segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

O PAÍS QUE SEMPRE ADIA

                                     


                                                                    Cunha e Silva Filho


     A quem  já viveu uma boa experiência de vida, lembro aqui de uma crônica exemplar de Paulo Mendes Campos (1922-1991) falando sobre o espírito protelatório do brasileiro. Nem me recordo mais do título, mas ela é muito atual para os dias que vivemos no país Concordo em gênero número e grau  com  o  apreciado  cronista, jornalista  e poeta brasileiro. Repare o leitor se o cronista não estava certo. Darei    como exemplo  o  setor  da segurança  pública    do Rio de Janeiro. 
      Veja-se o que a ação protelatória   fez com a segurança  pública  desse estado da Federação, sobretudo na cidade do Rio de Janeiro. Aproximadamente,  pode-se afirmar que  há trinta anos  os cariocas  começaram a sentir  na pele as consequências severas  da violência que de então ate hoje  só tem  crescido ao ponto de o governo  federal  ter tomado  a difícil decisão de nomear um interventor militar, o general  Braga Neto,  para ser comandante-em-chefe,   com   todos os poderes  de sua função,  da segurança  fluminense.
    Eu diria que o passo dado pelo governo federal só foi  dado  porque a escalada   da violência  chegou a tal  ponto  que o próprio governador  Pezão  houve por bem  pedir socorro ao Presidente da república  alegando  que tinha perdido  total  controle  da alarmante   e caótica desordem  social que se instalou no asfalto e nas favelas por traficantes  de drogas s e meliantes  oportunista.
    O ponto máximo  de grau de violência e barbárie  localizou-se  em pleno carnaval  carioca. As imagens, na zona  sul, de facínoras armados com fuzis  atirando  em várias  direções,   um  policial civil sendo quase  massacrado por um bando de bandidos,  uma senhora  idosa sendo  caçada numa   calçada da zona sul  e imobilizada por  criminosos que lhe tomavam tudo   que lhes parecesse valioso e outras cenas  de selvageria como arrastões,  furtos, assaltos em diferentes  lugares do Rio de Janeiro  foram a gota d’água a  fim de que o governo federal  acordasse de um longo  sono  pesado  para a realidade nua e crua  da vida carioca de hoje.
   Agora, me pergunto: por que não se  tomou  essa decisão  muito  tempo atrás? Sabia-se há tempos que o Rio, tal como São Paulo e outras cidades pelo país afora,  já vinha dando   evidentes e sobejos sinais de que  a coisa estava ficando preta  para os brasileiros de todas as classes. Pelo Rio de Janeiro, o Estado,   passaram vários governadores ( Moreira Franco, Brizola, Garotinho,  a mulher do Garotinho,  Benedita  da Silva,  Sérgio Cabral e Pezão) e, no mandato de cada um deles,  o Rio de Janeiro  já vinha  sofrendo  as consequências de uma segurança  pública   mal conduzida. 
      Medidas contra  a violência  não nego,  foram  tomadas, mas nenhuma delas surtiu  efeito positivo  relativamente  à segurança  que  teimava em  se manter  cada vez mais ameaçadora Implantaram-se as UPPs porém estas foram  fogo de palha,  porquanto  a violência nos morros  recrudescia e,  no varejo,  vieram as balas perdidas matando  crianças, jovens e adultos  decorrentes dos confrontos entre facções criminosas, milícias ou entre forças de segurança pública e meliantes em geral.   
  O fato é que a violência ascendente atingiu tão magnitude que seus agressores  passaram a  mandar e desmandar  nos morros e favelas, de todos os cantos  do Rio de Janeiro. Nessas comunidades começou a imperar  a lei dos chefes de quadrilhas cada vez mais bem armadas e, em muitos casos,  bem superiores às   dos policiais civis e militares. 
   As favelas e os morros  deixaram de pertencer a um país com ordenamento  jurídico para se definir como   “cidades paralelas” “governos paralelos,” “cidades partidas” - enclaves  com as suas leis próprias e draconianas, “olho por olho,” “dente por dente”, ou seja, pena de talião. Seus modos de vida em flagrante  dissociação  com a vida no asfalto. Nesses  enclaves manda quem  tem mais, império da   força  bruta e das armas, lei do cão,   “cidade de Deus,”   lei do silêncio, em convivência  tácita   à revelia  da estrutura do Estado Brasileiro. Desobediência civil ampla  e irrestrita.
   Ali só entra quem  passar por uma revista  de homens armados. Quem desobedecer  a seus esquemas  sofre pena capital. Ali os serviços de luz, gás e outros  só funcionam  se passarem  pelas mãos de um chefe de quadrilha, traficante ou miliciano, ou melhor, quem  esteja com o poder  nas mãos sempre sujeito a ser substituído  por outro bando de criminosos  invasores  e vitoriosos  na batalhas entre  marginais. Ali poucos viverão  uma velhice feliz. Quase todos morrem  em plena adolescência, ou  ainda mocidade.
  Muitos  dos que  vão ajudar seus chefes são analfabetos  funcionais ou  senão analfabetos. Os que se rebelam contra esses  chefes de tráfico são expulsos ou mortos. Não há meio termo. Não há diálogo. Os dedos-duros são penalizados mortalmente. Há tempos a pena de morte ai  se tornou consuetudinária. Ninguém escapa  dos algozes. A solução para tudo ali  só se resolve com um tiro na testa, sem julgamentos nem tribunais,  nem  promotores nem  defensores, nem jurados, quanto menos  juízes togados.  
   Perdidos para sempre  são essas gerações  esquecidas dos poderes  públicos, vivendo vidas relativas  e  temporárias,   ao arrepio das leis do Estado Brasileiro. A intervenção das Forças Armadas, acima de ideologias  e partidos políticos,  é um  dever  das autoridades e, para mim,  é um ponto de partida. Já é um começo da batalha contra a violência tentacular e covarde  que angustia e cobre de luto  a sociedade  carioca.
       


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