terça-feira, 6 de junho de 2017

SOBRE O BRASIL ATUAL: ALGUMAS INDIGNAÇÕES

                                        
                                                                         Cunha e Silva Filho

        
         Já se está falando que a Operação Lava-Jato vai ter  o mesmo destino  da italiana  Mãos Limpas. Não direi que sim, mas também não direi que não. Mas a novela  da impunidade, da corrupção e da violência sem freios já mostrou  a sua  resistência às leis,  à democracia plena, às soluções que delas esperamos sem o passo de tartaruga,  sem as protelações,  sem os jogos  das instâncias  jurídicas, sem empurrar a barriga.
       O povo quer  conclusões,   justiça feita contra malversações  do dinheiro público que, em parte, escorreu pelo ralo  das propinas milionárias, aqui e fora do país, pois a corrupção  nacional  se internalizou  para grande vexame  dos homens de bem desta Nação vilipendiada nos seus  fundamentos básicos:  seu sistema político  desmoralizado,   suas instituições   desacreditas, sua falta de rumo para a sucessão  do novo  presidente   da República. Um mato sem cachorro. Um caminhar nas trevas  do imponderável.
      O quadro  político brasileiro mostra-se sombrio. O país se encontra  dividido em várias  classes sociais, o povão, “bestializado” em sua grande parte,  pouco se importa com os graves  problemas   que  atravessamos. Para  suavizar  seus males e sua  carência encontra um meio de entrar num botequim, preparar-se para o próximo carnaval e assistir  a um jogo  de futebol num boteco próximo de sua casa, ou ainda participar de  uma roda de samba de fundo de quintal na periferia  das grandes  cidades.  Seu  único  gesto  é o da sobrevivência,  do salve-se quem puder,  com medo só da falta de emprego, preocupado só  com o sustento   da família,  e com a desenfreada violência urbana ou mesmo  interiorana, à frente, a bala perdida,  o desespero de mortes anunciadas,  que se banalizam  com a sua recorrência  sem fim.
       No entanto,  as reais causas primeiras,  o fundo das questões  que levaram à crise   econômico-financeira estão muito longe de sua compreensão. Penso mesmo que os políticos  maus do Brasil  jogam   com essas carências,  com essa ignorância,  com   as ideias embaralhadas  do uomo qualumque sem  estudo,  o analfabeto, analfabeto funcional, sem horizontes,  sem metas  definidas. E, por falta de inclusão cultural-econômica, vão se reproduzindo por anos a fio.  São o que o crítico  Eduardo Portella (1932-2017),   definia como  assimetrias   de modos de vida  sociais  dos brasileiros, numa convivência secular  entre o arcaico e o moderno, à semelhança daquela  imagem  culturalmente grotesca de  mansões luxuosas  ao lado da extrema penúria dos favelados.
     Enquanto isso, a sociedade civil letrada ou semiletrada e   socialmente  dividida,  conduz suas vidas  presas a um  individualismo    exagerado,  com os  seus membros afastados uns  dos outros,  vivendo cada um  o seu exclusivismo   em níveis  melhorados  social, cultural   e financeiramente. Aqui se situam a classe média, média  alta, da burguesia  e da elite  econômica. Não existe, assim, homogeneidade ou interpenetração,  mas compartimentação visível  e previsível.
      Por outro lado,  já no caso das investigações da Lava-Jato,  no julgamento da chapa Dilma-Temer, o vaivém das notícias veiculadas pela mídia e por notícias  que saem em áudios, nas redes sociais, essa espécie de 5º poder que  está se  constituindo  no cyberspace,  acrescidas de comentários e opiniões divergentes  ou convergentes, a depender  da posição ideológica  do usuário, os fatos que vêm à tona vão se acumulando  vertiginosamente ao ponto de  deixarem  algumas pessoas  entediadas  da mesmice  da questões.
    Essa explosão de fatos  do mesmo teor sobre decisões tomadas  pela Justiça,  pelos Tribunais, pelo Ministério Público e pela Procuradoria  Geral da União são muito maiores  na sua  quantidade do que  a nossa capacidade de assimilação de muitas delas. 
  Já uma vez, em artigo,  chamei  às desastrosas  e multiformes   formas do comportamento  político  do país de “poliedro de insânias.”   Constato, infelizmente,  que ainda penso de igual  maneira.  Pouco se alterou  o que era de ruim  na política  nacional,  nos nossos males renitentes, nas nossas crises, quer morais, financeiras,  econômicas,  quer no setor de segurança  pública,  na educação,  no ensino  universitário,  na saúde,  nos transportes, no meio-ambiente,  na mais aguda   onda de violência de que já se teve notícia na história da  sociedade brasileira. Assim como  na  impunidade  diante  de todos esses  aflitivos  problemas  que vêm  maltratando o nosso povo. Ainda que tentemos ser  um pouco esperançosos,   a realidade  do país  ainda se mostra  inquietante,   arriscada,  perigosa,
  Quando Dilma foi  destituída do poder no seu segundo mandato, por via do impeachment,  ainda cheguei a pensar que teríamos  águas menos turbulentas. Qual nada! Mudou-se o governo, mudaram-se  os ministros,   e lá veio o vendaval de novos  escândalos, desta vez  envolvendo o vice-presidente  do governo Dilma, o atual   presidente Temer.  Investigações novas  vieram  comprometer  o seu  mandato que parecia, a princípio, estar  dando alguns passos  certos, porém  polêmicos,  como  reformas  intempestivas  na Previdência Social, nas leis trabalhistas e na condição das finanças  federais, procurando,  segundo  o próprio Temer proclamara,  “pôr a economia nos trilhos.”   
    No entanto,  as investigações da Polícia Federal  levantaram o véu da  fantasia da sisudez  do Temer e causaram um   nova reviravolta  no seu  instável  governo, tendo ele na berlinda  de  ser mais um  membro do governo considerado  como suposto   beneficiário  das práticas  de propinas e dinheiro  oriundo de Caixa 2  durante   campanhas  políticas  ao lado de Dilma Rousseff.  A espada de Dâmocles agora paira sobre a cabeça  do ex-professor de Direito Constitucional, de um político  culto, inteligente,  diplomático.
    O Brasil não vai bem das pernas. Há algo  que não dá certo  quando uma  pequena luz  surge no  fim do túnel. Pode-se afirmar que  quase ninguém escapa  das manchas deletérias  da propina,  da corrupção passiva ou ativa,  da lavagem de dinheiro, de enriquecimento  ilícito, do conluio  fétido entre políticos  influentes e  parte do grande empresariado  brasileiro,   em tal  magnitude  que  praticamente todas as esperanças  na figura dos nosso  políticos  parecem  nos levar  à condenação geral.
       O país,  rico  por natureza,  quase não aguenta mais de tanta pancada que lhe dão homens inescrupulosos,  ávidos  tanto do poder  quanto do vil mental. Lembro-me agora de um artigo de Leandro Konder (1936-2014) publicado há tempos no  antigo Jornal do Brasil em que  ele  faz uma pequena  e lúcida análise   acerca  do dinheiro e da  morte. Sobre o dinheiro,   me recordo de que ele o considerava  o corruptor de todos os valores.

       Posso finalizar essas reflexões dizendo que  a raiz de toa  essa falta de vergonha nacional  tem como  núcleo  central  o endeusamento  do dinheiro a qualquer custo, ainda que   fira moralmente uma Nação toda  ou um Estado inteiro, como no caso  do Rio de Janeiro, com o Sr. Sérgio Cabral, já preso pela suas  desídias e maracutaias cometidas contra  os cariocas e fluminenses. Todos os que praticaram  ilegalidades e crimes financeiros   abomináveis perderam a dignidade, ou seja, perderam tudo. E não há volta nem perdão,  nem reabilitação  para  criminosos do Erário Público.  

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