Cunha e Silva filho
Há
tempos não assisto à festa do
carnaval, sobretudo o mais
empolga, o do Rio de Janeiro, com os famosos
desfiles de escolas de samba, onde até
crianças de três ou cinco
anos mostram todo o seu
talento no toque rítmico da bateria.
São os
geniozinhos, desses que, de vez em quando, em
todas as áreas da atividade
humana, surgem deixando-nos boquiabertos
pelo especial precocidade. Não é só na bateria que
surgem, surgem também
como um mestre-sala e uma
porta-bandeira.Têm o sangue da
folia, do samba no pé,
esse talento de mostrar a que
veio na
Avenida, ou melhor, na pista do
Sambódromo.
Meu carnaval se perde lá nos tempos em que se ia, sozinho ou acompanhado, ver a
passagem eletrizante dos blocos cariocas na velha Avenida
Rio Branco e, depois, na Presidente
Vargas, as duas caras do
Rio.
Dizem que os blocos da rua estão se revitalizando. Vêm eles da Zona Sul,do Centro e dos subúrbios, todos sintonizados com o país de ponta-cabeça, esquecido das suas grandes mágoas e defeitos. Alguns desses blocos se tornaram parte da vida do carnaval carioca,: o Bola Preta, a Banda de Ipanema e inúmeros outros que descem das periferias , dos morros para o Centro da cidade de São Sebastião.
Dizem que os blocos da rua estão se revitalizando. Vêm eles da Zona Sul,do Centro e dos subúrbios, todos sintonizados com o país de ponta-cabeça, esquecido das suas grandes mágoas e defeitos. Alguns desses blocos se tornaram parte da vida do carnaval carioca,: o Bola Preta, a Banda de Ipanema e inúmeros outros que descem das periferias , dos morros para o Centro da cidade de São Sebastião.
Em quase todos os bairros cariocas há sempre um
palco, uma espécie de coreto atualizado a fim de que pessoas dos bairros ali possam
se reunir com as suas fantasias e
fantasias da imaginação. Para os
mirins, há também lugares
em que ali podem,
fantasiados, entrar na folia,
pular, dançar e cantar as marchinhas
novas ou antigas, estas ensinadas pelas
avós. No carnaval valem as brincadeiras, as formas
diversificadas de fantasia, as
transformações, as trocas de papéis, em
que o
que é sério passa a não sê-lo. O antropólogo Roberto
DaMatta foi quem, talvez,
mais aprofundou uma análise e compreensão do que significa alegoricamente o carnaval. Festa de todos, do rico e do
pobre, do político e do eleitor, tudo,
à sua volta se transmuda em inversão de
funções sociais. O carnaval almeja
o brilho, o som, a
música, a folia, a ginga, a malandragem, o samba.
Gosto do carnaval, agora, à minha
moda, mais como meditação
entre o retiro e a solidão.
Porém, fundas estão as boas lembranças do carnaval; primeiro, as de Teresina, com o seu anual corso atravessando numerosas
ruas da capital verde, formado de carros com
belas moças e rapazes da sociedade mais aquinhoada, automóveis, e sobretudo daquele caminhão das meninas e menos meninas da Paissandu, motivo, com a sua
passagem, de críticas de mal-amadas e de donzelas
ungidas na fé católica e inimigas do pecado da carne, assim como são
fortes ainda as reminiscências do carnaval no Clube dos
Diários, ali na Rua Álvaro Mendes, Centro de
Teresina.
Alguns meninos e meninas,
que não eram
filhos de sócios do clube da
alta sociedade, ficavam
maravilhados e ao mesmo tempo
desapontados por não poderem
adentrar o salão do
saudoso clube dos endinheirados.
Naquele meu tempo, inícios da década de 1960, um fato trágico entristeceu as memórias
do carnaval. Era tempo em que o
uso do lança-perfume se fazia presente
entre jovens, não para borrifar as fantasias das meninas
bonitas como sinal de que por elas
se interessavam, o que seria normal
e até romântico. Um desses jovens, o Almedinha, com quem
tive pouco contato, inalou
em dose excessiva o
perfumado éter, não sei ao certo
se misturado a alguma bebida. Foi o bastante para que lhe
causasse a morte na flor da vida. Foi um
consternação geral em Teresina esse infausto
incidente, especialmente
porque o jovem era muito
querido..
Assisti, menino e adolescente, a
muitos desse corsos e, no tempo, me divertia
muito. Numa das ruas em que
morei, a Arlindo Nogueira, o percurso do corso num dos anos em que
ali residia, passava
pela minha rua.
O
corso se resumia num desfile de carros com
seus ocupantes fantasiados ou
não, apenas com o prazer de ostentar que
possuíam carros e se diferenciavam da multidão
que ficava grudada na
visão dos que passavam indiferentes
aos seus olhos de espectadores.
Aplausos e motejos
se confundiam aqui e ali,
dependendo do que se estava vendo na passarela das rodas.
O carnaval
carioca mudou. Mudamos
nós, também. O carnaval carioca
perdeu um pouco do antigo charme, da naturalidade, de um certa
“pureza.” As novas marchinhas perdem
para as antigas, tanto é que,
durante os carnavais
dos novos tempos, elas, as antigas, continuam sendo cantadas
pelo povo, na rua ou em clubes. Pertencem
a diversas décadas. Mas ainda têm a sua
presença na folia carioca. “Corta o cabelo dele, corta o cabelo dele!,” “Viva o Zé Pereira,” e as célebre
marchinhas dos anos 20, 40, 50
ainda hoje relembradas de geração a geração.
A figuração do carnaval brasileiro
penetra praticamente todas as formas de artes. São
livros com o título de Carnaval,
de Manuel Bandeira, são
poemas, como o de Da Costa e Silva: “Carnaval”, que se encontra na obra sob
o título Alhambra: “Amplo salão alucinado de luz, música e perfume,/o éter germina sensações de
alegria e volúpia...”; no
cinema, temos o “Orfeu
do carnaval, filme de 1959, com direção de Marcel Camus, adaptado
da peça de Vinicius de Morais, Orfeu da Conceição.” O mesmo filme teve um
outra versão a cargo de Cacá Diegues, em 1999, mas com outro
título: Orfeu.No romance, Marafa, de
Marques Rebelo, temos uma passagem magnífica
da descrição eletrizante que o
ficcionista faz de cenas
do carnaval carioca por volta
de 1930.
Os
grande compositores já se foram. Até os bailes de gays tinham
a sua noite de esplendor.
Muitas das figuras emblemáticas do carnaval carioca, os compositores Braguinha,
Zé Kéti, Jamelão, já não
estão mais entre nós. Outras figuras, verdadeiros
ícones, do carnaval carioca, como
Clóvis Bornay, Blecaute e
tantos outros deixaram
um vazio eterno nesta
festas das folias, de momices, de confetes e serpentinas, de Pierrôs e Colombinas. A História
registra os faustos, mas a saudade
permanece.
Acredito que tanto em Teresina quanto no Rio de Janeiro, Salvador,
Recife, o carnaval perdeu
o antigo glamour,
mas este cronista, sem se fechar em
copas, transita entre
o sentido do “retiro” e da solidão - limites entre
ideias, livros pra ler
e recordações que não se deixam apagar no tempo e no espaço.
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