  dinheiro,   desvalorização do real,   enfim, em tantas outras    revelações  que  a mágica da  Presidência  não queria  tirar  do colete. Em outras palavras,  o  Brasil,  agora,  ficou,  num piscar de olhos, transparente ao seu povo, antes  anestesiado e ludibriado  pelas   arengas  solertes e midiáticos  de D. Dilma e de  sua entourage,  contumazes  bajuladores  palacianos, cuja única sinceridade  é o bifrontismo até para a própria  Presidente Dilma.
       Paralelamente a esse Brasil  real  e  envergonhado, explodiram  as sucessivas    denúncias  das falcatruas  de altos  funcionários  da Petrobrás  em negociatas   com  empreiteiras, mancomunados com alguns   políticos, inclusive, do PT,  dentro e fora  do  país,   com objetivo  bem   planejado e de caso  pensado  de   vampirizar  o sangue – digo melhor -  o dinheiro da  Petrobrás – a maior estatal  brasileira. O quadro ficou  dantesco ou, para outros,  mefistofélicos  nas suas    tramas e no  enredo da  tragicomédia  nacional. A Polícia Federal,  dando exemplo de  alto  sentido  público,   não  economizou nas investigações aos tubarões  e predadores  do Erário  Público. Foram fundo, descobriram  cobras e lagartos  do bas-fond  da  estrutura  administrativa    do país. Mandados foram expedidos para prender falsários e  dilapidadores   do povo   brasileiro.  A máfia e seus  componentes,  pouco a pouco,  vão sendo  desvendados.
        O instrumento   da delação premiada, se ajudou  um pouco,  não  é o bastante  para se   avaliar  o quanto ainda  está submerso  no lodaçal  da impunidade da máquina  estatal   do país.
       Dadas  tantas   danças e contra-danças  no rodamoinho da   politicagem  nacional,  percebo que  as CPIs, de parte em  parte,  ou seja,  do governo e da oposição,   procuram  fazer o seu papel  de  co-adjuvante   da Polícia  Federal e   do Ministério  Público;  não desejam, contudo,   tocar na ferida,  ou seja,  evitar ao máximo que  os escândalos da Petrobrás  apontem   figuras  políticas   de alguns   partidos, o que   sinaliza para um   certo  cuidado de preservar  a declinação   de  nomes de políticos que sabemos  estar  envolvidos até os dentes com as maracutaias petrolíferas...
       Todavia,   toda  essa digressão  se  imbrica num   outro   fato  digno  da  indignação   brasileira, sempre cordeirinha,  bem-comportada,  bem classemediana ou mesmo  aburguesada, amiga  inseparável dos bares, da cervejinha , vinhos ou mesmo  para os mais afortunados,  do whisky e das comidas   apetitosas temperadas   dos  fins de semana nacional. Bares cheios,  todo mundo  comendo  à farta,  com seus carros   atravancando  as cidades,   as ruas, os estacionamentos  que não mais comportam   tantos  veículos    dos   adeptos do epicurismo  sem peias e  dos shoppings refrigerados,  com  seus usuários  fugindo  do calor do verão.  Todos  desfrutando da dolce  vita. “Que importam  os famintos,   os  pobres,  os  baixa renda?” “Eu quero  é viver a vida na  plenitude  dos valores  hedonísticos,   do viver ao máximo  todas  os prazeres físicos  e gastronômicos. Viva o prazer!”
         Tudo isso,  leitor,  pensado e refletido, foi um expediente   para este articulista  reclamar contra a farra dos   aumentos,     aprovados agora,   para os  donos do poder: ministros,   políticos,   área da Justiça, numa reação em cadeia que  seguramente  passará para o setor público  estadual e  municipal.  D. Dilma, da sua governança  provisória  no Mercosul,   com seu novo   salário   polpudo e seu cartão  corporativo  que   as más línguas  dizem  superar  os gastos  pessoais da  rainha da  Inglaterra, a tudo isso  assiste  soberana  e  bem avaliada  pelo IBOPE, ou seja, em ascensão  no gosto  brasílico. País dos contrastes!
         Enquanto isso,  os  funcionários  públicos federais da ativa  e inativos, tais como professores, burocratas,  médicos,   enfermeiras, engenheiros  e de outras categorias    permanecem sem  aumentos salarial  há pelo menos  três anos! D. Dilma, existe   maior    desfaçatez  e  descaso  do governo federal  para com  esses  servidores  da União  com  os salários  praticamente  congelados, que estão sendo  corroídos pela  inflação que a Sra. negou  nas campanhas  quando afirmava  estar sob  controle?
      O país,   quanto aos direitos  de cidadania,  está  assim,  clivado no que concerne aos vencimentos  de seu funcionalismo: os  altos   cargos  da República autoproclamando  seus   aumentos  anuais com índices  de porcentagem   de neo-marajás. O resto da Nação,   que se dane! Os parlamentares  e os outros altos  escalões  calados ficam,   antegozando as delícias do poder  reinol.Vou usar um chavão  histórico:  De Gaulle  tinha  razão.




segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Tradução do poema "The slave's dream", de Henry W. Longfellow (1807-1882)

            




                        The slave’s  dream 
            

Beside the ungathered  rice he lay, 
          his sickle in his hand;
His breast was bare, his matted hair
          was buried in the sand.
Again in the mist  and shadow of sleep,
          he saw  his native  land.

Wide through   the landscape of his dreams
          the lordly Niger flowed;
Beneath the palm-tree on the plain once more
          as king he strode,
And heard the tinkling caravans descend the mountain-road.

He saw once more his dark-eyed queen
         among  her children  stand;
They clasped his neck, they kissed his cheeks,
          they  held him by the hand! __
A tear burst from  the sleeper’s lids,
          and fell into the sand.
And then at furious speed he rode alon g
         the Niger’s bank;
His bridle-reins were golden chains, and,
         with a martial clank.
At each leap he could feel his  scabbard of steel
          smiting his stallion’s flank.

Before him, like a blood-red flag,
          the bright flamingoes flew;
From  morn till night he followed their  flight,
          o’er plains where the tamarind grew,
Till he saw the roofs of Caffre huts, and  the  ocean
          rose to view.

At night he heard the lions roar, and the hyena scream,
And the river-horse, as he crushed the  reeds
         beside some  hidden stream.
And it passed, like a glorious roll of drums,
         through the triumph of his  dream.

The forests, with their myriad tongues,
        shouted of liberty;
And the blast of  the desert cried aloud,
        with a voice so wild and free,
That he started in his sleep and smiled.
         at their tempestuous glee.
He did not feel the driver’s  whip,
         nor the burning heat of day;
For death had illumined the land of sleep,
         and his lifeless body lay
A worn-out fetter that the soul had broken
         and thrown away


   O sonho do escravo

Junto do arroz ainda por colher jazia,
        numa das mãos a foicinha.
O peito nu, o cabelo, emaranhado,
        na areia   enterrado.
No meio da névoa e sombra do sono,
       seu berço natal aos seus olhos renascia.

Na amplidão da paisagem de seus sonhos,
       fluía, majestoso,  o Níger.
Outra vez mais, por sob as palmeiras da planície,
       como  rei caminhava a passos largos
    E ouvia,  descendo o caminho  montanhoso,   o tilintar das [caravanas.

    Outra vez viu os olhos  negros da rainha
          No meio dos filhos.
    Estes o pescoço do pai abraçavam, beijando-lhe a face,
          segurando-lhe as mãos __
    Das pálpebras verteu uma  lágrima
          que  na areia veio cair.
    De repente, com  rapidez fulminante,  atravessou
          a margem do Níger.
    Douradas  eram-lhe  do cabresto as rédeas
         um  ruído  guerreiro provocando.
    Sentia a cada salto que o aço do sabre
        o flanco do seu garanhão machucava.

    Diante de si,  qual um  estandarte de cor sangrenta,
       brilhantes,  fugiam  os flamingos.
    Seu voo seguia da manhã até o anoitecer.
          sobre planícies onde crescia o tamarindo
    Até que de Cafraria viu    das cabanas os telhados.
    À noite,  o rugido do leão  escutou, assim como  o  uivo da hiena.
    E o grunido do hipopótamo, enquanto  ele esmagava os juncos,
        próximo de algum  riacho  oculto,
   Atravessou, como um glorioso   rufo de tambores,
       de seu sonho o triunfo.

   As florestas, com as suas miríades de línguas
       clamavam por liberdade.
    E a rajada do vento do  deserto, em alta voz,  gritou
       com uma voz  tão selvagem e livre
   Que fez com que ele continuidade  desse ao seu sono, sorrindo
      com a procelosa  alegria.
    Nem sentiu ele o chicote do  algoz
       nem tampouco do dia o calor  escaldante.
    Pois a morte do sono a terra iluminado havia
       e do seu corpo sem vida, o qual jazia
    Qual grilhão que  a alma houvesse
      lançado ao  lixo.

                                                           (Trad. de Cunha e Silva Filho)
         
        
           





                         

sábado, 13 de dezembro de 2014

A insidiosa violência e impunidade brasileira







                                                         Cunha e Silva Filho

            
            No momento desta escrita,  na sala do meu apartamento, na tevê,   num  programa que aborda  assuntos policiais e de  violência, ouço  desfilando  uma série de  notícias  escabrosas   do que de mais vergonhoso  acontece diuturnamente  no Brasil, incluindo,  reportagens de situações recorrentes   de crueldades  do nosso cotidiano: uma ex-marido mata a esposa e a filha  por ciúme,  por achar  que  lhe  ultrajaram  a honra; uma  linda jovem  é assassinada pelo  ex-namorado;  um  serial killler  mata dezenas  de  pessoas  sem  demonstrar nenhum   arrependimento; um psicopata  mata duas vintenas  de  pessoas  por prazer  ou por  morte por encomenda. É infindável  o número de homicídios  no país em toda a  parte e -  vou arriscar – principalmente em  São Paulo e Rio de Janeiro.
           Não posso me furtar a um fato   que me  parece  ter alguma veracidade   de opinião: os crimes  acontecem mais  nos  estratos mais   humildes  da  população brasileira. Na high society acontecem igualmente  crimes tão  horripilantes quanto  nas camadas  médias  e  baixas  da sociedade. Esse, no entanto,  é um dado sociológico nada desprezível, i.e.,  o crime, além de estar associado   à ignorância e a uma  educação   mais   desenvolvida,   está  da  mesma sorte  associado   à vida afetiva, amorosa, à sexualidade.
        Por outro lado,  é insofismável  que o componente  da estrutura  jurídica e, em especial,   da legislação penal  jogue um  papel  primordial  na criminalidade  tendo  como eixo-central   a condição  da impunidade. Diria mais, além da impunidade,  outro fator agravante  e atrelado a ela é a inalterabilidade  das  leis  de que nosso  Código  Penal   dispõe. Tornaram-se  praticamente  causas   pétreas em muitos aspectos  que só têm  trazido  o recrudescimento   da delinquência  entre nós.
       Se o país  investir  pesado  na  educação e melhorar as condições do bem-estar  do povo, já se estará dando um  bom passo  na    formação de jovens   menos   violentos e propensos  ao crime.  A educação   transforma  para melhor  a mente,  o corpo físico e a consciência  de uma cidadania  mais humanizada e integral.
       A modificação  das atuais   leis  penais, que  dependem  de projetos de mudanças  na alteração  da  maioridade penal, ou seja,  de uma mentalidade  mais avançada e ajustada à vida  contemporânea, proporcionará  novas  e mais  rigorosas leis que decerto  redundarão  em   frear  os impulso animalescos  e a selvageria  de  criminosos.
        Com as leis  em vigor,  o  bandido, o criminoso,   o homicida,  ainda mesmo aqueles  que  sofrem de  psicopatias,  não se sentem   ameaçados pela estrutura  do poder   jurídico, do  nosso sistema penal, porquanto   têm  consciência de que  no país quem  mata não é  punido  e, quando  o é,  as penas elevadas  contam  com  benefícios  da chamada  progressão  penal. Ora,  é muito fácil na prisão  um condenado  perigoso  mostrar-se  ou fingir-se  de bom comportamento diante do fato  de que,  se for  assim visto  aos olhos  da autoridades prisionais,  naturalmente   fará jus  à diminuição  de sua  pena.
       Essas brechas  da lei,  tão  conhecidas dos advogados  de criminosos,  é um excelente  e prático  expediente  para  levar  um  apenado  à liberdade. Conhecedores  dessas regalias,  o  criminoso    se sente fortalecido e mesmo   amparado   pela  estrutura  penal  do  Estado  brasileiro.
       Por essas e  outras  razões,  facínoras   brasileiros,  sobretudo os de menor e adultos  que   sabem   como funcionam os meandros    que o conduzirão à liberdade,   não se sentirão  nunca   amedrontados  nem pensarão duas vezes  para cometerem  iguais  ou  outros  crimes ainda mais   hediondos. E, assim, vai a nação  assistindo, desesperada  e  abandonada,  à escalada de  barbáries   ceifando  as vidas de  inocentes, crianças,   adolescentes,  adultos e idosos numa  estatística de   crimes  que equivale  a  persistentes   guerras civis  em   alguns  países do mundo.
       É no  poder  legislativo  que as questões da violência e da impunidade  se encontram  travadas, quer  dizer,   os deputados  federais, provavelmente com  poucas  exceções,  nada têm  apresentado como  projetos   de lei que venham   alterar substancialmente  as normas vigentes  de penalidade  mais    rigorosas  a fim de   reduzirem   a violência  no Brasil  e   rechaçar de vez  a prática   da impunidade  que já se  tornou  praticamente um comportamento cultural   já naturalizado no pensamento   médio  do  povo  brasileiro. Matar  no Brasil  -  é preciso   reiterar  - banalizou-se, parecendo  não  mais comover   a sensibilidade  de  nossas autoridades,   máxime  os homens responsáveis por  fazerem   as leis  de nosso  país.
         O mais  gritante  ponto de nossa  indignação  é constatar que, em  pronunciamentos  públicos,  o atual  Ministro da Justiça sempre  se me  pareceu  evasivo,   ou melhor,  contrário  às prementes     reformas  do nosso  sistema   de  punição legal.         
           Tem-se a impressão  de que  a sua  visão sobre  questões fundamentais  como   modificação   da maioridade  penal, redução   drástica  da  impunidade, prisão  perpétua,  pena de morte são  temas   que não  podem  ser  amplamente discutidos pela sociedade civil como se os  deputados fossem  os donos  do saber e os únicos  a   entender o que seja  certo ou errado  para o povo que os  elegeu.
           Um deputado  ou senador  não são senhores do  destino  da sociedade. Ao contrário,   as angústias, os sofrimentos, as dores   da  sociedade   é que devem ser  levados em conta  pelos  seus representantes, muitos dos quais  não  representando, sobretudo  na conjuntura atual  da nossa  vida  política, dignamente  as  reais reivindicações da nação. Seu comportamento  tem  que ser  pautado    pelos princípios   autenticamente  democráticos. Não podem ser  déspotas.    Lembro ao ministro  de plantão  e de visão  petista que o povo  brasileiro  não dispõe  de  proteção oficial  de seguranças e de carros blindados. 
           O povo enfrenta as ruas  do país  infestadas   talvez do maior  nível de violência do mundo e de  igual  e  correspondente  nível de impunidade, não somente da impunidade  dos bandidos e quadrilhas   fortemente armados mas da impunidade   escandalosa  dos white collars  da  política nacional, desmoralizadores  da imagem do país no exterior, tendo  como pior  exemplo as  sucessivas  revelações feitas  pela Polícia  Federal  de desvios financeiros da Petrobrás, num  criminoso conluio entre    partidos  políticos (incluindo-se o PT), o alto escalão  de funcionários daquela  estatal e empresas   privadas. Propinas, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e corrupção  ativa e passiva  passaram  a  fazer parte  do vocabulário   circulante do noticiário  nacional em todas as mídias.
          Concluo  este artigo    lembrando  o conteúdo pleno de indignação de um  conhecido apresentador  de programa  policial em rede nacional: os políticos não fazem nada contra  a violência  insidiosa  do país  porque  seus filhos  ou  pais  não foram  ainda vítimas   da descomunal    e covarde violência    brasileira.