quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Os super-salários: a volta dos marajás do Poder Legislativo





                                               Cunha e Silva Filho


            Não há conserto para o Brasil. Um  exemplo danoso vem, agora,  de um  dos  três poderes, justamente aquele  que deveria  ser o mais  rigoroso com a decência  pública: o Supremo  Tribunal Federal (STF) Um membro do Supremo que,  por sinal,  foi  escolhido  pelo  ex-presidente Collor,   concedeu uma liminar  com a qual  funcionários da Câmara  dos Deputados, que haviam  tido seus  faraônicos   salários  reduzidos para patamares  mais modestos,  recuperaram, agora,  os mesmos  altíssimos  vencimentos.    
        Se o ministro do STF argumenta que apenas cumpriu  a lei  constitucional,  então   esses funcionários  foram  reabilitados   financeiramente de forma  legal. Porém,  não sabe o ministro que  o legal não é muitas vezes  justo. Não é correto, é imoral. E a Constituição Federal, posto  seja  o  instrumento  maior  dos direitos e deveres do cidadão,  não é obra de inspiração  divina,  mas obra  humana e,  portanto,  falha,   incompleta,  injusta  e passível de modificações e emendas que, à medida que o tempo  passa,  tem que ser atualizada com  o  objetivo  precípuo de  proteger   a sociedade.
  O ministro em causa  cometeu um  tremenda  injustiça com a cidadania  brasileira, principalmente se levar-se em conta o quanto  ganha um funcionário  público federal, um professor universitário, um professor do ensino médio,  um médico, um cientista, um pesquisador em diversas áreas do conhecimento humano, com  diplomas de doutorado e até de pós-doutorado. Nem que estejam no último nível de atividade,  esses profissionais, que tanto bem fazem ao Estado  brasileiro e à sociedade, estão longe de receber vencimentos  estratosféricos à custa do Erário Público.
Quem são esses  privilegiados,  o que fazem  pelo  bem  da nação,  eles que  trabalham  em instituições  representativas  do povo e que,  por isso,  têm que dar  exemplo de  virtudes, de equilíbrio e de  austeridade. A mídia noticiou  o fato, entrevistou  o homem comum na rua e a resposta  foi  sempre de indignação  contra  atos dessa  espécie. Nenhum  governo  se faz respeitado   quando  permite  que regalias  deste jaez aconteçam. Os privilégios  excessivos   atribuídos  financeiramente a funcionários  marajás  no país da impunidade, da violência extrema e da desfaçatez  de políticos só infundem no espírito da nação  sentimentos de  rancor,  de desesperança e   de desprezo  pelas  instituições  governamentais.  Ora,  salários  de vinte,  trinta, quarenta,  cinquenta mil reais  e até mais  só  provocam  repúdio  total  do homem brasileiro  que  trabalha  duramente  para, no final do mês,  receber  minguados  salários  e pensões  miseráveis  que não  lhes permitem  nem mesmo   comprar remédios para a a saúde alquebrada e uma  velhice  cheia  de  carências de toda a sorte.
Um país que age assim não pode ser levado a sério, nem  pode atingir  um elevado grau de civilização  e de cultura. Não conheço  tempos tão  frívolos quanto  os que  enfrentamos  atualmente  no  Brasil. Alguém  pode rigorosamente chamar   de democracia  a um país  que é tão  desigual  com seus filhos?  A democracia  se arranha profundamente  quando  nela  persistem  os   sempiternos   desmandos  governamentais e  abusos  no uso  da leis. A farra dos salários  astronômicos de uma  casta   privilegiada  de funcionários  encravados nos três poderes  de Brasília é um  chute na cara  dos cidadão  brasileiros que constroem esta nação.
Acabou-se o tempo da história  republicana brasileira  em que, no Senado e na Câmara dos  deputados, pontificavam  congressistas  competentes, éticos e homens de  palavra,  políticos de vocação   e voltados  para  o aperfeiçoamento do Estado  brasileiro,   ministros  do STF  e de outros  setores  federais que se distinguiram  como  figuras  de grande reserva moral, com se dizia  antigamente.A política brasileira  ficou  confinada,  em grande parte,   a  politiqueiros,  arrivistas e aventureiros  que, no Planalto,  se instalam  para   se locupletarem e se aproveitarem  das  mordomias  de seus mandatos e da influência  de suas funções. Daí tantos  escândalos surgidos na política  nacional  em conluio com  o setores  privados resultando  nos  mensalões da vida. 
Enquanto  persistirem  os altos índices  de  analfabetismo puro ou funcional, de escolaridade de baixa qualidade em geral,  de  falta  de consciência  política  e de cidadania,  enquanto  votos  forem   dados a candidatos  demagogos, populistas, despreparados  para  suas funções  de  alta  responsabilidade  cívica, enquanto o voto  continuar sendo  “comprado,”   "traficado,"  malbaratado  pela  ausência de  patriotismo  da sociedade, elegeremos  políticos  sem vocação nem  dignidade - oportunistas que, ao final dos mandatos,   deixam  atrás de si   a mancha nauseabunda  da corrupção,  do desrespeito  ao  povo, do  autoritarismo e da     indignidade  popular. Isso não é nem será  nunca  o que  entendemos  como  democracia  no sentido mais  genuíno de “governo   do povo,  pelo o povo e  para o povo.”  (Abraham Lincoln,  Discurso em Gettysburg, a 19 de novembro de 1863)
A história mundial no passado e no presente tem  demonstrado que as democracias  não se sustentam  quando  se sobrepõem  à  vontade da soberania  popular,   quando  governantes  esquecem  o  princípio  fundamental, que é  governar  afinado com as  aspirações da sociedade  unida, coesa,  solidária.  As democracias  só caem  quando  a sociedade  se divide demais,   provocando   confrontos   ideológicos, econômicos e dissimetrias  exageradas de  renda individual na sociedade, as quais     podem se encaminhar  para  perigosas   lutas   de classes e  profundos fossos   sociais.     A democracia  pode cair  ainda   quando, no centro  do poder,    se aninham prerrogativas de abusos  e regalias palacianas, que custam  milhões aos cofres  públicos em flagrante   desrespeito e indiferença   às condições precárias  da vida  social. O Brasil está vivendo  esta    realidade e não está dando a devida atenção  a uma  possível  dura  resposta das  urnas que se aproximam minuto a minuto.


                         

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