Cunha
e Silva Filho
1. INTRODUÇÃO.
Duas diferenças de construção poética
saltam à vista após a leitura das duas obras do jovem poeta piauiense Luiz Filho de Oliveira; a
primeira, suscitada pelo livro BardoAmar [1]
me conduz como leitor diretamente ao aspecto visual; a segunda, provocada pela leitura de Ondehumano[2]
(Teresina, Nova Aliança, 2009, 114 páginas) me leva sem esforço ao universo do
léxico, i. e., da palavra, tomada aqui no sentido mais despojado de poiésis,
do vocábulo elevado ao estatuto mais
nobre do eixo da seletividade
(paradigmático) sobre o eixo da
combinação (sintagmático), segundo o pensamento teórico de Jakobson sobre o que pensava
da função poética. Dessa junção lúcida
e lógica advêm as chamadas
estranhezas do discurso poético moderno. Essa ideia do fazer poético corresponde, a meu ver, àquele conceito de “imprevisibilidade” de outra
linha de pensamento crítico-teórico. Não quer isso significar que, no
primeiro livro, o poeta abdique de suas preocupações com o verso enquanto discurso lírico. Longe disso, as
duas diferenças são somente componentes
básicos nas duas obras mencionadas.
Neste estudo, vou-me concentrar no que os dois livros de poesia de Luiz Filho de Oliveira possam
propiciar de novo ou de velho à lírica
brasileira. Em carta do autor a mim
endereçada, o poeta fornece alguns dados
paratextuais sobre os motivos de sua
experiência não só quanto ao início de seu interesse pelo gênero poético
mas também como chegou a publicar seus poemas e mais outras razões que o fizeram trilhar a solitária aventura do que já se
chamou a mais pura das formas literária.
Já anteriormente havia
lido alguns textos em prosa do autor, os quais
me provocaram uma sensação de
estar diante de um escritor
avesso ao conservadorismo ou à gratuidade. Sua prosa (tanto quanto com maior intensidade na poesia)), diria mais
precisamente crônica ou ensaio, é vazada de estranhamentos, sobretudo no modo de colocação
dos pronomes oblíquos e de
outras excentricidades de usos gráficos e léxicos no corpo de
discurso. Não sei se, no futuro, vai se afastar
desses expedientes - o que para mim
seria melhor quando se tratasse daqueles gêneros
literários.
Creio que o caminho
melhor seria aquele trilhado tão bem por Ferreira de Gullar na crônica ou no ensaio (ele, que já foi tão
subversivo e experimentalista na
poesia). Por outro lado, no âmbito do poema, em decorrência da própria natureza intrínseca
da linguagem poética, aí sim,
todo esforço criativo e "contra-ideológico" seria válido nos estreitos
limites da literariedade e com
uma vantagem a mais: respeito, ousadia e dignidade intelectual.
. O resultado da leitura dos dois livros, no geral, é promissor. Além disso, acrescentaria um pormenor curioso. Segundo o
autor, Ondehumano enfeixa poemas
anteriores à experiência experimentalista de BardoAmar que, de certa
maneira, inverte o processo de continuidade da segunda obra.
Ou seja, enquanto vivência
poética, o segundo livro, Ondehumano, cronologicamente deveria ser
virtualmente o primeiro, visto que, segundo aduz o
poeta, “é um livro experimental mais
sóbrio” se comparado ao primeiro. Para simplificar, do meu
ângulo de leitor, Ondehumano, a despeito de
incluir grande parte de poemas
anteriores ao primeiro livro, é,
todavia, o que, a meu juízo, servirá
como coerente avanço no percurso poético
de Luiz Filho ainda que seja um pouco cedo demais para um julgamento mais conclusivo das possibilidades futuras de seu estro, sem
cair numa espécie de fatalidade que tem acometido poetas
piauienses, os quais, depois de publicarem um número pequeno de obras, ainda dispondo de
muitos anos pela frente, silenciam praticamente
ante o futuro de seu projeto poético no início tão promissor. Não resta dúvida, entretanto,
de que Ondehumano é, até agora, a constatação mais
consistente de um talento com indicativos seguros, vias nítidas
e potencial criativo aberto e pronto a desenvolver novos temas e formas
elaboração no domínio do verso.
Permito-me delimitar porém, o alcance lírico de BardoAmar e procurar então, sondar—lhe as especificidades de
um autor que deu seus primeiros frutos no difícil e competitivo mundo das letras. Oh! como estava longe da verdade contemporânea o historiador literário inglês John Burguess Wilson, ao vaticinar, erroneamente, como, aliás, outros,
o futuro da poesia: “Não existe um poeta vivo que consiga viver de poesia. Mau sinal que talvez acene para a inexistência de um futuro para a poesia.”[3]
Sua
produção editada é diminuta se confrontada com os
anos de sua convívio com a musas. Isso, porém, não vem ao caso quando o que pesa para a literatura é a qualidade do que se
escreve e, nesse particular, Luiz Filho com apenas dois livros já me permite
um julgamento favorável, segundo anteriormente assinalei.
Na introdução à poesia de Luiz Filho de
Oliveira, a princípio prometera,
num só estudo, abordar as duas
obras do poeta. No entanto, à medida em
que ia desenvolvendo as ideias sobre o livro de estreia, BardoAmor, ia verificando que a análise estava crescendo além do objetivos previamente traçados. Por isso, me decidi a me ater neste trabalho somente ao primeiro livro. Vou reservar o segundo livro, Ondehumano para um outro ensaio que pretendo escrever
posteriormente.
Pela faixa etária, Luiz Filho se
colocaria na geração de poetas do final dos anos oitenta aos inícios dos anos noventa. Quer
dizer, geração de poetas bem atravessados pelos tempos da pós-modernidade, da experiência cibernética, de uma indústria
cultural cada vez mais tentacular em
razão dos avanços vertiginosos na área tecnológico-eletrônica, em tempo de
economia globalizada, em tempo também de
ameaça cíclica de instabilidade econômica e de hegemonia midiática,
principalmente via Internet.
O poeta viveu também na carne, posto que, pela idade, ainda imatura para a
compreensão de tantas mudanças estruturais e políticas no país, os últimos anos da ditadura militar, as primeiras manifestações da redemocratização política
nacional, assim como testemunhou o período pós-Guerra-Fria, a Queda do Muro de
Berlim, o esfacelamento do Comunismo
russo, a Guerra do Golfo Pérsico, as ditaduras na América Latina, entre outros
fatos e mudanças no país e no mundo. É que no século 20 das últimas décadas o
poeta se situa como indivíduo e como jovem intelectual ansioso por expressar
seu sentimento poético histórica e
culturalmente contextualizado. Sua poesia não pode fugir a esses condicionamentos de uma época.
BardoAmar, de resto, é livro premiado em 2000 num concurso
realizado pela FUNDEC e se classificou
em segundo lugar. Antes, fora
selecionado num “Concurso de Poesia Antero de Quental,” no II Festival de
Inverno de Educação de Itajubá, Minas Gerais. O concurso lhe valeu participação
em antologia.
Um dos fascínios pelos quais o texto em poesia me seduz vem a ser a imensa
possibilidade de releituras de um mesmo livro graças,
é claro, ao poder de síntese
inerente ao gênero. Daí ser a leitura
poética para o critico uma
atividade muito mais concentrada, mais
visceral, a que vai corresponder
um mergulho mais denso e totalizante do objeto poético. Na prosa, fica mais difícil essa prospecção
vantajosa à hermenêutica. Por esse motivo, no trabalho de análise de um volume
de poemas, devido em geral à exiguidade do número de páginas, o instrumental crítico torna-se muito mais
fácil de operacionalizar, o que nada tem a ver com as dificuldades intrínsecas
também à prosa.
Não seria gratuito ou ingênuo afirmar-se ao jovem
escritor de hoje, seja na prosa,
seja na poesia, que o esforço despendido na composição de uma obra literária
demanda muito maior suor
intelectual do que no passado, aqui entendido como um vasto e variado período abrangendo, com se sabe, vários
séculos de tradição literária e especialmente quando se leva em conta as
vanguardas europeias que reconfiguraram drasticamente os estilos
literários a elas anteriores.
Em outras palavras, o poeta, o
ficcionista, o teatrólogo de hoje, quer desejem ou não, não podem evadir-se da
contingência de ser uma simples
partícula dessa considerável cadeia de estilos e linguagens literárias inserida, formando o circuito da tradição ou cânone, e,
ademais, agravada por vezes
pela ideia da chamada “angústia da influência” formulada por Harold
Bloom, que não deixa de ser uma espécie
de “pedra no meio do caminho” de novos autores na seara da poesia.
Desta forma, Luiz Filho, por seu turno, não pode
assim ser uma exceção a essa conjuntura da história da literatura universal. No
movimento paradigmático das letras brasileiras, indissociável daquele circuito
de tradição ocidental e divisor de águas entre o conservadorismo e a ruptura
convocada pelos defensores do Modernismo
de 1922 com a sua histórica e
exaustivamente citada e pesquisada Semana de Arte Moderna de 22 no Teatro Municipal
de São Paulo, o passado foi, na
primeira fase do movimento, vigorosamente rechaçado e a literatura brasileira
genuína(?) passaria a ter seu marco zero a partir daquele ano-símbolo.
Essa atitude dos prógonos do Modernismo, sempre me pareceu algo exagerada, porquanto não é possível zerar a dimensão permanente da tradição literária. Não há presente sem a dimensão durável do passado, i.e., não se pode descartar esse legado não social, histórico, quanto sobretudo de substrato cuja moldura é sólida e não pode ser abolida por um “presente” de uma certa contemporaneidade que são as rupturas das formas estéticas, das chamadas vanguardas, por sua vez, também efêmeras.
Essa atitude dos prógonos do Modernismo, sempre me pareceu algo exagerada, porquanto não é possível zerar a dimensão permanente da tradição literária. Não há presente sem a dimensão durável do passado, i.e., não se pode descartar esse legado não social, histórico, quanto sobretudo de substrato cuja moldura é sólida e não pode ser abolida por um “presente” de uma certa contemporaneidade que são as rupturas das formas estéticas, das chamadas vanguardas, por sua vez, também efêmeras.
Contudo, a história literária do país
sofreu, em linhas gerais, a partir de
1945, principalmente na poesia, uma forma de retrocesso em relação aos princípios fundamentais da nova estética
impiedosamente
transgressora que caracterizou os primeiros anos dos modernistas históricos, tendo à frente um
Mário de Andrade, um Oswald de Andrade, entre outros.
Já na segunda fase do Modernismo, na década de 30 do século passado, a
virulência iconoclasta arrefeceu e
aparou os seus iniciais ímpetos
corrosivos face ao passado e
iniciou uma nova postura estético-temática, procurando um equilíbrio onde nem se voltaria mais às fontes parnasianas anacrônicas nem tampouco se permaneceria irredutível
nos limites estreitos dos
experimentalismos e pirotecnias inócuas.
Procurou-se, antes, uma via ou vias renovadoras que exprimissem literariamente um Brasil
sintonizado com a sua cultura,
suas tradições, com a sua língua e com os seus modos
de tentar aproximar o mais possível do povo a realidade da nação, com seus problemas peculiares, muitas dificuldades e incertezas
políticas e econômicas num país que, para dar um só exemplo
significativo, viveria os embates da Revolução de 30 liderada por Getúlio Vargas e, na mesma década,
sofreria um retrocesso político
com o Estado Novo sob novamente a tutela de Vargas com todas as sequelas de
males inerentes a uma Estado ditatorial e,
contraditoriamente, de
conquistas no plano social, sobretudo na área dos direitos dos trabalhadores.
Por
outro lado, a questão da inserção do
povo na ficção e nos principais gêneros literários brasileiros precisa de ser
um tanto relativizada, visto que os
movimentos literários têm caráter hierarquizante e mesmo elitista quando os entendemos como mudanças estéticas de cima para baixo, de
uma elite intelectual para a qual o povo
pode ser matéria de temas e de
linguagens mas delas não co-participam
do tripé autor+obra+ leitor, este último sendo quase sempre sujeito passivo ou
externo pelas próprias condições de
penúria cultural e escolaridade
que o impossibilita à fruição dos
bens culturais das elites
intelectuais. Esse é o grande dilema entre a vida intelectual e o
povo, o homem comum, o operário.
Os escritores que, em 1945,
não se afinaram com algumas conquistas estéticas de 22 e de 30, procuraram, ainda que de forma não uniforme
nos seus preceitos estéticos,
reagir contra as formas variadas tomadas pelo Modernismo e suas
diferentes manifestações estéticas
inovadoras, numa atitude estética que os levavam a uma espécie de Neo-parnasianismo,
ressuscitando o uso do soneto, da métrica, da rima e das imagens
plásticas, corpóreas, concretas e
objetivas no que concerne aos temas e a uma linguagem refinada, aristocratizante.
Entretanto, cumpre ressaltar que as
“geração de 45”
não desejou, entre os inúmeros adeptos
de sua estética, uma mera cópia do velho Parnasianismo.
Nem tampouco isso seria possível em termos absolutos, pois a poesia brasileira, após o vendaval modernista, jamais seria a mesma e é nesse ponto que surge um poeta que, embora se inclua na “geração de45,” logo seguiu um caminho independente. Falo de João Cabral de Melo
Neto, cuja práxis poética não confirmou a tendência geral daquela geração, preferindo,
consoante pondera bem Sílvio Castro[4] deixar sua poesia permear-se de
algumas influências da geração
poética de 30, muito fértil também na ficção, sobretudo com os romances nordestinos de 30.
Nem tampouco isso seria possível em termos absolutos, pois a poesia brasileira, após o vendaval modernista, jamais seria a mesma e é nesse ponto que surge um poeta que, embora se inclua na “geração de
Sendo assim, Cabral
pagou tributo à poesia de Carlos Drummond de Andrade pela vertente política,
à poesia de Augusto Frederico Schmidt no
que concerne a uma “aparente falta de consciência formal”[5]
e ainda até à poética de Murilo Mendes
quanto ao aproveitamento da “informalidade compositiva dos poemas imagísticos,”
não sem antes serem por João Cabral
“criticados e negados”[6]
Quer dizer, João Cabral, tanto quanto outros poetas da “geração de 45,” após negarem conquistas
expressivas do Modernismo de 22, não deixam,
entretanto, de reaproveitarem
“dialeticamente” valores que provêm desse mesmo
marco histórico decisivo aos
futuros avanços estético-formais da poesia brasileira.
2. DA GEOMETRIA DA CAPA ÀS
DESARTICULAÇÕES SILÁBICO-SEMÂNTICAS. No início deste estudo da poesia de Luiz Filho tinha chamado a
atenção do leitor para um aspecto dominante de BardoAmar: o campo pictórico. Só para alertar, lembro a
circunstância de que neste livro o elemento visual se enlaça umbilicalmente em
toda a extensão do volume, o que é facilitado por ser o autor quem preparou as
ilustrações do livro. Ou seja, é intencional
a fusão aqui da palavra poética com a arte visual, remetendo logo ao
velho preceito horaciano do ut pictura poesis. Exteriormente,
torna-se palpável o largo uso de natureza icônica entre as linhas do desenho e a palavra
conotada.
Veja-se
o anverso da capa do volume onde se harmonizam intimamente o título do
livro e os elementos
pictórico-geométricos, já entremostrando, então, rupturas sintagmáticas, recurso amplamente empregado pelo autor.Em BardoAmar, o verbo em forma nominal reduzida
do infinitivo se aglutina a uma anacrônica e solene designação da palavra “poeta”, além de que essa mesma aglutinação
cria certa ambiguidade – recurso
igualmente encontradiço neste poeta - despertando associações, por
exemplo, com variadas estruturas possivelmente desdobráveis: “amar
um bardo,” “o amor de um bardo” ou até mesmo uma associação virtualmente
possível e de valor morfológico,
atribuindo a “bardo,” por derivação imprópria,
um valor adjetivo.
A par disso, anda no espaço do
mencionado anverso da capa, há um
significativo desenho de uma caravela que,
por sinal, se repete três vezes mais no
corpo do livro. Cabe, neste sentido, uma
observação. Na chamada advertência, ou prólogo do livro, Luiz Filho, à
semelhança de antigos poetas românticos, à frente Gonçalves de Magalhães, nosso introdutor do Romantismo brasileiro, com os
seus Suspiros poéticos e saudades
(1836 ), reporta-se a uma viagem, ideia reiterada pelo habilidoso pastiche dessacralizante e oswaldiano do terceiro
verso do Canto I, Proposição do clássico épico Os
lusíadas: “.. bares & mares muito gigantes navegados.”
De resto, este tipo de procedimento técnico do autor,
ao longo do livro, se vai novamente
insinuar junto a leitor. Quero antecipar que as alusões, tão poderosas hoje na
poesia contemporânea e que há tempos já fora prenunciada pelo critico inglês I. A Richards,[7]
em BardoAmar se fazem igualmente presentes,
em que o antigo, i.e., o passado, em termos de estilos literários,
esteticamente deliberado aqui e ali, se
mostra fértil, provavelmente naquela
mesma linha de pensamento da poesia de
Manuel Bandeira (O itinerário de
Pasárgada) segundo a qual o poeta
apenas desejou prestar homenagem ao legado de ancestralidade lírica.
O texto “Advertência” (p.10),
finalmente, embute as pressuposições estéticas e escolhas do autor que, em
lentes ampliadas, indiciam uma proposta de poema na qual podem conviver estilos
e tempos diferentes (traços de pós-modernidade da lírica contemporânea) de linguagens
em diálogo sincrônico ou contemporâneo com as matrizes da nossa formação
estético-literária, num amálgama tenso ou irônico-humorístico em construções
ousadas que, ao longo do texto, se desconstelam pelas possibilidades fônicas,
rítmicas, léxicas e sintáticas, as quais me lembram um dado linguístico de
capital importância – a funcionalidade do fonema na formação da palavra, onde a
troca de um fonema por outro (paronomásia) resulta noutro vocábulo ou num todo
sem sentido na horizontalidade ou transversalidade do ato da leitura. O
resultado, além disso, muitas vezes
possibilita um inteligente, criativo e lúcido jogo semântico . Esta é uma das
chaves de leitura que o texto poético de Luiz Filho parece propor ao leitor de poesia atento.
A distribuição dos poemas no espaço do livro merece ainda um
comentário. BardoAmor se divide em
três partes, sendo que o primeiro
vocábulo “parte” sofre desarticulação gráfica de duas maneiras: a) o poeta
primeiro o grafa “PART...TE” e, em
seguida, o escreve “PAR-TE”. Ora, tanto numa forma anti-convencional da grafia normativa
portuguesa quanto noutra, as duas novas formas remetem, enquanto significantes,
para novos sentidos.
3. BARDOAMAR: TEMAS, LINGUAGEM/NS E
FORMA/S
A profusão grafemática que se espraia
por toda a extensão da 1ª parte,
incluindo poemas de diferentes extensão, que vão de 15 versos até poema de um só verso, reforça e reafirma as
intenções do autor para a importância atribuída à visualização, à maneira do
Concretismo de 56, com seus
correspondentes recursos verbovocovisuais
e bem assim a outros recurso
trazidos pelas vanguardas brasileiras (Poema-Processo, Poesia Práxis, Neoconcretismo).
Só que em Luiz Filho há um passo dado a mais,: o recurso de desenhos
de figuras e de objetos, ou partes do corpo humano não-figurativos, como
no enigmático poema
“cama suma” (p.21) introduzido
por traços geométricos (um retângulo encimado por linhas geométricas
figurando uma cabeça humana usando óculos e exibindo uma forma de boca. Sobre a cabeça (masculina?
feminina?), os cabelos (?) semelham raios elétricos O retângulo
inclui formas de ângulos, num dos quais existe um par da letra “y” (?)
simetricamente colocados um do lado do outro. O poema a que corresponde
àquele geometrismo vale mais pelo seu
ângulo semiológico do que pela sua apreensão lógico-analítica, onde a
palavra poética fala mais de si do que
pela captação da mensagem decodificada. Seria antes um mero jogo abstracionista pela sua
irredutibilidade cognitiva.
Na 1ª
parte, ao todo composta de 28 poemas, há que se notar, inicialmente, a forma gráfica da escrita manual impressa. Nesta antessala do
conjunto de poemas se estabelece o mood em que formas de linguagens vão
delimitar a fronteira dos dois temas dominantes desses versos: a viagem e o amor que simultaneamente lhes
vão insuflar vida como criação poética.
Entretanto, - convém
acentuar bem - aqueles temas
não são convocados arbitrariamente. Cumpre desentranhar-lhe - e aqui estou me reportando ao poema de
abertura, “BardoAmar” ( p. 18) que dá título ao
livro -, o alcance: a viagem e o amor
de que se cogita falar aqui não é a real, a empreendida em confortável embarcação. De resto, o índice
icônico – a ilustração de uma caravela –
bem reforça os meus objetivos de entendimento
do poema, consoante, mais adiante,
comentarei. Antes é uma viagem pelas palavras, ou seja, pela poesia, com todas as suas reverberações.
A viagem seria, para completar, a do encontro do amor, liame indissociável entre Arte e Sentimento. Sob um pano de fundo histórico, remetendo às conquistas portuguesas ultramarinas, na melhor hipótese à tona vem a epopeia lusíada. O poema é constelado de lexemas alusivos àquela viagem: “cenas líquidas”, “caminho”, “tormentas”, “amarras”, em fusão com “velozes”, “velas”, “a mar”, expressão esta última que também remete ao verbo “amar,” caso houvesse a aglutinação dos vocábulos, expediente gráfico muito comumem Luiz Filho.
A viagem seria, para completar, a do encontro do amor, liame indissociável entre Arte e Sentimento. Sob um pano de fundo histórico, remetendo às conquistas portuguesas ultramarinas, na melhor hipótese à tona vem a epopeia lusíada. O poema é constelado de lexemas alusivos àquela viagem: “cenas líquidas”, “caminho”, “tormentas”, “amarras”, em fusão com “velozes”, “velas”, “a mar”, expressão esta última que também remete ao verbo “amar,” caso houvesse a aglutinação dos vocábulos, expediente gráfico muito comum
Deste primeiro poema para os seguintes, a inflexão se dirige mais
fortemente para o terreno do sentimento amoroso, a começar do sugestivo poema
“faróis” (p. 18). O “eu-lírico” desse
poemito de três versos neste ponto
divisa um lugar procurado e
seguro. Já a esta altura, se constata um tipo especial de construção
sintático-poética que, no mínimo, me dá a sensação de
emprego latinizante, aquela construção
na qual a ordem dos termos
oracionais se faz entendida pela
subordinação às flexões das declinações.
Em outras palavras, a combinação dos termos oracionais rompe drasticamente a estrutura plausível de um verso tradicional, dir-se-ia de dicção romântica, parnasiana, simbolista ou mesmo moderna. E isso não é de modo algum motivado por figuras de construção – tropos - violentamente transgressoras da ordem direta do discurso referencial, como hipérbatos, anástrofes e sínquíses, empregadas, sobretudo, na poesia clássica e no Barroco. O estranhamento da construção em alguns poemas de Luiz Filho se situa mais no terreno do mimetismo rítmico-melódico da sintaxe poética. Talvez seu propósito seja mesmo o de propiciar o choque, o estranhamento, a desautomatização, a desestabilização nos hábitos usuais do leitor de poesia de corte conservador para adequar-se ao mood do poema à maneira de José Albano, Manuel Bandeira ou Da Costa e Silva, por exemplo, com seus conhecidos poemas trecentistas (Bandeira), os Vilancetes e Palimpsestos (Da Costa a e Silva) e os sonetos de sabor camonianos (José Albano).
Vê-se que se tem diante de nossos olhos um artista do verso sintaticamente hermético, criando opacidades em todos os sentidos e estratos da linguagem. Este experimentalismo arrojado, a meu ver, só possui uma única vantagem: transformar a dicção poética por meio dos sentidos, pelas sensações rítmicas, melódicas, pictóricas, causadas no leitor, lembrando de perto por vezes alguns preceitos dos simbolistas buscados em Verlaine: “De la musique avant toute chose.”
Em outras palavras, a combinação dos termos oracionais rompe drasticamente a estrutura plausível de um verso tradicional, dir-se-ia de dicção romântica, parnasiana, simbolista ou mesmo moderna. E isso não é de modo algum motivado por figuras de construção – tropos - violentamente transgressoras da ordem direta do discurso referencial, como hipérbatos, anástrofes e sínquíses, empregadas, sobretudo, na poesia clássica e no Barroco. O estranhamento da construção em alguns poemas de Luiz Filho se situa mais no terreno do mimetismo rítmico-melódico da sintaxe poética. Talvez seu propósito seja mesmo o de propiciar o choque, o estranhamento, a desautomatização, a desestabilização nos hábitos usuais do leitor de poesia de corte conservador para adequar-se ao mood do poema à maneira de José Albano, Manuel Bandeira ou Da Costa e Silva, por exemplo, com seus conhecidos poemas trecentistas (Bandeira), os Vilancetes e Palimpsestos (Da Costa a e Silva) e os sonetos de sabor camonianos (José Albano).
Vê-se que se tem diante de nossos olhos um artista do verso sintaticamente hermético, criando opacidades em todos os sentidos e estratos da linguagem. Este experimentalismo arrojado, a meu ver, só possui uma única vantagem: transformar a dicção poética por meio dos sentidos, pelas sensações rítmicas, melódicas, pictóricas, causadas no leitor, lembrando de perto por vezes alguns preceitos dos simbolistas buscados em Verlaine: “De la musique avant toute chose.”
O segundo poema,
“Poesia na morada do aluno” (p.19), pela desarticulação de sílabas e
pela rearticulação e ressignificação
daquelas resulta numa curiosa e original
paródia do conhecido e antológico poema
de Oswald de Andrade: “Amor/humor”, isto é, aquele poema no qual, abaixo do título (“Amor”) se segue um único
verso-poema. Não é gratuito o título do poema de Luiz Filho, que parece
inspirado no título da obra de Oswald de Andrade Primeiro caderno de poesia do aluno Oswald de Andrade (1927), do
qual consta o poema “Amor”
Na
reinvenção de Luiz Filho, o humor já
presente em Oswald de Andrade, ainda se radicaliza mais e cria novos
sentidos e possibilidades conceituais via humor, além de ser acrescido dos
próprios reforços metalinguísticos
(sobretudo os utilizados na publicidade como
fazem sugerir as letras em maiúsculas) e poéticos. As alterações
morfológicas, as justaposições, os sinais de
pontuação ( reticências, ponto de
exclamação, bem como
ainda o início de cada linha
poética em letra minúscula que,
pela primeira vez, encontrei no excelente
poeta português Vasco Graça Moura (1942-2014) a disposição espacial deslocada dos vocábulos
“amor” e “humor” não simétrica e com o primeiro verso
oswaldiano partido, demonstram a
perícia da apropriação para outras mudanças compositivas a partir de um poema-fonte.
A dupla leitura que o poema parodizado, no contexto fonológico, poderia assumir caso se pensasse da perspectiva co-particpante e lúdica do leitor ao trocar o fonema vibrante alveolar em maiúscula (“R”) pela lateral alveolar, redundaria num vocábulo que, subtextualmente,, nos salta à vista: “amolação,” numa permuta de fonema bem afim com o sentido geral humorístico-parodístico do 3 º verso do poema. Veja-se o poema na sua inteireza:
A dupla leitura que o poema parodizado, no contexto fonológico, poderia assumir caso se pensasse da perspectiva co-particpante e lúdica do leitor ao trocar o fonema vibrante alveolar em maiúscula (“R”) pela lateral alveolar, redundaria num vocábulo que, subtextualmente,, nos salta à vista: “amolação,” numa permuta de fonema bem afim com o sentido geral humorístico-parodístico do 3 º verso do poema. Veja-se o poema na sua inteireza:
a-MOR
HUMmm...
a MOR
ação!
Em outras palavras, o
terceiro verso adquire o duplo sentido pela injeção de novo semantema e de nova
desarticulação silábica entre o primeiro e o terceiro versos. Finalmente, o próprio título pode ainda ser lido no seu duplo sentido se
porventura o leitor co-participante
deseje justapor os elementos morfológicos do sintagma “na morada”: “namorada’,
criando, destarte, mais
um terceiro novo sentido: “ poesia,
a namorada do aluno, que dá pano
para muitas mangas interpretativas cujo epicentro é a arte poética em si.
O que
se segue a estes dois poemas é uma continuidade transgressora da estrutura
sintática de versos, aliada a outras
invenções de desarticulação silábicas, de inserções de desenhos esquemáticos,
habilmente ilustrados pelo autor. Tudo isso reitera um elemento diferenciador da poesia
do autor e que serve de sustentação aos procedimentos compositivos de seu
verso: a capacidade de produzir novos sentidos e de revesti-los de uma sintaxe
que lembra a construção latina, segundo já mencionei.
O fato mais inusitado do aspecto
de estranhamento do verso de Luiz Filho
é cantar o amor carnal tendo o cuidado de não chocar nunca o leitor nos seus
melindres moralistas, contudo produzir
erotismo em meio a rupturas de malabarismos de imagens que mais prevalentemente se pressentem do que
gratuitamente se apresentam ao leitor. De resto, o poema de Luiz Filho, antes
de tudo, e já o frisei, solicita a participação do leitor, constituindo, muitas vezes, um esforço
de co-autoria diante das direções apontadas no corpo do poema, segundo se pode ver igualmente no seu segundo livro, Ondehumano.
Um bom exemplo é o poema “conjogal”(p.27), no
qual o poema visualmente representa a forma de um jogo da
velha.É bem inventivo e constitui um do
que maior exige a habilidade
participativa do leitor. Naturalmente, esse tipo de poema visual, assim
como outros na extensão do livro, amealha o que de bom se legou das vanguardas
europeias e das suas derivações no Brasil: os grafemas, a espacialidade
horizontal, diagonal e vertical, a circularidade, o lado ideogramático que remonta à Antiguidade e, no Simbolismo
brasileiro, encontrou diversos cultures, inclusive Da Costa e Silva e Elmar
Carvalho, entre outros autores
piauienses.
O
mesmo poder-se-ia afirmar do poema
“misteros” (p.25).. Nele também o
grafismo que, no caso, é uma imagem preta, ou melhor, um desenho, nos conduz
visualmente para aquele conhecida figura da “Wife or mother-in-law” que W.E. Hill insere no American Journal of Psychology
e que está reproduzida por Antônio Gomes Penna[8]
na obra Percepção e aprendizagem. Se
olho para esta figura de um ângulo dado,
percebo, no desenho que introduz
o poema, uma figura de um objeto em forma fálica e meio em curva, com uma extremidade
lembrando uma cobra. Se, por outro lado,
observo de outro prisma o desenho escuro, vejo um perfil humano em
branco e com sua sombra escura ampliada.
O
título, vocábulo criado artificialmente
por aglutinação, provavelmente formado de “mistério” + “eros.”
aponta para o tema da iniciação sexual. A ambivalência, um das constantes da poesia de Luiz Filho, é a espinha dorsal de inúmeras formas lexicais ou fônico–estilísticas. Os quatro versos que
constituem o poema se revestem, na sua
disposição sintática, de um caráter de
descoberta (da poesia?) ou do dionisíaco
prazer do sexo.
Não
poderia deixar de comentar o último poema desta 1ª Parte, o da páginas 30-32, sob o título
“Amarração.” Formado de 12 estrofes
trissilábicas, me parece o mais belo
poema desta parte. Leio-o em voz
alta, como o faria com um poema de Poe ( conselho que me dera um professor americano de literatura do meu tempo de graduação ), e percebo seu
ritmo, sua melodia, sua musicalidade e, por acima disso, um misterioso halo
notálgico-amoroso. Poema feito de muitas camadas superpostas. Poema-síntese
servindo a muitas chaves de leituras.
No
campo semântico, no atrevimento de formas
verbais irradiando células semânticas, no tema do amor liricamente bem urdido, nas camadas
fônicas (aliterações), nas alusões intertextuais exógenas e endógenas, tendo
como ponto referencial o poema épico camoniano, a mitologia desconstruída pelos novos tempos pós-modernos, a referência
direta ao título do segundo livro do autor (dado intratextual), conforme se vê
no 3ªº verso da 9ª estrofe Poema pleno de alusões diretas, indiretas e desconstruídas nos
sentidos, e nas formas lexicais,
operando ressignificações
originais e inesperadas. “Amarração” reúne três temas: o amor, a linguagem e a poesia. Sua leitura é
pluridimensional e, como todo poema bem
realizado, não se exaure aos caprichos do leitor ou do critico.
A
poesia de Luiz Filho - já se pode até
aqui tentar extrair uma conclusão
provisória em suas linhas gerais -, é a de um artista do verso ao qual o leitor
deve estar continuamente alerta, particularmente do ponto de vista intelectual, dado que
sua dicção encerra pelo menos dois traços constantes: a surpresa e a duplicidade
ou multiplicidade semântica,
compreendidas nas ousadias sintáticas do discurso lírico, gerando sentimentos díspares e forte
humor e/ou ironia no seu universo
poético, num vigoroso e original
ludismo fonético, fonológico, visual, espacial e, acima de tudo, numa
predisposição infensa às decifrações explícitas e lineares
ao se tornarem objeto de exegeses
do seu espaço interno de expressão
significativa (mensagem, conteúdo, ideologia e cosmovisão) e sua exterioridade significante esteticamente formalizada
(retórica e todos os elementos constitutivos do verso, do poema ( estrofe,
aliteração, cadência, ambiguidades, mood,
ritmo, métrica (se houver), gênero
poético, tropos, estrutura, entre outros
artifícios da arte versificatória,
considerado esta na sua acepção
temporal mais ampla possível). A poesia de Luiz Filho tende, no geral, a
oferecer resistências e obscuridades inquietantes.
A 2ª
parte, se o leitor bem notar, a maneira de subtítulo, retoma invertidamente os
três últimos vocábulos do verso final da
“I PARTE”: “em mar fragil mar”. Nesta parte, o tipo de escritor muda para um outro tipo
impresso, não o manual impresso
da primeira parte.
Os
poemas da segunda parte reunidos em número de 27, aceleram ainda mais as estratégias de desconstrução
e, desta maneira, se vão impondo aos
olhos do leitor com toda a riqueza
provinda do lirismo amoroso, ainda que
continuadamente de natureza
carnal, transfundido em inovadoras
formas de elaboração poemática, em
ousadias metalingüísticas, metapoéticas,
aliando beleza de sentimentos a beleza de linguagem
O caráter de rupturas poéticas em Luiz Filho é traço diferencial entre ele e outros poetas de sua geração. Todas essas subversões
no verso operacionalizadas pelo seu
estro são na realidade modos de cultivar poemas medularmente modernos mas não radicalmente destituídos daquilo que
a grande herança da poesia antiga
lhe ensinaram e foi antropofagicamente
por ele assimiladas, sendo para mim este
o grande caminho que poetas que se querem
modernos deveriam buscar. Não ler e aprender
com o passado me parece uma
atitude leviana e contraditória a um só tempo.
No verso de Luiz Filho pressente-se o quanto sua natureza poética aqui e ali, dialoga com a tradição, seja com a Antiguidade, grega ou latina, seja com a poesia provençal, com o quinhentismo camoniano, com o Arcadismo, com Oswald de Andrade – presença nele forte -, com Carlos Drummond de Andrade, entre outras vozes da lírica brasileira e universal. P Poeta ubíquo, nas fontes do dialogismo atemporal nem por isso deixa de ser uma artista do verso bebido nos tempestuosos e voláteis tempos pós-modernos, antenando-se ciberneticamente e pondo no seu verso a experiência e o contato dos meios eletrônicos cada vez mais sofisticados e em constante mutações plurifuncionais
Inserido de corpo e alma na pós-modernidade, a poesia de Luiz Filho planta-se no tempo presente, numa atitude que poderia repetir a natureza orgânica do poeta Drummond como o mais representativo artista do verso que tomou para si o presente, na poesia e na prosa, como matéria primacial de sua poética. Instalando-se no tempo presente, o poeta Luiz Filho se deixa impregnar do “aqui e agora,” primado do instante, no afã de se afirmar e firmar o seu objeto poético feito da matéria humana e dos produtos e conquistas do nosso tempo desagregador
Na 2ª Parte,tudo se torna possível em termos de experimentalismos, nos quais as palavras como que assumem o controle de si mesmas, espécie de silêncio do verbum, onde as palavras são capazes de criar e recriar sentidos insuspeitos em códigos cifrados. Instaura-se, agora, o reino dos hermetismos e dos malabarismos obscuros à Mallarmé, combinando, segundo já ressaltei, características simbolistas com ludismo, ironia, humor e subtextos indevassáveis a olho nu.
Nesta instauração de avanços ousadíssimos do discurso poético, Luiz Filho se torna um virtuoso. Entretanto, a persistir nestas estratégias de virar pelo avesso a função poético-comunicativa, ele se arrisca a perder-se no puro hermetismo indesejável ( e aqui estou com José Guilherme Merquior ao falar da poesia humilde de Bandeira) a um poeta que aspira ao entendimento sem abrir mão da qualidade e originalidade dos versos.
No verso de Luiz Filho pressente-se o quanto sua natureza poética aqui e ali, dialoga com a tradição, seja com a Antiguidade, grega ou latina, seja com a poesia provençal, com o quinhentismo camoniano, com o Arcadismo, com Oswald de Andrade – presença nele forte -, com Carlos Drummond de Andrade, entre outras vozes da lírica brasileira e universal. P Poeta ubíquo, nas fontes do dialogismo atemporal nem por isso deixa de ser uma artista do verso bebido nos tempestuosos e voláteis tempos pós-modernos, antenando-se ciberneticamente e pondo no seu verso a experiência e o contato dos meios eletrônicos cada vez mais sofisticados e em constante mutações plurifuncionais
Inserido de corpo e alma na pós-modernidade, a poesia de Luiz Filho planta-se no tempo presente, numa atitude que poderia repetir a natureza orgânica do poeta Drummond como o mais representativo artista do verso que tomou para si o presente, na poesia e na prosa, como matéria primacial de sua poética. Instalando-se no tempo presente, o poeta Luiz Filho se deixa impregnar do “aqui e agora,” primado do instante, no afã de se afirmar e firmar o seu objeto poético feito da matéria humana e dos produtos e conquistas do nosso tempo desagregador
Na 2ª Parte,tudo se torna possível em termos de experimentalismos, nos quais as palavras como que assumem o controle de si mesmas, espécie de silêncio do verbum, onde as palavras são capazes de criar e recriar sentidos insuspeitos em códigos cifrados. Instaura-se, agora, o reino dos hermetismos e dos malabarismos obscuros à Mallarmé, combinando, segundo já ressaltei, características simbolistas com ludismo, ironia, humor e subtextos indevassáveis a olho nu.
Nesta instauração de avanços ousadíssimos do discurso poético, Luiz Filho se torna um virtuoso. Entretanto, a persistir nestas estratégias de virar pelo avesso a função poético-comunicativa, ele se arrisca a perder-se no puro hermetismo indesejável ( e aqui estou com José Guilherme Merquior ao falar da poesia humilde de Bandeira) a um poeta que aspira ao entendimento sem abrir mão da qualidade e originalidade dos versos.
Não lhe posso sonegar a invejável tendência à inventividade, à disponibilidade para novas formas de diálogo com o leitor, com
a poesia e consigo mesmo. Não é possível
não se comover com os versos do
poema “amamos” (p. 40):
Amamos
quando não se-sentem
passado & presente
o verbo nos-arremessa ao
mágico
neutralizando nosso
espaço de sujeitos
ao acaso & próximo...
só
o advérbio mente ao tempo
Ou não se divertir com
o poema “Caro Prato” (p.43):
Caro Prato
Sem nenhuma etti ..........................Queta
O amor fugiu do card......................Ápio
E quem pagou o
p.............................Ato?
Ou essoutro com
ressonâncias oswaldianas (p. 35):
Voz nua à lua nativa
contrassopram em mim
lembrançass de ti
a selvar-me salvagem
como tupis amórfagos
ritos em vocação nova:
Catiti!
[1] O
:NN NOTAS:
OL * O ensaio acima é uma reprodução, revisada, corrigida e melhorada das quatro partes sé que já foram postadas neste Blog. Dei-lhe, agora, uma feição mais acadêmica.
:NN NOTAS:
[1] OLIVEIRA, Luiz Filho de. BardoAmar. Teresina: Edição do Autor, 2003.
[1]. ________. Ondehumano.Teresina:
Nova Aliança, 2009.
[1] BURGUESS
WILSON, John. English literatura: a survey
for for students. 9th impression. London : Longman, 1970., p. 11.
[1] CASTRO, Sílvio. História
da literatura brasileira. Vol. 3. Lisboa: publicações Alfa, 1999, p. 256.
[1] Idem , ibidem.
[1] CASTRO, Sílvio.
Op. cit., p.256-257.
[1] RICHARDS, I. A. Princípios
de crítica literária. Trad. Rosana Eichenberg, Flávio Oliveira e Paulo Roberto do Carmo. Porto Alegre:
Globo/Universidade de São Paulo, 1967,
p. 181-185.
[1] Apud
GOMES PENNA, Antônio. Percepção
e aprendizagem. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Fundo de cultura, 1968,
p.14.
OL * O ensaio acima é uma reprodução, revisada, corrigida e melhorada das quatro partes sé que já foram postadas neste Blog. Dei-lhe, agora, uma feição mais acadêmica.