Cunha e Silva Filho
Não vá o leitor pensar que sou um expert em futebol. Longe
disso. Creio que o interesse pelo futebol no Brasil é algo entranhado como o samba, o carnaval, as mulheres brasileiras.
Quando
adolescente, lá em Teresina, na Rua Arlindo Nogueira esquina com a São
Pedro, tudo poderia ter sido diferente se, nas peladas, do lado da Arlindo
Nogueira, eu me saísse melhor nos chutes
e nos dribles. "Qual nada!” Mamãe era a primeira a lembrar, tempos depois, quando já era adulto, que eu, não aguentando o lado mais
violento do futebol, de repente
saía do jogo quase chorando por ter levado alguma pancada mais forte na
canela. Não gostei desse comentário de mamãe,
por que me expunha aos risos de colegas, amigos e parentes. E eu não suportava tais confidências. Mexia com os meu brios de adolescente . mas deixemos isso pra
lá que, do contrário, iria
transformar-se em desabafos à maneira de Graciliano Ramos.
Há pouco, fui
chamado pela minha esposa para colocarmos a bandeira brasileira na grade protetora da varanda do meu
apartamento. O meu ato de escrita, pode se chamar com rigor, foi uma pausa
no tempo real da narrativa, ou seja, o real se intrometeu na crônica, o que me faz lembrar daqueles dois elementos da narrativa - o interno e o externo - componentes “dissociados,” expressão do crítico Antonio Candido, que, segundo este mesmo critico, se tornavam
unificados já que o externo (a realidade
empírica, os fatores sociais, históricos, biográficos
etc) se tornava interno, quer dizer,
passa a fazer parte integral da compreensão estrutural da ficção,
sem os receios de subordinar-se ao
interno ( a linguagem literária, "sistema semiótico secundário", a história inventada, as personagens,
o enredo, o tempo, o espaço, os símbolos, a imagem, a metáfora, o ritmo, os recursos retóricos, tão prezados pelo pensamento crítico formalista dos anos setenta, oitenta do século passado
Depois dessa digressão cansativa ao leitor que espera
alguma fato surpreendente, leve ou poético no gênero da crônica,
quero-lhe dizer que há uma hora atrás estive quase
a dar uma volta nas pistas de ciclistas
do belo Estádio do Maracanã – delícia dos turistas nacionais e estrangeiros, principalmente daqueles tão aficionados ao futebol e desejosos de conhecer o
mundialmente famoso estádio. Com um sol forte pros dias de um mês mais geralmente frio, o
estádio estava em festa, com gente
circulando por toda a parte externa daquele “santuário" do futebol brasileiro.
O Maracanã está pronto, por dentro e por fora, a fim de receber, no
domingo duas seleções (deixe-me consultar a tabelinha da Copa do Mundo-20140. Ah,
aqui está: no domingo, amanhã: Espanha e Chile. Não irei assistir ao jogo in loco.
Verei pela TV. O receio é que amanhã possa
haver manifestações contra a Copa, digo, contra os gastos governamentais na construção de estádios ou
em reformas de estádios. Fora outros gastos derivados das exigências da toda poderosa FIFA. Esperemos que tudo ocorra
bem dentro do Maracanã e fora dele.
Sou informado
pela TV que o Brasil está melhor
no que tange à vida dos brasileiros. Contudo, essa declaração da imprensa internacional nunca espelha a verdade mais funda, i.e., a dos brasileiros que tanto ainda sofrem pelas graves deficiências
já tão conhecidas dos leitores. Continuam
morrendo pessoas por falta de assistência
médica em toda a parte do país. Os transportes de massa ainda precisam
dar conta da demanda crescente das megalópoles.
A escola pública (estadual e municipal – é bom que lembremos isso - , está ainda em baixa, tanto na
valorização dos professores quanto na eficácia
dos ensino oferecido. A violência sem
freios, a impunidades que lhe é corolário
determinante, o tráfico,
as drogas, as milícias, a delinquência
de menores e adultos continuam livres e fagueiras.
Essa dimensão do país não
pode ser jogada debaixo do tapete, mas
denunciada sempre e sempre aqui e fora de nossas fronteiras. E, last but not least, a corrupção
da politicagem, que parece não
ter fim. Esta imagem podre do Brasil tem que ser levada em conta em qualquer
análise da sociedade brasileira.
Não queremos um país dividido entre riquíssimos e miseráveis, que ainda os há pelo Brasil
afora. O que não se pode suportar, sem protestos e indignação, é passivamente ver jornais
ou pesquisas de estatísticas no
exterior passarem uma imagem edulcorada de meu país. Só quem vive o dia-a-dia
do povo brasileiro pode avaliar o que aqui se faz, como se faz e por que se
faz. É preciso ter vivência suficiente
para fazer-se uma estimativa sobre as condições e os vários aspectos da realidade nacional. O
olhar do estrangeiro nem sempre confirma a experiência de nosso quotidiano e de nossas mazelas em todos os sentidos.
Não podemos
perder a onda da bola. Tentar decifrá-la é matéria de quem
ama o país de verdade e não na limitada
forma de individualismo burguês refestelado, bem nutrido, como já afirmei alhures, em poltronas macias, alienante, hipócrita e mistificador.
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