Cunha
e Silva Filho
Se política brasileira constitui
uma soma de simulacros, em que as imagens dos candidatos se constroem
graças à publicidade enganosa, a marqueteiros vendilhões, a mentiras trocadas entre candidatos e, agora, no segundo turno, a recomposição de candidatos que,
antes se atacavam olho no olho ou em viagens pelo
país afora, já começam
a jogar seus papéis múltiplos no
ping-pong de partidos de orientações ideológicas
díspares e incompatíveis com os seus programas de governo e metas a serem atingidas
durante seus mandatos, como é que fica
a cabeça do eleitor sem
ponto de apoio seguro,
transparente, diante de tanta balbúrdia?
O segundo turno
gerou a bipolarização pronta a vender
a alma ao diabo desde que seja o vencedor
dessa segunda rodada. Os antigos
inimigos se tornam, agora, amigos de
oportunismo porque, na peleja
renhida, tudo vale nas alianças feitas. Os fundamentos ideológicos
dos candidatos se esfarelam, viram
uma salada mista, um saco de gatos, um samba do crioulo doido.
No meio desse mafuá
de novas combinações
estapafúrdias, o país continua
desatrelado das suas obrigações
e compromissos assumidos da candidata-presidente:
aumento dos preços, novas revelações de corrupção,
violência calamitosa, o estado de Santa Catarina em
polvorosa, com explosões de violência, ônibus
incendiados, bandidos à solta
teleguiados por ordens de
alto crime cujas decisões partem
dos presídios. O país está em baixa, política, moral e
eticamente. Até os
eleitores menos instruídos que, porém, têm
experiência da vida e dos homens, me
dizem em conversas na
rua que o país vai
mal, que ninguém acredita mais em políticos
nem em melhorias para a Nação, que estão decepcionados com
todos e tudo que traz o sinete
do que chamam de política.
A crise
política é de ordem ética, de falta
de confiança nos nossos homens públicos.
Vejam-se alguns candidatos reeleitos para a Câmara dos Deputados ou para o Senado. Vejam que os mais bem
votados nada podem representar
de útil ao país; são
oportunistas que, por
pertencerem à mídia cultural,
são feitos deputados e senadores.
O pior: esses candidatos, durante os mandatos anteriores,
nada fizeram pelos
seus estados. Fizeram, sim, para si
mesmos, ou seja, para se beneficiarem
das condições de marajás – condições estas que não
mudaram desde os tempos do Collor que, por sinal,
foi eleito senador.
Transformamos a eleição num espetáculo circense, no qual os eleitores estão
presentes ao voto para se divertirem com o próprio cinismo
e falta de auto-respeito.
Não vejo o voto nulo,
o voto em branco como
falta de atitude
cidadã. Esse comportamento do
eleitorado tem sua razão de ser: ele
espelha a náusea que cada um sente
pelo que está vendo acontecer no país. Ele sabe que, ao se eleger
um político para defender
os direitos e atender aos anseios
da sociedade, nada se concretiza
das promessas falaciosas do que afirmou na campanha. Foram palavras ocas, sem substância, sem o
peso da verdade.
Essa postura negativista do eleitorado
é um sinal de alerta ao sistema
democrático que, assim, é posto
em dúvida no que concerne à
sua validade. Quando o embuste,
a mentira, a falsidade, e mormente
o cinismo se tornam moeda corrente entre quem abraça
a política por
oportunismo e interesses
pessoais, o nível de ceticismo,
de descrença do eleitorado ascende
a proporções alarmantes e
perigosas para os alicerces da democracia e se torna
presa fácil para o arrivismo populista ou messiânico, ou senão para lançar os incautos à fogueira
dos regimes de força
de triste memória, não só no
Brasil como em outros países.
Não se pense
que as manifestações –
compreenda-se, as pacíficas - do
ano passado contra
os erros da política brasileira, contra a corrupção e outros
males nacionais foram em vão. O futuro
governante da Nação não pode nem deve subestimá-las. Elas permanecem como um vulcão pronto a entrar em erupção novamente e com mais poder de
força caso não sejam solucionados
os graves problemas
do país.
O “homem
cordial” brasileiro tem suas complacências, seu
lado pacífico e
ordeiro, mas, se sentir
aviltado, esbulhado em suas justas
reivindicações, saberá como
agir sem violência nem depredações, mas
com a firmeza da massa
indignada contra os desmandos do
poder arbitrário. E o mesmo vale
para todos os três
poderes constituídos. Lembrem-se os futuros governantes que o mero
fato de conquistar mandatos políticos
não lhes faculta o
uso do autoritarismo, da prepotência, da enganosa ilusão que, no exercício do poder, possa arvorar-se em donos”
do poder. A soberania da nação é apanágio do
povo, não de políticos
de plantão.
O merecimento de nosso
voto está em estreita dependência dos valores
morais, da integridade , competência e do real desejo de os políticos propiciarem o bem-estar da sociedade.
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