Cunha e Silva Filho
Reportagem da Folha de São Paulo (23/05/2010) discute as causas do absenteísmo e das chamadas e conhecidas licenças médicas de professores estaduais paulistas.As informações, entretanto, prestadas ao leitor não mostram a verdadeira causa da péssima saúde dos professores. Seu foco antes se restringe a apresentar estatísticas de faltas dos professores às escolas, de professores doentes, ou seja, de mestres sofrendo das cordas vocais, de hipertensão, de stress e de outros males provocados por uma carreira que perdeu há muito tempo alguma consideração da sociedade.
Ora, abrir discussão só em torno dos efeitos do mau desempenho docente é uma forma de escamotear os motivos mais concretos e fundos do problema do magistério paulista e do magistério brasileiro público na sua generalidade, porquanto essa radiografia que se faz fundamentada apenas em informações técnicas da saúde do professorado ideologiza o cerne da questão: enquanto não se alterarem as condições de plano de carreira dos professores das redes estadual e municipal como uma medida escorada em lei sancionada e cumprida, não são vagos paliativos de natureza médico-psicológico-tecnológica que contornarão a difícil realidade vivida faz muito tempo pelos professores brasileiros.
Ainda me recordo de uma opinião insensata e autoritária de um ex-governador paulista que declarara publicamente não haver remédio para a questão do salário dos docentes do ensino público. Para o governador, professor não vai jamais ter bons salários. Como não? Não é obrigação de o Estado prover gratuidade ao ensino público? Se o é, não há que se falar aqui de uma impossibilidade definitiva de propiciar um salário decente a essa heroica carreira, que é o magistério. O Estado tem seus limites orçamentários, reconheço. No entanto, tal não obstaculiza que ao setor da educação sejam alocados recursos suficientes e permanentes de molde a remunerar condignamente nossos mestres. Por que, por exemplo, não se fazer parcerias ou convênios com recursos privados de grandes empresas e recursos públicos, através, por exemplo, de contrapartidas no imposto de renda ou de forma diferente de compensação, segundo já existe no ensino universitário estadual?
O que proporia seria uma forma de remuneração que permitisse ao docente levar uma vida sem aperturas financeiras indecentes, sem ter condições de comprar livros, jornais, aperfeiçoar-se, e não se ver compelido a lecionar em um, dois, três ou mais colégios a fim de, no final do mês, somar uma remuneração um pouco mais alta. Isso é um suicídio, pois, esse professor não terá condições de dar boas aulas nem tempo e saúde para elas se prepararem. Eis aí uma outra razão que leva nossos docentes às moléstias e a faltarem muito às aulas.
Além disso, há que proporcionar ao professor condições favoráveis a um desempenho satisfatório, bom ou ótimo estimulando, isto sim, os mestres a uma das missões sociais mais úteis e nobres, que é a de ensinar, orientar e preparar as novas gerações de cidadãos do país. Sem a Escola, não há país que atinja um alto estágio de desenvolvimento pleno, que traga mudanças efetivas na formação ético-educativa ao educando, dele fazendo uma pessoa mais humana, solidária e responsável.
Um outro desafio a ser enfrentado pelas autoridades educacionais, em conjunção com outros setores, como assistência social, médica e psicológica a alunos e professores, seria possibilitar apoio logístico à segurança dos mestres que, nas últimas décadas, se veem vítimas da violência dos próprios alunos, os quais não mais dão atenção às aulas dos professores nem os respeitam mais. A escola pública brasileira atual vive momentos de inusitada insegurança, com seus professores sendo ameaçados até por causa de notas de exames escolares. A integridade física e psicológica dos docentes está comprometida, desencadeando por isso sérios prejuízos ao sistema educacional, uma vez que professores chegaram à exaustão e, por mais que sejam vocacionados e competentes, resolvem abandonar a profissão, como foi o caso, recentemente noticiado pela TV, de uma jovem professora de inglês de uma escola de Brasília, vítima da violência e ameaça de um aluno delinquente. Em todo o país, esses casos já se tornaram comuns.
Essa realidade sombria e vergonhosa para nossas autoridades educacionais se torna mesmo extremamente nociva ao aperfeiçoamento da educação brasileira. Isso demonstra que existe uma estreita vinculação de causa e efeito entre a má educação e a criminalidade no país.
Somente medidas rigorosas conducentes à erradicação desses mencionados entraves crônicos que enfrenta a escola pública, desde que não negligenciem o nó górdio – a valorização efetiva e contínua do nível salarial dos docentes – alterarão a escandalosa situação do nosso ensino fundamental e médio. Mobilizar logística médico-psicológico-técnica – repito - não fará diferença no encaminhamento das soluções do problema central. Não adianta suprir o professor dessa parafernália, útil se as condições básicas aqui apontadas prevalecessem, se o bolso do educador continuar vazio e, portanto, falto de estímulo. O contrário disso é a persistência de um círculo vicioso alimentado pela ideologia elitista e sem pés no chão dos que, na gestão do ensino, não desejam um novo e produtivo caminho para a educação pública brasileira.
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