Cunha e Silva Filho
Não é de hoje que as eleições brasileiras se deixam levar pela falta de bom senso, para dizer o mínimo inclusive do TSE. Há algum tempo atrás, a presença do índio Juruna, eleito deputado federal, virou também uma espécie de piada nacional. Sua marca registrada era carregar consigo um inseparável gravador. Ele próprio, depois, foi alvo de críticas que nele viram espertezas e oportunismos para um cargo cheio de privilégios. Sua vida familiar e afetiva tampouco o ajudou, Não teve boa atuação parlamentar, pois lhe faltava o mínimo indispensável ao exercício do mandato.
Outros exemplos semelhantes se seguiram, nos quais era evidente a ausência de critérios na escolha de candidatos aos partidos, mais propensos estes a incluírem alguém despreparado e, assim, facilmente manipulável. Esses candidatos, por sua vez, em geral logo se revelaram meros oportunistas que ascendiam aos mandatos visando só ao poder e às regalias, as chamadas mordomias auferidas pelas funções públicas de “representantes” do povo.
Um dado real nessa sociedade de espetáculos é o fato de que alguns setores da sociedade, sobretudo provenientes da indústria cultural, a qual, por si mesma, já coloca o indivíduo no centro das atenções do público, como a televisão, o rádio, o cinema, o teatro - e aí se incluem artistas dos diferentes gêneros, atores, cantores, apresentadores, jornalistas, líderes religiosos, jogadores de futebol e de outras modalidades, sem muita dificuldade conseguem eleger candidatos a mandatos políticos.
Não diria todos, mas boa parte deles é levada à política por oportunismo e pelas benesses propiciadas generosamente pelos cargos que irão ocupar. Não que sejam impedidos de se candidatarem, mas a verdade é que a prioridade deles não é o bem coletivo e sim o individual. Os eleitores, despolitizados e principalmente formando a massa invisível dos espectadores e dos fanáticos pelos seus ídolos, naturalmente são presas fáceis desse oportunismo midiático.
O último exemplo desse tipo de candidato acolhido por um partido é o do humorista conhecido pelo nome de Tiririca que, na eleição de agora, recebeu mais de um milhão de votos em São Paulo. O que é mais vergonhoso para a nossa democracia é o fato de que, além disso, foi o mais bem votado daquele estado (e no país todo!) para um mandato de deputado federal do mais importante estado brasileiro.
Falou-se que o Tiririca é analfabeto e, desse modo, teria sua vitória anulada caso, num exame de escolaridade a ser feito pelo Tribunal Eleitoral, se comprove que o eleito seja incapaz de ler e escrever. Aguardemos.
Porém, a vitória em si do candidato não é o fato mais grave. O que é mais grave é a atitude do eleitorado paulista que nele votou, alegando ter sido um voto de protesto. Ora, voto de protesto para dar prerrogativas a uma pessoa que nem mesmo se leva a sério é uma prova irrefutável da irresponsabilidade da população às instituições públicas do país. O caso do Tirica iguala-se àquele mesmo chamado voto de protesto que se deu ao macaco Tião. Eleição não é brincadeira. Enquanto homens de valor, com experiência política e comprometidos com o bem-estar do país se candidatam e não recebem dez por cento dos Tiriricas da vida, parte ponderável do povo de São Paulo dá mostras de completa imaturidade política nesse triste e vexatório episódio que são o milhares de votos dados a um humorista de terceira categoria, o qual bem provavelmente está dando a esta hora boas gargalhadas a um eleitorado arlequinal, ou seja, eleitores que, pelo seu comportamento leviano, se tornam objeto execrável de seu próprio ato de bufonaria.
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