Cunha
e Silva Filho
Moro pertinho do Maracanã, o mais
famoso estádio de futebol do mundo. Com as reformas ficou
majestoso, solene, digno do respeito que merece por uma longa folha de serviços prestados ao país e ao nosso
futebol. Só uma vez nos deixou tristes: em 1950, com a derrota do Brasil para o Uruguai na Copa do Mundo. Gol de
Ghiggia.Costuma-se dizer que o Brasil, nessa derrota em casa, silenciou de
tristeza. Eu estava com 5 anos na época,
menino em Teresina.
Agora, perto do Maracanã, que será o
centro das atenções amanhã, dia da abertura dos Jogos Olímpicos, tudo no entorno desse estádio virou medida de segurança, a quadra de esporte do
centenário Colégio Militar do Rio de
Janeiro (CMRJ) está fazendo o papel de
lugar de pouso de helicópteros do Exército. Nas
principais ruas que dão acesso ao grande estádio estão postados
homens do Exército, guardas
municipais, Polícia Militar. Polícia Civil. Guarda Naional.
De vez em quando, da minha janela, vejo muita coisa e escuto o barulho ensurdecedor
dos helicópteros. Me lembra um estado de
guerra.Ainda bem que é só uma lembrança.Alguns caminhões cobertos do Exército e outras viaturas estão
estacionados no campo de hipismo do
Colégio Militar. Os soldados do
Exército, desde pelo menos a semana
passada, já estão em pontos estratégicos,
bem armados, da Rua São Francisco Xavier,
num ponto da qual se localiza o
velho Colégio, que é parte também de
minhas lembranças por ter exercido a docência
de língua inglesa nessa prestigiada
instituição educacional, modelo
de ensino-aprendizagem no país com um corpo docente de primeira grandeza.
Na
semana passada, passando por dois militares fazendo a segurança em frente do
portão principal do Colégio Militar,
vendo que um deles tinha um
semblante simpático, lhe fiz uma pergunta só por cortesia e ele me tratou
com muita atenção . Na rápida conversa, me disse que
tinha vindo do Rio Grande do Sul
somente para fazer parte da segurança da Olimpíada de
2016. Com ele estava uma colega militar,
que era de Curitiba, um moça discreta
e também cordial.
Se me perguntassem se estou feliz com os Jogos Olímpicos, eu diria que sim e não. Sim, porque não é qualquer tempo em que
um país é anfitrião de um megaevento tão importante. Um país que sedia um
acontecimento destes torna-se foco das atenções do mundo inteiro e,
principalmente, propicia o encontro
dos povos que, pelo inestimável valor
dos esportes, se vê
congregado, unido, trazendo
alegrias e um sopro de esperança de paz entre as nações no momento em que a
nossa Terra está tão conflagrada e tão sofrida em
tantas regiões dos continentes.
Na essência, sim, os Jogos Olímpicos são
alvissareiros, bem-vindos. O melhor, o
certo é tratar bem os que aqui
chegam como desportistas
competidores ou como turistas
estrangeiros e nacionais. Em suma,
é um período de confraternização, de uma pausa que se dá a divergências variadas entre
os povos. O seu cerne é a alegria
do fairplay, a vitória dos grandes
atletas, o fortalecimento dos valores humanos, como a paz, a concórdia, a troca de experiência entre culturas diferentes
ou semelhantes, a
consagração de alguns competidores.
Seria uma festa ecumênica, um
encontro universal entre povos, a continuidade de um elo que teve sua origem na admirada Grécia antiga. Seu símbolo maior é a
decantada tocha olímpica que,
percorrendo o país inteiro, chega
ao centro irradiador
dos Jogos – a bela cidade de São
Sebastião. Não poderia ser outra.
Por outro lado, diria que não estaria alegre
pelos Jogos Olímpicos no Brasil dado o fato de que o momento em que vai ocorrer
o megaevento, por um desses infortúnios da vida, é aquele
em que o país não vai bem na mente e no corpo.
Oscilando entre um governo interino e um
governo afastado, o país é caudatário dos muitos desmandos
do governo anterior e, a par
disso, não está sendo, em alguns aspectos
de sua nova administração federal, bem recebido por parte da sociedade
civil. Ambos me parecem resultar de uma espécie de simbiose entre
o fracasso do governo anterior e as incertezas de um governo que já está tomando
medidas impopulares pelas quais o
povo vai ter
pagar a conta.
Ou seja,
o governo afastado dilapidou as finanças do país com o acúmulo de
desvios do dinheiro público que
foram parar nas mãos dos beneficiários das propinas milionárias
responsáveis pela grave crise
econômico-financeira.
Esta constatação não foi uma quimera inventada pelos que não desejavam a continuidade do governo Dilma.Foi a
incompetência combinada com a rapinagem
do governo Dilma que a afastou do cargo. A Operação Lava-Jato não nasceu ex-nihilo. Fundamentou-se das
investigações das diversas operações
implementadas em consonância
com a Justiça e com a resposta
da sociedade civil que manifestou seu repúdio a um governo que estava se despedaçando pelos seus malfeitos,
desmandos, desídias e sobretudo
corrupção generalizada conluiada
com parte do alto empresariado e com a impunidade que o governo
afastado não combateu de vez que
ele era parte intrínseca desses desvios de conduta de administração pública, cujo ponto mais
alto do desastre financeiro
foi justamente uma estatal do porte da Petrobrás – pivô dos maiores
escândalos da história política brasileira.
Num país assim assolado pelo desemprego, inflação,
violência, criminalidade galopante, falência de alguns Estados brasileiros, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, por exemplo, sucateamento de setores
vitais à normalidade do funcionamento das cidades, como saúde,
educação, segurança, transporte,
pensar-se em gastos
faraônicos com a preparação dos Jogos
Olímpicos seria uma temeridade
pra o Erário. Quer dizer, os gastos com o megaevento esportivo acentuaram
as já combalidas finanças dos Estados da Federação e do governo
federal. Tudo junto, resultou e tem resultado no agravamento da crise financeira do país.
O governo interino, já desde o início de sua composição
ministerial, não deu bom exemplo de contenção de gastos. Veio logo
o anúncio de aumento de salários das categorias de cargos
do mais alto escalão do governo:
presidente da República, ministros, membros do Supremo, deputados, senadores e,
por efeito cascata, os
outros cargos ligados ao Poder Judiciário, seguido, por sua vez,
pelo aumento de salários da cúpula governos estaduais nos três
poderes.
Ora,
leitor, que pior exemplo
deu o novo presidente ao permitir tudo isso? Por que privilegiar primeiro os que mais têm salários
elevados no pais? O funcionalismo
público federal de outras categorias,
mormente os chamados barnabés, não
mereciam também reajustes, sobretudo
porque, desde o governo Dilma não tem
sido beneficiados por reajustes salariais?
Não se justifica uma discriminação destas
para com o funcionalismo público que, faz uns cinco anos, não tem aumento. Contudo, o atual governo permitiu
e autorizou aumentos nos preços de
tudo, elevando o custo de vida e arrochando,
desta forma, mais uma vez os assalariados
em larga escala em itens que têm impacto no bolso dos consumidores das classes médias e mais
onerosamente os menos aquinhoados: taxas
de luz, telefone, gás, IPTU, os preços
dos remédios, dos alimentos em geral, dos planos de saúde, dos setores de serviços etc.
Um governo que mal começa e age
assim não está dando prova
de que assumiu o poder para melhorar
a vida das pessoas.
Além disso, o que os três poderes em
Brasília gastam daria bem para melhorar muitos problemas enfrentados
pela população sofrida do país.As
mordomias palacianas neles continuam
soltas e fagueiras. Os gastos continuam astronômicos
até parecendo que estamos vivendo
num país
sem crise financeira e no melhor dos mundos possíveis..
Como poder confiar numa
Estado brasileiro que muda de partido
mas não muda as suas práticas nefastas: o nepotismo, os mesmo
donos do poder e da
política, a herança política
familiar em cargos-chave.
Para concluir esta crônica, volto à minha
ambiguidade inicial, entre a alegria da
sedução da Olimpíada e a decepção dos
desmedidos gastos públicos do governo federal e os
de alguns estaduais e municipais.
A pátria amada idolatrada é mesmo uma mistura. Não é pura, mas causa dor,
espanto e indignação.
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