domingo, 28 de abril de 2013

O homem que não queria morrer




Cunha e Silva Filho



Era jovem ainda o Hadesiano, assim mesmo escrito. Não tinha mais do que trinta anos, mas vivia afirmando que morrer não estava nos seus planos,.não. Antes viver, viver como pudesse, viver ao máximo ainda que fosse no seu mundo pequeno e sem graça, viver sem pactos, sem essa conversa de perder a alma para ganhar a vida ou a eterna mocidade e sem ter que recorrer ao expediente macabro de Dorian Gray ou à ambiguidade do pacto do narrador Riobaldo ou às implicações fáusticas de Thomas Mann. Viver no seu epicurismo de pobre e ambulante semi-letrado. Viver a vida simplesmente vivida, sem horizontes, sem grandes sonhos, sem grandes esperanças. Viver apenas...

Por isso, agia como se escondesse eternamente da morte, não pegava avião, não pegava ônibus interestadual, nada. No seu bairro, que não era pequeno, preferia passar a vida só caminhando pelas ruas. Conhecia-as de cor e salteado e delas sabia os nomes todos, ainda mesmo aqueles escritos em língua estrangeira.

Era assim Hadesiano. Se alguém lhe viesse dar uma sugestão para se tornar igual a todos a respeito da condição mortal do ser humano lá vinha ela com sete pedras na mão, esbravejando aos quatro ventos que essa sugestão melhor seria dada para quem professasse alguma religião cristã, que, para pacificar os ânimos dos fiéis, inventou que há vida depois desta. Com ele, não, não se criava este princípio. E não havia mesmo ninguém que o dissuadisse de suas excêntricas ideias, nem padres, nem pastores, nem espíritas, nem  seguidor de qualquer crença afro-brasileira.

Hadesiano, assim, ia vivendo como podia, vendendo pipoca no seu carrinho, na praça principal de um populoso bairro carioca. Tinha-se afastado dos pais porque não fora compreendido, questão de temperamento dele muito individualista.

Uma outra ideia que levava muito a sério era que jamais iria se casar. Casamento, nunca! Só pros que não pensavam o quanto era dura a vida de casado, com filhos e, depois, netos. Isso só lhe custaria dissabores, brigas em família, escândalos etc.

Os pais dele já se haviam acostumado com a decisão de sair de casa e morar sozinho, lá no centro, perto da Avenida Mem de Sá, num quitinetezinho que fazia parte de um velho prédio. Gostara sempre do centro do Rio, local ideal para ver muitas coisas de dia ou de noite. Seu lugar de trabalho, vendendo pipoca naquele bairro perto do centro, era-lhe  a menina dos olhos. Bem asseado em  tudo, a roupa de trabalho, o avental branco, o boné branco, a barba feita, o cabelo bem penteado. A pipoca feita na hora, quentinha, saborosa. O elogio dos clientes, sempre bem tratados, mas sem liberdades, nem sorriso encenado. Seu cabelo liso e escuro brilhava como se nele colocasse a brilhantina dos anos cinquenta e início de sessenta.

Tinha pouquíssimos conhecidos. Amigos, não, que não era de confiar em ninguém. Toda amizade lhe soava falsidade. Não acreditava em nada. Não tinha religião. Entretanto, sozinho, na hora de ir pra cama  de solteiro (presente de sua mãe), Hadesiano sonhava com espíritos maléficos que vinham do desconhecido querendo devorar-lhe as entranhas. Eram terríveis, parecendo animais medonhos com asas e sem face. Eram, contudo, tão reais no sonho que, ao acordar, seu coração batia tão forte e acelerado como se fosse explodir, tamanho era o medo que dele se apossava naquele instante de despertar de madrugada. Sentia, às vezes, um calafrio de meter medo em qalquer valentão.  Olhava para a sala semi-iluminada por um abajur, no entanto, não via ninguém. Eram sonhos mesmo, concluía aliviado.

Hadesiano, que não queria  morrer, um dia, foi encontrado sem vida, em  adiantado estado de decomposição. A porta do apertado quitinete tivera que ser arrombada pela polícia. Os vizinhos do prédio não o conheciam, apenas o viam entrando e saindo. Ele não gostava de falar com quem morava no mesmo prédio. Uma semana depois, o pai, lendo um jornal popular do dia, soube de sua morte. Já havia sido enterrado no Catumbi por um conhecido com quem se dava um pouco, morador de um prédio também velho, vizinho ao seu. Este conhecido atendeu a um pedido de Hadesiano. Uma mensagem escrita a tinta numa meia folha de papel A4, encontrada em cima de uma mesinha perto da cama. O conteúdo da mensagem era muito claro, escrito naquela letra dele bem desenhada e numa frase dizia tudo: “ Não avisem nada a ninguém, principalmente à minha família. 

Não deixava de ser bizarra esta sua disposição que valia como palavras de um testamento. Uma contradição, diria algum leitor. Hadesiano se declarava um ateu convicto, inabalado. Somente a vida pra ele tinha valor. Daí todo o seu medo de morrer, de evitar a morte por todos os lados. Cuidados extremos tinha ao andar pelas ruas, ao atravessar uma rua. Parecia que havia perigo em tudo ao seu redor. Não viajava para nenhum outro estado brasileiro com medo de morrer em acidente. Nisso coincidia com o jurista Rui Barbosa: “A morte nos cerca de todos os lados.” Hadesiano era um cara que não queria morrer, contudo, a morte o perseguiu até no próprio nome de batismo. Hadesiano era a própria morte.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

A ausência de Neuza Machado



Cunha e Silva Filho





Conheci Neuza Machado quando, de 1999 a 2006, fui lecionar no curso de Letras da Universidade Castelo Branco, em Realengo, Rio de Janeiro. Não me lembro bem como foi o meu primeiro contato com ela. Só sei que, de repente, já éramos bons colegas no ambiente universitário. Ela lecionava teoria literária; eu, literatura brasileira e, depois, língua inglesa, cheguei mesmo a lecionar também, e por um semestre, literatura americana.

Me lembro bem de que, uma noite, após uma reunião geral com o reitor, saí do auditório e fui para a cantina, lugar de encontro de professores e alunos e lá Neusa me perguntou se eu tinha alguma facilidade de conseguir um editor para um livro dela pronto a ser publicado. Por um ou outro motivo, ela pensava que eu tivesse assim bons contatos, o que não era o meu caso. Ficamos amigos e dessa amizade que cresceu mais com as muitas vezes que, no Centro do Rio, por mera coincidia,  nos encontramos  tomando o  mesmo ônibus para Realengo.

Foi nessas vezes que comecei a conhecê-la melhor. Nessas idas de ônibus, cujo percurso durava uma hora ou mais, dependendo do trânsito, e em ônibus lotado, aproveitávamos para falar principalmente de literatura, de escritores, dos tempos de graduação na Faculdade de Letras da UFRJ, dos bons professores e das dificuldades inerentes aos tempos de estudante.  Assim,  ia formando minha opinião sobre esta colega que não chegou a ser amiga íntima, mas cujo convívio profissional no mesmo ambiente de trabalho foi suficiente para que sentisse admiração pela sua formação intelectual e seus anseios de estudiosa e pesquisadora sobretudo na sua área de maior interesse, a teoria literária.

Neuza era mineira e tinha muito do que se fala de bem dos mineiros.Por outro lado, a sua personalidade simpática e brincalhona por vezes escondia algo de um temperamento muito crítico e rigoroso com o que fazia na sua vida profissional. Sua visão do fenômeno literário era penetrante, muito seletiva, numa abordagem metodológica que se orientava pela análise semiológica, por ela declaradamente haurida da experiência que teve nas aulas de Anazildo Vasconcelos da Silva, professor da Faculdade de Letras da UFRJ. Na sua dissertação de Mestrado, O narrador toma a vez (Rio de Janeiro: N. Machado,  2006,  120 p.) em que discute o conto “A hora e a vez de Augusto Matraga”, de Guimarães Rosa, depois editada por conta própria, em 2006, Neuza deixa bem nítida essa inclinação às aproximações semiológicas (Greimas, Barthes, Anazildo Vasconcelos da Silva e outros) e sociológicas (Goldaman, Luckács, Weber e outros) do fenômeno literário. Percebe-se que neste estudo ela mobilizava um instrumental teórico diversificado, pluralista, no qual não havia nenhuma prevenção dogmática e radical na interpretação da obra literária.

Não li sua tese de doutoramento, a qual da mesma forma, deu continuidade e aprofundamento à obra de Guimarães Rosa, porém, nesse estudo me recordo bem de que se serviu largamente do pensamento de Bachelard que me parece deve ter sido a sua viga-mestra na condução do desenvolvimento da sua tese. Penso que  quem a orientou foi o professor Rogel Samuel, um escritor de cuja obra Neuza iria se ocupar com dedicação e competência, tornado-se provavlemente a sua maior intérprete e divulgadora.

Neuza foi ficcionista, além de crítica e ensaísta. Na sua coluna Letras, no Entretextos, deixou páginas que demonstram sobejamente sua capacidade de análise e sua maneira original de absorver o que a sua formação lhe propiciou em anos de estudos,  leituras e de experiência docente. Não podemos negar a sua vocação para o debate teórico no sentido mais elevado do termo.

Neuza era uma mulher batalhadora, sobretudo no que pretendia fazer no domínio intelectual, Percebendo claramente quão é espinhoso se publicar no país através das grandes editoras, ela não perdeu tempo, criou a sua própria “editora”, NMachado,  cuidou de todos os trâmites burocráticos e saiu vitoriosa: editou sua dissertação de mestrado e possivelmente alguns outros trabalhos. Ela cuidava praticamente de tudo para que seus livros viessem a público. Era, pois, uma determinada.

Respeitada por seus pares na Universidade.Castelo Branco, mulher corajosa ao defender seus pontos de vista, sobretudo no campo teórico, Neuza Machado antes de ter lecionado naquela universidade, também ensinou na Universidade Estácio de Sá, na Universidade Sousa Marques e, por um ano, saindo do Rio de Janeiro, lecionou na Universidade Federal do Pará ou Amazonas, não sei bem. Anos antes, participou de um congresso em Paris ao lado de Rogel Samuel, de quem sempre foi uma admiradora e amiga. Me recordo de que, na Castelo Branco, adotava livros de Samuel Rogel, que, de resto, foi seu professor na Faculdade de Letras da UFRJ, no tempo em que funcionou na Avenida Chile antes de se transferir definitivamente para o campus do Fundão.

Uma outra lembrança que me ocorre de Neuza, durante nossas conversas regadas a boas gargalhadas que às vezes surpreendiam os outros passageiros do ônibus que nos levava para a Universidade Castelo Branco, era a sua disposição de sugerir boas dicas naquela época em que eu estava escrevendo minha tese de doutorado. Eram sugestões inteligentes que me apontavam dimensões novas ao meu estudo do conto de João Antônio ( 1937-1996).

Tenho, sim, saudades de nossas conversas, nas quais Neuza me superava nos inúmeros relatos de fatos passados de sua vida de universitária,de professora, alguns pitorescos, alguns divertidos, outros de natureza amorosa, sobre situações que presenciou e vivenciou no mundo acadêmico que se tornariam mais segredos, casos particulares do mundo dos vivos e do tumultuado relacionamento entre as pessoas, confidências não publicáveis do ponto de vista de gaurdar segredo. Era uma ótima causeuse  a querida Neuza Machado.

Ela sabia de sua importância, de seu valor, de sua capacidade como profissional aberta e disponível ao universo do saber e da inteligência. A notícia de seu falecimento prematuro me deixa menos feliz apesar do meu afastamento há sete anos da Universidade Castelo Branco e sem ter tido praticamente mais  contato com ela. A distâcia, nas grandes cidades, muitas vezes nos separam uns dos outros.Seus alunos sem dúvida hão de sentir muito a sua falta, a sua palavra alegre, muitas vezes brincalhona e educadamente irônica. À sua família e amigos envio daqui os meus sentimetos de muito pesar.



quarta-feira, 24 de abril de 2013

BRAZIL'S OVERVIEW CORNER: Violence: Brazil's number one problem



Cunha e Silva Filho


My writing again about the same problem is not for lack of a theme to be dealt with; it is simply a matter of a regrettable and recurrent situation. From day to day more news about murders, muggings, rapes, and other atrocities are to be found in all existing media in my country. I know in advance that some part of Brazilian society that we might well label the elite, regard news about crimes and all sort of violence to be “not politically correct.”. What do I care about being politically correct when before my eyes I can see the same scenes of violence being shown over and over again?

People may say so because they have houses or apartments equipped with the latest technologies in terms of security measures against violence. However, all these means available to them do not prevent them from suffering the same troubles and drawbacks a man in the street may be taken aback. We are all in the same boat and no one can escape harmless.

The tendency of opinions on the reduction of age bracket years for juvenile delinquency is not normally accepted by lawyers and jurists nor is it accepted by religious sectors of all denominations. If so, how are we to circumvent this issue that is causing so many deaths of innocents of all ages and social ranks? Are we to continue losing our beloved ones due to the endless waves of murders of all types? Can’t we put an end to all this bloodshed? Don’t we have competent and responsible authorities to tackle this pressing issue? Do we have to cross ours arms and remain passively enduring all this state of uncertainty as to the outcome of all this ? Will people say I am exaggerating in my evaluation of social condition of our society security?

As far as I know, Brazil is not facing a civil war, but if you, reader, observe this unbearable situation, it seems we are in the middle of a battle with bullets, especially the so-called strayed bullets killing innocents that pass exactly where a big shooting is being going on the streets of rich and poor cities sections? Nowhere are we safe of being the victim of a strayed bullet. Should one put the number of dead people killed by strayed bullet the statistics graphic would certainly rise skyhigh like a sum of people killed in a war between two countries. The death toll of innocent people is getting higher and higher and no effective steps have so far been taken by all instances of power here in Brazil. Like in the well known tale by Anderson, the king is naked but everyone says he is dressed just to comply with the king’s attitudes and behavior.

Brazilian society if it were united like many others around the world would not remain so silent as to the errors and omissions of authorities. As long as Brazilian laws are not changed for the better, i.e., while our congressmen and our judiciary power do not manifest themselves sensitive and sensible to this afflicting state of violence on a large scale that is putting in danger and in shock our society, more and more people will be killed on the street, at home, everywhere, inasmuch as murderers, muggers, rapers and a host of other criminals will be waiting to attack their victims unexpectedly, regardless of the place and hour they choose their prey.

In the case of young underage criminals, it is worth noticing that in most acts of evildoings, they are guided by grownup criminals who make use of them to commit infringements because if they caught by the police, they already know no warrant of imprisonment will be sent to them, as they are instead conducted to youth custody and , upon reaching adulthood, are set free in society.

Of course when I discuss this issue I am mostly referring to the two main metropolis in Brazil: São Paulo and Rio de Janeiro, although it is known violence is spread all over the country.

I recognize some measures have been put in practice by authorities of the Security Departments of these two cities. However, this is not at all enough. One must fight the long-rooted crime battle from many sides.

Besides, there must also be a radical change in dealing with other topics of fundamental importance, being the main one the improvement of social life conditions of poor communities, well known by the name of “favelas” (slums or shanties) that are generally located in hills and mountains as is the case of Rio de Janeiro.

Rio de Janeiro state government has created the so-called UPPs (a Portuguese acronym for Police Pacification Unities), which are a kind of a small police station the function of which is to interact with the local dwellers of slums, trying to gain the respect and friendship of the community, striking up acquaintances with the dwellers and get them rid of traffic drug dealers and drug addicts in a well known environment of an ambiguous selling and buying drug business connections.

Their function is, consequently, very difficult to tackle and demands patience and tact on the part of policemen. Obviously, the creation of the UPPs have in some aspects helped the communities, as in Rio they can be counted by hundreds of them scattered throughout Rio de Janeiro, and are located both surrounding famous and elegant south sections of Rio de Janeiro and distant middle-class people and poorer north or west sections in Rio de Janeiro.

The coming of the UPPs in Rio de Janeiro has undergone a tremendous change in the real state broker business, inasmuch with their creation, prices of houses and apartments, which were devalued because of violence chiefly originated in the slums located close to good and privileged sections, had their prices of selling or renting risen overnight.

Violence manifold problems thus pose a very troublesome issue to our authorities and therefore it is up to them to relentlessly cope with the issue not in long term, as it will only get worse and worse to such an extent that it may become uncontrollable. Nobody wishes this to happen as any other alternative would mean to decree the complete failure of our instances of powers, thus weakening State Machine. If our federal government fails to solve this problem, our country will soon feel the disasters it has in part be responsible for. The worst consequences are not difficult to be envisaged: economical losses, political turmoil, tourism collapse ands social problems. All people will, in a way or other, be reached and harmed.

No authority will say people have not warned them in time about the unforeseen evils that may be brought about by high levels of violence. It is high time our authorities might wake up for this ever growing level of violence in my country.







Violência: o maior problema do Brasil





Não é por falta de assunto que escrevo sobre o mesmo problema. Sou levado pela atual situação recorrente e lamentável. Diariamente, me deparo, através da mídia, com novas notícias sobre crimes, assaltos, estupros e outras atrocidades ocorridos em meu país. Não é novidade constatar que parte da sociedade brasileira, que poderia rotular de elite, considera notícias sobre crimes e toda sorte de violência como algo “não politicamente correto”. Não me importa ser “politicamente correto” quando, diante de mim, vejo as mesmas cenas de violência repetidas vezes.

È possível que tal elite pense assim porque é proprietária de casas ou apartamento aparelhados com as mais recentes tecnologias em termos de segurança contra a violência. Entretanto, todos esses meios disponíveis não as livram de passarem pelos sofrimentos e os mesmos infortúnios e reveses do homem comum pego de surpresa. Estamos no mesmo barco e ninguém disso escapa incólume.

A tendência de opiniões acerca da redução de idade para a delinquência juvenil não é normalmente aceita por advogados e juristas nem tampouco é aceita por setores religiosos de todas as denominações. Em caso afirmativo, como deveríamos contornar esta questão que continua provocando tantas mortes de inocentes de todas as idades e níveis sociais? Continuaremos perdendo nossos entes queridos devido a ondas de violência de todos os tipos? Não se poderia pôr termo a toda esta carnificina? Será que não temos autoridades responsáveis e competentes para cuidar desta questão urgente? Teremos que cruzar os braços e permanecer passivamente aceitando todo esta estado de incerteza com relação às suas consequêcias? Dir-me-ão que estou exagerando na minha avaliação das condições sociais da segurança de nossa sociedade?

Que eu saiba, o Brasil não está enfrentando uma guerra civil, porém se você, leitor, atentar para esta situação insustentável, parece-nos que estamos no meio de um batalha com balas, sobretudo as conhecidas balas perdidas, ceifando inocentes que passem justamente onde está havendo tiroteio nas ruas de bairros ricos e pobres das cidades. Se porventura anotássemos o número de mortos por balas perdidas, os gráficos estatísticos seguramente iriam para a estratosfera como se fossem o total de pessoas mortas numa guerra entre dois países. O número de mortes de inocentes cresce cada vez mais e, até agora, nenhuma medida efetiva foi tomada pelas instâncias do poder aqui no país. Tal qual no conto de Anderson, o rei está nu, mas todos dizem que está vestido a fim de não contrariar as atitudes e comportamento do rei.

A sociedade brasileira se unida fosse, à semelhança do que se vê em outros países do mundo, não permaneceria tão calada quanto aos erros e omissões das autoridades. Enquanto as leis brasileiras, que são lenientes, não mudarem para melhor, i.e., enquanto nosso congressistas e nosso poder judiciário não se manifestarem sensíveis e sensatos com esta estado de angustiante com esta escalada de violência, colocando em perigo e em estado de choque nossa sociedade, cada vez mais haverá pessoas assassinadas nas ruas, visto que criminosos, assaltantes e estupradores e um n´mero de outros facínoras estarão atacando suas vítimas de surpresa, independente do lugar e hora que escolhem para suas presas.

Naturalmente, quando discuto esta questão, me reporto geralmente a duas principais metrópoles do Brasil: São Paulo e Rio de Janeiro, Reconheço que algumas medidas têm sido tomadas pelas autoridades das Secretarias de Segurança destas duas cidades. No entanto, isso não é bastante. Deve-se enfrentar a batalha da criminalidade crônica em muitos flancos.

Além disso, deve haver uma mudança radical no enfrentamento de outros tópicos de fundamental importância, sendo o principal a melhoria das condições de vida social das comunidades desfavorecidas, mais conhecidas como “favelas,” situadas nas colinas e montanhas, segundo se vê no Rio de Janeiro.

O governo estadual do Rio de Janeiro criou as chamadas UPPs (sigla em português para Unidades de Polícia Pacificadora), que são uma espécie de pequeno distrito policial, cuja função é interagir com os habitantes locais de favelas, procurando conquistar o respeito e a amizade da comunidade, estabelecendo de amizade com os moradores e livrando-os dos narcotraficantes e viciados em drogas em ambiente de ambíguas transações de compra e venda de drogas.

Sua função é, em consequência, muito difícil enfrentar e exige paciência e tato da parte dos policiais. Obviamente, a criação das UPPs em alguns aspectos tem auxiliado as comunidades, pois no Rio elas se contam às centenas espalhadas em todo o Rio de Janeiro e se localizam tanto em torno de bairros famosos e elegantes da Zona Sul carioca quanto em bairros distantes de classe média e classes menos favorecidas da Zona Norte e Oeste do Rio de Janeiro.

A chegada das UPPs no Rio de Janeiro mudou tremendamente o mercado imobiliário, visto que com elas os preços de casas e apartamentos, que estavam desvalorizados em razão da violência principalmente oriunda das favelas situadas perto de bons e privilegiados bairros, tiveram seus preços de venda e aluguel aumentados consideravelmente da noite para o dia.

As múltiplas atribulações causadas pela violência, desse modo, cobram um posicionamento de nossas autoridades, a elas competindo, portanto, cuidar sem trégua deste problema, não a longo termo, porquanto isso só agravará a situação de tal maneira que não haveria meios de controlá-la. Ninguém deseja que isso aconteça, pois qualquer outra alternativa significaria decretar a falência de nossas instâncias do poder. Se o governo federal fracassar na solução deste problema, nosso país logo sentirá os efeitos danosos pelos quais em parte será responsável. As piores consequências não são difíceis de vislumbrar: prejuízos na economia, instabilidade política, colapso do turismo e problemas sociais. De uma ou outra forma, todos serão atingidos e não sairão ilesos.

As autoridades não poderão dizer que o povo não as advertiu a tempo sobre os males imprevisíveis que possam ser desencadeados pelos altos níveis de violência. Está na hora de as autoridades despertarem para este  incessante recrudesciemento da  violência no país.



sábado, 20 de abril de 2013

A ideia de um Monumento ao poeta Da Costa e Silva e outra questão



Cunha e Silva Filho



De dois temas tratarei neste artigo: a construção em Amarante de um monumento ao mais ilustre poeta piauiense, Antonio Francisco da Costa e Silva, ou designando-o pelo nome que o consagrou nacionalmente, Da Costa e Silva (1885-1950). O segundo tema diz respeito à pouca difusão de autores piauienses em todas as suas modalidades de escrita literária.

Consideremos o primeiro. Todo país que se preza procura preservar a memória oral e escrita de suas figuras mais ilustres.A isso se chama de tradição dos valores da terra natal, seja de um estado, seja de uma cidade, seja finalmente de um pais .Portugal, Inglaterra, França, por exemplo, são países que cultivam e reverenciam seus homens mais eminentes, notadamente no campo cultural. O Brasil não deveria ficar à margem dessa demonstração de tributo aos que elevaram o nome de seus países ao conhecimento do mundo inteiro. É uma forma de eternizar no imaginário dos povos, através da construção de monumentos ou mausoléus, artistas, homens da ciência, da História e das artes.

No sentido que imprimo a essa posição favorável ao culto da memória dos grandes homens estou afastando qualquer sinal típico do culto à personalidade muito ao feitio de países que viveram ou vivem em regimes autoritários.

O Rio de Janeiro, por exemplo, é, de alguma maneira, uma cidade que presta homenagem às imagens, esculpidas em mármore, de grandes nomes de nossa vida cultural e por esse aspecto a cidade ganha foros de civilização e se faz modelo por ter erigido monumentos, hermas, de diversas personalidades da vida cultural brasileira, não descurando a de celebrados nomes locais nas artes, não só populares como também do mundo erudito. Esse equilíbrio entre a cultura popular e a cultura erudita torna a cidade ainda mais encantadora aos visitantes nacionais ou estrangeiros, além de tornar seus monumentos, estátuas e mausoléus relevantes dados históricos sobre a cidade e o país.

Outras capitais e cidades brasileiras deveriam seguir modelos semelhantes, sem exageros, é claro. Só a tradição autêntica e imparcial sabe melhor selecionar quem deva ser digno de figurar como monumentos ou esculturas de seus grandes homens nos diversos campos do conhecimento humano.

O escritor Elmar Carvalho, conhecido poeta piauiense e detentor de várias honrarias locais e nacionais, cronista, contista, ensaísta e crítico literário, nascido em Campo Maior, há muito tempo, e por diversas vezes, manifestou a ideia de, primeiro, conseguir trasladar os restos mortais do “Poeta da Saudade’, que se encontram em cemitério do Rio de Janeiro.

Elmar Carvalho se fundamentava no   fato de que o segundo terceto do soneto “Amarante,” poema que, na  obra do autor, Zodíaco (1917), compõe o conjunto de 5 sonetos sob o título geral de “Minha Terra,” alude  a aspectos de natureza explicitamente autobiográfica. Nesse  terceto, o vate de Sangue (1908) expressou a vontade de ser sepultado no seu berço natal, Amarante: “Terra para se amar com o grande amor que eu tenho! /Terra onde tive o berço e de onde espero ainda/Sete palmos de gleba e os dois baços de um lenho!”

Ora, Elmar, como poeta e amante de Amarante, a par de ser admirador e entusiasta leitor de Da Costa e Silva, razões de sobra tinha para querer ver realizado o desejo do poeta, desejo este com o qual igualmente comunga tanto quanto qualquer outro piauiense.

Não sendo concretizado o desejo do poeta no que tange aos seus restos mortais, Elmar agora, em novo combate, se empenha em conseguir, com o apoio irrestrito de outros intelectuais piauienses, como Virgílio Queiroz, Deusval Lacerda, Evaldo Madeira, assim como já recebeu o sinal verde do prefeito e o vice-prefeito de Amarante, respectivamente, Luís Neto e Clemílton Queiroz, para erguer um Monumento à memória de Da Costa e Silva.

O autor deste artigo recentemente se pronunciou, em comentário postado no Blog do Elmar Carvalho, favorável a esse projeto e se alia, destarte, a todos os leitores do bardo amarantino, cuja obra ainda se presta, dadas as virtualidades múltiplas de sua linguagem e temática, a um amplo campo de investigação interpretativo, o que vem sendo confirmado por trabalhos publicados nos últimos anos enfocando aspectos diversos da sua poética. São ensaios de autores mais jovens que, na poética dacostiana, vêem importância e perenidade, utilizando-se de abordagens atualizadas, sobretudo advindas do meio universitário piauiense.

O segundo tema deste artigo tem o objetivo de acentuar a relevância dos estudos de autores piauienses em todos os gêneros literários e ao mesmo tempo pretende chamar a atenção dos órgãos púbicos do Piauí responsáveis pelos setores da educação e cultura no sentido de que façam valer a obrigatoriedade, resultante de lei aprovada e regulamentada, do ensino de literatura de autores piauienses na grade curricular do ensino fundamental e médio público e particular, conforme preceitua a Constituição Estadual de 1989, no seu Art. 226, parágrafo único.
Por outro lado, esse limite de nível de obrigatoriedade bem poderia se estender ao ensino superior do Piauí se dependesse do interesse e boa vontade dos professores de literatura brasileira Serve de exemplo e exemplo a ser imitado o que se faz no estado do Paraná, no qual se estuda a literatura paranaense nas universidades. Tudo dependeria da visão mais arejada e sem preconceitos da parte dos docentes universitários. Bastaria que eles oferecessem cursos com ementas referentes a estudos e pesquisas de autores e temas da literatura piauiense. Nada mais do que vontade própria.Lembre-se de que a literatura brasileira inclui, no seu sistema literário, para usar um conceito caro a Antonio Candido, a produção ficcional, poética e de outros gêneros. Por conseguinte, não há como separar a unidade e diversidade do pensamento literário nacional.

Quero ressaltar que tal reivindicação não se pauta por mero bairrismo ou provincianismo locais, mas sim pela necessidade e conveniência de que os estudantes piauienses tomem pleno conhecimento do bom e por vezes excelente nível de qualidade da sua literatura. Para isso, contamos já com obras de referência de histórias literárias, de quadros críticos e ensaísticos, tanto na universidade quanto fora dela, de editoras locais com capacidade técnica de publicar livros bem impresso, de uma vida literária em efervescência e desejosa de alcançar voos mais altos. O terreno foi fecundado, a colheita está sendo feita, resta disseminá-la e fruí-la.

Não é possível que os professores do Piauí, tanto no ensino médio quanto no superior ainda hesitem na indicação de autores piauienses que merecem ser estudados, analisados e oferecendo imensas possibilidades para constituir ementas nos curso de letras das universidade piauienses.

Sonegar a existência desses autores e só dando peso aos chamados autores que atingiram um nome nacional da tradição e a outros, os mais novos, os novíssimos, que estão se firmando nacionalmente, se me afigura um erro palmar de visão pedagógica e de ausência de espírito universal e progressista.

O que não pode continuar é essa forma de apagamento ou sequestro de grande parte dos autores piauienses locais, com exceção de um grupo de happy few, tais como Assis Brasil, Mario Faustino, H. Dobal, Torquato Neto, O. G.Rego de Carvalho, e muito poucos outros com alguma visibilidade.

Já afirmei alhures que a literatura piauiense não termina naquele pequeno grupo. Cabe aos professores do ensino médio e superior, esquecer um certo complexo de inferioridade provinciana e abrir as comportas da riqueza de autores piauienses, do passado e da contemporaneidade, mostrando aos jovens leitores que esses “ilustres desconhecidos” têm muito a propiciar aos professores e alunos com uma produção literária merecedora de ser urgentemente adotada, estudada, pesquisada tanto quanto os chamados autores “nacionais.”

A literatura piauiense está aí, viva, atuante, com novos autores lançando obras, só esperando ser divulgados e prestigiados pelos próprios piauienses. È tempo de realização de seminários, debates, congressos, simpósios, mesas-redondas que venham tirar do exílio uma boa quantidade de autores dignos de serem valorizados e consagrados pelo público piauiense, jovem, adulto, idoso, estudantes, professores de todos os níveis de ensino, enfim, leitores, críticos, ensaístas e cidadãos piauienses amantes da leitura e da literatura mafrense.

No dia-a-dia do piauiense esses autores são vistos na rua e em outros lugares. Merecem a sua atenção e o seu respeito. Merecem, sobretudo, ser  lidos.



quarta-feira, 17 de abril de 2013

O Rio de Janeiro é uma enfermaria




Cunha e Silva Filho



Nada melhor do que sentir na carne a experiência do cotidiano das grandes cidades, desses lugares apinhadíssimos de gente de todas as idades lotando, ou melhor, superlotando as clínicas com pacientes de todos os planos. Não consigo entender por que os médicos não estão festejando a demanda vasta de pacientes, cada qual queixando-se de uma doença.

Depois, não me venham dizer que as pessoas não cuidam de sua saúde. A realidade está aí a olhos vistos nessa corrida pelas marcações de consultas médicas.

Assim que os neoliberais, a partir do governo Collor se implantaram no país, no qual o serviço médico engordou o bolso dos donos de planos de saúde e os próprios consultórios médicos, constatou-se uma modificação substancial na vida da população carioca e, por extensão, brasileira. Antes, o grosso da prestação do serviço médico ficava por conta do governo federal, com o antigo INAMPS, enquanto o governo estadual ficava com alguns hospitais e bem assim os municípios. Havia uma divisão de atribuições no setor médico.

Quem conheceu a realidade do antigo sistema, onde existia  pouca margem para a medicina privada, não deixa de sentir uma certa saudade de atendimento médico pelo INAMPS. Claro que havia alguns problemas de gestão no seu funcionamento, mas surgiu, com a privatização quase total da saúde brasileira, um tipo de problema igual ou pior do que havia na saúde pública federal. É aquele ligado a data de marcação de consultas médicas. Os planos de saúde, mesmo os de alguma projeção nacional, estão incorrendo nos mesmos defeitos que havia com a marcação de consulta através do velho sistema federal.

Um paciente com plano de saúde vai a uma clínica particular, levando sua identidade e sua carteira do plano e, quando a atendente vai marcar-lhe a consulta, informa ao cliente (neste caso, seria melhor chamar assim ao consumidor da medicina paga), ao portador do plano que só tem consulta para duas, três ou quatro semanas depois! Ora, até lá o doente até poderá ficar mais doente e mesmo morrer por falta de atendimento médico.Assim está funcionado a medicina mercantilizada no país. Por outro lado, é uma medicina excludente e discriminatória, já que o cliente que pode arcar com planos caros leva vantagem sobre os menos aquinhoados financeiramente. Quer dizer, existe hoje uma medicina privada do rico, do cliente de classe média e do cliente de baixa renda, os mais sacrificados e os menos protegidos, visto que os diversos tipos de planos são como as classificações de hotéis, que vão de zero estrela a cinco estrelas.

Esta realidade da saúde brasileira foi,  assim, criada de forma imposta e através de uma opção do modelo econômico que se institui no Brasil. Seria mais ou menos o que se pratica ainda nos EUA, onde há planos e planos. Quem tem mais dinheiro, tem mais condições de uma saúde melhor, com maiores recursos tecnológicos, aparelhamento de ponta que redundam num melhor diagnóstico de doenças .

Tal comportamento vigorante na saúde do brasileiro não deixa de ser perverso porque elitiza a medicina privada em detrimento da medicina para os pobres. Esta medicina somente accessível a quem tem mais posses ainda se torna mais segregacionista no uso da medicação, de vez que o preço dos remédios comprados é muito elevado, ainda que o governo federal hoje utilize do programa, aliás de ba utilidade pública,  da chamada “Farmácia Popular”, que vende remédios mais baratos, porém não dispõe de estoques de remédios para outros tipos de doenças que exigem medicação muito dispendiosa para o bolso do pobre e mesmo da classe média baixa.

A situação financeira das farmácias dá mostras de grande vitalidade e o país está repleto de farmácias por toda parte, algumas delas formam grandes redes localizadas tanto nas grandes cidade quanto no interior. É sinal inequívoco de que andam bem com lucros e riqueza.

Os últimos governos brasileiros, por assim dizer, sucatearam propositadamente a saúde pública em vários flancos, na péssima qualidade dos hospitais, carência de médicos, tantos clínicos gerais quanto especializados, dos postos de saúde, ou de outros tipos de atendimento médico ao grande público carente.Uma outra incongruência: os planos de saúde aumentam anualmente sem que os usuários tenham tido também reajuste em seus salários. Ora, isso leva muita gente a cancelar seu plano, o que equivale a se privar de um dever do Estado:  prover o cidadão com prestação de serviço de saúde de qualidade e com disponibilidade de atendimento eficiente.  Os donos de planos foram beneficiados com a transferência de um dever e obrigação do Estado que passou para as mãos dos capitalistas da medicina.

Um país sem proporcionar saúde gratuita e de qualidade ao povo está cometendo um desserviço à sociedade. Cumpre aos responsáveis pela saúde do Brasil repensar o modelo em vigor, procurando conciliar, em igualdade de condições, meios e recursos que venham atender tanto a quem opta pela medicina privada como para quem só depende da medicina pública. O Estado brasileiro tem condições financeiras para solucionar esta disparidade gritante entre as duas formas de medicina.Já se disse que, na educação, nosso país gasta mais do que nos Estados Unidos que têm uma população maior. O grande nó a desatar se encontra na forma de administrar os recursos canalizados para a saúde pública. Questão de gestão, de saber utilizar corretamente os recursos, combatendo a corrupção administrativa, os desvios, os superfaturamento, as licitações fraudulentas. É um problema que tem muito a ver com a probidade de uso do dinheiro público. Muitos dos defeitos da máquina do Estado estão conexionados com a ocupação de cargos públicos, i.e., com fatores de ordem moral e não apenas da tecnoburocracia.. Moralidade é a palavra de ordem que deve presidir a res publica em nosso país..

terça-feira, 16 de abril de 2013

Maratona com ataque terrorista



Cunha e Silva Filho



A 117ª Maratona de Boston nos Estados Unidos, realizada em concomitância com um feriado estadual, o “Dia do Patriota,” foi este ano surpreendida com um ato de covardia, insensatez resultando num tragédia de, pelo menos, até agora, três mortes de inocentes, um dos quais uma criança de oito anos, sendo que 144 ficaram feridos, alguns com membros mutilados, incluindo adultos e crianças. Não há dúvida de que essa ação de barbárie foi cometida por um insano, que tanto pode ser cidadão americano quanto estrangeiro residente ou não no país.Os crimes de terrorismo constituem, a meu ver, um dos mais execrandos atos de pusilanimidade dos tempos atuais que se possa fazer contra o ser humano. É tão abominável quanto qualquer crime hediondo que se cometem mundo afora.

O Presidente americano Barack Obama, que é um homem prudente mas firme, em pronunciamento à nação, não fez uso do termo “ ataque terrorista”. Ele tem lá suas razões de se portar assim. Comportou-se diplomaticamente, como Chefe de Estado a quem cabe medir bem as circunstâncias e o momento delicado por que está passando o mundo com as ameaças, não obstante possam não passar de bravatas do ditadorzinho norte-coreano, Kim Jong-un que, me parece, querer brincar de guerra contra os países por ele tidos como inimigos: o seu vizinho, a coréia do Sul, o Japão e os EUA. Ora, leitor, até agora não posso atinar por que motivos Kim Jong-un, herdeiro de uma linhagem de ditadores coreanos, que vem de avô e pai, esteja se portando com bazófias de belicista e senhor das armas, espalhando notícias pelo mundo de que seu Grande Exército seria capaz de atingir duramente a Coréia do Su, o Japão ae os Estados Unidos.

Julgo que nem a China nem a Rússia, dois países de grande projeção mundial, ainda que tenham relações de certa forma ideológicas com a Coreia do Norte, estão dispostos a se alinhar ao novel ditador norte-coreano. Kim Jong-um deveria é procurar formas e meios de se reunificar aos irmãos vizinhos, no mínimo restabelecer vínculos de boa vizinhança e até de comércio e intercâmbio cultural, e não exibir-se diante do mundo para demonstrar poder de fogo que seguramente não possui.

Nem a ONU nem nenhum outro organismo mundial relacionado a guerra ou à paz aprovam as bravatas do pueril ditador norte-coreano. O que ele devia, sim, fazer seria melhorar as condições do povão lá que vive com dificuldades de toda a sorte.

O mundo precisa é de paz, de “ democracia real”, segundo o conceito bem formulado e convincente do professor e cientista da Universidade de Sydney, o australiano Simon Tormey, comentado em trechos de entrevista a João França, originalmente publicada no jornal “El Diário,” de Barcelona (jornal O Globo, Prosa, 13/04/2013.

A era das ditaduras precisa acabar o quanto antes. O de que o nosso Planeta precisa é  um banho de democracia, não a de fachada, que ainda infelizmente temos em inúmeros países, mas uma democracia que, conforme falou o citado professor australiano, que se renove com o apoio e a participação ativa e contínua do povo, ou como ele pondera numa referência à situação político-econômica da Espanha: (...) “há muita criatividade [aludindo ao interesse do povo espanhol por renovação dede uma democracia renovadora]. Nunca vi tanta gente tão pouco dogmática como na Espanha. Há uma política muito mais plástica, que chamo de política evanescente e que consiste em buscar o comum, tecer redes com outros, provar novos tipos de iniciativas .” (...)

Por essa direção é que as nações autoritárias deveriam enveredar, e não perpetuando regimes de governo isolados e sem a participação popular.Só a busca incessante da paz entre as nações importa à humanidade .Essa lição serve a muita democracia de fancaria, sobretudo que se oculta pelo rótulo democrático mas potencializa modos de agir através da manutenção de novos no poder mas de linhagem oligárquica, o que redunda na manutenção do status quo que não se deseja alterar substancialmente.

Retomando o atentado com traços inegavelmente terroristas ocorrido em Boston num dia de celebração cívica de uma competição com participantes de outras nacionalidade, inclusive de brasileiros, fica mais difícil a qualquer competidor, a qualquer desportista participar em novos competições pelo mundo afora sem a certeza de que estarão seguros de acontecimentos indesejáveis como o ocorrido na acidade americana. Por outro lado, esta tragédia serve também como outra alerta às autoridades de segurança de um país para que todas as precauções sejam cuidadosamente tomadas em todas as suas dimensões e conduzidas sem o fantasma da paranóia, mas com discernimento e prudência.

Oxalá logo logo a polícia americana, o FBI consigam descobrir os responsáveis por esse ato desumano, que ceifou inclusive uma criança entre as vítimas fatais e deixou tantas pessoas feridas e em estado grave.

O terrorismo é uma das manifestações mais horrendas a que um ser humano pode chegar. Ato de extrema covardia, que se serve de inocentes para infligir desafetos, pessoas, instituições, países etc.O ser humano é dotado de inteligência, de raciocínio, de arbítrio para evitar a prática de atos de brutalidade inominável. Somente levados pela insânia do facciosismo, do pensamento distorcido e doentio, irmão siamês da crueldade sem limites, do fanatismo cego e destruidor, uma pessoa ou grupo de pessoas podem cometer atrocidades dessa natureza.

A Humanidade ainda não perdeu o seu lado de bondade, de gesto de carinho e de misericórdia, de compaixão e de solidariedade para com seu semelhante. O lado bom do ser humano ainda subsiste felizmente. Do contrário, seria decretar-se o fim da vida na sacrificada Terra, morada de todos nós, que deve ser protegida contra os inimigos da Humanidade..

sábado, 13 de abril de 2013

BRAZIL'S OVERVIEW CORNER: Brazil's teenagers murderers

(A Portuguese translation of this article is given below the English text)









Present under age murderers cases in Brazil must have a solution on the part of Brazilian authorities, otherwise we will be watching a never thought before wave of violence, mainly in São Paulo and Rio de Janeiro cities. The situation is too serious to be disregarded by Brazilian authorities and therefore the penal legislation should make an urgent reform as to the age bracket for a teenager to be held responsible for a murder committed.

Present penal sentence for a murderer can only be applied from eighteen years old on. Before this limit, an adolescent (male or female), can only be sent to the so called state reformatories the function of which is to try to reeducate and ressocialize the youngster criminals, albeit it is the general people’s view to consider this kind of social and psychological work fruitless, as it is claimed they do not get to reform these young people. Far otherwise, people generally say that when reaching adult age, they leave those places of isolation from society worse than before they were sent to those reformatories. Reality has shown that in most cases this is what actually happens.

As it is, the situation of these young criminals, whose age for some of them ranges between twelve and sixteen or seventeen years old, demands immediate steps to be taken by competent authorities especially because Brazilian society cannot stand any longer successive murders committed almost daily by young boys and sometimes girls causing too many griefs and afflictions to parents who are bereft of their beloved ones, victims of these cruel and cold criminals.

In São Paulo an example of this happened to a young boy, Victor Hugo Deppman, a nineteen-year-old, university student of journalism who was killed three days ago by a seventeen year-old criminal who held him up in front of the student’s residence. The thief wanted the student’s cell phone and the student, in turn, handed him what he was asked to. I want to point out that the student did not give any sign of reaction against the murderer who leveled a gun at him, and at the same time shot him dead on the face at close range.

As you can see, my reader, it was a hideous crime, an abominable action of savagery practiced by a human being. This shocking murder at once became a nationwide piece of news spread throughout the country and by all media and Brazilian society, it seems, has firmly reacted to this degrading social evil. Maybe this murder will become a turning point in the history of murders committed by young criminals in Brazil. As the student’s mother stated: “Something must be done to put an end to tragedies like these. It is not possible that such a kind of crime may last for ever. What will become of us here in our country?”

What seems to me is that Brazilian people, chiefly the common people, want a strong and urgent change in terms of age bracket penal legislation, i.e., people want reduction in the age of youngsters who murder or rape or commit whatsoever coldblooded cruelty crime. They want prison for them just  like for  any other grown-up person. This issue of course should be widely debated by society before being transformed into a federal law. However, the fact that cannot be neglected at all, in my view, is that something in this direction should be done immediately. People’s patience has been exhausted. Our country does not accept that the present high level of violence may go on endlessly.

Brazilian society, as a whole, cannot bear any more such anomalous situation as far crimes are concerned. It is known Brazil’s Penal Code is outdated. We also know a reform of it which is underway should take into due account this issue involving murders committed by teenagers. So, I expect the members of learned jurists who are dealing with it at present will carefully think in depth about this subject, as it cannot be put aside among other important issues of our social life.

I think it would be extremely important to have our society mobilized towards demanding from our congressmen, as urgently as possible, the presentation of a bill dealing with this momentous issue and, after discussing it deeply, pass it having in mind the will and wishes of the greater part of Brazilian society who eagerly expects our laws put and end to the actions of young killers of innocents of all ages and social ranks. We all know that we may become, at any time of day or night in rich or poor sections of our cities, helpless fatal victims of these young murderers.

Incidentally, in the case of the student killed in São Paulo, the police did not even need to search to locate him and get him arrested. Before that could occur, the young criminal cunningly gave himself up to the nearest police district.

Naturally he acted so because he was aware of the cricumstance that if he did not show up immediately at the police station, he might be arrested as a grown up, since three days later he would complete eighteen years old, that is, he would have been treated like any other grown up declared guilty of a crime. To escape the law infringement and by behaving as he did, he got rid of going directly to jail. Obviously, when at home watching the news about his murder on TV and probably advised by someone related to him, his mother or a friend or someone else more experienced, he did not count twice and quickly got to save his skin. That is the way unfortunately things are unfolded in Brazil when dealing with law matters.

Brazilian citizens expect that effective steps must be taken in short or medium term to improve this gloomy state in which the country is engulfed as to the wave of unprecedented violence terrifying a society in its everyday life routine. We are practically helpless, with tied hands, hostages of very dangerous killers ready to surprise us, as I said before, around the corner. Brazilian authorities in all their instances of power, whether federal, state or municipal spheres, have to give an immediate response to this most serious problem that our people all over Brazil are going through, mainly in the most affluent cities: São Paulo and Rio de Janeiro.

Impunity in Brazil is the corollary of omission of successive governments. The tragical murder committed against  Victor Hugo Deppman adds to one more similar case in the ever increasing death rate of innocents of all ages killed in my country. Brazilians generally ascribe these crimes to impunity on the part of Brazil’s authorities. In a way, Brazilian State for sure has its share of blame in this connection. Brazil should struggle incessantly against this reprovable and distressing situation which gives a bad image of social life in my country.













Menores assassinos no Brasil









Casos de criminosos de menor idade atualmente no Brasil precisam de um solução por parte das autoridades, do contrário estaremos assistindo a uma onde de violência inimaginável no passado, sobretudo nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. A situação é grave demais para que a negligenciemos.e, por isso a legislação penal deverá implementar uma reforma urgente no que concerne ao limite de idade para que um adolescente seja responsabilizado por um crime cometido.

Hoje a penalidade para um assassino só se aplica a partir dos dezoito anos. Antes desta faixa etária, um adolescente ( do sexo masculino ou feminino) que venha cometer um assassínio será apenas encaminhado a reformatórios estaduais, cuja função é tentar reeducá-lo e ressocializá-lo, embora na visão geral das pessoas, esta espécie de trabalho social e psicológico não tenha dado nenhum resultado prático, porquanto se alega que o jovem internado não demonstra nenhuma melhoria em seu comportamento. Muito ao contrário, afirma-se em geral que, ao atingir idade adulta, sai desse lugares de isolamento pior do que antes de neles ser internado. A realidade demonstra que, na maioria dos casos, é isso mesmo que acontece.

Destarte, a situação destes jovens criminosos, cuja idade para alguns medeia entre doze e dezesseis ou dezessete anos, requer providências imediatas das autoridades competentes, em particular porque a sociedade brasileira não aguenta mais sucessivos crimes de morte perpetrados quase diariamente por jovens de ambos os sexos desencadeando imensas dores e aflições aos pais de famílias que perdem seus entes queridos, vítimas destes criminosos cruéis e desalmados.

Em São Paulo, um exemplo disso aconteceu com Victor Hugo Deppman, um jovem universitário cursando  jornalismo, de dezenove anos, que há três dias foi morto por um menor de dezessete anos em assalto em frente de sua residência. O ladrão queria o celular do estudante e este, por sua vez, lho entregou atendendo, assim, ao desejo do assassino. Convém assinalar que o estudante não esboçou nenhuma reação contra o assaltante, o qual, apontando-lhe uma arma, disparou-a à queima-roupa contra o rosto do estudante, matando-o no instante.

Veja, leitor, que se trata de um crime hediondo, uma ato abominável de selvageria levada a termo por um ser humano.Este crime chocante logo virou notícia nacional espalhada no país inteiro e em todas as mídias, a a sociedade brasileira, assim me parece, reagiu duramente a este degradante mal social. Quiçá este assassínio se torne um divisor de águas na história de crimes cometidos por jovens no Brasil. Conforme, as palavras da mãe do estudante: “ Não é possível que tal espécie de crime possa durar para sempre. O que será der nós todos em nosso país?”

O que me parece é que os brasileiros, principalmente o povão, desejam uma firme e urgente alteração da legislação penal no tocante ao limite de idade, i.e., desejam uma redução na idade para jovens que matem, estuprem ou cometam qualquer delito com requinte de crueldade. Querem para eles a prisão como seria para qualquer outra adulto. Esta questão n naturalmente deverá ser amplamente discutida pela sociedade antes de se transformar em lei federal. Entretanto, tal fato não pode ser absolutamente ignorado,e, no meu juízo, alguma coisa nesta direção deve ser feito de imediato. A paciência do povo se exauriu. Nosso país não aceita que o atual nível de violência se eternize.

A sociedade brasileira, como um todo, não suporta mais esta situação anômala atualmente no que diz respeito à criminalidade. É notório que o Código Penal brasileiro está ultrapassado. Sabe-se também que está em andamento uma reforma dele, a qual não pode deixar de contemplar esta questão de crimes cometidos por adolescentes. Deste modo, espero que os membros de juristas de alto nível encarregados de de sua atualização, reflitam maduramente sobre o tema, que na pode ser esquecido entre outras questões relevantes de nossa vida social.

Julgo extremamente importante que a sociedade se mobilize exigindo de nossos congressistas, tão urgentemente quanto possível , a apresentação de um projeto de lei tratando desta momentosa questão e, após amplo debate, aprove-o levando em consideração a vontade e as aspirações da maioria da sociedade brasileira que espera ansiosamente leis que ponham um fim a mortes de inocentes de todas as idades e níveis sociais.todos tem consciência de que podemos ser vítimas, em qualquer hora do dia ou da noite, de criminosos surgindo de todos os cantos da cidade, em bairros de ricos ou de pobres.

A propósito, no caso do estudante morto em São Paulo, a polícia nem mesmo teve que procurar localizá-lo e apreendê-lo. Antes que isso ocorresse, o jovem criminoso astutamente se entregou à delegacia mais próxima. Decerto assim procedeu porque tinha consciência da circunstância de que se não o fizesse logo, poderia ser preso pela polícia, pois dentro de três dias atingiria a maioridade e seria tratado como qualquer outro criminoso adulto. Para escapar às infrações da lei, agiu diretinho a fim de se livrar do xadrez. Obviamente, havia assistido na televisão aos comentários de seu crime e, provavelmente advertido pela mãe, ou um amigo ou alguém mais de sua relação com mais experiência, não contou duas vezes e rapidamente salvou a pele. Assim infelizmente as coisas acontecem no Brasil no tocante a matéria relacionada à lei.

Cidadãos brasileiros esperam que medidas efetivas sejam tomadas em curto ou médio prazo a fim de melhorar este estado sombrio em que se encontra engolfado o país no que concerne à onda de violência sem precedente aterrorizando uma sociedade no seu cotidiano.Praticamente estamos desamparados, com as mãos atadas, reféns de assassinos de alta periculosidade, prontos, como afirmei atrás, a surpreender-nos ao dobrar a esquina. As autoridade brasileiras, em todas as instâncias do poder, seja nas esferas federal, estaduais ou municipais, têm a obrigação de dar uma resposta imediata a este gravíssimo problema que nosso povo, em todo o Brasil, está enfrentado, sobretudo nas cidades mais afluentes: São Paulo e Rio de Janeiro.

A impunidade brasileira é o corolário da omissão de sucessivos governos. O crime trágico perpetrado contra  Victor Hugo Deppman soma-se a mais um caso da crescente estatística de mortes de inocentes de todas as idades em meu país. Geralmente, os brasileiros atribuem estes crimes à impunidade da parte de nossas autoridades. De certo modo, o Estado brasileiro seguramente tem sua parcela de culpa neste sentido. O Brasil deve continuadamente lutar contra esta reprovável e triste situação que passa uma imagem ruim da vida social em meu país.





terça-feira, 9 de abril de 2013

Tradução de um poema de T.S. Elliot ( 1888-1965)





              Whispers of Immortality





Webster was much possessed by death
And saw the skull beneath the skins;
And breathless creatures under ground
Leaned backwards with a lipless grin.

Daffodil bulbs instead of balls
Stared from the socket of the eyes!
He knew that thought clings round dead limbs
Tightening its lusts and luxuries.

Donne, I suppose, was such another
Who found no substitute for sense,
To seize and clutch and penetrate;
Expert beyond experience,

He knew the anguish of the marrow
The ague of the skeleton;
No contact possible to flesh
Allayed the fever of the vbone.

. . . . . .

Grishkin is nice: her Russian eye
Is underlined for emphasis;
Uncorseted, her friendly bust
Gives promise of pneumatic bliss.

The couched Brazilian jaguar
Compels the scampering marmoset
With subtle effluence of cat;
Grishkin has a maisonette;

The sleek Brazilian jaguar
Does not in its arboreal gloom
Distil so rank a feline smell
As Grishkin in a drawing room.

And even the Abstract Entities
Circumambulate her charm;
But our lot crawls between dry ribs
To keep our metaphysics warm.




                      Sussurros da Imortalidade



Demasiado obcecado pela morte foi Webster
Sob a pele o crânio via;
Criaturas ofegantes, por sob o chão
Com caretas sem lábios de costas se apoiavam.

Em lugar de bolas, bolbos de narciso
Saltavam das órbitas dos olhos!
Sabia ele que a membros mortos o pensamento gruda-se
Suas luxúrias e concupiscências aumentando.

Donne, creio eu, foi outro
Que não encontrou um substituto para os sentidos,
A fim de apoderar-se, arrebatar e penetrar.
Hábil além da experiência,

Sabia que a angústia da medula
A dor do esqueleto,
Nenhum contato possível com a carne
A febre do osso aplacava.


. . . . . .


Boa é Grishkin: seu olho russo
Da ênfase a marca tem.
Nu, seu busto amável
Bênçãos pneumáticas promete

Em repouso, a onça brasileira
Amedrontado sagui constrange
Com a sutil aparição de felino.
Grishkin de um chalé proprietária é.

A garbosa onça brasileira,
No escuro arvoredo,
Um cheiro felino esparze tão forte
Quanto Greshkin na sua sala de visitas.

E as próprias Entidades Abstratas
De seus encantos cativas se tornam.
Entre costelas sedentas, nossa sorte, contudo, rasteja
Para nossa metafísica tórrida preservar.



                                                           (Trad. de Cunha e Silva Filho)

Notas ao leitor:


1.Grishin: Uma prostituta de alta classe dominada pelos instintos animalescos da carne.

2.Webster: Referência a John Webster, dramaturgo jacobino, autor de A duquesa de Malfi e de O diabo branco.

3.Donne: Alusão ao poeta inglês John Donne (1572-1631).

Fonte bibliográfica:

The Norton Anthology of English literature, edited by M. H. Abrams et alii. New York: W.W Norton & Company INC., 1968, p. 2580.



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domingo, 7 de abril de 2013

Passagem e sobrevivência




Cunha e Silva Filho



No sofá da sala estou lendo um jornal e, de repente, olho para uma placa de metal revestida de uma moldura de plástico duro de uma turma de alunos que, em 2005, concluiu o segundo grau no Colégio Militar do Rio de Janeiro.A placa exibe, em letras do tipo manual, o meu nome completo gravado como homenagem, lembrança e agradecimento da turma por ter sido dela professor durante o período de um ano  da última série do ensino médio. A placa é nominalmente individualizada, mas sua inscrição se estende a todos os professores que contribuíram para o sucesso dos alunos naquele ano de sua formatura

A última série desse centenário e conceituado Colégio público ali também se chama Prevest, pois funciona como reforço preparatório ao ingresso no ensino superior.

O Prevest é uma das seções mais respeitadas do Colégio Militar. Ela consegue reunir um quadro de professores de alto nível de competência, na sua maioria  com mestrado ou doutorado, o que me levava a afirmar aos meus colegas que o Colégio tem credenciais de uma verdadeira instituição universitária.

Olhando para aquela placa, assim como para todos os objetos de casa, os livros nas estantes, os objetos de decoração, os quadros de pintura na parede, enfim, todos os itens de que se formam o mobiliário e os acessórios gerais de uma casa ou apartamento, fico imaginando o quanto a nossa passagem pela Terra é rápida, diminuta e limitada.

Aquela placa, os livros, os objetos de decoração, todos os outros itens de bens materiais inanimados provavelmente, ainda que tenham destino diferente no tempo e no espaço, dependendo de sua estrutura física, do material usado na sua fabricação, durarão mais do que a nossa frágil estrutura de carne e osso.

Daqui a alguns anos, quando não mais estiver no Planeta, só restarão os objetos que, durante um tempo, a mim pertenceram. Os meus olhos já não os verão nem tampouco poderão mais sentir o que representavam para mim. Haverá outros olhares para eles, olhares que seguramente poderão trazer à lembrança quem primeiro naquela ambiente os viu,  os tocou e por eles teve  especial carinho de enxergá-los, de neles tocar, de sentir a sua textura, de ver a sua cor, o seu tamanho,o seu cheiro, a sua forma, a sua utilidade, a sua função. Se fosse um livro preferido e muitas vezes examinado com os dedos do antigo dono, um dicionário, por exemplo, naquelas páginas tantas vezes folheadas por mim de certa maneira estaria impressa espiritualmente  a antiga vida de seu dono.

Não podemos prever ou projetar o seu destino ou destinos, ou seja, em que mãos estarão, como serão tratados pelos sobreviventes de nossa frágil e liquida mortalidade.

Contaram-me que um famoso poeta brasileiro, logo que morreu, uma semana depois, se tanto, teve sua rica e variada biblioteca retirada para outro lugar de seu apartamento. Quer dizer, a viúva, logo dele se livrou, vendendo-a ou doando a uma instituição cultural. Não sei.

Será que a mesma coisa iria acontecer comigo? Também não sei. A única certeza de que tenho na projeção do futuro é que parte deles sobreviverá após o meu limite de existência. Estarão muitos deles em outras mãos, em ambientes diferentes.

.Não sei como serão tratados ou que cuidados terão por parte dos outros, às vezes, nem mais da própria família do antigo dono, daquele que os recebeu e os mereceu, ou daqueles que os compraram como se fossem proprietários deles para sempre. Para eles outros seres mortais dirigirão os olhares, novos olhares, novos sentimentos, novas visões, novos modos de percepção, de toque, de cheiro, de uso, de funções.

Os objetos, os seres inanimados, as coisas que estão na Natureza, nas cidades ou nos campos, são quase “imortais.” É certo que essa “imortalidade” também não será eterna porque a velhice para alguns deles da mesma forma os aniquilará com o tempo e o uso. Outros, contudo, permanecerão por séculos ou serão vendidos, descartados ou tornar-se-ão peças de lojas de antiguidades, quem sabe, poderão se tornar peças de um museu. O seu fim me parece imprevisível à medida que mais durarem e mudarem de lugar. Há uma aura futura de cunho metafísico para cada um em particular, sobretudo para os que sobreviverem por mais tempo.

De qualquer forma, os objetos presentes transmitem algo de vivo na presente relativo de seus donos. Dá-me a impressão de que para eles transfiro os meus sentimentos, as minhas alegrias, tristezas, vitórias e fracassos. Eles me dão a sensação de que se impregnam de nossa interioridade, de nossa alma e de nosso gostos e preferências; por isso, entre eles e mim há uma espécie de contaminação, de sopro de vida que lhes infundi na convivência dos anos com eles, de cumplicidade, de harmonia, de uma deliciosa sensação de paz e bem-estar.

Por isso, falei de incorporação de nosso mundo interior para o que poderia falar de “alma” dos objetos queridos e amados. Neste nível, os objetos amados e transfigurados parecem dialogar comigo, numa linguagem que só quem os ama tão visceralmente sabe o quanto eles significam afetivamente para mim e para todos aqueles que vivem, viveram ou viverão situações análogas no contato com seus objetos e pertences.





sábado, 6 de abril de 2013

Ventos negros no Leste Asiático





Cunha e Silva Filho


Não é nada alvissareiro o que pode estar se tramando na Coreia do Norte, país liderado pelo ditador Kim Jong-un, filho do seu antecessor e pai, King Jon-il. Isso explica muita coisa apesar das nuvens cinzentas e das incertezas e ambivalências que nos chegam pela mídia.

O mais jovem ditador da atualidade, com passagens pela Suíça, na condição de estudante, ainda criança ou adolescente, sob nome e identidade postiços, o jovem ditador, afeiçoado ao basquetebol e aos esportes, e tendo sido considerado pela notas de escola um estudante medíocre, tímido e desajeitado com as garotas, se tornou um adulto com propensão aos estudos de física e militares em nível universitário, com estas e outras qualidades e defeitos logo foi assumindo diversos cargos de relevância da Coreia do Norte, naturalmente pela influência e poder paterno. Tal escalada rapidamente o levou aos píncaros do poder da ditadura norte-coreana, ou seja, a Chefe de Estado.

A ele todas as honras e privilégios, a ele toda a submissão imposta pelos regimes de força. Salve Kim Jong-um, senhor da terra , dos mares e dos céus de sua pátria! O que mais poderia desejar deste mundo terreno um jovem com formação belicista e com ideias de expansão de poder sem fronteiras?

A Coreia do Sul que se previna contra as possíveis decisões impensadas e imaturas desse jovem ditador.De resto, os seus primeiros vagidos já se espalharam além-fronteiras e já chegaram ao Ocidente, tendo como alvos principais a Coreia do Sul e os Estados Unidos.Vamos ver o que pode se desdobrar destas ameaças de lançar mísseis intercontinentais ou em direção à outra metade da Coreia. Fidel Castro, que conhece todos os meandros políticos que pressupõem desavenças perigosas entre países de ideologias diferentes, já afirmou que – e é bem sintomática tal declaração do velho Castro -, que cabe aos Estados Unidos tomarem atitudes contra os riscos nucleares que possam vir de Pyongyang. Tudo é possível e, por conseguinte, toda precaução deve ser tomada contra ações extremas partidas de um governante sem maturidade política. Já sabemos o que disso pode resultar, porque as lições da História ainda não foram assimiladas corretamente pelos povos, sobretudo pelas nações antidemocráticas.

O próprio ditador Kim Jog-un já preveniu que as embaixadas de alguns países chamassem de volta seus diplomatas.Mas, confesso, leitor, minha ignorância política, por não atinar com os fundamentos lógicos de ameaça de guerra pela Coreia do Norte. Até entendo que o conflito seja direcionado contra os vizinhos sul-coreanos, até entendo que estes tenham ideologia política diversa e sejam influenciados pelo capitalismo ocidental, principalmente americano. Porém, isso é motivo forte para desencadear uma conflagração entre potências civilizadas? Não seria mais justo e coerente que as duas Coreias procurassem se harmonizar e resolver suas diferenças diplomaticamente, embora conservando, cada uma, suas características político-ideológicas dessemelhantes? Ou, mesmo quem sabe, até se reunificarem? A China comunista, a Rússia socialista não mantêm relações com o nosso país, se respeitando e desenvolvendo relações econômicas em paz? Até mesmo o Irã, que esbraveja contra os Estados Unidos e contra Israel, bem ou mal, nunca partiu para um conflito armado cujas consequências seriam desastrosas para todos os países e mesmo para o mundo.

Não pode haver mais guerra em escala mundial. Diante dela, somente há uma alternativa: a extinção dos homens e do mundo, das artes e do progresso, de tudo o que de bom o homem construiu na Terra. Um recurso bélico extremo envolvendo países com armas nucleares, não seria nada bom para o nosso planeta. Não há nação amadurecida que deseje repetir os horrores da Primeira e Segunda guerras mundiais. Candidatos a moldar-se pelo figurino de Hitler, diante do potencial nuclear disponível por algumas nações, é algo impensável. O mundo está cansado de guerras. Seu destino se inclina para alcançar a paz, ainda que esta seja uma paz relativa, com boa dose de consensos e harmonias entre os países.

A humanidade aspira à paz e fará tudo o que estiver ao seu alcance para atingi-la. Estamos fartos da insanidade bélica, da sua estupidez e da sua inutilidade. O Holocausto, provocado pelo nazismo, há de ser para a contemporaneidade o último acontecimento-símbolo do século 20 do que a crueldade e a loucura de um ditador foi capaz de fazer contra a espécie humana.

A afirmação de Fidel Castro tem, sim, um peso grande, pois se mostra imparcial e objetiva. É declaração de um homem que já viveu muito e que, mesmo não tendo conseguido - o que é justo - a interrupção, até hoje, do embargo americano, ainda lhe sobra prudência e sabedora para dar um sinal de alarme.

O tão chamado Poderoso Exército norte-coreano não haverá de estragar os caminhos da humanidade em direção à paz entre os povos, cuja luta maior deverá ser, no campo político, em prol da derrocada dos países ainda com regimes autoritários, mas uma derrocada pelas vias da educação política na sua ação mais rigorosa da busca incessante da autonomia dos povos e da sua liberdade de expressão e de escolha de seus dirigentes.



terça-feira, 2 de abril de 2013

A violência no trânsito do Rio de Janeiro




Cunha e Silva Filho


No geral, todos os males crônicos que afligem a população do Rio de Janeiro, malgrado reconheça que alguns igualmente se vêem em outras capitais brasileiras, poderiam deixar de sê-lo se a autoridade pública e setor privado se dessem as mãos e procurassem meios de diminuir o seu impacto catastrófico para a sociedade, principalmente para as camadas menos favorecidas da população que se utilizam desse transporte de massa.

Veja o leitor a tragédia que aconteceu hoje de tarde na Avenida Brasil, onde um ônibus, em velocidade acima do permitido, choca-se com o gradil do viaduto que vem da Ilha do Governador e tomba de ponta cabeça de uma altura de, pelo menos oito metros. Resultado: oito mortos e uns onze feridos, estes conduzidos por resgate de helicóptero ou mesmo de carro, caso de um taxista que, vendo o sofrimento de pessoas feridas, levou as que pôde para um hospital mais próximo. As tragédias, que ninguém deseja que ocorram, unem os brasileiros, o que é uma virtude entre nós.

A causa desse acidente, segundo o depoimento dado à imprensa televisiva por um sobrevivente de nome Daniel Silva, que está em observação num dos hospitais do Rio, apenas tendo sofrido um pancada na cabeça e alguns ferimentos leves, foi uma discussão entre um passageiro e o motorista, O passageiro, indignado com a velocidade do ônibus, advertira duramente o motorista de que ele estava correndo muito e poderia provocar um acidente. O motorista, de forma malcriada, soltando palavrões, lhe respondera que se o passageiro quisesse “conforto,” que fosse pegar um táxi. Foi nesta rápida e áspera discussão, levada quase às vias de fato entre os dois, que, de repente, o veículo se desgovernara e, como afirmei, despencara do viaduto.
Outra versão, todavia,   conta que o  passageiro indignado, um jovem universitário, havia primeiro dado  o sinal  para saltar num  ponto sem que o motorista  o atendesse, daí ter-se  iniciado um bate-boca que chegou à agressão  por parte do passageiro. O motivo do acidente, mostra-se, pois,  conflitante quanto ao que de fato  se deu no veiculo. De qualquer  forma,  para mim  a causa  primeira seria a alta  velocidade que explica    essa tragédia.
Quem anda muito de ônibus no Rio sabe que uma tragédia dessa magnitude era de se esperar. Eu próprio, que ando também de ônibus, já me vi na mesma situação em que se encontravam os passageiros dessa tragédia. Muitas vezes já chamei a atenção de motoristas imprevidentes, irresponsáveis, violentos e mal preparados para a função que exercem. Por outro lado, ao chamar a atenção de um motorista desta espécie, quase sempre não encontro ninguém no veículo que manifeste solidariedade a mim. Ao contrário, alguns até mostram-se hostis. Em suma, estamos sozinhos nesta queixa contra maus profissionais de volante e o cúmulo disso tudo é que há passageiros que só gostam de motoristas que correm muito como desvairados. Por aí se vê que a situação é delicada e difícil.

Deixando de lado este aspecto digamos, de “desunião’ dentro de coletivos, há uma reivindicação que poderia ser levada a sério a fim de mobilizar os usuários de ônibus independente do que seja a sua reação ou a sua opinião sobre o assunto. Através dos meios de informação de que dispomos, poder-se-ia lançar uma campanha de esclarecimento aos usuários de coletivos no sentido de que pressionem as linhas de ônibus a modificarem a forma de seleção de motoristas urbanos, exigindo maior qualificação, competência e comportamento educado e respeitoso para com os passageiros.

Não desconhecemos que existam motoristas sérios e responsáveis. Contudo, estes são raros, constituem uma minoria. Ora, o passageiro não pode contar com somente uma minoria de bons motoristas. Precisamos de uma maioria de motoristas de bom nível profissional e pessoas de caráter. E isso só conseguiremos quando as empresas de transportes de massa também pensem no bem-estar do passageiro, na integridade física das pessoas. Também há um componente a ser considerado nesta mudança de perfil de motorista: os salários deles devem ser melhorados afim de que sejam estimulados a trabalhar em condições saudáveis ao seu desempenho, de alta utilidade social.

Talvez, o Rio de Janeiro seja a cidade brasileira em que o desempenho dos motoristas seja o mais deplorável em muitos aspectos: 1) Não respeitam o aceno que os passageiros fazem para entrar no veículo em pontos obrigatórios de parada; 2) Não têm consideração com as pessoas idosas que embarcam com os seus cartões de gratuidade; 3) Dirigem em alta velocidade, fazem desnecessárias freadas bruscas podendo causar acidentes dentro do próprio veículo; 3) Dão partida imediata e apressada ao veículo ainda quando o passageiro está subindo os degraus da porta de entrada, valendo o mesmo nas saídas do passageiro.4) Não respondem ao passageiro que lhes dá um “bom dia”, “boa tarde” ou “boa noite.” Ora, o motorista devia estar consciente de que o seu emprego depende dos passageiros que usam o coletivo.

Há ainda outros aspectos do problema e estes são da alçada da Secretaria de Transportes do Estado do Rio de Janeiro. A ela compete fiscalizar continuamente e com rigor a qualidade de transporte de ônibus circulando na cidade. Condições do estado do veículo, idade do ônibus, manutenção da frota, pneus, freios, obrigatoriedade de tacógrafos (espécie de “caixa-preta” do veículo), de GPS, câmeras, e de outros recursos tecnológicos que fornecem preciosos dados sobre o veículo.

O serviço de reclamações de passageiros à autoridade pública ou privada não pode ser uma letra morta, mas deve ser efetivo, produzir melhorias, punir motoristas que põem a via do passageiro em risco. Ou seja, a fiscalização deve ser para valer e ao passageiro reclamante individual ou, ou se forem muitos, coletivamente, se deve dar satisfação do que se fez em relação às reclamações. Isso poderia ser feito de forma escrita ao reclamante ou reclamantes.

Outras instâncias públicas ou privadas que poderiam dar sua contribuição inestimável seriam, por exemplo, a Polícia de Trânsito, o Ministério Público, a OAB, a Secretaria Municipal de Transportes e, por último, o Ministério dos Transportes.

Espero que as autoridades citadas assumam sua responsabilidade de cargos púlicos   ou dêem a sua contribuição com vistas a sanar um dos males crônicos que há tempos está pondo em constante risco as vidas das pessoas que dependem, para seu deslocamento diário, de andar de ônibus. A omissão das autoridades responsáveis pelo transporte de ônibus sinalizaria um comportamento de cumplicidade com o estado lamentável em que se encontram os passageiros que precisam usar ônibus na cidade.. Enfim, a intenção deste artigo é cobrar providências urgentes e concretas no serviço de transporte de ônibus do Rio de Janeiro.



segunda-feira, 1 de abril de 2013

Tradução de um poema de Théophile Gautier ( 1811-1872)











                 L’aveugle


Un  aveugle au coin d’une borne,
Hagard comme um jour un hibou,
Sur son flageolet, d’un air morne,
Tâtonne en se trompant de trou,


Et joue un ancien vaudevillle
Qu’il fausse impertubablment;
Son chien le conduit par la ville,
Spectre diurne à l’oeil dormant.


Les jours sur lui passent sans luire;
Sombre, il entend le monde obscure
Et la vie invisible bruire
Comme un torrent derrière un mur.


Dieu sait quelles chimères noires
Hantent cet opaque cerveau!
Et quells illisibles grimoires
L’idée écrit en ce caveau”


Ainsi dans les puits de Venise,
Un prisioner à demi fou,
Pendant as nuit que s’éternise,
Grave des mots avec um clou.


Mais peut-être aux heures fúnebres,
Quand la mort, souffle le flambeau,
L’âme habitué aux ténèbres
Y verra clair dans le tombeau!



                   O cego



Um cego, num canto determinado,
Desvairado como um mocho de dia,
Com seu flajolé, de ar batido,
Um buraco encontrado tateia.


Toca ele um velho vaudeville
Completamente desafinado.
Seu cão pela cidade o guia
Fantasma diurno de imobilizado olhar.


Na escuridão transcorrem seus dias
Sombrio, o negrume do mundo percebe
E o tumulto invisível da vida
Qual uma torrente atrás de uma parede.


Sabe Deus que lúgubres quimeras
Este opaco cérebro assombram
E que ilegíveis garranchos
A ideia nesta sepultura escreve.

Assim, nas prisões de Veneza,
Um sentenciado meio louco,
Durante a noite sem fim,
Com um prego grava palavras.

Quem sabe, porém, nas horas fúnebres,
Quando a morte a luz apaga
A alma, afeita às trevas,
Lá no túmulo a luz verá!



                                                     (Trad. de Cunha e Silva Filho)