terça-feira, 20 de janeiro de 2015

O meio-ambiente é a palavra-chave




                                 Cunha e Silva Filho


       Em incisivo artigo  publicado no Globo (17/01/2015), o cientista  político  Nelson  Paes Leme tece com argúcia e oportunidade  algumas  observações acerca  do  recente atentado  contra o jornal  francês  Charlie  Hebdo do qual   resultou a morte de  talentosos cartunistas  e de outras  pessoas , causando  uma comoção  nacional  e um grande  repercussão  no exterior.
     Porém, acertadamente,  Paes Leme não deixa escapar   a chance de  fazer  um  pertinente    alerta: que não apenas  as multidões  conduzidas por chefes de Estado   europeus  se  unam  contra o terrorismo, mas que,   no conjunto de  problemas  mundiais  de alta  relevância  existe  a questão  do meio-ambiente,  da preservação da Natureza-mãe,   esquecida  com frequência  em  manifestações  de massas  da envergadura  que foi a da morte dos  cartunistas.
    Para o cientista político, a “sobrevivência da humanidade” e da “bioesfera” se encontram   entre as prioridades  urgentes  que deveriam estar na pauta  dos impasses  a serem   debatidos  amplamente  no mundo  inteiro. Lutar contra  o terrorismo   é uma questão de honra  para  os países que  prezam a democracia, mas  olvidar  um outro  inimigo que nos espreita,  a derrocada  da vida em nosso  planeta,  é da  mesma maneira    vital para os  seres humanos  deste  início  de século.
      Segundo  o  cientista  político,  a visão dos  problemas  de enorme   significação  para  a preservação  de nosso  planeta é  tema que deve  ser  considerado  num programa amplo  interdisciplinar  envolvendo o maior número  possível  de  equações   conducentes   a estratégias para  estancar  a reação   da natureza contra os que a   destroçam  por muitos meios: poluição,   efeito  estufa provocado  pelo  uso   excessivo  do dióxido de carbônio,  inundações,    afrontosas  mudanças climáticas, tempestades,  explosão demográfica nas metrópoles,  desmatamento  das florestas tropicais,   incompetência   das autoridades, ganância  financeira,   gigantismo  das urbes,  demandas  econômicas,   desperdício  dos recursos da natureza,  tudo isso, repito,  em decorrência do  descaso do homem moderno  por preservar,   na medida   justa e humana,   o que nos  resta  do planeta. 
      No Brasil,  temos várias consequências  do mau tratamento  da natureza pelo  homem:   a situação   da seca em São Paulo,  a degradação do rio  São Francisco,  o fornecimento de água  potável  para  São Paulo,   os apagões   já registrados,  o  extremo  calor no Rio de Janeiro jamais visto. A expressão “Rio  45 graus” já era, pois a sensação térmica  pode chegar a  50 graus! Qualquer habitante com mais idade  do  Rio de Janeiro  percebe  que a cidade  já foi  menos quente. São Paulo, idem.
      Paes Leme sublinha  um dado   de extrema   importância: a humanidade  pensa  mais  nos problemas humanos  do que na  prática  e cultivo   do entrosamento  entre  a “espécie  humana e a história evolutiva das demais  espécies.”  Para ele,  uma não  pode  se separar da outra. É o todo  do Planeta que  estamos  pondo em  risco e afundando  na destruição. O perigo  é o homem, não a natureza. E o homo economicus  ainda joga  papel  saliente e decisivo; caso não o  faça,  ele estará   cavando sua  própria cova, se é que ainda haverá  cova  para todos. Será como aquela   advertência, algumas vezes já citada por este colunista,   ainda  tão atualizada de  Bertrand Russell (1872-1970): “ Só há dois caminhos para a  humanidade,  a paz ou a destruição  total.”
     Para ele,  falta a  nós  uma  visão  “holística,” ou seja,  um   encaminhamento   dos problemas de  maneira   geral e em conjunto. Não se poderia  levar  só  em conta       a questão econômica, que é relevante, mas  não é a mais   premente  à felicidade  terrena.
     Segundo  Paes Leme,  ou haverá  interdisciplinaridade  no   ataque aos problemas  do meio-ambiente,  ou  estaremos  caminhando  para  uma   posição  perigosa de sobrevivência ainda neste século. As  sugestões,  expressas de forma cristalina  pelo  cientista  político, são no sentido de que, em  primeiro lugar, se dê  prioridade ao chamado  “Índice de Desenvolvimento  de Desempenho Sustentável” e não,  como  se faz  amiúde  no trato  de questões   cruciais  para a salvação do  planeta Terra,   prioritariamente ao  PIB.
   E, por falar  naquele  Índice,   Paes Leme adverte o leitor  para  a posição   pouca honrosa  para o  Brasil que,  em 2014,  cujo EPI se coloca na 62ª  posição do “ranking mundial”! Mesmo  na América Latina,  encontra-se o  Brasil  em   posição   vergonhosa, ou seja,  fora  do conjunto de dez  países   que  se situam num ranking  mais expressivo. Acentua  o  cientista  político  que   tal  posição   inferior  de nosso  país   não faz jus  à condição de que  aqui  se encontra, como dádiva  da natureza,  o  "pulmão do mundo", aludindo  à nossa  Amazônia.

     O artigo de Paes Leme é polêmico  é ,  a meu ver,   de   grande   interesse  para   todos aqueles  que desejam  que seus  netos e  bisnetos   tenham   sobrevivência  ao longo  deste século. Mas, o artigo  não se sustenta  no vazio.  É rico de  detalhes e  observações  que devem ser   medidas  com  toda a  atenção que merece o assunto. 
    Para tanto, cita   importantes autoridades  científicas,  como a de do astrofísico  Martin Rees, autor do apocalíptico  Our final  century (em tradução  livre, Nosso  século  final), ou do  biólogo também britânico James  Lovelock, com  seu livro,  A vingança de Gaia, ou ainda  a do filósofo John  Gray, com seu livro  Cachorros de palha. Para  Paes Leme,  os três formam uma   “espécie de  trilogia do apocalipse" na Inglaterra e o mais   assustador  é que  suas previsões  já incluem  os  “próximos  50 anos!
      Ressalte-se que  o citado  Martin Rees se  fundamenta  em   índices  analisados   conjuntamente, ou seja,  usa  o  citado  EPI, IDH e  PIB. Ou seja,  não se prende tão-só ao  fator  de ordem  econômica. Além disso, critica os gastos   astronômicos  de  países civilizados  com armamentos,    os quais só servirão  para    precipitar  ainda mais  as posições   nada  alvissareiras  para a sobrevivência  na Terra.
     Além disso,   a própria OTAN, de acordo com  suas próprias fontes,  dobraram seus  gastos militares, atingindo  cifras de  trilhões de dólares. Os EUA, também. Tudo isso  só pode  provocar    indignação  e  consternação dos homens   que lutam  pela  paz e pela  bem do  Terra. 
     De qualquer  forma,   o artigo de Paes Leme é útil  e  original e, como  cientista político,   não  se furta a   fazer  analogias  com  outros temas  que,  estruturalmente,    se  imbricam   na  tentativa de  entender  as implicações   da  desordem  do Planeta,  sobretudo do   “aquecimento  global”,  cujos  efeitos  hoje em dia,  em  nossas metrópoles e mesmo  no interior,  já  dão  sobeja  prova  de que  o  planeta  Terra está  muito doente  e, por conseguinte,   necessita  da atenção  de todos  os  povos do mundo,   sobretudo  dos que  mais  concorrem  para   a  deterioração    da  atmosfera.
   Refletir sobre um artigo  dessa  dimensão  social  não somente serve  de alerta  aos “donos do mundo”  mas  também  abre os olhos  de grupos da paz que,  em todo  os países,    deveriam lançar campanhas    de esclarecimento  sobre  a nossa  própria sobrevivência     neste tão  desolado   mundo contemporâneo.  
 


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