Cunha e Silva Filho
A reflexão critica é uma ação de constantes retomadas, lembrando a imagem de Sísifo. Por esta razão, desde suas primeiras manifestações, seu objeto principal – a obra literária -, combina conquistas do passado, desde os gregos, com as contribuições do presente.
No entanto, o corpus imenso e variado que constitui o legado de obras atravessando os séculos, num evoluir em que dados novos confluem com a tradição literária, ressignificam alguns conceitos e visões desta e ao mesmo tempo fornecem-lhe novos contributos sem que as novidades se considerem melhores ou piores na atividade de julgamento, de interpretação e de outros caminhos a serem trilhados pelo pensamento crítico contemporâneo.
Sendo assim, a atividade da crítica literária é um trabalho contínuo de tentativas de compreensão das obras através dessas retomadas e releituras que se vão sucedendo sem interrupção.
Dado ser a função crítica a de favorecer a variabilidade de temas, motivos, formas literárias e obras, vejo nessa recorrência de reflexões um certo ponto de circularidade nas escolhas de grandes autores, nacionais ou de fora, quer dizer, de quase sempre a crítica revisitar as mesmas obras já amplamente estudadas, as quais, em geral, fazem parte das listas canônicas de uma determinada literatura. Se a um tempo essas retomadas contribuem para alargar os horizontes de sua hermenêutica, de outra parte empobrece o curso a ser percorrido por novos autores que não se tomaram ainda como motivos de diferentes especulações que, da mesma forma, serviriam para ampliar, em relação a eles, estudos de maior magnitude em diferentes ângulos das obras.
É bem restrito o conjunto de livros e de autores que se tornaram verdadeiros totens da judicatura crítica brasileira. Tomem-se para ilustração, autores como Machado de Assis, Drummond, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, entre poucos mais. A literatura brasileira é já muito extensa no quantitativo de autores nos vários gêneros.
Se a nossa crítica superior se ativer tão-só a um seleto grupo de autores, ela decerto merece restrição, ainda que não possamos – quem somos nós? - absolutamente impor aos exegetas quais obras devem eles pesquisar e sobre elas produzir trabalhos.
Devemos acrescentar à nossa crítica as conquistas teóricas do exterior – sobretudo da Europa e dos Estados Unidos -, é verdade, mas sem que elas nos coloquem numa posição continuadamente de subordinação. Qualquer tese que se preze deverá, em princípio, escorar-se em teóricos estrangeiros caso o pesquisador deseje ser aprovado e aceito pelo meio acadêmico universitário. Claro que há exceções neste particular. A primeira alegação por parte da orientação acadêmica é a de que, se não houver a infraestrutura teórica, o estudo se ressentirá profundamente de uma visão científica, objetiva, séria.. Do contrário, o trabalho acadêmico apresentado se enquadraria em repudiado anacronismo impressionista.
Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. A crítica que proponho deve, sim, ser oxigenada pela grande contribuição de avançados e respeitados teóricos estrangeiros, mas o trabalho que dela decorra, mantendo o necessário diálogo com a teorias de fora, não deve se tornar demasiada e culturalmente ancilar a elas.
A crítica brasileira tem uma grande e decisiva tarefa a cumprir pela frente: a de desenvolver-se verticalmente, procurando desbravar internamente um caminho de alta reflexão e pesquisa acadêmica que redunde em originais conquistas a fim de exercer um pensamento crítico atuante, renovador e produtivo. Quer-se dizer, um pensamento sintonizado com os mais adiantados estudos literários do exterior através de um diálogo constante, fértil e – reforço - sem servidão cultural. Dessa simbiose pode surgir o tão almejado exercício da crítica literária entre nós, aberta às discussões, mas também consciente de seu lugar no mundo dos estudos literários e identificável por uma voz crítica singularizando modos brasileiros de entender o fenômeno literários e seus múltiplos e intrincados problemas trazidos pela contemporaneidade e desenvolvimento da civilização.
Os temas discutidos neste blog se concentram sobretudo na área de Literatura Brasileira, mas se estendem a outros temas e áreas culturais afins. Os gêneros literários da preferência da produção do autor são crítica literária, ensaios e crônicas. tradução de poesia estrangeira. Áreas de pesquisa e interesse do autor: teoria literária,história literária, vida literária.relação entre literatura, pobreza e violência, literatura universal e literatura de autores piauienses
domingo, 30 de maio de 2010
sexta-feira, 28 de maio de 2010
Fernando Pessoa: "Sonnet XXXV"
Fernando Pessoa: “Sonnet XXXV”
Sonnet XXXV
GOOD, I have done. My heart weighs. I am sad.
The outer day, void statue of lit blue,
Is altogether outward, other, glad
At mere being not-I (so my aches construe)
I, that have failed in everything, bewail
Nothing this hour but that I have bewailed,
For in the general fate what is’t to fail?
Why, fate being past for Fate, ‘tis but to have failed.
Whatever hap or stop, what matters it,,
Sith to the mattering our will bringth nought?
With the higher trifling let us world our wit,
Conscious that, if we do’t, that was the lot
The regular stars bund us to, when they stood
Godfathers to our birth and to our blood.
Soneto XXXV
Eis o resultado. Coração pesado. Triste estou.
O dia exterior, do azul iluminado estátua vazia,
Por inteiro aberto, outro, radiante está
Por não ser-Eu (formas de minhas dores).
Eu, que em tudo fracassei, não lamento
Nada nesta hora senão por lamentado haver
Pois, o que vem a ser fracasso no final do destino?
Ora, sendo o destino passado para o Destino, fracasso é.
Pouco importa o que quer que suceda ou se interrompa,
Porquanto não se reduzirá a nada todos os nossos cuidados?
Do novo mundo o melhor seriam as frivolidades mais elevadas,
Conscientes de que, se assim agirmos, a parte que nos coube essa foi.
A tal nos destinaram os astros quando se nos tornaram
Do nascimento e do sangue padrinhos.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
Sonnet XXXV
GOOD, I have done. My heart weighs. I am sad.
The outer day, void statue of lit blue,
Is altogether outward, other, glad
At mere being not-I (so my aches construe)
I, that have failed in everything, bewail
Nothing this hour but that I have bewailed,
For in the general fate what is’t to fail?
Why, fate being past for Fate, ‘tis but to have failed.
Whatever hap or stop, what matters it,,
Sith to the mattering our will bringth nought?
With the higher trifling let us world our wit,
Conscious that, if we do’t, that was the lot
The regular stars bund us to, when they stood
Godfathers to our birth and to our blood.
Soneto XXXV
Eis o resultado. Coração pesado. Triste estou.
O dia exterior, do azul iluminado estátua vazia,
Por inteiro aberto, outro, radiante está
Por não ser-Eu (formas de minhas dores).
Eu, que em tudo fracassei, não lamento
Nada nesta hora senão por lamentado haver
Pois, o que vem a ser fracasso no final do destino?
Ora, sendo o destino passado para o Destino, fracasso é.
Pouco importa o que quer que suceda ou se interrompa,
Porquanto não se reduzirá a nada todos os nossos cuidados?
Do novo mundo o melhor seriam as frivolidades mais elevadas,
Conscientes de que, se assim agirmos, a parte que nos coube essa foi.
A tal nos destinaram os astros quando se nos tornaram
Do nascimento e do sangue padrinhos.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
Não são todos
Cunha e Silva Filho
O grande mal das pessoas são as generalizações. Há que separar o joio do trigo. Isso vale para muitas situações da vida. Saber discernir, com a razão, sem extremismos, sem prevenções, sem calúnias precipitadas. Em todas as denominações religiosas há pessoas de boa intenção, que querem o bem, que, aliás, o praticam. Quando tal ocorre, as denominações religiosas, as crenças, as correntes espirituais,em especial as cristãs, praticamente se aproximam, sendo mínimas suas diferenças básicas, as quais, ademais, não as impedem de uma convivência sem maiores atritos nem fanatismos. O grande passo a ser dado entre as diversas religiões ou correntes espirituais deverá ser o de uma coexistência pacífica, tendente a um ecumenismo.
Na caça às bruxas de padres católicos acusados de pedofilia é preciso que a autoridade máxima da Igreja Católica seja firme e não transija com essa prática condenável. Religiosos que nela sejam identificados devem ser alijados do corpo da Igreja.
Recordo-me de que meu pai, que foi seminarista em Lavrinhas, no Estado de São Paulo, em conversa franca comigo, me contara que, entre colegas seus do Seminário, deles havia que eram verdadeiramente puros e dedicados ao chamamento da carreira eclesiástica. Outros, não. Não eram predestinados, jamais seriam bons padres. Meu pai comentava que aqueles padres imbuídos da Fé e da vocação à vida clerical se tornariam, anos mais tarde, figuras proeminentes da Igreja. Ele, que não tinha inclinação à vida monástica, desistira quando prestes estava a ir cursar Filosofia em Turim, na Itália.. Tomara a decisão correta e em tempo hábil de desistir da vida religiosa.
Se a Igreja persistir na vontade firme de expurgar padres indignos de seus quadros, seja em que escalão for, poderá reabilitar-se diante da sociedade e readquirir sua credibilidade e o respeito dos católicos.
Daí vejo como de extrema importância a formação dos novos religiosos que desejem abraçar a carreira eclesiástica. A escolha deverá ser muito criteriosa, sobretudo nos aspectos da sexualidade. Os seminários católicos devem dar o primeiro passo na direção de uma mudança efetiva para que os novos religiosos sejam pessoas que demonstrem incoercível inclinação à vida secular.
Sei que é questão fechada o celibato no catolicismo. Nesse terreno, porém, não me afino com o pensamento da Igreja. O celibato é uma exigência bem pesada aos ombros dos padres. A Igreja poderia renovar nesse aspecto, por exemplo, deixando a critério do religiosos, a opção pelo matrimônio. É perfeitamente factível o alcance dessa opção. Por acaso, não existe, em outras denominações religiosas respeitadas, o direito ao matrimônio? Sei que a questão é de alta complexidade e envolve outros componentes que levam a Igreja a não abrir mão do celibato, como a possibilidade de um padre casado não se dar bem no casamento e querer separar-se, e bem assim a eventualidade da paternidade, a formação da família com todos os seus óbices. Essas questões são polêmicas e merecem ampla discussão no seio da Igreja.
O que, contudo, não pode continuar é a permanência de uma forma de falsidade ou hipocrisia na prática do celibato que só na aparência se afirma como verdadeira, quando sabemos, de longa data, de exemplos de padres que geraram filhos sobretudo no passado da história eclesiástica. Essa prática só desserve o catolicismo aqui e alhures.
O homem nasceu para se completar numa união com uma mulher. Um homem saudável, com todas as suas funções biológicas em pleno funcionamento, necessita de exercer sua sexualidade plena. Contrariar tendências naturais do seu organismo seria pedir sacrifício demais de sua parte, em desacordo com a Natureza e todo o seu conjunto em harmonia com o Universo. Não são suficientes o amor espiritual ou platônico, e sublimar todas essas formas naturais equivale a desrespeitar a normalidade da vida.
Flexibilizando mais a vida pessoal do clero, o catolicismo daria um sopro de vitalidade e de renovação nas rígidas normas do comportamento social dos religiosos. Acredito que, com o tempo, a Igreja vai se deparar com a necessidade de acompanhar os tempos atuais, não com o sentido de perder todas as conquistas de seus valores positivos, mas com uma visão terrena compatível com a doutrina do seu rico legado de espiritualidade.
O grande mal das pessoas são as generalizações. Há que separar o joio do trigo. Isso vale para muitas situações da vida. Saber discernir, com a razão, sem extremismos, sem prevenções, sem calúnias precipitadas. Em todas as denominações religiosas há pessoas de boa intenção, que querem o bem, que, aliás, o praticam. Quando tal ocorre, as denominações religiosas, as crenças, as correntes espirituais,em especial as cristãs, praticamente se aproximam, sendo mínimas suas diferenças básicas, as quais, ademais, não as impedem de uma convivência sem maiores atritos nem fanatismos. O grande passo a ser dado entre as diversas religiões ou correntes espirituais deverá ser o de uma coexistência pacífica, tendente a um ecumenismo.
Na caça às bruxas de padres católicos acusados de pedofilia é preciso que a autoridade máxima da Igreja Católica seja firme e não transija com essa prática condenável. Religiosos que nela sejam identificados devem ser alijados do corpo da Igreja.
Recordo-me de que meu pai, que foi seminarista em Lavrinhas, no Estado de São Paulo, em conversa franca comigo, me contara que, entre colegas seus do Seminário, deles havia que eram verdadeiramente puros e dedicados ao chamamento da carreira eclesiástica. Outros, não. Não eram predestinados, jamais seriam bons padres. Meu pai comentava que aqueles padres imbuídos da Fé e da vocação à vida clerical se tornariam, anos mais tarde, figuras proeminentes da Igreja. Ele, que não tinha inclinação à vida monástica, desistira quando prestes estava a ir cursar Filosofia em Turim, na Itália.. Tomara a decisão correta e em tempo hábil de desistir da vida religiosa.
Se a Igreja persistir na vontade firme de expurgar padres indignos de seus quadros, seja em que escalão for, poderá reabilitar-se diante da sociedade e readquirir sua credibilidade e o respeito dos católicos.
Daí vejo como de extrema importância a formação dos novos religiosos que desejem abraçar a carreira eclesiástica. A escolha deverá ser muito criteriosa, sobretudo nos aspectos da sexualidade. Os seminários católicos devem dar o primeiro passo na direção de uma mudança efetiva para que os novos religiosos sejam pessoas que demonstrem incoercível inclinação à vida secular.
Sei que é questão fechada o celibato no catolicismo. Nesse terreno, porém, não me afino com o pensamento da Igreja. O celibato é uma exigência bem pesada aos ombros dos padres. A Igreja poderia renovar nesse aspecto, por exemplo, deixando a critério do religiosos, a opção pelo matrimônio. É perfeitamente factível o alcance dessa opção. Por acaso, não existe, em outras denominações religiosas respeitadas, o direito ao matrimônio? Sei que a questão é de alta complexidade e envolve outros componentes que levam a Igreja a não abrir mão do celibato, como a possibilidade de um padre casado não se dar bem no casamento e querer separar-se, e bem assim a eventualidade da paternidade, a formação da família com todos os seus óbices. Essas questões são polêmicas e merecem ampla discussão no seio da Igreja.
O que, contudo, não pode continuar é a permanência de uma forma de falsidade ou hipocrisia na prática do celibato que só na aparência se afirma como verdadeira, quando sabemos, de longa data, de exemplos de padres que geraram filhos sobretudo no passado da história eclesiástica. Essa prática só desserve o catolicismo aqui e alhures.
O homem nasceu para se completar numa união com uma mulher. Um homem saudável, com todas as suas funções biológicas em pleno funcionamento, necessita de exercer sua sexualidade plena. Contrariar tendências naturais do seu organismo seria pedir sacrifício demais de sua parte, em desacordo com a Natureza e todo o seu conjunto em harmonia com o Universo. Não são suficientes o amor espiritual ou platônico, e sublimar todas essas formas naturais equivale a desrespeitar a normalidade da vida.
Flexibilizando mais a vida pessoal do clero, o catolicismo daria um sopro de vitalidade e de renovação nas rígidas normas do comportamento social dos religiosos. Acredito que, com o tempo, a Igreja vai se deparar com a necessidade de acompanhar os tempos atuais, não com o sentido de perder todas as conquistas de seus valores positivos, mas com uma visão terrena compatível com a doutrina do seu rico legado de espiritualidade.
terça-feira, 25 de maio de 2010
Fernando Pessoa: "Sonnet XXXIV"
Sonnet XXXIV
HAPPY THE MAIMED, the halt, the mad, the blind -
All who, stamped separate by curtailing birth,
Owe no duty’s allegiance to mankind
Nor stand a valuing their scheme of worth!
But I, whom Fate, not Nature, did curtail,
By no exterior voidness being exempt,
Must bear accusing glances where I fail,
Fixed in the general orbit of contempt.
Fate, less than Nature, in being kind to lacking,
Giving the ill, shows not as outer cause,
Making our mock-free will the mirror’s backing
Which Fate1s own acts as if in itself shows;
And men, like children, seeing the image there,
Take place for cause and make our will Fate bear.
Soneto XXXIV
FELIZES OS MUTILADOS, os coxos, os loucos, os cegos –
Todos os que, por estranho nascimento destoantes,
Favor não devem nem obrigação com a humanidade têm
Nem tampouco a estimar sua parcela de valor se põem!
Eu, porém, a quem o Destino, não a Natureza, de menos deu,
De todo vazio exterior livre sendo,
Olhares acusatórios das imperfeições minhas que suportar tenho
Na órbita geral do desprezo centrados.
O Destino, sendo mais tolerante do que a Natureza,
Trazendo-nos moléstias, não como uma causa externa mostra-se,
Que faz com que do espelho a proteção do nosso escárnio nos poupe
E que do Destino os próprios atos como se nele mesmo contidos mostra;
Os homens, qual crianças, vendo ali a imagem,
Confundem lugar com causa e no Destino nossa vontade se realiza.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
HAPPY THE MAIMED, the halt, the mad, the blind -
All who, stamped separate by curtailing birth,
Owe no duty’s allegiance to mankind
Nor stand a valuing their scheme of worth!
But I, whom Fate, not Nature, did curtail,
By no exterior voidness being exempt,
Must bear accusing glances where I fail,
Fixed in the general orbit of contempt.
Fate, less than Nature, in being kind to lacking,
Giving the ill, shows not as outer cause,
Making our mock-free will the mirror’s backing
Which Fate1s own acts as if in itself shows;
And men, like children, seeing the image there,
Take place for cause and make our will Fate bear.
Soneto XXXIV
FELIZES OS MUTILADOS, os coxos, os loucos, os cegos –
Todos os que, por estranho nascimento destoantes,
Favor não devem nem obrigação com a humanidade têm
Nem tampouco a estimar sua parcela de valor se põem!
Eu, porém, a quem o Destino, não a Natureza, de menos deu,
De todo vazio exterior livre sendo,
Olhares acusatórios das imperfeições minhas que suportar tenho
Na órbita geral do desprezo centrados.
O Destino, sendo mais tolerante do que a Natureza,
Trazendo-nos moléstias, não como uma causa externa mostra-se,
Que faz com que do espelho a proteção do nosso escárnio nos poupe
E que do Destino os próprios atos como se nele mesmo contidos mostra;
Os homens, qual crianças, vendo ali a imagem,
Confundem lugar com causa e no Destino nossa vontade se realiza.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
domingo, 23 de maio de 2010
Falência da escola pública estadual e municipal: as verdadeiras causas
Cunha e Silva Filho
Reportagem da Folha de São Paulo (23/05/2010) discute as causas do absenteísmo e das chamadas e conhecidas licenças médicas de professores estaduais paulistas.As informações, entretanto, prestadas ao leitor não mostram a verdadeira causa da péssima saúde dos professores. Seu foco antes se restringe a apresentar estatísticas de faltas dos professores às escolas, de professores doentes, ou seja, de mestres sofrendo das cordas vocais, de hipertensão, de stress e de outros males provocados por uma carreira que perdeu há muito tempo alguma consideração da sociedade.
Ora, abrir discussão só em torno dos efeitos do mau desempenho docente é uma forma de escamotear os motivos mais concretos e fundos do problema do magistério paulista e do magistério brasileiro público na sua generalidade, porquanto essa radiografia que se faz fundamentada apenas em informações técnicas da saúde do professorado ideologiza o cerne da questão: enquanto não se alterarem as condições de plano de carreira dos professores das redes estadual e municipal como uma medida escorada em lei sancionada e cumprida, não são vagos paliativos de natureza médico-psicológico-tecnológica que contornarão a difícil realidade vivida faz muito tempo pelos professores brasileiros.
Ainda me recordo de uma opinião insensata e autoritária de um ex-governador paulista que declarara publicamente não haver remédio para a questão do salário dos docentes do ensino público. Para o governador, professor não vai jamais ter bons salários. Como não? Não é obrigação de o Estado prover gratuidade ao ensino público? Se o é, não há que se falar aqui de uma impossibilidade definitiva de propiciar um salário decente a essa heroica carreira, que é o magistério. O Estado tem seus limites orçamentários, reconheço. No entanto, tal não obstaculiza que ao setor da educação sejam alocados recursos suficientes e permanentes de molde a remunerar condignamente nossos mestres. Por que, por exemplo, não se fazer parcerias ou convênios com recursos privados de grandes empresas e recursos públicos, através, por exemplo, de contrapartidas no imposto de renda ou de forma diferente de compensação, segundo já existe no ensino universitário estadual?
O que proporia seria uma forma de remuneração que permitisse ao docente levar uma vida sem aperturas financeiras indecentes, sem ter condições de comprar livros, jornais, aperfeiçoar-se, e não se ver compelido a lecionar em um, dois, três ou mais colégios a fim de, no final do mês, somar uma remuneração um pouco mais alta. Isso é um suicídio, pois, esse professor não terá condições de dar boas aulas nem tempo e saúde para elas se prepararem. Eis aí uma outra razão que leva nossos docentes às moléstias e a faltarem muito às aulas.
Além disso, há que proporcionar ao professor condições favoráveis a um desempenho satisfatório, bom ou ótimo estimulando, isto sim, os mestres a uma das missões sociais mais úteis e nobres, que é a de ensinar, orientar e preparar as novas gerações de cidadãos do país. Sem a Escola, não há país que atinja um alto estágio de desenvolvimento pleno, que traga mudanças efetivas na formação ético-educativa ao educando, dele fazendo uma pessoa mais humana, solidária e responsável.
Um outro desafio a ser enfrentado pelas autoridades educacionais, em conjunção com outros setores, como assistência social, médica e psicológica a alunos e professores, seria possibilitar apoio logístico à segurança dos mestres que, nas últimas décadas, se veem vítimas da violência dos próprios alunos, os quais não mais dão atenção às aulas dos professores nem os respeitam mais. A escola pública brasileira atual vive momentos de inusitada insegurança, com seus professores sendo ameaçados até por causa de notas de exames escolares. A integridade física e psicológica dos docentes está comprometida, desencadeando por isso sérios prejuízos ao sistema educacional, uma vez que professores chegaram à exaustão e, por mais que sejam vocacionados e competentes, resolvem abandonar a profissão, como foi o caso, recentemente noticiado pela TV, de uma jovem professora de inglês de uma escola de Brasília, vítima da violência e ameaça de um aluno delinquente. Em todo o país, esses casos já se tornaram comuns.
Essa realidade sombria e vergonhosa para nossas autoridades educacionais se torna mesmo extremamente nociva ao aperfeiçoamento da educação brasileira. Isso demonstra que existe uma estreita vinculação de causa e efeito entre a má educação e a criminalidade no país.
Somente medidas rigorosas conducentes à erradicação desses mencionados entraves crônicos que enfrenta a escola pública, desde que não negligenciem o nó górdio – a valorização efetiva e contínua do nível salarial dos docentes – alterarão a escandalosa situação do nosso ensino fundamental e médio. Mobilizar logística médico-psicológico-técnica – repito - não fará diferença no encaminhamento das soluções do problema central. Não adianta suprir o professor dessa parafernália, útil se as condições básicas aqui apontadas prevalecessem, se o bolso do educador continuar vazio e, portanto, falto de estímulo. O contrário disso é a persistência de um círculo vicioso alimentado pela ideologia elitista e sem pés no chão dos que, na gestão do ensino, não desejam um novo e produtivo caminho para a educação pública brasileira.
Reportagem da Folha de São Paulo (23/05/2010) discute as causas do absenteísmo e das chamadas e conhecidas licenças médicas de professores estaduais paulistas.As informações, entretanto, prestadas ao leitor não mostram a verdadeira causa da péssima saúde dos professores. Seu foco antes se restringe a apresentar estatísticas de faltas dos professores às escolas, de professores doentes, ou seja, de mestres sofrendo das cordas vocais, de hipertensão, de stress e de outros males provocados por uma carreira que perdeu há muito tempo alguma consideração da sociedade.
Ora, abrir discussão só em torno dos efeitos do mau desempenho docente é uma forma de escamotear os motivos mais concretos e fundos do problema do magistério paulista e do magistério brasileiro público na sua generalidade, porquanto essa radiografia que se faz fundamentada apenas em informações técnicas da saúde do professorado ideologiza o cerne da questão: enquanto não se alterarem as condições de plano de carreira dos professores das redes estadual e municipal como uma medida escorada em lei sancionada e cumprida, não são vagos paliativos de natureza médico-psicológico-tecnológica que contornarão a difícil realidade vivida faz muito tempo pelos professores brasileiros.
Ainda me recordo de uma opinião insensata e autoritária de um ex-governador paulista que declarara publicamente não haver remédio para a questão do salário dos docentes do ensino público. Para o governador, professor não vai jamais ter bons salários. Como não? Não é obrigação de o Estado prover gratuidade ao ensino público? Se o é, não há que se falar aqui de uma impossibilidade definitiva de propiciar um salário decente a essa heroica carreira, que é o magistério. O Estado tem seus limites orçamentários, reconheço. No entanto, tal não obstaculiza que ao setor da educação sejam alocados recursos suficientes e permanentes de molde a remunerar condignamente nossos mestres. Por que, por exemplo, não se fazer parcerias ou convênios com recursos privados de grandes empresas e recursos públicos, através, por exemplo, de contrapartidas no imposto de renda ou de forma diferente de compensação, segundo já existe no ensino universitário estadual?
O que proporia seria uma forma de remuneração que permitisse ao docente levar uma vida sem aperturas financeiras indecentes, sem ter condições de comprar livros, jornais, aperfeiçoar-se, e não se ver compelido a lecionar em um, dois, três ou mais colégios a fim de, no final do mês, somar uma remuneração um pouco mais alta. Isso é um suicídio, pois, esse professor não terá condições de dar boas aulas nem tempo e saúde para elas se prepararem. Eis aí uma outra razão que leva nossos docentes às moléstias e a faltarem muito às aulas.
Além disso, há que proporcionar ao professor condições favoráveis a um desempenho satisfatório, bom ou ótimo estimulando, isto sim, os mestres a uma das missões sociais mais úteis e nobres, que é a de ensinar, orientar e preparar as novas gerações de cidadãos do país. Sem a Escola, não há país que atinja um alto estágio de desenvolvimento pleno, que traga mudanças efetivas na formação ético-educativa ao educando, dele fazendo uma pessoa mais humana, solidária e responsável.
Um outro desafio a ser enfrentado pelas autoridades educacionais, em conjunção com outros setores, como assistência social, médica e psicológica a alunos e professores, seria possibilitar apoio logístico à segurança dos mestres que, nas últimas décadas, se veem vítimas da violência dos próprios alunos, os quais não mais dão atenção às aulas dos professores nem os respeitam mais. A escola pública brasileira atual vive momentos de inusitada insegurança, com seus professores sendo ameaçados até por causa de notas de exames escolares. A integridade física e psicológica dos docentes está comprometida, desencadeando por isso sérios prejuízos ao sistema educacional, uma vez que professores chegaram à exaustão e, por mais que sejam vocacionados e competentes, resolvem abandonar a profissão, como foi o caso, recentemente noticiado pela TV, de uma jovem professora de inglês de uma escola de Brasília, vítima da violência e ameaça de um aluno delinquente. Em todo o país, esses casos já se tornaram comuns.
Essa realidade sombria e vergonhosa para nossas autoridades educacionais se torna mesmo extremamente nociva ao aperfeiçoamento da educação brasileira. Isso demonstra que existe uma estreita vinculação de causa e efeito entre a má educação e a criminalidade no país.
Somente medidas rigorosas conducentes à erradicação desses mencionados entraves crônicos que enfrenta a escola pública, desde que não negligenciem o nó górdio – a valorização efetiva e contínua do nível salarial dos docentes – alterarão a escandalosa situação do nosso ensino fundamental e médio. Mobilizar logística médico-psicológico-técnica – repito - não fará diferença no encaminhamento das soluções do problema central. Não adianta suprir o professor dessa parafernália, útil se as condições básicas aqui apontadas prevalecessem, se o bolso do educador continuar vazio e, portanto, falto de estímulo. O contrário disso é a persistência de um círculo vicioso alimentado pela ideologia elitista e sem pés no chão dos que, na gestão do ensino, não desejam um novo e produtivo caminho para a educação pública brasileira.
sábado, 22 de maio de 2010
O Brasil, o Irã e o urânio
O Brasil, o Irã e o urânio
Cunha e Silva Filho
Mesmo com as minhas discordâncias, algumas duras, contra o governo Lula, não resta dúvida de que o Presidente brasileiro conseguiu visibilidade no concerto das nações, a ponto de aparecer em capas de revistas internacionais famosas e ser reconhecido como líder mundial influente. Já se afirmou que Lula é um individuo de sorte, tem carisma e uma indiscutível forma conciliatória de conduzir-se como Chefe de Estado.
Me membro de que, na história política do Piauí, falavam mal da falta de instrução e de cultura do governador Pedro Freitas, com mandato de 1951 a 1955. Era até por vezes motivo de mofa da oposição. No entanto, ninguém lhe podia negar dotes de bom governante, de hábil administrador, o que nos leva á conclusão de que um político com invejável curriculum nem sempre será um governante vitorioso.
Já escrevi artigos contundentes contra o governo Lula e o seu partido, reprovando o injustificável silêncio e leniência do ex-sindicalista no abominável e longo episódio da política brasileira conhecido como “o escândalo do Mensalão”.
Nem por isso devo omitir aspectos positivos do seu governo, principalmente na recente questão da posição da nossa diplomacia com respeito ao direito que o Irã tem de desenvolver sua política de energia nuclear
É da índole política brasileira, pelo menos do Brasil moderno, procurar, através do diálogo, e não da força das armas e das invasões a territórios soberanos, dirimir questões delicadas que, no mínimo, são tratadas com transparência. Desta maneira, o governo Lula tem se conduzido com vontade de buscar soluções, pela via do diálogo, sem autoritarismos e arrogâncias imperialistas anacrônicas face a regiões do Planeta cheias de constantes conflitos geopolíticos, econômicos (o Irã é a segunda maior reserva de petróleo mundial, perdendo apenas para a Arábia Saudita) e ideológicos.
O nosso país cresceu e amadureceu em múltiplas setores de desenvolvimento. Conseguiu, pelo exemplo de sua política econômica, evitar que caíssemos na recente grave crise financeira internacional, de que foram vítimas principais os EUA e países europeus.
Conquistas como estas permitiram que o Brasil passasse a ser visto com outros olhos, como um país responsável e com um potencial afirmativo que decerto já o alçou a uma posição de respeito e de capacidade de liderança no palco internacional.
Por essa razão, não vejo que Lula tenha sido joguete do Irá nessa busca de encontrar um entendimento, junto às grandes potências, para permitir que o país dos aiatolás usufrua das mesmas prerrogativas no emprego do urânio para finalidades pacíficas, sobretudo nas áreas energética e médica.
Ao procurar mediar os conflitos do Irã com as nações ricas e fortemente armadas, o Presidente Lula, que não é prêmio Nobel da Paz, tem-se mostrado com maior espírito de liderança e de disposição para questões que envolvem a paz e a segurança mundial do que o Presidente Obama, o qual, até hoje, não conseguiu pôr termo às investidas no Afeganistão e no Paquistão, além de ainda manter intacta a vexatória prisão de Guantánamo no Caribe.
Por que – pergunto – os EUA não obstaram o crescente poderio bélico de Israel? O Irã tem direito, neste aspecto, a se defender também e como pode fazê-lo se há uma espada de Dâmocles pairando sobre Teerã através das ameaças de invasão norte-americana no seu território?
Fala-se que o Brasil vai sair perdendo por tentar encontrar solução pacífica entre o Irã e as nações hegemônicas, todas sob a tutela marcial implícita norte-americana.
Conquanto não logre, diante da não-aceitação dos Estados Unidos e de outros aliados ocidentais sobre o acordo firmado com o Irã na questão do programa nuclear, um assento permanente no Conselho de Segurança da Nações Unidas, o Brasil, com essa política externa extremamente aberta e cordial, terá dado ao mundo um exemplo de país que já conquistou maioridade política e a admiração de muitos países do orbe.
Não vejo que o Presidente Lula tenha feito papel de “Bobo útil” de Mahmoud Ahmadinejad. como levianamente definiu o analista Jackson Diehl, do Washington Post. Tampouco veria como um fracasso ou perda de “credibilidade internacional”, segundo ponderou o ex-ministro das Relações Exteriores do governo FHC, Luiz Felipe Lampreia, ” essa tentativa de o governo brasileiro negociar, através do diálogo, um caminho pacífico a fim de que o Irã possa dar continuidade ao seu programa nuclear. O que muito importou foi a tentativa de abrir vias de solução do problema e disso o nosso país tem consciência de haver dado sua contribuição.
O que cumpriria aos EUA seria suspender as sanções ao Irã, até porque o governo americano não pode ser o senhor do mundo e moralmente, nem pode agir como o faz, logo ele que detém arsenal capaz de varrer a Terra do Universo.
Cunha e Silva Filho
Mesmo com as minhas discordâncias, algumas duras, contra o governo Lula, não resta dúvida de que o Presidente brasileiro conseguiu visibilidade no concerto das nações, a ponto de aparecer em capas de revistas internacionais famosas e ser reconhecido como líder mundial influente. Já se afirmou que Lula é um individuo de sorte, tem carisma e uma indiscutível forma conciliatória de conduzir-se como Chefe de Estado.
Me membro de que, na história política do Piauí, falavam mal da falta de instrução e de cultura do governador Pedro Freitas, com mandato de 1951 a 1955. Era até por vezes motivo de mofa da oposição. No entanto, ninguém lhe podia negar dotes de bom governante, de hábil administrador, o que nos leva á conclusão de que um político com invejável curriculum nem sempre será um governante vitorioso.
Já escrevi artigos contundentes contra o governo Lula e o seu partido, reprovando o injustificável silêncio e leniência do ex-sindicalista no abominável e longo episódio da política brasileira conhecido como “o escândalo do Mensalão”.
Nem por isso devo omitir aspectos positivos do seu governo, principalmente na recente questão da posição da nossa diplomacia com respeito ao direito que o Irã tem de desenvolver sua política de energia nuclear
É da índole política brasileira, pelo menos do Brasil moderno, procurar, através do diálogo, e não da força das armas e das invasões a territórios soberanos, dirimir questões delicadas que, no mínimo, são tratadas com transparência. Desta maneira, o governo Lula tem se conduzido com vontade de buscar soluções, pela via do diálogo, sem autoritarismos e arrogâncias imperialistas anacrônicas face a regiões do Planeta cheias de constantes conflitos geopolíticos, econômicos (o Irã é a segunda maior reserva de petróleo mundial, perdendo apenas para a Arábia Saudita) e ideológicos.
O nosso país cresceu e amadureceu em múltiplas setores de desenvolvimento. Conseguiu, pelo exemplo de sua política econômica, evitar que caíssemos na recente grave crise financeira internacional, de que foram vítimas principais os EUA e países europeus.
Conquistas como estas permitiram que o Brasil passasse a ser visto com outros olhos, como um país responsável e com um potencial afirmativo que decerto já o alçou a uma posição de respeito e de capacidade de liderança no palco internacional.
Por essa razão, não vejo que Lula tenha sido joguete do Irá nessa busca de encontrar um entendimento, junto às grandes potências, para permitir que o país dos aiatolás usufrua das mesmas prerrogativas no emprego do urânio para finalidades pacíficas, sobretudo nas áreas energética e médica.
Ao procurar mediar os conflitos do Irã com as nações ricas e fortemente armadas, o Presidente Lula, que não é prêmio Nobel da Paz, tem-se mostrado com maior espírito de liderança e de disposição para questões que envolvem a paz e a segurança mundial do que o Presidente Obama, o qual, até hoje, não conseguiu pôr termo às investidas no Afeganistão e no Paquistão, além de ainda manter intacta a vexatória prisão de Guantánamo no Caribe.
Por que – pergunto – os EUA não obstaram o crescente poderio bélico de Israel? O Irã tem direito, neste aspecto, a se defender também e como pode fazê-lo se há uma espada de Dâmocles pairando sobre Teerã através das ameaças de invasão norte-americana no seu território?
Fala-se que o Brasil vai sair perdendo por tentar encontrar solução pacífica entre o Irã e as nações hegemônicas, todas sob a tutela marcial implícita norte-americana.
Conquanto não logre, diante da não-aceitação dos Estados Unidos e de outros aliados ocidentais sobre o acordo firmado com o Irã na questão do programa nuclear, um assento permanente no Conselho de Segurança da Nações Unidas, o Brasil, com essa política externa extremamente aberta e cordial, terá dado ao mundo um exemplo de país que já conquistou maioridade política e a admiração de muitos países do orbe.
Não vejo que o Presidente Lula tenha feito papel de “Bobo útil” de Mahmoud Ahmadinejad. como levianamente definiu o analista Jackson Diehl, do Washington Post. Tampouco veria como um fracasso ou perda de “credibilidade internacional”, segundo ponderou o ex-ministro das Relações Exteriores do governo FHC, Luiz Felipe Lampreia, ” essa tentativa de o governo brasileiro negociar, através do diálogo, um caminho pacífico a fim de que o Irã possa dar continuidade ao seu programa nuclear. O que muito importou foi a tentativa de abrir vias de solução do problema e disso o nosso país tem consciência de haver dado sua contribuição.
O que cumpriria aos EUA seria suspender as sanções ao Irã, até porque o governo americano não pode ser o senhor do mundo e moralmente, nem pode agir como o faz, logo ele que detém arsenal capaz de varrer a Terra do Universo.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
Fernando Pessoa: "Sonnet XXXIII"
Fernando Pessoa: “Sonnet XXXIII”
Sonnet XXXIII
HE THAT GOES back does, since He goes, advance,
Though he doth not advance who gets back,
And he that seeks, though he on nothing chance,
May still by words be said to find a lack.
This paradox of having, that is nought
In the world’s meaning of the things in screens,
Is yet true of the substance of pure thought
And there means something by the nought it means.
For thinking nought does on nought being confer,
As giving not is acting not to give,
And to the same unbribed true thought, to err
Is to find truth, though by its negative.
So why call this world false, if false to be
Be to be aught, and being aught Being to be?
Soneto XXXIII
AQUELE QUE REGRESSA, ao fazê-lo, evolui, sim ,
Embora não alcança evoluir quem o faz.
Ainda que nada arrisque, quem procura
De alguém não passa que, carente, se torna.
De ser este paradoxo o que não tem
Das coisas secretas no significado do mundo,
É, todavia, válido do pensamento para a substância
Daquilo que, não sendo nada, denota algo.
Porquanto do pensamento a ausência a nada decerto se reduz,
Assim como o não dar nulo ato é,
E, ao próprio pensamento lídimo e incorruptível, errar
Posto seja pelo seu reverso, é a verdade encontrar.
Por que, então, considerar falso este mundo se falso ser qualquer coisa
É ser qualquer coisa e, sendo qualquer coisa, ser o Ser?
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
Sonnet XXXIII
HE THAT GOES back does, since He goes, advance,
Though he doth not advance who gets back,
And he that seeks, though he on nothing chance,
May still by words be said to find a lack.
This paradox of having, that is nought
In the world’s meaning of the things in screens,
Is yet true of the substance of pure thought
And there means something by the nought it means.
For thinking nought does on nought being confer,
As giving not is acting not to give,
And to the same unbribed true thought, to err
Is to find truth, though by its negative.
So why call this world false, if false to be
Be to be aught, and being aught Being to be?
Soneto XXXIII
AQUELE QUE REGRESSA, ao fazê-lo, evolui, sim ,
Embora não alcança evoluir quem o faz.
Ainda que nada arrisque, quem procura
De alguém não passa que, carente, se torna.
De ser este paradoxo o que não tem
Das coisas secretas no significado do mundo,
É, todavia, válido do pensamento para a substância
Daquilo que, não sendo nada, denota algo.
Porquanto do pensamento a ausência a nada decerto se reduz,
Assim como o não dar nulo ato é,
E, ao próprio pensamento lídimo e incorruptível, errar
Posto seja pelo seu reverso, é a verdade encontrar.
Por que, então, considerar falso este mundo se falso ser qualquer coisa
É ser qualquer coisa e, sendo qualquer coisa, ser o Ser?
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
terça-feira, 18 de maio de 2010
A Casa e a Rua: um apólogo no Brasil de hoje
A Casa e a Rua: uma apólogo no Brasil de hoje
Cunha e Silva Filho
Leitor do século 21, você que está sempre apressado e não tem tempo para ninguém, nem para si mesmo, ouça o diálogo abaixo que pode ser um espaço das grandes cidades brasileiras. Penso no Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Belo Horizonte, que são as que mais interessam ao subtexto do diálogo :
Casa: - Quando penso em sair, me vem logo alguma indisposição, que pode ser gástrica, urinária, ou mesmo uma dor de cabeça. Penso duas, três vezes antes da decisão final de sair à rua. Se não incorro em erro, foi o antropólogo Roberto DaMatta que, em célebre livro, afirmou ser a rua o perigo, o que me leva a lembrar também de uma célebre frase do Riobaldo de Guimarães Rosa: “Viver é perigoso. Esta frase, na narrativa do escritor mineiro, vale como um refrão. Há ainda uma frase equivalente na narrativa do contista João Antônio, do livro Dedo-Duro – “Viver é brabo” - que parece inspirada em Guimarães Rosa, só que contextualizada no espaço urbano, enquanto em Guimarães Rosa ocorre no espaço do sertão mineiro. O que você me diz disso, amiga (!) Rua?
Rua: Não é tanto assim, porém reconheço que, no fundo, você tem razão. Veja, por exemplo, o trânsito, uma viagem de ônibus. O passageiro entra, compra sua passagem ou passa o cartão eletrônico, senta-se e daí a pouco sente que o motorista não parece ter cérebro, pois arrisca a vida dele e a dos passageiros com alta velocidade, freadas bruscas e desnecessárias, direção em ziguezague, numa palavra, usa o carro, que é grande, como se fosse uma arma. Por isso, os passageiros ficam apreensivos com a viagem, não sabendo que o pior pode acontecer por irresponsabilidade do motorista. A viagem tornou-se uma aventura perigosa. O pior é que a maioria dos passageiros nem está aí para as lambanças do motorista incompetente. Não há solidariedade na reclamação de um passageiro. Você vê, amiga (!) Casa, que eu sei dos perigos que as pessoas enfrentam na rua. São inúmeros; assaltos, bala perdida, acidentes de carro, engarrafamento e mil e outras inconveniências.
Casa: É verdade, amiga (!), é verdade. Não tenho vergonha de dizer que tenho medo de você, isso está virando quase uma obsessão, uma patologia. Daqui apouco terei que procurar um médico que, provavelmente, vendo meu estado psicológico, me prescreverá uns remédios para baixar a crista, a fim de aguentar tudo calada, e não me queixar de nada. Mas, não vê que isso não é bom para mim porque, com o tempo, ficarei dependente dos remédios, se bem que, mesmo com os remédios, ainda persiste em mim, lá no fundo, uma medozinho de encarar a vida, ou melhor, a rua. Tenho um amigo que ficou um ano quase sem sair de casa, tinha horror a tudo que fosse espaço aberto, a tudo que extrapolasse os muros de sua casa, pois ele tem ainda a sorte de morar em casa.Uma vez, estava dirigindo seu carro e, de repente, parou, largou a direção e ficou sentado na calçada, cego, mudo e surdo. A família só veio dar conta dele porque uma conhecido o viu naquele estado catatônico.
Rua: Na realidade, minha amiga(!), o espaço aqui fora não está pra peixe. As pessoas estão apavoradas com o que sabem pela televisão onde as notícias boas são exceções. Só se ouve falar de assaltos, sequestros, “saidinha do banco”, clonagem de cartão de credito, estupradores, pedófilos, crimes em família, violência policial, corrupção política, quadrilhas para todos os gostos e tipos, padres degenerados, brigas de vizinhos, brigas em condomínios, crimes estúpidos, em suma, ausência completa do Bem. Reconheço, diante de toda s essas misérias, que há algo errado com o nosso país e, em alguns aspectos, com o nosso Planeta, que não vai bem não.
Casa; Você acha, amiga (!) que essa desvida tem conserto?
Rua: Tem, se houver mudanças profundas na essência do ser humano, e citaria algumas: na formação educacional dos jovens, na procura de uma orientação espiritual séria , na união entre as pessoas, na eliminação do fanatismo de qualquer natureza, dos preconceitos, no uso da Ciência e da Tecnologia para fins pacíficos voltados para o bem-estar da humanidade. Enquanto não existirem espírito desarmado, ausência de hipocrisia, desambição entre os homens, amor ao próximo e uma mente estruturada em bases realmente cristãs, sem contrafações, as maldades persistirão. Sei que essas metas soam utópicas. Os outros dirão que essas ideias são ingênuas e que muito pouco há de se conseguir melhorar moralmente as criaturas humanas. Quer dizer, a rua será o perigo e a casa um refúgio cercado de grades, concretas ou abstratas, com calmantes ou sem calmantes. A concepção do viver dos dois ficcionistas, reforçada pelo antropólogo, atrás citados, continuaria a ser “perigo”, “perigoso” e “brabo.” A nossa conversa, por ora, vou dar aqui por encerrada. Até breve, amiga (!).
Casa: Até...
Cunha e Silva Filho
Leitor do século 21, você que está sempre apressado e não tem tempo para ninguém, nem para si mesmo, ouça o diálogo abaixo que pode ser um espaço das grandes cidades brasileiras. Penso no Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Belo Horizonte, que são as que mais interessam ao subtexto do diálogo :
Casa: - Quando penso em sair, me vem logo alguma indisposição, que pode ser gástrica, urinária, ou mesmo uma dor de cabeça. Penso duas, três vezes antes da decisão final de sair à rua. Se não incorro em erro, foi o antropólogo Roberto DaMatta que, em célebre livro, afirmou ser a rua o perigo, o que me leva a lembrar também de uma célebre frase do Riobaldo de Guimarães Rosa: “Viver é perigoso. Esta frase, na narrativa do escritor mineiro, vale como um refrão. Há ainda uma frase equivalente na narrativa do contista João Antônio, do livro Dedo-Duro – “Viver é brabo” - que parece inspirada em Guimarães Rosa, só que contextualizada no espaço urbano, enquanto em Guimarães Rosa ocorre no espaço do sertão mineiro. O que você me diz disso, amiga (!) Rua?
Rua: Não é tanto assim, porém reconheço que, no fundo, você tem razão. Veja, por exemplo, o trânsito, uma viagem de ônibus. O passageiro entra, compra sua passagem ou passa o cartão eletrônico, senta-se e daí a pouco sente que o motorista não parece ter cérebro, pois arrisca a vida dele e a dos passageiros com alta velocidade, freadas bruscas e desnecessárias, direção em ziguezague, numa palavra, usa o carro, que é grande, como se fosse uma arma. Por isso, os passageiros ficam apreensivos com a viagem, não sabendo que o pior pode acontecer por irresponsabilidade do motorista. A viagem tornou-se uma aventura perigosa. O pior é que a maioria dos passageiros nem está aí para as lambanças do motorista incompetente. Não há solidariedade na reclamação de um passageiro. Você vê, amiga (!) Casa, que eu sei dos perigos que as pessoas enfrentam na rua. São inúmeros; assaltos, bala perdida, acidentes de carro, engarrafamento e mil e outras inconveniências.
Casa: É verdade, amiga (!), é verdade. Não tenho vergonha de dizer que tenho medo de você, isso está virando quase uma obsessão, uma patologia. Daqui apouco terei que procurar um médico que, provavelmente, vendo meu estado psicológico, me prescreverá uns remédios para baixar a crista, a fim de aguentar tudo calada, e não me queixar de nada. Mas, não vê que isso não é bom para mim porque, com o tempo, ficarei dependente dos remédios, se bem que, mesmo com os remédios, ainda persiste em mim, lá no fundo, uma medozinho de encarar a vida, ou melhor, a rua. Tenho um amigo que ficou um ano quase sem sair de casa, tinha horror a tudo que fosse espaço aberto, a tudo que extrapolasse os muros de sua casa, pois ele tem ainda a sorte de morar em casa.Uma vez, estava dirigindo seu carro e, de repente, parou, largou a direção e ficou sentado na calçada, cego, mudo e surdo. A família só veio dar conta dele porque uma conhecido o viu naquele estado catatônico.
Rua: Na realidade, minha amiga(!), o espaço aqui fora não está pra peixe. As pessoas estão apavoradas com o que sabem pela televisão onde as notícias boas são exceções. Só se ouve falar de assaltos, sequestros, “saidinha do banco”, clonagem de cartão de credito, estupradores, pedófilos, crimes em família, violência policial, corrupção política, quadrilhas para todos os gostos e tipos, padres degenerados, brigas de vizinhos, brigas em condomínios, crimes estúpidos, em suma, ausência completa do Bem. Reconheço, diante de toda s essas misérias, que há algo errado com o nosso país e, em alguns aspectos, com o nosso Planeta, que não vai bem não.
Casa; Você acha, amiga (!) que essa desvida tem conserto?
Rua: Tem, se houver mudanças profundas na essência do ser humano, e citaria algumas: na formação educacional dos jovens, na procura de uma orientação espiritual séria , na união entre as pessoas, na eliminação do fanatismo de qualquer natureza, dos preconceitos, no uso da Ciência e da Tecnologia para fins pacíficos voltados para o bem-estar da humanidade. Enquanto não existirem espírito desarmado, ausência de hipocrisia, desambição entre os homens, amor ao próximo e uma mente estruturada em bases realmente cristãs, sem contrafações, as maldades persistirão. Sei que essas metas soam utópicas. Os outros dirão que essas ideias são ingênuas e que muito pouco há de se conseguir melhorar moralmente as criaturas humanas. Quer dizer, a rua será o perigo e a casa um refúgio cercado de grades, concretas ou abstratas, com calmantes ou sem calmantes. A concepção do viver dos dois ficcionistas, reforçada pelo antropólogo, atrás citados, continuaria a ser “perigo”, “perigoso” e “brabo.” A nossa conversa, por ora, vou dar aqui por encerrada. Até breve, amiga (!).
Casa: Até...
Por que, no Piauí, não há mais suplementos literários?
Por que, no Piauí, não há mais suplementos literários?
Cunha e Silva Filho
No Brasil, regredimos muito no que respeita aos chamados suplementos literários. Agora mesmo, senti uma mudança para pior no caderno Ideias do JB. Não há mais um caderno independente dos outros cadernos, das outras seções. A derradeira página atual do caderno está colada a outra seção Carro & Moto, que nada tem a ver com literatura. Que lástima! O que houve? Com a página de rosto dispõe agora só de cinco páginas. Como não sou ligado aos bastidores do jornal, só me resta fazer conjecturas pessimistas sobre o que pode acontecer.
Quanto ao caderno Mais! da Folha de São Paulo, a edição que li ontem, (domingo, 16/05/2010) informa ser a última num caderno que durou dezoito anos. A direção do jornal, no entanto, comunica que, no próximo domingo, dia 23, o prestigioso Mais! será substituído por um novo caderno cultural, chamado Ilustríssima. Segundo a reportagem, Ilustríssima – não gostei do nome – será um caderno cultural renovado, sem jargões acadêmicos, mas atento à atualidade, à reflexão crítica, ao texto “prazeroso” e será aberto a gerações diferentes. Constará de ensaios, textos de ficção, dramaturgia, poesia e quadrinhos, entre outros itens. Ficará a cargo de Paulo Werneck, que é jornalista e tradutor, tendo já trabalhado em editoras de renome. Segundo ainda a reportagem, Aliás, o jornal no seu texto, receberá novo tratamento gráfico, visual e de conteúdo. Vamos, pois, torcer para que o novo caderno cultural, assim como a Folha inteira, seja um sucesso.
Mas, o que esta crônica deseja comentar é a situação de inatividade em que as páginas culturais ficaram de longo tempo para cá. Ainda quando morava em Teresina, nos inícios dos anos sessenta, havia jornais com, pelo menos, uma página sobre literatura e cultura, onde grandes intelectuais ou mesmo jovens aspirantes a atividade literária de Teresina, como foi o meu caso, assinavam, aos domingos, bons artigos ou pequenos ensaios. Quando o jornal não dispunha de uma página cultural, não deixavam de publicavam artigos sobre literatura ou outros assuntos relacionados à cultura. E aí valia tudo, crônica, contos, poesia, resenhas, tradução, noticiário acadêmico, como fizeram os jornais Estado do Piauí( de Josípio Lustosa) Jornal do Piauí, O Dia (do tempo de Mundico Santilo) entre outros. Foi uma época fértil para quem escrevia sobre literatura e cultura em geral. Tudo isso acabou praticamente. Hoje desconheço algum jornal do Piauí que tenha pelo menos uma página toda destinada a agasalhar matéria literária.
Um outro dado importante: não havia restrição a artigos grandes, que tirassem o espaço do jornal reservado à publicidade ou a outros itens mais lucrativos. Pessoalmente, não vejo que um jornal atento possa descuidar desse tema como meta a ser implementada pelos seus proprietários e diretores. Ainda que seja, em proporções pequenas, o espaço cultural-literário não vai trazer prejuízos aos donos dos jornais. É claro que as matérias dos autores, sendo remuneradas, irá atrair bons colunistas, críticos, resenhistas e intelectuais do meio jornalístico ou acadêmico. Tenho certeza de que os leitores cultos e o público médio em geral irão receber bem esse novo espaço jornalístico.
Por sua circulação em larga escala, ou seja penetrando em todo estado do Piauí, os jornais ainda têm a vantagem e a celeridade de serem um veículo de acesso direto ao leitor, sem falar na sua inegável força de divulgação de livros, de autores e do que está acontecendo no meio cultural de um estado. Valeria a pena tentar um empreendimento desses. Torço para que isso ainda possa motivar algum empresário do setor jornalístico que saiba valorizar o papel da literatura e da cultura em geral como fator de progresso da minha terra.
Cunha e Silva Filho
No Brasil, regredimos muito no que respeita aos chamados suplementos literários. Agora mesmo, senti uma mudança para pior no caderno Ideias do JB. Não há mais um caderno independente dos outros cadernos, das outras seções. A derradeira página atual do caderno está colada a outra seção Carro & Moto, que nada tem a ver com literatura. Que lástima! O que houve? Com a página de rosto dispõe agora só de cinco páginas. Como não sou ligado aos bastidores do jornal, só me resta fazer conjecturas pessimistas sobre o que pode acontecer.
Quanto ao caderno Mais! da Folha de São Paulo, a edição que li ontem, (domingo, 16/05/2010) informa ser a última num caderno que durou dezoito anos. A direção do jornal, no entanto, comunica que, no próximo domingo, dia 23, o prestigioso Mais! será substituído por um novo caderno cultural, chamado Ilustríssima. Segundo a reportagem, Ilustríssima – não gostei do nome – será um caderno cultural renovado, sem jargões acadêmicos, mas atento à atualidade, à reflexão crítica, ao texto “prazeroso” e será aberto a gerações diferentes. Constará de ensaios, textos de ficção, dramaturgia, poesia e quadrinhos, entre outros itens. Ficará a cargo de Paulo Werneck, que é jornalista e tradutor, tendo já trabalhado em editoras de renome. Segundo ainda a reportagem, Aliás, o jornal no seu texto, receberá novo tratamento gráfico, visual e de conteúdo. Vamos, pois, torcer para que o novo caderno cultural, assim como a Folha inteira, seja um sucesso.
Mas, o que esta crônica deseja comentar é a situação de inatividade em que as páginas culturais ficaram de longo tempo para cá. Ainda quando morava em Teresina, nos inícios dos anos sessenta, havia jornais com, pelo menos, uma página sobre literatura e cultura, onde grandes intelectuais ou mesmo jovens aspirantes a atividade literária de Teresina, como foi o meu caso, assinavam, aos domingos, bons artigos ou pequenos ensaios. Quando o jornal não dispunha de uma página cultural, não deixavam de publicavam artigos sobre literatura ou outros assuntos relacionados à cultura. E aí valia tudo, crônica, contos, poesia, resenhas, tradução, noticiário acadêmico, como fizeram os jornais Estado do Piauí( de Josípio Lustosa) Jornal do Piauí, O Dia (do tempo de Mundico Santilo) entre outros. Foi uma época fértil para quem escrevia sobre literatura e cultura em geral. Tudo isso acabou praticamente. Hoje desconheço algum jornal do Piauí que tenha pelo menos uma página toda destinada a agasalhar matéria literária.
Um outro dado importante: não havia restrição a artigos grandes, que tirassem o espaço do jornal reservado à publicidade ou a outros itens mais lucrativos. Pessoalmente, não vejo que um jornal atento possa descuidar desse tema como meta a ser implementada pelos seus proprietários e diretores. Ainda que seja, em proporções pequenas, o espaço cultural-literário não vai trazer prejuízos aos donos dos jornais. É claro que as matérias dos autores, sendo remuneradas, irá atrair bons colunistas, críticos, resenhistas e intelectuais do meio jornalístico ou acadêmico. Tenho certeza de que os leitores cultos e o público médio em geral irão receber bem esse novo espaço jornalístico.
Por sua circulação em larga escala, ou seja penetrando em todo estado do Piauí, os jornais ainda têm a vantagem e a celeridade de serem um veículo de acesso direto ao leitor, sem falar na sua inegável força de divulgação de livros, de autores e do que está acontecendo no meio cultural de um estado. Valeria a pena tentar um empreendimento desses. Torço para que isso ainda possa motivar algum empresário do setor jornalístico que saiba valorizar o papel da literatura e da cultura em geral como fator de progresso da minha terra.
sábado, 15 de maio de 2010
Fernando Pessoa: "Sonnet XXXII"
Sonnet XXXII
WHEN I HAVE sense of what to sense appears,
Sense is sense ere ‘tis mine or mine in me is.
When I hear, Hearing, ere I do hear, hears,
When I see, before me abstract Seeing sees.
I am part Soul part I in all I touch –
Soul by that part I hold in common with all,
And I the spoiled part, that doth make sense such
As I can err by it and my sense mine call.
The rest is wondering what these thoughts may mean,
That come to explain and suddenly are gone,
Like messengers that mock the message’ mien,
Explaining all but explanation;
As if we a ciphered letter’s cipher hit
And find it in an unknown language writ.
Soneto XXXII
QUANDO PERCEBO o sentido do que sentido pareça sê-lo
Antes que seja meu e em mim se encontre, o sentido é o sentido.
Antes de mim quando vejo, vê a Visão abstrata..
Em parte Alma sou, em parte Subjetividade em tudo que toco –
Naquilo que partilho com todos, em parte Alma,
A Subjetividade enferma a parte faz, sim, sentido de tal sorte.
Que por ela erre e afirmar possa o meu sentido ser.
Não passa o resto de indagações sobre o sentido dos pensamentos,
Que para explicarem surgem e, de repente, se afastam,
Tal qual mensageiros que das aparências do conteúdo escarnecem
Tudo explicando menos a explicação em si.
Como se de uma carta cifrada na decifração penetrássemos
E em estranha língua escrita a encontrássemos.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
WHEN I HAVE sense of what to sense appears,
Sense is sense ere ‘tis mine or mine in me is.
When I hear, Hearing, ere I do hear, hears,
When I see, before me abstract Seeing sees.
I am part Soul part I in all I touch –
Soul by that part I hold in common with all,
And I the spoiled part, that doth make sense such
As I can err by it and my sense mine call.
The rest is wondering what these thoughts may mean,
That come to explain and suddenly are gone,
Like messengers that mock the message’ mien,
Explaining all but explanation;
As if we a ciphered letter’s cipher hit
And find it in an unknown language writ.
Soneto XXXII
QUANDO PERCEBO o sentido do que sentido pareça sê-lo
Antes que seja meu e em mim se encontre, o sentido é o sentido.
Antes de mim quando vejo, vê a Visão abstrata..
Em parte Alma sou, em parte Subjetividade em tudo que toco –
Naquilo que partilho com todos, em parte Alma,
A Subjetividade enferma a parte faz, sim, sentido de tal sorte.
Que por ela erre e afirmar possa o meu sentido ser.
Não passa o resto de indagações sobre o sentido dos pensamentos,
Que para explicarem surgem e, de repente, se afastam,
Tal qual mensageiros que das aparências do conteúdo escarnecem
Tudo explicando menos a explicação em si.
Como se de uma carta cifrada na decifração penetrássemos
E em estranha língua escrita a encontrássemos.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
sexta-feira, 14 de maio de 2010
O mundo está entupido de livros
O mundo está entupido de livros
Cunha e Silva Filho
Estou amedrontado. Ao contrário do que proclamava Castro Alves(1847-1871) com o seu desejo de semeadura de “livros às mancheias”, diria melhor que diminuíssemos o ritmo vertiginoso de tantos livros. Que fizéssemos uma moratória: “A partir de tal dia, no mundo inteiro, não se vai publicar um só livro, ainda que seja uma obra-prima.”
Demos uma trégua, demos um tempo para podermos respirar. Livros, livros, livros, amontoando-se uns sobre os outros, numa vertigem hitcockiana, num rodopio frenético, imagem de mil tentáculos tentando agarrar-nos à força, ou implorar-nos que os leiamos a fórceps, Livros de todas as qualidades e ao mesmo tempo de mínimas qualidades, em todas as áreas, em todos os gêneros, em quase todas as línguas conhecidas, no original, traduzidas, ou pouco conhecidas,de todos os tipos e para todos os gostos, todas as fantasias, todos os caprichos, para todas as idades. Pouco importa: livros, livros, livros a não acabar mais. E, ante tudo isso, me vejo sobressaltado: onde estão os leitores? Onde o dinheiro pra comprá-los, ou para publicá-los, ou para vendê-los, ou as pessoas para doá-los já que é tão difícil administrar tudo isso?
Me lembro de que há pouco tempo, numa entrevista repetida depois de seu falecimento, o jornalista e respeitado cronista esportivo Armando Nogueira, em auto-ironia, afirmava que tinha escrito dez livros, mas se definia como um “campeão de encalhe”.
Não é uma brincadeira minha, mas o mundo está saturado de livros. Vejam-se os sebos virtuais nos quais os livros se contam já em milhões. Quem irá ler todo esse mega-acervo? A humanidade está mesmo afundada em livros: velhos, novos, baratos, caros, caríssimos, livros raros, livros de artes, incunábulos. O homem contemporâneo tem uma batalha a vencer; a de formular estratégias daquilo que pode ler ou de quanto pode ler, que é uma questão complicadíssima.
Como atravessar a vida curta com tantos livros interessantes que não poderiam deixar de ler? Talvez o computador nos ajudasse nessa tarefa de opções certas e imperdíveis. E não estamos falando ainda dos e-books, que já começam a se propagar no mundo editorial, já ganhando aficionados.. A verdade é que a quantidade incalculável de livros está aí dando mais trabalho a nós contemporâneos.
Os e-books terão uma função imprescindível no futuro: eles resolverão o problema do espaço do livro escrito., de vez que as bibliotecas no futuro não darão vazão aos milhões de livros impressos, ocupando gigantescos espaços em todo o mundo, ainda que bibliotecas sejam geograficamente bem distribuídas entre os continentes. E tomem-se lançamentos. Qual é a sua profissão? Escritor - palavra que ecoa em milhares de bocas alegres ou tristes, a depender de serem sucessos ou fracassos de vendas. Os Estados Unidos me dão a impressão de que qualquer fato ou acontecimento que chamem a atenção da mídia pode dar motivo para a publicação de um livro. Tudo é razão para “vou contar minha história. ”E haja biografias! Onde estão os leitores?
Além dos livros, ainda contamos com um outro espaço, o virtual, distribuído em milhares de blogs, sites, portais espalhados pelos quatro cantos do Planeta, todos pensando que serão lidos e comentados. E por falar em comentários, que é uma seção levada em alta consideração na estrutura dos blogs ou sites, a experiência tem mostrado o quanto vazios em geral permanecem, levando os pobres blogueiros a pensarem mal de seus próprios escritos. Ou a pensarem, como lembrou um escritor, que na verdade só escrevemos nos blogs para nós mesmos.
Por que não eliminar do formato dos blogs esses pequenos espaços para comentários? Claro que são uma espécie de termômetro que medem o nível de interesse de supostos leitores. A invenção deles é bem provável que veio da terra do Tio Sam – país tão chegado às estatísticas, às pesquisas, aos feedbacks.
Ainda prefiro que os blogs sejam como jornais que, obrigatoriamente, não incluem, ao final das colunas, um espaço para os comentários. Os leitores simplesmente leem , gostam ou não gostam e até podem, na seção “Carta do leitor”, incensar ou desancar o articulista da coluna, sendo que, no segundo caso, podem ainda usar de uma réplica, caso sejam ofendidos pelo eventual leitor.
Nada, contudo, podemos fazer para sustar por um período a avalanche de livros que semanalmente são lançados no mercado, para a alegria efêmera de seus autores ou para o estrondoso sucesso de outros autores. Não podemos também deixar escapar o nosso desapontamento que, de resto, pode ser de muita gente que escreve, que é o de sentir-se impotente de não poder jamais ler todos os livros da nossa escolha, todos os autores de que gostamos, nos vários gêneros literários ou em outras áreas do conhecimento humano. Mesmo que iniciássemos a leitura em mui tenra idade, ser-nos-ia impraticável fruir o prazer da leitura dos melhores livros do mundo.
Enquanto isso, pelo mundo afora, os livros estão saindo dos prelos, invadindo as livrarias e aguardando que um leitor os descubra ou os deixe entregues ao esquecimento – destino que nenhum livro, por pior que seja, merece ter. Ó impiedoso leitor, contraditório em tantas coisas e mais ainda nas opções de leituras, tende piedade dos autores.
Cunha e Silva Filho
Estou amedrontado. Ao contrário do que proclamava Castro Alves(1847-1871) com o seu desejo de semeadura de “livros às mancheias”, diria melhor que diminuíssemos o ritmo vertiginoso de tantos livros. Que fizéssemos uma moratória: “A partir de tal dia, no mundo inteiro, não se vai publicar um só livro, ainda que seja uma obra-prima.”
Demos uma trégua, demos um tempo para podermos respirar. Livros, livros, livros, amontoando-se uns sobre os outros, numa vertigem hitcockiana, num rodopio frenético, imagem de mil tentáculos tentando agarrar-nos à força, ou implorar-nos que os leiamos a fórceps, Livros de todas as qualidades e ao mesmo tempo de mínimas qualidades, em todas as áreas, em todos os gêneros, em quase todas as línguas conhecidas, no original, traduzidas, ou pouco conhecidas,de todos os tipos e para todos os gostos, todas as fantasias, todos os caprichos, para todas as idades. Pouco importa: livros, livros, livros a não acabar mais. E, ante tudo isso, me vejo sobressaltado: onde estão os leitores? Onde o dinheiro pra comprá-los, ou para publicá-los, ou para vendê-los, ou as pessoas para doá-los já que é tão difícil administrar tudo isso?
Me lembro de que há pouco tempo, numa entrevista repetida depois de seu falecimento, o jornalista e respeitado cronista esportivo Armando Nogueira, em auto-ironia, afirmava que tinha escrito dez livros, mas se definia como um “campeão de encalhe”.
Não é uma brincadeira minha, mas o mundo está saturado de livros. Vejam-se os sebos virtuais nos quais os livros se contam já em milhões. Quem irá ler todo esse mega-acervo? A humanidade está mesmo afundada em livros: velhos, novos, baratos, caros, caríssimos, livros raros, livros de artes, incunábulos. O homem contemporâneo tem uma batalha a vencer; a de formular estratégias daquilo que pode ler ou de quanto pode ler, que é uma questão complicadíssima.
Como atravessar a vida curta com tantos livros interessantes que não poderiam deixar de ler? Talvez o computador nos ajudasse nessa tarefa de opções certas e imperdíveis. E não estamos falando ainda dos e-books, que já começam a se propagar no mundo editorial, já ganhando aficionados.. A verdade é que a quantidade incalculável de livros está aí dando mais trabalho a nós contemporâneos.
Os e-books terão uma função imprescindível no futuro: eles resolverão o problema do espaço do livro escrito., de vez que as bibliotecas no futuro não darão vazão aos milhões de livros impressos, ocupando gigantescos espaços em todo o mundo, ainda que bibliotecas sejam geograficamente bem distribuídas entre os continentes. E tomem-se lançamentos. Qual é a sua profissão? Escritor - palavra que ecoa em milhares de bocas alegres ou tristes, a depender de serem sucessos ou fracassos de vendas. Os Estados Unidos me dão a impressão de que qualquer fato ou acontecimento que chamem a atenção da mídia pode dar motivo para a publicação de um livro. Tudo é razão para “vou contar minha história. ”E haja biografias! Onde estão os leitores?
Além dos livros, ainda contamos com um outro espaço, o virtual, distribuído em milhares de blogs, sites, portais espalhados pelos quatro cantos do Planeta, todos pensando que serão lidos e comentados. E por falar em comentários, que é uma seção levada em alta consideração na estrutura dos blogs ou sites, a experiência tem mostrado o quanto vazios em geral permanecem, levando os pobres blogueiros a pensarem mal de seus próprios escritos. Ou a pensarem, como lembrou um escritor, que na verdade só escrevemos nos blogs para nós mesmos.
Por que não eliminar do formato dos blogs esses pequenos espaços para comentários? Claro que são uma espécie de termômetro que medem o nível de interesse de supostos leitores. A invenção deles é bem provável que veio da terra do Tio Sam – país tão chegado às estatísticas, às pesquisas, aos feedbacks.
Ainda prefiro que os blogs sejam como jornais que, obrigatoriamente, não incluem, ao final das colunas, um espaço para os comentários. Os leitores simplesmente leem , gostam ou não gostam e até podem, na seção “Carta do leitor”, incensar ou desancar o articulista da coluna, sendo que, no segundo caso, podem ainda usar de uma réplica, caso sejam ofendidos pelo eventual leitor.
Nada, contudo, podemos fazer para sustar por um período a avalanche de livros que semanalmente são lançados no mercado, para a alegria efêmera de seus autores ou para o estrondoso sucesso de outros autores. Não podemos também deixar escapar o nosso desapontamento que, de resto, pode ser de muita gente que escreve, que é o de sentir-se impotente de não poder jamais ler todos os livros da nossa escolha, todos os autores de que gostamos, nos vários gêneros literários ou em outras áreas do conhecimento humano. Mesmo que iniciássemos a leitura em mui tenra idade, ser-nos-ia impraticável fruir o prazer da leitura dos melhores livros do mundo.
Enquanto isso, pelo mundo afora, os livros estão saindo dos prelos, invadindo as livrarias e aguardando que um leitor os descubra ou os deixe entregues ao esquecimento – destino que nenhum livro, por pior que seja, merece ter. Ó impiedoso leitor, contraditório em tantas coisas e mais ainda nas opções de leituras, tende piedade dos autores.
quarta-feira, 12 de maio de 2010
Spleen à romântica
Spleen à romântica
Cunha e Silva Filho
Acordei com uma sensação de viver à antiga, no Rio de Janeiro, talvez no século 19, desde a fase imperial de D. Pedro I, com suas estrepolias e aventureiras escapadas eróticas da mocidade até o reinado de seu pai, D. Pedro II. Mas viver não como um homem comum do povo, no meio de escravos e europeus ávidos do poder econômico, mas como enfadonho habitué de saraus só para satisfazer o bom tom da sociedade aburguesada, ou freqüentador assíduo de comédias farsescas de Martins Pena, tempo em que pontificava o ator João Caetano, ou de tragédias de Gonçalves de Magalhães, José de Alencar, Gonçalves Dias, Macedo, e ainda, de vez em quando, ler algum folhetim de Macedo, Alencar ou mesmo as aventuras pícaras de Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um sargento de milícias ( em folhetins de 1853).Sim, leitor, viver o romântico século do subjetivismo, sofrer do spleen, do “mal do século”, da tuberculose, dos namoros platônicos ou mesmo dos desejos dionisíacos, das orgias e da tavernas meio escuras e fantasmagóricas à Álvares de Azevedo.
Fui buscar no século retrasado uma forma de escape, um fuga, diria melhor, da náusea contemporânea que nos avassala a todos, principalmente aqueles que mal suportam o peso e o sacrifício das nossas desgraças em vários setores da sociedade, na política municipal, estadual, nacional e internacional. Não veem, leitor, as disputas na Inglaterra entre conservadores e trabalhistas tendo no meio deles os liberais-democratas. Ó redentora Terceira Via, que tendes entre vossos ideólogos o decadente Gordon Brown, aquele mesmo que destratou, pensado estar em off, uma velhinha com palavras descorteses para um Premier que foram para o ar em transmissão mundial. O filme, mudando a língua e excluindo a palavra final da rainha inglesa e alguns costumes, é praticamente o mesmo de um país como o nosso. São realidades iguais para cenários diferentes.
Leio o jornal, ligo a TV ou mesmo o computador e, no noticiários, o que vejo? A polícia de São Paulo espancando um inocente até ao desfalecimento, quando – que ironia diabólica – o levam a um hospital e lá chegando, os médicos declaram que o jovem inocente está morto. O espancamento foi em frente à casa do jovem, um motoby, diante da pobre e desamparada mãe que tudo viu, inclusive os gritos dele pedindo socorro.. E era o Dia das Mães.
O mais doloroso foi o depoimento dela à imprensa afirmando que nem mesmo podia, naquele momento de aflição e terror, chamar a polícia uma vez que a policia ali mesmo estava trucidando seu próprio filho querido. Poucos dias atrás, um outro jovem foi fuzilado por policiais e, segundo soube, foram policiais de um quartel próximo ao daquele a que pertenciam os policiais do segundo crime.Onde está a formação que se dá a esses incompetentes e brutais policiais que, pagos pelo Estado de São Paulo com o dinheiro do contribuinte, carregam armas no corpo para assassinarem jovens brasileiros inocentes? Não quero crer que estamos num país democrático, cujo líder-mor a míope imprensa estrangeira alça à estratosfera como exemplo da mais influente liderança mundial. Oh, imprensa estrangeira, como seus membros estão longe de conhecer nosso país e nossas misérias! O marketing falaz, que custa milhões aos cofres públicos, consegue torcer visões de um país diante do mundo basbaque. Afinal, a burrice não tem fronteiras.
Não vou me alongar desfiando meu rosário de lágrimas diante de tanta covardia, mistificação, tráfico de influência, corrupção deslavada, cumplicidade, parcialidade da Justiça, injustiça social, desgoverno em vários setores e sobretudo empulhação para pascácios ou fanáticos de um rei nu que o aulicismo da direita, da esquerda e do centro teima em dizer que está vestido. O rei nu, porém, continua rindo, na sua ginga malandra, sendo homenageado globalmente, a serviço do capital de dentro e de fora, da especulação interna e externa, a ponto de se oferecer – como se fosse um poderoso paxá ou marajá miliardário do Oriente afundado na galinha dos ovos de ouro – ajuda a um país que se endividou na ciranda da especulação cujas consequências nefandas se comportam como efeito dominó Europa afora. Os ricos ou pseudo-ricos se deliciam em se ajudarem mutuamente já que são interdependentes nas suas metas e nos seus gostos, nos seus luxos, paraísos e mordomias palacianas.Ora, que liderança é essa incensada por capadócios da imprensa mundial que, ao invés de, como se queixou com toda razão, um leitor da Folha de São Paulo, amenizar o sufoco dos salários aviltantes dos aposentados brasileiros do INSS, nababescamente se oferece – para salvar especuladores gregos, naturalmente os homens lá do poder econômico, enquanto a população da velha Grécia de Homero (séc. IX a. C.?) vai às ruas protestar contra o arrocho dos salários imposto a ferro e fogo contra ela. Antío sas, ò Hélade, berço da civilização e da filosofia!
Acordei mesmo com um spleen romântico em tempo de objetividade e ausência de alma.
Cunha e Silva Filho
Acordei com uma sensação de viver à antiga, no Rio de Janeiro, talvez no século 19, desde a fase imperial de D. Pedro I, com suas estrepolias e aventureiras escapadas eróticas da mocidade até o reinado de seu pai, D. Pedro II. Mas viver não como um homem comum do povo, no meio de escravos e europeus ávidos do poder econômico, mas como enfadonho habitué de saraus só para satisfazer o bom tom da sociedade aburguesada, ou freqüentador assíduo de comédias farsescas de Martins Pena, tempo em que pontificava o ator João Caetano, ou de tragédias de Gonçalves de Magalhães, José de Alencar, Gonçalves Dias, Macedo, e ainda, de vez em quando, ler algum folhetim de Macedo, Alencar ou mesmo as aventuras pícaras de Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um sargento de milícias ( em folhetins de 1853).Sim, leitor, viver o romântico século do subjetivismo, sofrer do spleen, do “mal do século”, da tuberculose, dos namoros platônicos ou mesmo dos desejos dionisíacos, das orgias e da tavernas meio escuras e fantasmagóricas à Álvares de Azevedo.
Fui buscar no século retrasado uma forma de escape, um fuga, diria melhor, da náusea contemporânea que nos avassala a todos, principalmente aqueles que mal suportam o peso e o sacrifício das nossas desgraças em vários setores da sociedade, na política municipal, estadual, nacional e internacional. Não veem, leitor, as disputas na Inglaterra entre conservadores e trabalhistas tendo no meio deles os liberais-democratas. Ó redentora Terceira Via, que tendes entre vossos ideólogos o decadente Gordon Brown, aquele mesmo que destratou, pensado estar em off, uma velhinha com palavras descorteses para um Premier que foram para o ar em transmissão mundial. O filme, mudando a língua e excluindo a palavra final da rainha inglesa e alguns costumes, é praticamente o mesmo de um país como o nosso. São realidades iguais para cenários diferentes.
Leio o jornal, ligo a TV ou mesmo o computador e, no noticiários, o que vejo? A polícia de São Paulo espancando um inocente até ao desfalecimento, quando – que ironia diabólica – o levam a um hospital e lá chegando, os médicos declaram que o jovem inocente está morto. O espancamento foi em frente à casa do jovem, um motoby, diante da pobre e desamparada mãe que tudo viu, inclusive os gritos dele pedindo socorro.. E era o Dia das Mães.
O mais doloroso foi o depoimento dela à imprensa afirmando que nem mesmo podia, naquele momento de aflição e terror, chamar a polícia uma vez que a policia ali mesmo estava trucidando seu próprio filho querido. Poucos dias atrás, um outro jovem foi fuzilado por policiais e, segundo soube, foram policiais de um quartel próximo ao daquele a que pertenciam os policiais do segundo crime.Onde está a formação que se dá a esses incompetentes e brutais policiais que, pagos pelo Estado de São Paulo com o dinheiro do contribuinte, carregam armas no corpo para assassinarem jovens brasileiros inocentes? Não quero crer que estamos num país democrático, cujo líder-mor a míope imprensa estrangeira alça à estratosfera como exemplo da mais influente liderança mundial. Oh, imprensa estrangeira, como seus membros estão longe de conhecer nosso país e nossas misérias! O marketing falaz, que custa milhões aos cofres públicos, consegue torcer visões de um país diante do mundo basbaque. Afinal, a burrice não tem fronteiras.
Não vou me alongar desfiando meu rosário de lágrimas diante de tanta covardia, mistificação, tráfico de influência, corrupção deslavada, cumplicidade, parcialidade da Justiça, injustiça social, desgoverno em vários setores e sobretudo empulhação para pascácios ou fanáticos de um rei nu que o aulicismo da direita, da esquerda e do centro teima em dizer que está vestido. O rei nu, porém, continua rindo, na sua ginga malandra, sendo homenageado globalmente, a serviço do capital de dentro e de fora, da especulação interna e externa, a ponto de se oferecer – como se fosse um poderoso paxá ou marajá miliardário do Oriente afundado na galinha dos ovos de ouro – ajuda a um país que se endividou na ciranda da especulação cujas consequências nefandas se comportam como efeito dominó Europa afora. Os ricos ou pseudo-ricos se deliciam em se ajudarem mutuamente já que são interdependentes nas suas metas e nos seus gostos, nos seus luxos, paraísos e mordomias palacianas.Ora, que liderança é essa incensada por capadócios da imprensa mundial que, ao invés de, como se queixou com toda razão, um leitor da Folha de São Paulo, amenizar o sufoco dos salários aviltantes dos aposentados brasileiros do INSS, nababescamente se oferece – para salvar especuladores gregos, naturalmente os homens lá do poder econômico, enquanto a população da velha Grécia de Homero (séc. IX a. C.?) vai às ruas protestar contra o arrocho dos salários imposto a ferro e fogo contra ela. Antío sas, ò Hélade, berço da civilização e da filosofia!
Acordei mesmo com um spleen romântico em tempo de objetividade e ausência de alma.
domingo, 9 de maio de 2010
Fernando Pessoa: "Sonnet XXXI"
Sonnet XXXI
I AM OLDER than Nature and her Time
By all the timeless age of Consciousness,
And my adult oblivion of the clime
Where I was born makes me not countries.
Ay, and dim thought my daylight thoughts escape
Yearnings for that land where my childhood dreamed,
Which I cannot recall in colour or shape
But haunts my hours like something that hath gleamed
And yet is not as light remembered,
Nor to the left or to the right conceived;
And all round me tastes as if life were dead
And the world made but to be disbelieved.
Thus I my hope on unknown truth lay; yet
How but by hope do I the unknown truth get?
Soneto XXXI
SOU MAIS VELHO do que o Tempo e a Natureza
A despeito da idade intemporal da Consciência
Do lugar meu esquecimento adulto
Não me torna do meu nascimento um desterrado
Sim, à luz do dia em mim refogem vagos pensamentos
Saudades dos sonhos infantis daquela terra,
Cujas cores e formas recordar é impossível
Porém, qual brilho extinto as horas me assombram
A se esfumar na escuridão
Numa configuração sem rumo;
A sensação de estar morto o meu ser invadindo
Apenas para a descrença se fez o mundo
Desse modo, numa verdade ignota minha esperança pus;
De que forma a essa verdade chegar posso pela esperança?
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
I AM OLDER than Nature and her Time
By all the timeless age of Consciousness,
And my adult oblivion of the clime
Where I was born makes me not countries.
Ay, and dim thought my daylight thoughts escape
Yearnings for that land where my childhood dreamed,
Which I cannot recall in colour or shape
But haunts my hours like something that hath gleamed
And yet is not as light remembered,
Nor to the left or to the right conceived;
And all round me tastes as if life were dead
And the world made but to be disbelieved.
Thus I my hope on unknown truth lay; yet
How but by hope do I the unknown truth get?
Soneto XXXI
SOU MAIS VELHO do que o Tempo e a Natureza
A despeito da idade intemporal da Consciência
Do lugar meu esquecimento adulto
Não me torna do meu nascimento um desterrado
Sim, à luz do dia em mim refogem vagos pensamentos
Saudades dos sonhos infantis daquela terra,
Cujas cores e formas recordar é impossível
Porém, qual brilho extinto as horas me assombram
A se esfumar na escuridão
Numa configuração sem rumo;
A sensação de estar morto o meu ser invadindo
Apenas para a descrença se fez o mundo
Desse modo, numa verdade ignota minha esperança pus;
De que forma a essa verdade chegar posso pela esperança?
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
sábado, 8 de maio de 2010
"Presença": uma publicação grandiosa
“Presença”: uma publicação grandiosa
Cunha e Silva Filho
Muita gente ainda torce o nariz para publicações oficiais não sabendo que, assim agindo, comete um erro palmar. Se o Estado custeia, no plano cultural, revistas ou mesmo livros, não me parece haver mal algum nessa iniciativa. Tampouco vejo como uma ação paternalista de um órgão público se este escolhe pessoas certas e capazes para cuidarem de uma publicação, a exemplo da já consagrada revista Presença há anos editada pelo Conselho Estadual de Cultura do Piauí. Dela guardo um grande número de edições que preservo como uma coleção fundamental, um inegável patrimônio de importantes estudos por ela enfeixados ao longo de toda a sua produção. A revista tornou-se, por isso, uma inestimável fonte de pesquisa sobre a história cultural piauiense nos seus vários setores de pesquisa, não só erudita mas de natureza popular.
Desde a sua estreia já dava sinais de que chegaria para ficar, ao contrário de tantas revistas culturais brasileiras que geralmente tiveram existência efêmera. Presença tem resistido ao tempo e alcançado o seu mais recente número, a sua 43ª edição, além de dar demonstração insofismável de seu efervescente espírito catalisador e de ser expressivo instrumento de divulgação não só da história cultural piauiense mas também por nunca esquecer o fato de que o regional faz parte do nacional e, nessa diversidade, consegue integrar-se harmoniosamente como unidade especificamente brasileira.A revista constitui um verdadeiro fórum de discussões de temática piauiense no mais elevado padrão ético-cultural-literário. Por esse motivo, ela se diferencia de outras congêneres e daí também sua duração.
Grande parte do extraordinário sucesso da Presença, cujos lançamentos de edições já se tornaram um evento em Teresina, mobilizando imprensa e leitores, deve-se ao trabalho incansável e fecundo do presidente do Conselho Estadual do Piauí, o professor e escritor M. Paulo Nunes. Creio que a pessoa desse escritor se confunde mesmo com parte significativa da feliz história dessa revista. Do editorial à revisão, a par da constante e operosa contribuição dele próprio à revista, M Paulo Nunes já deixou nas suas páginas uma marca inconfundível e duradoura. Presença, essencialmente, é uma publicação literária na mais rigorosa acepção do termo.
Dessa maneira, se explica sem muita dificuldade o quanto a revista deve ao esforço e ao critério do presidente do Conselho Estadual de Cultura, quer na escolha de sua equipe, quer na crescente qualidade de um número para outro, quer na supervisão de outros itens envolvidos na publicação: impressão, capa, cores, disposição gráfica, revisão, ilustrações e suporte jornalístico, tudo realizado com dedicação, esmero e beleza.
Li, de ponta a ponta, o nº 43, que está estupendo. Abrangente, como de costume, na escolha das matérias selecionadas, neste número apresenta dois temas centrais, o primeiro, uma homenagem ao centenário da morte de Euclides da Cunha, incluindo contribuições sobre a vida e a obra do grande escritor fluminense, a cargo da Redação da revista, uma visada geral do valor literário, jornalístico, histórico, sociológico e científico de Os sertões, em breve ensaio assinado pelo ficcionista Oton Lustosa, num desdobramento de sua participação em mesa redonda realizada, em agosto do ano passado, pela Academia Piauiense de Letras durante uma exposição da vida e obra do homenageado e um estudo vigoroso e atualizado do historiador Dagoberto Carvalho Jr. de título “Euclides da Cunha: Inflexões sociológicas do realismo literário brasileiro.” Neste estudo, só senti a falta de uma referência à obra de Clóvis Moura, Introdução ao pensamento de Euclides da Cunha (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964).
O segundo tema refere-se a duas matérias que valorizam a cidade de Amarante, sobretudo seu patrimônio arquitetônico e cultural. A primeira, “Cultura, Memória e Identidade da Cidade de Amarante”, feita a quatro mãos, tem um sentido de reivindicação para que essa cidade seja incluída entre outras que foram contempladas com o programa PAC instituído pelo governo federal com o objetivo de desenvolver ações de revitalização, recuperação e preservação do patrimônio arquitetônico-paisagístico de cidades históricas brasileiras. Amarante, incompreensivelmente, ficou de fora. O segundo artigo, assinado por Natacha Maranhão, tem cunho mais jornalístico e, portanto, fala de Amarante, sob um foco mais pessoal, mostra a cidade nos seus aspectos econômico, histórico, literário e sociológico, mencionando vultos intelectuais mais conhecidos da cidade e ainda traz um fac-símile de uma carta do presidente Juscelino Kubitscheck ao prefeito de Amarante Simão de Moura Fé, com data de 1961.
O número da revista ainda insere um comovente poema em quadras, em homenagem a Teresina, “Cidade Verde” da autoria de Hardi Filho, belo poema no qual as qualidades sonoras e rítmicas do poeta são novamente confirmadas. Não conheço poema melhor de exaltação a Teresina., verdadeeiro hino de amor à capital piauiense.
A revista se completa com uma resenha enxuta, de Enéas Athanázio sobre recém-publicado livro de crônicas de Jorge Amado, Hora da Guerra;um breve estudo-técnico sobre a arte rupestre; um conto de um autor que não conhecia, Pedro da Silva Ribeiro; um breve, claro e elucidativo artigo histórico, acompanhado de fac-símiles de documentos, de Jesualdo Cavalcanti Barros, de título “Fundação da Vila de São João da Parnaíba”; um texto de alto valor para as artes plásticas piauienses que aborda, em resumo, alguns ângulos da vida e obra do artista Genes Celeste Soares, falecido prematuramente e, por final, um cartum de Jota A no qual o talento do artista, entre a ironia e a destreza do traço, vergasta os inimigos das florestas brasileiras – tema sempre bem-vindo enquanto houver irresponsáveis e criminosos no maltratado meio ambiente brasileiro.
Cunha e Silva Filho
Muita gente ainda torce o nariz para publicações oficiais não sabendo que, assim agindo, comete um erro palmar. Se o Estado custeia, no plano cultural, revistas ou mesmo livros, não me parece haver mal algum nessa iniciativa. Tampouco vejo como uma ação paternalista de um órgão público se este escolhe pessoas certas e capazes para cuidarem de uma publicação, a exemplo da já consagrada revista Presença há anos editada pelo Conselho Estadual de Cultura do Piauí. Dela guardo um grande número de edições que preservo como uma coleção fundamental, um inegável patrimônio de importantes estudos por ela enfeixados ao longo de toda a sua produção. A revista tornou-se, por isso, uma inestimável fonte de pesquisa sobre a história cultural piauiense nos seus vários setores de pesquisa, não só erudita mas de natureza popular.
Desde a sua estreia já dava sinais de que chegaria para ficar, ao contrário de tantas revistas culturais brasileiras que geralmente tiveram existência efêmera. Presença tem resistido ao tempo e alcançado o seu mais recente número, a sua 43ª edição, além de dar demonstração insofismável de seu efervescente espírito catalisador e de ser expressivo instrumento de divulgação não só da história cultural piauiense mas também por nunca esquecer o fato de que o regional faz parte do nacional e, nessa diversidade, consegue integrar-se harmoniosamente como unidade especificamente brasileira.A revista constitui um verdadeiro fórum de discussões de temática piauiense no mais elevado padrão ético-cultural-literário. Por esse motivo, ela se diferencia de outras congêneres e daí também sua duração.
Grande parte do extraordinário sucesso da Presença, cujos lançamentos de edições já se tornaram um evento em Teresina, mobilizando imprensa e leitores, deve-se ao trabalho incansável e fecundo do presidente do Conselho Estadual do Piauí, o professor e escritor M. Paulo Nunes. Creio que a pessoa desse escritor se confunde mesmo com parte significativa da feliz história dessa revista. Do editorial à revisão, a par da constante e operosa contribuição dele próprio à revista, M Paulo Nunes já deixou nas suas páginas uma marca inconfundível e duradoura. Presença, essencialmente, é uma publicação literária na mais rigorosa acepção do termo.
Dessa maneira, se explica sem muita dificuldade o quanto a revista deve ao esforço e ao critério do presidente do Conselho Estadual de Cultura, quer na escolha de sua equipe, quer na crescente qualidade de um número para outro, quer na supervisão de outros itens envolvidos na publicação: impressão, capa, cores, disposição gráfica, revisão, ilustrações e suporte jornalístico, tudo realizado com dedicação, esmero e beleza.
Li, de ponta a ponta, o nº 43, que está estupendo. Abrangente, como de costume, na escolha das matérias selecionadas, neste número apresenta dois temas centrais, o primeiro, uma homenagem ao centenário da morte de Euclides da Cunha, incluindo contribuições sobre a vida e a obra do grande escritor fluminense, a cargo da Redação da revista, uma visada geral do valor literário, jornalístico, histórico, sociológico e científico de Os sertões, em breve ensaio assinado pelo ficcionista Oton Lustosa, num desdobramento de sua participação em mesa redonda realizada, em agosto do ano passado, pela Academia Piauiense de Letras durante uma exposição da vida e obra do homenageado e um estudo vigoroso e atualizado do historiador Dagoberto Carvalho Jr. de título “Euclides da Cunha: Inflexões sociológicas do realismo literário brasileiro.” Neste estudo, só senti a falta de uma referência à obra de Clóvis Moura, Introdução ao pensamento de Euclides da Cunha (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964).
O segundo tema refere-se a duas matérias que valorizam a cidade de Amarante, sobretudo seu patrimônio arquitetônico e cultural. A primeira, “Cultura, Memória e Identidade da Cidade de Amarante”, feita a quatro mãos, tem um sentido de reivindicação para que essa cidade seja incluída entre outras que foram contempladas com o programa PAC instituído pelo governo federal com o objetivo de desenvolver ações de revitalização, recuperação e preservação do patrimônio arquitetônico-paisagístico de cidades históricas brasileiras. Amarante, incompreensivelmente, ficou de fora. O segundo artigo, assinado por Natacha Maranhão, tem cunho mais jornalístico e, portanto, fala de Amarante, sob um foco mais pessoal, mostra a cidade nos seus aspectos econômico, histórico, literário e sociológico, mencionando vultos intelectuais mais conhecidos da cidade e ainda traz um fac-símile de uma carta do presidente Juscelino Kubitscheck ao prefeito de Amarante Simão de Moura Fé, com data de 1961.
O número da revista ainda insere um comovente poema em quadras, em homenagem a Teresina, “Cidade Verde” da autoria de Hardi Filho, belo poema no qual as qualidades sonoras e rítmicas do poeta são novamente confirmadas. Não conheço poema melhor de exaltação a Teresina., verdadeeiro hino de amor à capital piauiense.
A revista se completa com uma resenha enxuta, de Enéas Athanázio sobre recém-publicado livro de crônicas de Jorge Amado, Hora da Guerra;um breve estudo-técnico sobre a arte rupestre; um conto de um autor que não conhecia, Pedro da Silva Ribeiro; um breve, claro e elucidativo artigo histórico, acompanhado de fac-símiles de documentos, de Jesualdo Cavalcanti Barros, de título “Fundação da Vila de São João da Parnaíba”; um texto de alto valor para as artes plásticas piauienses que aborda, em resumo, alguns ângulos da vida e obra do artista Genes Celeste Soares, falecido prematuramente e, por final, um cartum de Jota A no qual o talento do artista, entre a ironia e a destreza do traço, vergasta os inimigos das florestas brasileiras – tema sempre bem-vindo enquanto houver irresponsáveis e criminosos no maltratado meio ambiente brasileiro.
quarta-feira, 5 de maio de 2010
Quem tem medo de ser político?
Quem tem medo de ser político?
Cunha e Silva Filho
Neste ano de campanha política para a eleição de presidente da República, de governadores e parte de senadores, fico a me perguntar se a política é mesmo vocação ou só vontade de possuir poder e receber os salários melhores do mundo como costuma dizer Villas-Bôas Corrêa, veterano e brilhante jornalista do Jornal do Brasil. Sem sombra de dúvida, as duas coisas Só que, entre uma e outra, paira no ar uma miríade de contradições e ambiguidades.
Costuma-se falar mal dos políticos de carreira, aqueles que, uma vez ingressando nesta seara, não mais querem dela se afastar. Ao contrário, nelas amadurecem, envelhecem e morrem. Deles há que, depois de um ou dois mandatos, desistem das mordomias por um ou outro motivo de foro íntimo ou porque, tendo pleiteado mais um mandato, não se reelegeu e, então saem de campo.
Quanto aos candidatos jovens, é corrente a opinião de eleitores que declaram publicamente, ou só a boca pequena, serem aqueles os mais indicados para moralizarem as câmaras municipais, as assembleias estaduais, a câmara federal, o senado e até a presidência da República.
Entretanto, guardadas as clássicas exceções da regra, políticos jovens não têm dado também bom exemplo quando estão no poder.
A verdade é que no país estamos órfãos de bons e competentes políticos que possam restaurar o ethos do passado.
Reconheço que o mundo de hoje é outro e muito mais complexo em todas as esferas da atividade humana. Contudo, há ainda amplo espaço a ser preenchido por vocações genuínas de políticos que façam de suas funções uma meio para aperfeiçoar a sociedade brasileira. Não é uma fantasia ou utopia minha. Indivíduos há talhados para assumirem mandatos políticos que tenham como pressuposto fundamental realizar mudanças profundas e duradouras na vida política da Nação. O que lhes falta é disposição e ânimo para saírem de seus casulos, de sua subjetividade sadia, de sua comodidade e tentar sem medo a carreira política e dela fazer um objetivo de vida: o bem público, o bem do país, a felicidade de um povo.
Temos, sem dúvida, grandes “reservas morais,” como eram chamados outrora os homens íntegros, que tanto poderiam fazer em prol de um Brasil melhor e mais transparente e tão distantes ficariam dos mascarados democratas do presente.
Enquanto houver, na arena política, esse excesso de partidos que só confundem mais ainda as camadas ignorantes de nossa população, o país só estará marcando passo, i.e., não sairá do imbróglio no qual está afundado e emaranhado.
As correntes político-ideológicas principais, a da esquerda e a da direita, agora se misturaram às escâncaras, sem cerimônia –às chamadas composições, alianças, coligações, concessões mútuas, num vale-tudo que qualquer brasileiro medianamente instruído está cansado de saber e de saber a que lugar geralmente chegam. O eleitor já não sabe o que seja esse melting pot incolor e polifônico.
Na realidade, as plataformas políticas, os programas partidários, as metas que deverão ser implementadas não passam em geral de retórica vazia e malsã para engodo dos humilhados e incautos, assim como – e por que não? – dos analfabetos funcionais, semi-analfabetos e analfabetos absolutos, massas de manobras que há décadas vêm sendo currais eleitorais que docilmente são iscas da mídia comprometida com o poder, aliada à fanfarronice dos meios eletrônicos, do marketing político, da execrável e inócua “propaganda obrigatória”, ainda com ranços ditatoriais, verdadeira pantomima que aos eleitores- telespectadores empurram goela abaixo. Esse lado trágico-histriônico da nossa vida política é, sim, um prato cheio para os estudos de análise do discurso dos linguistas e hermeneutas.
A grande questão que se levanta é a seguinte: por que atualmente não surgiram vereadores, parlamentares e congressistas do porte de antigos e respeitados políticos brasileiros? Em épocas passadas, antes da sede do governo federal em Brasília, não havia as chamadas mordomias – verdadeira orgia pantaguélica custando os olhos da cara dos milhões de contribuintes. Quem lê os artigos do Villas- Bôa Corrêa sabe de quê e de quem estou falando.
A função política do passado era investida de alguns valores caros ao ser humano: capacidade intelectual, poder de oratória e dignidade pessoal. Mordomias? Nenhuma. Salários Só os compatíveis com o mandato.
O tema deste artigo, aqui apenas aflorado, constitui farta matéria para pesquisas nas áreas da Ciência Política, da Sociologia, do Direito, da Antropologia e sobretudo para uma urgente discussão, por parte da sociedade brasileira, da natureza da práxis da vida política na atualidade.
Diante do quadro escorregadio que agora está se delineando como os primeiros passos que antecedem o período legal da corrida aos novos mandatos, não deixo de me preocupar com a gangorra que se esta montando tal qual um pacto fáustico, onde pouco espaço existe para a contribuição inestimável do Bem contra o espaçoso Mal.
Cunha e Silva Filho
Neste ano de campanha política para a eleição de presidente da República, de governadores e parte de senadores, fico a me perguntar se a política é mesmo vocação ou só vontade de possuir poder e receber os salários melhores do mundo como costuma dizer Villas-Bôas Corrêa, veterano e brilhante jornalista do Jornal do Brasil. Sem sombra de dúvida, as duas coisas Só que, entre uma e outra, paira no ar uma miríade de contradições e ambiguidades.
Costuma-se falar mal dos políticos de carreira, aqueles que, uma vez ingressando nesta seara, não mais querem dela se afastar. Ao contrário, nelas amadurecem, envelhecem e morrem. Deles há que, depois de um ou dois mandatos, desistem das mordomias por um ou outro motivo de foro íntimo ou porque, tendo pleiteado mais um mandato, não se reelegeu e, então saem de campo.
Quanto aos candidatos jovens, é corrente a opinião de eleitores que declaram publicamente, ou só a boca pequena, serem aqueles os mais indicados para moralizarem as câmaras municipais, as assembleias estaduais, a câmara federal, o senado e até a presidência da República.
Entretanto, guardadas as clássicas exceções da regra, políticos jovens não têm dado também bom exemplo quando estão no poder.
A verdade é que no país estamos órfãos de bons e competentes políticos que possam restaurar o ethos do passado.
Reconheço que o mundo de hoje é outro e muito mais complexo em todas as esferas da atividade humana. Contudo, há ainda amplo espaço a ser preenchido por vocações genuínas de políticos que façam de suas funções uma meio para aperfeiçoar a sociedade brasileira. Não é uma fantasia ou utopia minha. Indivíduos há talhados para assumirem mandatos políticos que tenham como pressuposto fundamental realizar mudanças profundas e duradouras na vida política da Nação. O que lhes falta é disposição e ânimo para saírem de seus casulos, de sua subjetividade sadia, de sua comodidade e tentar sem medo a carreira política e dela fazer um objetivo de vida: o bem público, o bem do país, a felicidade de um povo.
Temos, sem dúvida, grandes “reservas morais,” como eram chamados outrora os homens íntegros, que tanto poderiam fazer em prol de um Brasil melhor e mais transparente e tão distantes ficariam dos mascarados democratas do presente.
Enquanto houver, na arena política, esse excesso de partidos que só confundem mais ainda as camadas ignorantes de nossa população, o país só estará marcando passo, i.e., não sairá do imbróglio no qual está afundado e emaranhado.
As correntes político-ideológicas principais, a da esquerda e a da direita, agora se misturaram às escâncaras, sem cerimônia –às chamadas composições, alianças, coligações, concessões mútuas, num vale-tudo que qualquer brasileiro medianamente instruído está cansado de saber e de saber a que lugar geralmente chegam. O eleitor já não sabe o que seja esse melting pot incolor e polifônico.
Na realidade, as plataformas políticas, os programas partidários, as metas que deverão ser implementadas não passam em geral de retórica vazia e malsã para engodo dos humilhados e incautos, assim como – e por que não? – dos analfabetos funcionais, semi-analfabetos e analfabetos absolutos, massas de manobras que há décadas vêm sendo currais eleitorais que docilmente são iscas da mídia comprometida com o poder, aliada à fanfarronice dos meios eletrônicos, do marketing político, da execrável e inócua “propaganda obrigatória”, ainda com ranços ditatoriais, verdadeira pantomima que aos eleitores- telespectadores empurram goela abaixo. Esse lado trágico-histriônico da nossa vida política é, sim, um prato cheio para os estudos de análise do discurso dos linguistas e hermeneutas.
A grande questão que se levanta é a seguinte: por que atualmente não surgiram vereadores, parlamentares e congressistas do porte de antigos e respeitados políticos brasileiros? Em épocas passadas, antes da sede do governo federal em Brasília, não havia as chamadas mordomias – verdadeira orgia pantaguélica custando os olhos da cara dos milhões de contribuintes. Quem lê os artigos do Villas- Bôa Corrêa sabe de quê e de quem estou falando.
A função política do passado era investida de alguns valores caros ao ser humano: capacidade intelectual, poder de oratória e dignidade pessoal. Mordomias? Nenhuma. Salários Só os compatíveis com o mandato.
O tema deste artigo, aqui apenas aflorado, constitui farta matéria para pesquisas nas áreas da Ciência Política, da Sociologia, do Direito, da Antropologia e sobretudo para uma urgente discussão, por parte da sociedade brasileira, da natureza da práxis da vida política na atualidade.
Diante do quadro escorregadio que agora está se delineando como os primeiros passos que antecedem o período legal da corrida aos novos mandatos, não deixo de me preocupar com a gangorra que se esta montando tal qual um pacto fáustico, onde pouco espaço existe para a contribuição inestimável do Bem contra o espaçoso Mal.
domingo, 2 de maio de 2010
Por que insistir em morar no exterior?
Por que insistir em viver no exterior?
Cunha e Silva Filho
Tirante diplomatas, políticos, altos funcionários de governos e gente abastada da sociedade (os milionários são bem-vindos e se parecem em toda a parte do mundo) no passado e principalmente na contemporaneidade, seja de que nacionalidade for, a condição dos imigrantes mais humildes apresenta-se sempre como um risco iminente.
O sonho de um Eldorado vitorioso no exterior, sobretudo em países como os Estados Unidos e a Inglaterra, bem explorados pela publicidade e pelo cinema, em particular, o americano, em geral, de grande penetração entre a juventude, transforma-se em irresistíveis e constantes apelos, principalmente para jovens da América latina, do México, que se encantam, primeiro, com a língua inglesa, idioma difundido mundialmente nesta faixa etária, com seus atores e atrizes, com seus filmes de amplos recursos técnicos, depois, com os padrões angloamericanos de cultura, de música, de alta tecnologia Desse modo, sonham em fazer sucesso no exterior, ganhar a vida, realizar, de certa forma, a sua meta existencial: arranjar um emprego, ainda que para fazer trabalhos mais pesados que um nativo não faria, aprender uma língua começando, muitas vezes, do zero, e morar no exterior em país mais adiantado e com uma moeda mais forte.
Tal foi o exemplo daquele jovem mineiro, Jean Charles de Menezes, que já estava empregado na Inglaterra e, uma vez, como fazia toda a semana, andando de metrô, em direção ao lugar de trabalho, foi assassinado por policiais confundido, segundo eles, com um terrorista. Paranóia infernal dos tempos planetários! Seus assassinos, até hoje, pelo que sei, não foram devidamente punidos. Até veio ao Brasil uma comissão da polícia inglesa pedir suas desculpas pelo ocorrido. Mas, só isso. Nem mesmo se indenizou a família pelo ato de irresponsabilidade e incompetência dos que o alvejaram
.São muitos os exemplos de brasileiros que decidem procurar uma vida melhor no exterior e, quando lá chegam, se arrependem. Sofrem, não conseguem nada e, se permanecerem como clandestinos, ainda pioram sua situação de imigrante, porque estarão sempre amedrontados com o fantasma do serviço de imigração que pode pilhá-los a qualquer hora e deportarem-nos para o Brasil.
Brasileiros sem qualificação para trabalhos de maior nível e de perspectiva de melhoria efetiva no exterior se iludem ao pensar que a ventura do sonho americano ou inglês dará certo. A realidade, entretanto, tem mostrado que não é assim. Pura ilusão, bobagem de jovens incautos que pensam serem tais países lugares que os irão acolher fraternalmente.
Mesmo aqueles que já têm dupla nacionalidade, quatro de cinco brasileiros músicos paranaenses que se encontram em Londres, podem ser vítimas de truculentas abordagens policiais.. Tal se deu com esses jovens brasileiros que, vindos de um culto evangélico, no dia 18 de março, foram arrastados, espancados covardemente por quatro policiais ingleses, levando tapas na cabeça, chutes e pisadas como se fossem cães danados. Foram algemados. Estavam num carro. Os policias os pararam pensando que se tratava de um grupo de traficantes procurados e que, segundo a Polícia, estavam num carro com as mesmas descrições daquele em que se encontravam os brasileiros. Conforme a reportagem do JB (01/05/10), os jovens já fizeram queixa-crime na Comissão Independente de Queixas contra a Polícia, um órgão que cuida de investigar abusos de policiais da Inglaterra. Um dos jovens, de nome Thiago Antonio Murador, levou choque elétrico e teve uma costela quebrada devido à violência com que agiram os policiais.
O fato mais grave disso tudo foi que, de acordo com a informações prestadas em entrevista ao JB pelo diretor da Casa do Brasil em Londres, Carlos Mellinger, os policiais armados – oh, como distantes estão dos antigos bobbies que nem usavam arma e gozavam de boa popularidade! – ainda continuaram sendo violentos e irascíveis mesmo após constatarem que os jovens eram inocentes.
Neste ponto, é hora de o governo brasileiro, através de sua embaixada em Londres, procurar as autoridades diplomáticas inglesas e delas exigir imediata punição dos culpados. Não é esse o comportamento que se espera de um policial responsável e competente. Para mim, não passam de bandidos travestidos de policiais, que devem sofrer real punição por parte dos órgãos oficiais de segurança inglesa. Além do mais, o fato só tende a desmoralizar ainda mais a imagem de um país que se diz civilizado e amante das leis. .Na realidade, o que se tem visto mais nos últimos anos e em várias partes do mundo é o mau exemplo de policias cometendo atos de truculência e mesmo homicídios, igualando-se, desta forma, aos chamados criminosos comuns. Os órgãos de repressão do Estado hoje pouco se diferem uns dos outros no tocante a barbaridades e covardias cometidas ao arrepio das leis. Mesmo porque, nos tempos modernos, a logística da repressão, quer dizer, armas, instrumentos de coação, tecnologias, para fins de enfrentamentos entre a polícia e a sociedade civil, são praticamente iguais de um país para outro. Para isso, estão aí os intercâmbios, os cursos de treinamento entre policias de países diversos. Tudo se uniformizou. Em tudo isso só muda a língua, mas a coreografia é a mesma, assim como as intenções se igualam nos seus fins e nos seus meios. Tempos difíceis, paranoicos, esse que vivemos, onde o inimigo, se não se encontra, se fabrica.
Cunha e Silva Filho
Tirante diplomatas, políticos, altos funcionários de governos e gente abastada da sociedade (os milionários são bem-vindos e se parecem em toda a parte do mundo) no passado e principalmente na contemporaneidade, seja de que nacionalidade for, a condição dos imigrantes mais humildes apresenta-se sempre como um risco iminente.
O sonho de um Eldorado vitorioso no exterior, sobretudo em países como os Estados Unidos e a Inglaterra, bem explorados pela publicidade e pelo cinema, em particular, o americano, em geral, de grande penetração entre a juventude, transforma-se em irresistíveis e constantes apelos, principalmente para jovens da América latina, do México, que se encantam, primeiro, com a língua inglesa, idioma difundido mundialmente nesta faixa etária, com seus atores e atrizes, com seus filmes de amplos recursos técnicos, depois, com os padrões angloamericanos de cultura, de música, de alta tecnologia Desse modo, sonham em fazer sucesso no exterior, ganhar a vida, realizar, de certa forma, a sua meta existencial: arranjar um emprego, ainda que para fazer trabalhos mais pesados que um nativo não faria, aprender uma língua começando, muitas vezes, do zero, e morar no exterior em país mais adiantado e com uma moeda mais forte.
Tal foi o exemplo daquele jovem mineiro, Jean Charles de Menezes, que já estava empregado na Inglaterra e, uma vez, como fazia toda a semana, andando de metrô, em direção ao lugar de trabalho, foi assassinado por policiais confundido, segundo eles, com um terrorista. Paranóia infernal dos tempos planetários! Seus assassinos, até hoje, pelo que sei, não foram devidamente punidos. Até veio ao Brasil uma comissão da polícia inglesa pedir suas desculpas pelo ocorrido. Mas, só isso. Nem mesmo se indenizou a família pelo ato de irresponsabilidade e incompetência dos que o alvejaram
.São muitos os exemplos de brasileiros que decidem procurar uma vida melhor no exterior e, quando lá chegam, se arrependem. Sofrem, não conseguem nada e, se permanecerem como clandestinos, ainda pioram sua situação de imigrante, porque estarão sempre amedrontados com o fantasma do serviço de imigração que pode pilhá-los a qualquer hora e deportarem-nos para o Brasil.
Brasileiros sem qualificação para trabalhos de maior nível e de perspectiva de melhoria efetiva no exterior se iludem ao pensar que a ventura do sonho americano ou inglês dará certo. A realidade, entretanto, tem mostrado que não é assim. Pura ilusão, bobagem de jovens incautos que pensam serem tais países lugares que os irão acolher fraternalmente.
Mesmo aqueles que já têm dupla nacionalidade, quatro de cinco brasileiros músicos paranaenses que se encontram em Londres, podem ser vítimas de truculentas abordagens policiais.. Tal se deu com esses jovens brasileiros que, vindos de um culto evangélico, no dia 18 de março, foram arrastados, espancados covardemente por quatro policiais ingleses, levando tapas na cabeça, chutes e pisadas como se fossem cães danados. Foram algemados. Estavam num carro. Os policias os pararam pensando que se tratava de um grupo de traficantes procurados e que, segundo a Polícia, estavam num carro com as mesmas descrições daquele em que se encontravam os brasileiros. Conforme a reportagem do JB (01/05/10), os jovens já fizeram queixa-crime na Comissão Independente de Queixas contra a Polícia, um órgão que cuida de investigar abusos de policiais da Inglaterra. Um dos jovens, de nome Thiago Antonio Murador, levou choque elétrico e teve uma costela quebrada devido à violência com que agiram os policiais.
O fato mais grave disso tudo foi que, de acordo com a informações prestadas em entrevista ao JB pelo diretor da Casa do Brasil em Londres, Carlos Mellinger, os policiais armados – oh, como distantes estão dos antigos bobbies que nem usavam arma e gozavam de boa popularidade! – ainda continuaram sendo violentos e irascíveis mesmo após constatarem que os jovens eram inocentes.
Neste ponto, é hora de o governo brasileiro, através de sua embaixada em Londres, procurar as autoridades diplomáticas inglesas e delas exigir imediata punição dos culpados. Não é esse o comportamento que se espera de um policial responsável e competente. Para mim, não passam de bandidos travestidos de policiais, que devem sofrer real punição por parte dos órgãos oficiais de segurança inglesa. Além do mais, o fato só tende a desmoralizar ainda mais a imagem de um país que se diz civilizado e amante das leis. .Na realidade, o que se tem visto mais nos últimos anos e em várias partes do mundo é o mau exemplo de policias cometendo atos de truculência e mesmo homicídios, igualando-se, desta forma, aos chamados criminosos comuns. Os órgãos de repressão do Estado hoje pouco se diferem uns dos outros no tocante a barbaridades e covardias cometidas ao arrepio das leis. Mesmo porque, nos tempos modernos, a logística da repressão, quer dizer, armas, instrumentos de coação, tecnologias, para fins de enfrentamentos entre a polícia e a sociedade civil, são praticamente iguais de um país para outro. Para isso, estão aí os intercâmbios, os cursos de treinamento entre policias de países diversos. Tudo se uniformizou. Em tudo isso só muda a língua, mas a coreografia é a mesma, assim como as intenções se igualam nos seus fins e nos seus meios. Tempos difíceis, paranoicos, esse que vivemos, onde o inimigo, se não se encontra, se fabrica.
Fernando Pessoa: "Sonnet XXX"
Fernando Pessoa: “Sonnet XXX”
Sonnet XXX
I DO NOT KNOW what truth the false untruth
Of this sad sense of the seen world may own,
Or if this flowered plant bears a fruit
Unto the true reality unknown.
But as the rainbow, neither earth’s nor sky’s,
Stands in the d ripping freshness of the lulled rain,
A hope, not real yet fancy’s, lies
Athwart the moment of our ceasing pain.
Some how, since pain is felt yet as ill,
Hope hath a better warrant than being hoped;
Since pain is felt us, aught we should not feel
Man hath a Nature’s reason for having groped,
Since Time was Time and age and grief his measures,
Towards a better shelter than Time’s pleasures.
Soneto XXX
EU NÃO SEI qual verdade a falsa inverdade
Do mundo visível possa ter deste sentido triste,
Ou se também um fruto carrega esta florida planta
Desta conhecida e genuína verdade.
Contudo, qual arco-íris, nem da terra, nem do céu,
Da tranquila chuva permanece no frescor gotejante,
Uma esperança nem ainda verdadeira nem imaginosa, acena
No instante de nossa dor final em dois sentidos.
De alguma forma, visto ser nociva a dor sentida,
Do que a espera é melhor garantia a esperança;
Por ser algo indesejável a doença sentida
Na Natureza por haver sondado uma razão possui o homem,
Sempre o Tempo o Tempo foi e suas medidas a dor e a idade,
Melhor é um refúgio do que do Tempo os prazeres.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
Sonnet XXX
I DO NOT KNOW what truth the false untruth
Of this sad sense of the seen world may own,
Or if this flowered plant bears a fruit
Unto the true reality unknown.
But as the rainbow, neither earth’s nor sky’s,
Stands in the d ripping freshness of the lulled rain,
A hope, not real yet fancy’s, lies
Athwart the moment of our ceasing pain.
Some how, since pain is felt yet as ill,
Hope hath a better warrant than being hoped;
Since pain is felt us, aught we should not feel
Man hath a Nature’s reason for having groped,
Since Time was Time and age and grief his measures,
Towards a better shelter than Time’s pleasures.
Soneto XXX
EU NÃO SEI qual verdade a falsa inverdade
Do mundo visível possa ter deste sentido triste,
Ou se também um fruto carrega esta florida planta
Desta conhecida e genuína verdade.
Contudo, qual arco-íris, nem da terra, nem do céu,
Da tranquila chuva permanece no frescor gotejante,
Uma esperança nem ainda verdadeira nem imaginosa, acena
No instante de nossa dor final em dois sentidos.
De alguma forma, visto ser nociva a dor sentida,
Do que a espera é melhor garantia a esperança;
Por ser algo indesejável a doença sentida
Na Natureza por haver sondado uma razão possui o homem,
Sempre o Tempo o Tempo foi e suas medidas a dor e a idade,
Melhor é um refúgio do que do Tempo os prazeres.
(Tradução de Cunha e Silva Filho)
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