Cunha e Silva
Filho
Em incisivo artigo publicado no Globo (17/01/2015), o cientista
político Nelson Paes Leme tece com argúcia e
oportunidade algumas observações acerca do
recente atentado contra o
jornal francês Charlie
Hebdo do qual resultou a morte
de talentosos cartunistas e de outras
pessoas , causando uma
comoção nacional e um grande
repercussão no exterior.
Porém, acertadamente, Paes Leme não deixa escapar a chance de
fazer um pertinente
alerta: que não apenas as
multidões conduzidas por chefes de
Estado europeus se
unam contra o terrorismo, mas
que, no conjunto de problemas
mundiais de alta relevância
existe a questão do meio-ambiente, da preservação da Natureza-mãe, esquecida
com frequência em manifestações
de massas da envergadura que foi a da morte dos cartunistas.
Para o cientista político, a “sobrevivência da
humanidade” e da “bioesfera” se encontram
entre as prioridades
urgentes que deveriam estar na
pauta dos impasses a serem
debatidos amplamente no mundo
inteiro. Lutar contra o terrorismo é uma questão de honra para
os países que prezam a
democracia, mas olvidar um outro
inimigo que nos espreita, a
derrocada da vida em nosso planeta,
é da mesma maneira vital para os seres humanos
deste início de século.
Segundo
o cientista político,
a visão dos problemas de enorme
significação para a preservação
de nosso planeta é tema que deve
ser considerado num programa amplo interdisciplinar envolvendo o maior número possível
de equações conducentes
a estratégias para estancar a reação
da natureza contra os que a
destroçam por muitos meios: poluição, efeito estufa provocado pelo
uso excessivo do dióxido de carbônio, inundações,
afrontosas mudanças climáticas,
tempestades, explosão demográfica nas metrópoles, desmatamento
das florestas tropicais,
incompetência das autoridades,
ganância financeira, gigantismo
das urbes, demandas econômicas,
desperdício dos recursos da
natureza, tudo isso, repito, em decorrência do descaso do homem moderno por preservar, na medida
justa e humana, o que nos resta
do planeta.
No Brasil, temos várias consequências do mau tratamento da natureza pelo homem: a situação da secaem São Paulo , a degradação do rio São Francisco, o fornecimento de água potável
para São Paulo, os apagões
já registrados, o extremo
calor no Rio de Janeiro jamais visto. A expressão “Rio 45 graus” já era, pois a sensação
térmica pode chegar a 50 graus! Qualquer habitante com mais
idade do
Rio de Janeiro percebe que a cidade
já foi menos quente. São Paulo,
idem.
No Brasil, temos várias consequências do mau tratamento da natureza pelo homem: a situação da seca
Paes
Leme sublinha um dado de extrema
importância: a humanidade
pensa mais nos problemas humanos do que na
prática e cultivo do entrosamento entre
a “espécie humana e a história
evolutiva das demais espécies.” Para ele,
uma não pode se separar da outra. É o todo do Planeta que estamos
pondo em risco e afundando na destruição. O perigo é o homem, não a natureza. E o homo economicus ainda joga
papel saliente e decisivo; caso
não o faça, ele estará
cavando sua própria cova, se é
que ainda haverá cova para todos. Será como aquela advertência, algumas vezes já citada por
este colunista, ainda tão atualizada de Bertrand Russell (1872-1970): “ Só há dois
caminhos para a humanidade, a paz ou a destruição total.”
Para ele,
falta a nós uma
visão “holística,” ou seja, um
encaminhamento dos problemas de maneira
geral e em
conjunto. Não se poderia
levar só em conta a questão econômica, que é relevante,
mas não é a mais premente
à felicidade terrena.
Segundo
Paes Leme, ou haverá interdisciplinaridade no
ataque aos problemas do
meio-ambiente, ou estaremos
caminhando para uma
posição perigosa de sobrevivência
ainda neste século. As sugestões, expressas de forma cristalina pelo
cientista político, são no sentido
de que, em primeiro lugar, se dê prioridade ao chamado “Índice de Desenvolvimento de Desempenho Sustentável” e não, como
se faz amiúde no trato
de questões cruciais para a salvação do planeta Terra, prioritariamente ao PIB.
E, por falar
naquele Índice, Paes Leme adverte o leitor para a
posição pouca honrosa para o
Brasil que, em 2014, cujo EPI se coloca na 62ª posição do “ranking mundial”! Mesmo na América Latina, encontra-se o
Brasil em posição
vergonhosa, ou seja, fora do conjunto de dez países
que se situam num ranking mais expressivo. Acentua o
cientista político que
tal posição inferior
de nosso país não faz jus
à condição de que aqui se encontra,
como dádiva da natureza, o "pulmão do mundo", aludindo à nossa Amazônia.
O
artigo de Paes Leme é polêmico é , a meu ver,
de grande interesse
para todos aqueles que desejam
que seus netos e bisnetos
tenham sobrevivência ao longo
deste século. Mas, o artigo não
se sustenta no vazio. É rico de
detalhes e observações que devem ser medidas
com toda a atenção que merece o assunto.
Para tanto, cita importantes autoridades científicas,
como a de do astrofísico Martin
Rees, autor do apocalíptico Our final
century (em tradução livre, Nosso
século final), ou do biólogo também britânico James Lovelock, com
seu livro, A vingança de Gaia, ou ainda
a do filósofo John Gray, com seu
livro Cachorros de palha. Para
Paes Leme, os três formam uma “espécie de trilogia do apocalipse" na Inglaterra e o mais assustador
é que suas previsões já incluem
os “próximos 50 anos!
Ressalte-se que o citado
Martin Rees se fundamenta em
índices analisados conjuntamente, ou seja, usa
o citado EPI, IDH e PIB. Ou seja,
não se prende tão-só ao
fator de ordem econômica. Além disso, critica os gastos astronômicos
de países civilizados com armamentos, os quais só servirão para
precipitar ainda mais as posições
nada alvissareiras para a sobrevivência na Terra.
Além
disso, a própria OTAN, de acordo
com suas próprias fontes, dobraram seus
gastos militares, atingindo cifras de trilhões de dólares. Os EUA,
também. Tudo isso só pode provocar
indignação e
consternação dos homens que
lutam pela paz e pela
bem do Terra.
De
qualquer forma, o artigo de Paes Leme é útil e
original e, como cientista político, não
se furta a fazer analogias
com outros temas que,
estruturalmente, se imbricam
na tentativa de entender
as implicações da desordem
do Planeta, sobretudo do “aquecimento
global”, cujos efeitos
hoje em dia, em nossas metrópoles e mesmo no interior,
já dão sobeja
prova de que o
planeta Terra está muito doente
e, por conseguinte, necessita da atenção
de todos os povos do mundo, sobretudo
dos que mais concorrem
para a deterioração
da atmosfera.
Refletir sobre um artigo dessa
dimensão social não somente serve de alerta
aos “donos do mundo” mas também
abre os olhos de grupos da paz
que, em todo os países, deveriam lançar campanhas de esclarecimento sobre
a nossa própria
sobrevivência neste tão desolado
mundo contemporâneo.
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