Cunha e Silva Filho
 Me permita o leitor uma autocitação de um  pequeno trecho de uma crônica de título “Impressões da cidade”,  título, de resto,  sugerido oportunamente por meu saudoso  pai,  que publiquei no jornal “Estado do Piauí”, em 1974, e que constará de um dos  textos reunidos  do meu livro As ideias no tempo ainda a ser publicado: “Hoje possuímos a Universidade Federal do Piauí. A Universidade dá   uma nova dimensão à vida cultural de um estado. Ela é seu porta-voz maior, evitando o marasmo cultural. O desenvolvimento intelectual de Teresina se intensifica. Nota-se que há uma ânsia de se fazer alguma coisa que nossa e identifique valores culturais nossos. Nossos homens de letras sentem vontade de escrever, de publicar. A COMEPI é um exemplo edificante do governo”.
A observação citada acima tem uma distância de trinta e quatro anos! Ou seja, três décadas e uns quebrados. É uma vida. De lá pra cá aconteceram,  na  esfera cultural,  muitas coisas que, pouco a pouco,  foram  mudando o perfil daquele  Estado  que deixei ainda com  fortes  traços provincianos. No intervalo desse longo período, a história da inteligência piauiense longe ficou  de qualquer  óbice entrópico. 
Ao contrário, a cultura literária,  antes  mais circunscrita   aos redutos  da Academia Piauiense de Letras e à benevolência  e  espírito de visão de alguns donos de jornais, eles próprios, em geral,  ligados à causa  cultural, foi esgarçando lentamente  alguns comportamentos  e atitudes que não mais se coadunavam com os novos tempos  agora impulsionados pelos ventos  da comunicação  de massa,  pela criação  de novas  universidades e  proliferação  de campi  das universidades  públicas,  sem se falar no aperfeiçoamento  do corpo docente de professores que foram  realizar cursos  de alto nível nos centros mais  adiantados do país ou  mesmo no exterior.
 Assim, se foi desenvolvendo não só a universidade em si, mas  sobretudo o que dela  se irradia na conquista de novos saberes, de novas tecnologias em todos  os domínios do conhecimento e, agora, mais do  nunca, da inimaginável experiência haurida pela Internet, universalizando e democratizando mais as fontes do conhecimento humano.
Era de se esperar que  o impulso advindo das universidades de forma indireta  repercutiu nos  arraiais ainda presos  ao anacronismo e , assim,  foram aparecendo  fundações culturais,  conselhos de cultura,   revistas culturais de expressão nacional,  e, no que se refere ao capital humano,  o surgimento de uma massa crítica mais  tecnicamente preparada  para  dar continuidade  ao passado. No âmbito da comunicação  escrita,   criaram-se vários jornais  de alta qualidade de impressão e  diagramação,  com um corpo de redatores graduados  por universidades   atuando profissionalmente, sem mais o amadorismo  dos velhos tempos  idos e vividos, e  servidos de   colaboradores pertencentes  à alta cultura  do Estado  piauiense.
Ainda por força  do  progresso provocado pela chegada das   universidades públicas e particulares,  novos escritores foram  surgindo em  todos os gêneros e bem assim novos  talentos nos  domínios das artes  plásticas,  do cinema, da humorismo, do teatro.
No campo específico do ensaísmo e da crítica literária,  é de se notar  a efervescência. de talentos   que estão surgindo  e  procurando  ocupar os  espaços que  o presente e o futuro  estão  a eles reservando. Sirvam-se de exemplos  livros como Os sinais dos tempos, de João Kennedy Eugênio (Teresina, Halley S.A. Gráfica e Editora,  2007), Cantigas de viver – leituras, de João Kennedy Eugênio e Halan Silva (orgs.,  Teresina, Fundação Quixote,  2007), As formas  incompletas apontamentos para uma biografia de H. Dobal, de Halan Silva (Oficina da Palavra,  2005),  São os novos  teóricos  graduados e pós-graduados e, portanto,   especificamente mais  treinados, como diria Terry Eagleton, nas universidades para a atividade  literária no sentido técnico-científico    do que em geral  havia  no tempo em  que deixei  Teresina, quando o intelectual, o  crítico, o ensaísta  contavam mais com o talento e os estudos autodidáticos a fim de  dedicar-se  à vida literária. Mas,  essa realidade não era só no Piauí de então, mas nos estados mais  pobres.
Li uma publicação sobre estudos  lingüísticos e   ensaios  literários  em grosso volume, PHOROS ( Rio de Janeiro,  Editora Caetés,2006 ), reunindo   trabalhos de  mestrandos e doutores da Universidade Federal do Piauí que me  surpreenderam pela  profundidade  de reflexão crítica,  da   alta pesquisa na  área  multifacetada de Letras. Obviamente, todo essa produção que está  sendo feita  no Piauí ainda não recebeu  o tratamento   de correspondentes  estudos  nos campos da teoria literária,  da histografia literária e da crítica literária. Dado  ser já  considerável atualmente  essa  produção cultural-literária   do Piauí,  é bem provável que  o levantamento e a transformação  desse  lastro  conquistado em forma de  livros de referência,   tenham que    ser tarefa  para equipes  a  fim de poder abarcá-la  em  profundidade  de estudos  e atualidade de  pesquisas.   
Da mesma forma,  digno é de  salientar  que  o Piauí já dispõe de  editoras – a exemplo da  novíssima Editora Nova  Aliança -    com  disposição de crescer e lançar autores  novos  como, entre outros,  o próprio editor, Dílson Lages, e antigos, como  Assis Brasil ,cujo retorno  ao  Piauí foi benéfico para a vida literária local).
 Ora, como não deixar  de reconhecer  esse nítido florescimento de uma  nova mentalidade  de autores piauienses, nos diversos gêneros literários e em gêneros  afins com  os estudos literários , como  a história ( campo de estudos  no qual  o Piauí tem conhecido  bons autores  e uma boa  produção científico-acadêmica ou fora do estrito  espaço universitário.),  a sociologia, o jornalismo, a filosofia. Nem seria justo  assinalar, nestas longas  três décadas,  as inúmeras  gráficas, editoras particulares,  editoras  oficiais da importância da Fundação  Monsenhor Chaves,   da  antiga COMEPI,   da atual  Fundação  Quixote,  de publicações   do porte da revista Presença, editada pelo Conselho Estadual de Cultura sob a  operosa  presidência  do  escritor e crítico literario M. Paulo Nunes, de outras tantas  editoras já existentes  no Piauí, das publicações feitas  em convênio com a Academia Piauiense de Letras e  a Universidade Federal do Piauí, de outras publicações  entre  o setor privado e instituições públicas e mesmo, do esforço  próprio, digno de aplausos,  das edições particulares. Isso tudo é inequívoca evidência   de  uma afirmação  de um Piauí  consolidado nas suas raízes  culturais  e nos  desdobramentos  futuros de um  Estado que, no seu  universo  de produção  intelectual, dá exemplo de pujança e perene  desejo de ultrapassar   fronteiras  regionais  e lançar-se  corajosamente   rumo   a uma posição merecedora do respeito  nacional sem  mais receios de  parecer -  porque efetivamente  não o é -,  provinciano frente aos  Estados brasileiros mais  adiantados.
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