domingo, 29 de junho de 2014

A Fifa, a Copa e outros prolemas

                
                            
                                                                  Cunha  e Silva Filho


              Moro Rio de Janeiro há cinquenta anos. Já vi muita coisa,  boa e ruim, nos diversos  aspectos em que se queira colocar  o que tem atravessado  este Brasil,  belo na paisagem, difícil na condução de sua  política, nos grandes desafios que teimosamente  continuam sem solução, nas descontinuidades de seus  principais  problemas: desmoralização da coisa publica,  corrupção  crônica que se vai naturalizando, violência  insolúvel,  transporte ruim, educação pública municipal e estadual do ensino fundamental e médio ainda bem deficiente, saúde precária, bons  hospitais particulares só para a elite, segurança  do indivíduo por tempo determinado, só para inglês ver,  ou melhor,  para turistas estrangeiros  que vieram  acompanhar suas seleções em alguns estados brasileiros.
                           Perguntando, em dia de jogo  de seleções  estrangeiras,  a um  soldado da Polícia Militar do Rio de Janeiro por que eu não poderia entrar por uma rua  pela qual  costumo  passar a fim de dar caminha em volta do Maracanã, ele me  respondeu que por ali não poderia, acrescentando:  “São ordens da FIFA.” Então,  lhe  respondi, em tom de  desabafo e  indignação patriótica, como se eu  tivesse assumindo  o papel quixotesco    do   personagem de Lima Barreto - o   tragicômico  Policarpo  Quaresma: “Mas a Fifa é quem dá ordens agora no país? “Cadê meus direitos de ir e vir?”  O militar,   com ar sorridente, não me disse mais nada e eu tomei meu rumo.
O país da Fifa é  uma quarentena alegre e festiva – não há como  não concordar  com  a alegria que paira no ar  brasileiro, sobretudo agora com  a vitória do Brasil sobre o Chile. Vitória suada, arrastada, sortuda porque conquistada pelo acaso dos  pênaltis. A manchete hoje da Folha de São Paulo resume o resultado do jogo nestes termos desoladores: “Júlio César e trave salvam  Brasil  de vexame em casa.”
O país, até no  futebol,  está desconcertante. E não é pela força  grande que os torcedores  dão  de coração e alma  abertos tanto os  entusiastas  do futebol quanto  os  torcedores apenas  de Copa Mundial. Embora a nossa seleção não seja a dos sonhos  dos brasileiros, não é hora de  abandonar os nossos  jogadores, dentre os quais se   destaca a figura de um star, de um craque,  o nosso Neymar Jr. Deus sabe que, diante da tela da TV, acompanhando  os jogos  de nossa seleção, tenho   me esforçado  para   torcer e até me emocionar, derramando lágrimas,  quando está em jogo   o destino da nossa seleção.
É neste período dos  jogos da Copa  que devemos  dar todo o  nosso apoio  aos nossos atletas, esquecendo  até mesmo  algumas  fraquezas  de desempenho  dos jogadores. Por cima dos  problemas brasileiros,   há uma  voz interior, mais forte do que nós,  que nos   arrasta para manifestarmos  o nosso apoio e os nossos desejos de que  iremos  ganhar  a   Taça. É curioso  esta metamorfose que  ocorre em tempos de Copa Mundial de Futebol,  principalmente. Chamo a isso o sentimento da pátria, do amor  ao solo  brasileiro, à nossa língua, ao que temos de bom, ao que podemos ainda  construir.
Em síntese, isso  é patriotismo, sentimento  que  fala mais alto do que as misérias  que não podemos nem devemos   deixar de  denunciar  e reprovar, exigindo constantemente  melhorias para nosso país  cansado  de tantas    mazelas que nos envergonham  e nos entristecem a ponto de  perdermos as esperanças  em nossos políticos em todos os níveis de governo.
Se o analfabetismo  que ainda  existe no país  é um prato cheio para  os  que se elegem graças  ao clientelismo histórico  de nossos  políticos, e  à `irresponsabilidade de nosso  eleitorado  que dá votos para  picaretas  que se aproveitam do que  conquistaram no meio  artístico  de baixo nível ou em outros setores  de atividades que lhes dão  visibilidade  e fama, for  debelado  da cultura   nacional, então é possível  ter-se alguma  esperança de que   teremos  melhores tempos para o  Brasil.
O país será melhor em todos os sentidos  quando   a consciência de nossa    cidadania atingir  um nível razoável de visão  imparcial   de nossos problemas mais agudos: educação, saúde,  trans porte e segurança.  A sociedade brasileira precisa de encontrar  um caminho que,  conquanto tenha  divergências  ideológicas,  possa  levá-la a  uma convivência solidária, se não em  completa  comunhão de ideias, pelo menos  a um  estágio de relativo equilíbrio entre  todos  os níveis  de classes existentes,  sem preconceitos,   nem   prepotência,  nem   ambições desmedidas e individualismos  reprováveis.
Este  relativo  equilíbrio a que  me refiro é exequível. Pode ser alcançado. Só depende de forças  interiores, de transformação  moral  e ética e de um componente  que a pós-modernidade e   épocas  passadas não souberam  aplicar na práxis da vida  civilizada: a dimensão religiosa sem fanatismos nem cegueiras. Os fanatismos  não veem  senão seus próprios   princípios    ou dogmas obedecidos  na teoria,  nos rituais, ou nos livros sagrados, tanto  no mundo  ocidental quanto  oriental.
Essa dimensão espiritual, “the missing  dimension,”   como  a definia  um pastor  americano há muito falecido, é que está  faltando, com urgência, à  população  da Terra,  agora devastada,  poluída,   maltratada. Planeta  judiado  pelos homens,  pelos governos,   pelas pessoas. As consequências já estão à vista: enchentes devastadoras,  estranhas    mudanças climáticas,  efeito estufa,  degelo das calotas polares,  aumento  do nível dos mares –  este último um gravíssimo  problema  que pode rondar  os continentes  habitados  do Planeta. Eis a questão.



               

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