Cunha e Silva Filho
Não resta dúvida de que, depois de
tantos reveses sofridos pelo país, com consequências
medularmente danosas a seu povo em todos os setores da vida nacional, nos
defrontamos com uma realidade política
tão vexatória em termos de ausência ética no universo nosso político que, diante
do olhar perplexo de
países mais civilizados e mais democráticos, só
podemos reconhecer que cada um
habitante aqui pouca coisa
de bom tenha a afirmar sobre o Brasil.
Todos atacam os males do país e em todos nós não existe a mais leve sensação de que as coisas melhorarão
entre nós.
O mais sombrio
a salientar é que esta falta de esperança de melhoria e bem-estar tem como nó górdio da infelicidade atual o surgimento do que se vem chamando ideologicamente de um
país dividido, inimizado em dois
flancos: a direita e a esquerda. Nem vou discutir neste artigo que tipo de direita ou de esquerda temos. Isso
não nos levaria a lugar algum porque direita e esquerda no
país são uma faca de muito gumes que mais parece um samba de crioulo doido.
Ou
seja, um deputado esquerdista é aquele
que vai a Nova Iorque para comprar
dispendiosos objetos de moda e,
ao retornar ao país, vai discutir a questão da pobreza e das minorias nos morros e nas periferias. É fácil dominar textos teóricos de autores da esquerda e, na prática, ter comportamento de elite econômica. E quanto temos políticos e
teóricos desse naipe!
Da mesma forma um político da direita só conversa com pobres quando em campanha eleitoral ou para engabelar secularmente os ignorantes que ainda vendem o seu voto
por migalhas. Esse comportamento de
nossos políticos, à direita ou à esquerda, é, no mínimo, desprezível, bifronte, leviano, falso e esquizofrênico. Não é esse um Brasil que os
homens de bem, o cidadão comum esperam,
mas sim um país onde políticos
devotados e prontos a
realizar mudanças efetivas possam
exercer seus mandatos com
dignidade.
A polarização em que se transformou o
país desde a saída da ex-presidente Dilma
Rousseff tem crescido assustadoramente a ponto de criar inimizades entre pessoas que antes se
davam bem. Podia-se mesmo dizer que eram amigos ou bons colegas ou conhecidos. Eu
próprio adquiri adversários no
campo político-ideológico no meio do
magistério médio e superior. Gratuitamente se afastaram de mim e não mais se dirigiram a mim nas redes sociais somente porque
não comungo da mesma ideologia
ou doutrinação política. É muito triste constatar tudo isso.
Como pessoas
letradas se tornam tão intransigentes querendo
impor suas ideias sobre outras?
Como fazer de mim um adepto do
comunismo se não tenho o mesmo pensamento que um partidário desse sistema? Toda
imposição ideológica sobre outrem peca
por parcialidade ou
miopia fingida ou mesmo cega, e
não respeita o diálogo educado, civilizado
de alguém que não pensa igual. Onde fica, aí, a dialética da argumentação? Qualquer
tentativa de camuflar interesses escusos
imbricados na argumentação torna-se falaciosa.
Só entendo a democracia quando partidos
adversários conseguem polemizar com programas
bem intencionados e formulados
por gente honesta que leva o exercício da política sob a
égide da virtude e dos compromissos assumidos. Esta, a meu ver, é a primeira premissa a se levar em conta na vida
de um país.
Quaisquer ações desviantes da ética no
campo político e em pleno mandato de
cargos ferem frontalmente os princípios democráticos. Eis por que não me
apetece pertencer a um projeto político, ainda que este vise a melhorar as condições de vida dos desafortunados e
abandonados, se os homens no poder não são honestos e fazem dos seus mandatos
trampolins para se locupletarem
com o dinheiro público e acobertados pelo manto da impunidade.
O Brasil que todos queremos seria
aquele país no qual não há lugar para impostores e oportunistas
nem para candidatos populistas e com tendência a messianismo. O Brasil já
teve dois exemplos que se poderiam enquadrar nestas
condições de negatividade. A democracia,
se autêntica, abjura as práticas de estelionatos políticos,
propinas e peculatos.
Para tais
iniquidades, não obstante hajam os
mandatários conseguido aprimorar as condições de vida da população, como foi o
caso do ex-presidente Lula no primeiro mandato, não pode haver flexibilidades de qualquer espécie. Sabemos que o homem, em grande parte, é ávido de
vida de riqueza e regalias, além do domínio do poder, mas tal forma
de conduzir sua vida privada não pode levá-lo a permitir práticas de ilicitudes na administração de um
pais, de um estado ou de um município.
Foi
por comportamento semelhante ou aproximado que no país tornaram-se
odiados ou desmoralizados políticos que não respeitaram o povo, a sociedade e seus cargos. O país
que tanto desejamos
aponta para os valores morais dos quais a sociedade e, em particular, os políticos, não podem
se afastar um palmo em conjuntura
alguma e em qualquer época. A salvação
da democracia somente pode vicejar, se se mantiver e se fortalecer pelo caminho da retidão do caráter do homem público ou privado de que o país está por
muito tempo tão ausente e mesmo órfão.
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