quarta-feira, 30 de novembro de 2016

A RAZÃO ESTÁ NO MEIO, NÃO NOS JULGAMENTOS







                                                           Cunha e Silva Filho


           Quem diz que ele foi grandioso, herói,  líder mundial  conspícuo, não está sendo imparcial, Fidel Castro (1926-2016), no meu entender,  só fez três coisas  importantes na idílica  ilha  de Cuba: 1) livrar o pequeno país do jugo  do ditador, que, primeiro, foi  presidente eleito,  Fulgencio Batista (1901-1973),  uma joguete nas mãos dos norte-americanos  que transformou  Cuba num  grande lupanar   visitado por turistas, sobretudo  norte-americanos; 2) desenvolveu  um  louvável  sistema de saúde  pública,   se bem que,  no  interior,   esse setor  era negligenciado. Só se fazia eficiente na área  urbana; 3)  reduziu a quase zero o índice de analfabetismo. Alguém poderia  negar  esses feitos   de grande alcance  social? Ninguém, nem os seus opositores.
         No entanto,  nem tudo são flores.  Há um lado pernicioso  nos seus longos  anos  de comandante  geral dos cubanos. Seria o outro lado da sua personalidade carismática, que  é ter-se  batido contra a ditadura  do  seu antecessor e haver prometido  direcionar  seu governo  a um sistema político   aberto,  democrático e com liberdade de expressão e locomoção. Formado em direito,  logo que  conquistou  o poder,  esqueceu   o passado. As promessas  e a magia do poder   o tornaram mais um ditador,  alguém que  se pôs  na mesma condição  do antecessor se entendermos   que o termo  “ditador”  ainda  conserva o mesmo  sentido de um  governante tirano,  autoritário, autocrático, enfeixando em suas mãos todo o  poder  acima  das leis e dos direitos inalienáveis  do ser humano,  que é ter  o direito  de  divergir,  de discordar.  As promessas de fazer Cuba um país  livre e com sistema de governo  de alternância de poder periódica, consoante   fazem as nações minimamente democráticas, foram  olvidadas, tornaram-se  papel  queimado,  viraram cinzas.
        A ditadura  predominou,  as dissidências foram sufocadas, seja  pelo  paredón (fuzilamento), seja  pelas masmorras, às quais foram  mandados os políticos   que se lhe  tornaram adversários ou desafetos inimigos da revolução  castrista, alguns  deles  antigos  companheiros  da luta  revolucionária  que  culminou  com a queda do    ditador  Fulgencio em 1959.
         Fidel Castro,  portanto,  não pode ser  rotulado de  ícone   e libertário digno  de ser exemplo para outros  países  que almejem  a mesma  posição e esquema   político que caracterizou  a   duradoura  ditadura  cubana. Se olharmos  com  isenção  a política cubana e seus feitos econômicos, o seu desenvolvimento industrial,  a condição  do povão,  vemos  facilmente que  o país  não cresceu durante  meio  século  de  regime discricionário   e conduzido com mão de ferro. 
        Com as devidas  diferenças histórico-culturais, o Brasil  sob o governo  petista, sobretudo no  primeiro mandato do presidente Lula,   modificou, ninguém pode negar,  alguns  hábitos  de  governança  arcaica  e elitista,  em relação  às condições  do povão. Houve  progresso  social. Mas,  isso  não  é suficiente  para    exaltarmos   o lulopetismo,   de vez que, do outro lado da moeda, esse governo, falazmente   dito  da “esquerda,”   cometeu  e deixou  cometer  os  mais   aviltantes   escândalos  de corrupção de que já se teve notícia  na História do Brasil com  uma administração   caracterizada pelo contumaz  jogo espúrio da  propina   e pelos desvios  do dinheiro  público.  Isso tudo  resultando  no deplorável  estado  de nossas finanças  públicas   que atingiram    níveis  de bancarrota,  repercutindo até hoje com  estados brasileiros  sofrendo  as consequências deletérias do que  o governo federal fez de errado.
        O que torna respeitável um governo   é a sua transparência  ética,  suas decisões   calcadas na decência  e  proteção   de seus ativos,  de seus gastos  controlados  e nas  suas realizações  a serviço  de uma sociedade  mais justa O petismo  passou  muito ao largo de toda essa ética  fundamental  à grandeza de um nação. Por isso, caiuO  que norteou   a plataforma   de governo  elaborada pelos seus  ideólogos foi, com o tempo,  desvirtuando de seus objetivos  cívicos iniciais.  O mesmo, voltando a Fidel Castro,  poderia   dizer  dessa figura de ditador hiperbolicamente  exaltada  pelos seus  admiradores  aqui e fora do país, sobretudo no meio acadêmico universitário.público.
          A meu ver,  Fidel Castro, senhor absoluto do poder  de Cuba,  foi, ao contrário,   infeliz e   um mau estrategista que só  infelicitou e  atrasou o país quanto ao  seu   crescimento  econômico   e em outros setores, a começar  do regime  político   ali  implantado, regime este que só  trouxe àquela sociedade dissabores e uma vida  apertada e humilde. Se tivesse tido maior visão política, a despeito dos pronunciamentos fatigantes, e habilidade   diplomática,  teria  feito  aberturas  políticas em seu  governo e  organizado  o país   de forma independente   e sem ser  servil  aos Estados Unidos.
          Se o tivesse feito,  não teria  sofrido  o injusto   embargo  americano vigorante até hoje. Faltou-lhe tato, apesar  das várias situações dramáticas  pelas quais passou  o seu  longo percurso de ditador. Sua miopia de não   se ter  atualizado como  político, ainda que  impulsionado  pelo socialismo real  superado de estofo  soviético, foi o seu erro palmar. Enquanto  países comunistas como a China   absorveram  as vantagens  do  capitalismo  em sua economia,  Fidel Castro  ainda  vivia  repetindo, ao longa de décadas,  a sua cantilena  contra o que  dizia  ser o  imperialismo americano.
         Essa posição  casmurra  tanto  prejudicou   a sua imagem quanto   o desenvolvimento de Cuba. Projetar  os destinos  da  bela ilha caribenha não me  está nos  interesses de observador da cena  política  internacional,  mas  pode-se  tentar  um palpite: Cuba,  no futuro não muito distante,   encontrará  o caminho   da liberdade de expressão  e das divergências  sem  polarizações ou  recursos à violência política. 
       Para finalizar estas considerações, existe um dado  sombrio e contraditório  dessa figura tão  incensada  pela esquerda, que me deixa  perplexo. Segundo dados da Forbes,  Fidel  Castro  era um   homem  milionário. Como explicar que um ditador  milionário  venha a falar   de melhoria  de seu povo  e ao mesmo  tempo se dizia  socialista ou marxista?  Então, seria a vez de indagar: o seu  socialismo só servia para si mesmo, sua família, sua nomenklatura e para  uso externo com finalidades  midiáticas?


               


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