domingo, 27 de março de 2016

QUANDO O PASSADO SE CONFIRMA E SE REFORÇA NO PRESENTE




 Cunha e Silva Filho 


          NOTA  PRÉVIA.  O artigo abaixo é uma reprodução de uma texto meu publicado em 2006, no qual sintetizei alguns traços do perfil político do ex-presidente Lula. O artigo saiu publicado no Jornal Diário do Povo, de Teresina, Piauí,  em 13/06/2006. O que, após quase uma década, quero reafirmar é a ideia que, na época, fazia desse político e, acima, de tudo, modéstia à parte, a coerência com que lhe desenhei a forma de seu comportamento de político que antecipava todos os desdobramentos que hoje a grande parcela do eleitorado tem a respeito dele.
         Com o tempo, aquele mau político ainda piorou a sua imagem ante o cenário tenebroso que o petismo está revelando à sociedade brasileira e ao mundo.Os leitores, a partir daquele artigo, facilmente poderão também chancelar certos quesitos por mim destacados como crítica antecipadora, segundo já disse, das linha de força que permeiam a trajetória do PT nos dias que correm.
       Ademais, chamo a atenção do leitor para as muitas expressões que coloquei no antigo artigo utilizando sublinhados ao leitor. Intencionalmente, usei desse expediente gráfico para reforçar o longo percurso de um série de escândalos pelos quais o pais, quase dez anos depois, iria atravessar de forma ainda mais acintosa culminando com a Operação Lava-Jato, o ponto alto do que a Justiça brasileira, pela ações corajosas do juiz federal Sérgio Moro e da Polícia Federal, conseguiu   apurar nas investigações à procura de dilapidadores do dinheiro público do Estado brasileiro.
   O epílogo dessa mega-operação jurídico-policial só se dará quando tudo for revelado da sujeira, improbidade, falta de ética e toda a sorte de desídias cometidas contra a Nação pelos governos do ex-presidente Lula até essa fase de segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. 


                                                       A interface do governo Lula 


          No último debate da corrida presidencial realizado pela TV Globo, entre o candidato Lula, hoje presidente do país, e o político José Serra, analisando a mise-em-scène de ambos, e sobretudo de Lula, e certamente levado por um sexto sentido, tive uma desagradável e estranha sensação de que o candidato petista me dava uma ideia de alguma coisa fabricada, de algo postiço, de alguém que, mais cedo ou mais tarde, iria me causar alguma decepção. Não deu outra.
           Tendo nele votado, coisa de que me arrependo profundamente agora, fui aos poucos confirmando aquela desagradável sensação daquele último debate pela TV. Com o na dar da carruagem, fui me convencendo de que me deixara enganar por um candidato do qual esperava fosse cumprir um projeto de governo no qual, pelo menos, se mostrasse contrário a uma série de erros do governo Fernando Henrique Cardoso, seu antecessor. 
       Vitorioso na eleição, Lula apagou da memória todo o seu discurso de fundo moralista e ético apregoado em campanha para a presidência da República e até mesmo as suas ideias supostamente ousadas de viés esquerdista dos tempos de líder sindicalista em São Paulo. Figuras da intelligentsia brasileira, desde a fundação do PT, embarcaram no discurso político petista. 
         Onde estão esses intelectuais que deram sustentação ideológica ao Partido dos Trabalhadores, máxime à carismática persona de Lula? Não vingaram as ideias de mudança para um Brasil ético e moralizado, voltado para o bem-estar de todos e não só da pobreza.
          O vento neoliberal, inaugurado pela era Collor e retomado na sua radicalização pela era FHC, encontrou pleno agasalho nas asas do candidato das esquerdas brasileiras, co suas siglas hoje já gastas e desacreditadas mundialmente. Ao atual governo petista só interessam os altos juros graças aos quais tem conquistado dividendos na economia, mas, lamentavelmente, ao custo de um pesado fardo e sacrifício para a classe média. 
             Saúde, educação, tributação, sobretudo são os setores em que o povo em geral tem mais sentido a presença omissa e autoritária – caso do imposto de renda de pessoa jurídica e sobretudo física – esta última constituindo verdadeiro confisco salarial perpetrada pelo atual governo. Mas, voltando à persona de Lula, o que mais tem desqualificado o seu governo, não o credenciando, portanto, para um novo mandato, é a avalanche de práticas de ilicitudes e de desmoralização político-administrativa, cujo epicentro se situa no chamado “escândalo do mensalão,” segundo podemos acompanhar perplexos através das páginas de um jornal do porte da Folha de São Paulo, transformado em verdadeiro baluarte da causa democrática denunciando e verberando, passo a passo, essa grave crise moral por que está passando o nosso país.

terça-feira, 22 de março de 2016

Renúncia, impeachment, Lava-Jato e a crise econômica




                      Cunha e Silva Filho


        As  três situações de desordem, indicadas no título deste artigo, exceção feita à Operação Lava-Jato, configuram  o quadro atípico da vida em nosso país. Elas estão inextricavelmente interpenetradas. Daí seu caráter assustador. O deslindamento de cada um  exige de minha parte deveres com a minha consciência e com a minha dignidade de cidadão brasileiro que, antes de tudo,  só  aspira a um desfecho  que venha servir ao bem-estar de nosso povo e, por povo  entendo os vários níveis sociais e culturais.
      O primeiro item, a renúncia, de Dilma  é uma saída honrosa tanto para ela quanto para a Nação. Sei que vai  ser espinhoso  o que virá depois disso, ou seja,  um mandato-tampão a ser ocupado em consonância com a legislação vigente. Será efetivado consoante com os princípios constitucionais do preenchimento da vaga deixada. Pode até não ser uma figura ideal o novo ocupante, mas ela terá,  sob sua responsabilidade, que   evitar  o tumulto social,  político e econômico. Tal mudança atenderá à maior parte  da sociedade   civil e evitará  um mal maior e indesejável para todos os compatriotas.Isso não configuraria nenhum atentado à Constituição e, por conseguinte,  não seria  um golpe conforme alegaria   a política da situação.
    A presidente Dilma não mais  atende à vontade da maioria que foi às urnas maciçamente  pedir o seu afastamento ou  o seu  impeachment, assim como a punição dos responsáveis pela rapinagem  praticada  por políticos do PT e de outros partidos. Todo o trabalho de dois anos da Polícia  Federal, nas várias etapas realizadas sob o amparo da Lei e tendo à frente  as gestões  corajosas  do juiz Sérgio Moro, foi o de revelar  culpado e conluiados em lavagem de dinheiro, formação de quadrilha envolvendo  o governo  federal , e grandes empreiteiras  que  financiaram  campanhas  políticas  milionárias para elegerem  o ex-presidente Lula e inúmeros  políticos  petistas e da base aliada.
      Ora,  esse desvio  surrupiado dos cofres  públicos  se estendeu até os  governos de Dilma  tendo como fonte  principal a menina  de  ovos de ouro, a principal e mais  poderosa estatal brasileira, a Petrobrás num esquema  sórdido montado por alguns de seus dirigentes em conchavo criminosos com os políticos do governo  durante toda essa era  dominada pelo petismo. Todo esse  período em que o petismo  tem mandado e desmandado  impunemente no  governo  só poderia desaguar  nas contínuas e profundas  investigações,  denúncias e delações premiadas  levadas a cabo   graças à competência  da Polícia Federal, do Ministério Público e de Procuradores  Federais  e, sobretudo, da coragem e patriotismo do jovem e destemido  juiz federal  Sérgio  Moro.
   O caos  econômico, ao contrário do que  apontam  economistas, alguns deles  professores de universidades federais(caso  da USP), estaduais e até particulares (caso da PUC) com  implícitas   simpatia  pelo petismo,   não teve nenhuma  relação com a situação  externa do país. A desordem financeira atual se originou, máxime do dinheiro   desviado  da Petrobrás  para pagamento de milionárias propinas a políticos  do alto escalão  da República em decorrência de  contratos  celebrados entre os dirigentes da Petrobrás e as conhecidas  grandes empreiteiras, contratos  em licitações   com cartas marcadas  favorecendo grupos de empresários e políticos  da situação e de partidos da base aliada.
    O  imbróglio em que se meteu  o ex-presidente  Lula ao ser convidado por  Dilma para o relevante   cargo  de ministro da Casa Civil  complicou ainda mais a situação  constrangedora dele junto aos brasileiros, principalmente   quando foi grampeada uma conversa dele com   Dilma,  na qual a presidente  expressamente  lhe  concede, diante do desespero em face da iminência da prisão de Lula,   o cargo  de ministro  e até com  o termo de posse antecipado.  A atitude  no mínimo insólita da  presidente atesta,  por si  só,  o estado de  emparedamento diante da gravíssima   situação   da sua  malograda  administração.
    A posse atropelada  de Lula provocou  seguramente mais transtornos ao governo Dilma, mais desgastes, mais desmoralização da opinião público, ainda mais reforçada por um outro grampo  feito pela  investigação Lava-Jato  que flagrou  uma conversa  de dois  personagens  trocando  informações sobre o que poderia  acontecer com o Lula.
   O mais intrigante é que nessa conversa  pude  perceber nitidamente  o nível de irresponsabilidade e de   incertezas em que o diálogo  aconteceu. 
   A forma de linguagem – um prato cheio para a análise do discurso de algum  professor  de linguística – possui  um certo ar  de tragicomédia  com que são discutidos   assuntos  algo sórdidos nos bastidores  do governo  petista. É tão medíocre  o que  Rui Falcão, presidente do PT, diz para  o ex-ministro da Defesa,  Jaques Wagner, que me deixa impressionado com   a falta do que  fazer, de como agir num diálogo, diria melhor,  quase monólogo afásico  entre os dois. A conclusão que tirei desse diálogo mal-ajambrado, claudicante,  sem saída,  digno mais de uma  ópera-bufa, foi que ambos  pareciam  atônitos,  logo os dois  tão acostumados  às fanfarronices e ao baixo clero da politicagem  nacional.
     A polêmica  inflamada decorrente da impugnação da posse de Lula para o cargo de ministro da Casa Civil pelo ministro  Gilmar Mendes tem dividido  a opinião de magistrados  e juristas de todas as colorações  políticas. E  a alegação de se dizer que um ministro  do STJ sempre é movido pela imparcialidade é um ato  falho, porque não há como ser imparcial  avant la  lettre se levarmos  em conta  o elemento  da subjetividade. Mesmo a objetividade mais  despojada,  contém  algo  de subjetivo. Somos humanos, não máquinas, como diria  o  genial  Charles  Chaplin.
     Um juiz, um magistrado, tem o seu lado pessoal - como não?-  suas preferências políticas. Porém, no caso, de Gilmar Mendes ele não poderia ser indigitado como parcial, de vez que é a sociedade brasileira que, para as ruas no país inteiro, tem afluído gigantescamente clamando por justiça e pela moralidade e fim da  impunidade no país.
       A grande questão nacional no tocante a partidos  políticos  é que nela o diálogo  é quase  escasso.Contudo,  há certas  circunstâncias ou conjunturas históricas  que, ante dos fatos e as evidências comprovadas nas investigações  da Polícia federal desde o início do governo  Lula,  nos dão  o equilíbrio  e a consciência  necessários  ao discernimento para  verificarmos  o que realmente anda errado nas administrações  petistas.
        O que se  revelou das investigações   complicando    o comportamento e as ações supostamente  éticos do PT – lavagem de dinheiro,   falsidade ideológica,   desvios  astronômicos  do dinheiro público, desídias de toda a sorte  praticadas e consentidas pelos próceres do PT  e dos seus aliados nem precisaria de tantas  filigranas  e chicanas  jurídicas para  comprovação da realidade  político-social-econômica nacional.
       Tudo está claramente visto,  denunciado,  revelado,  avaliado, comprovado e a comprovar, pois as ações da Lava-Jato não terminaram ainda. Seria tapar o sol com uma peneira não ver que  o ciclo petista  se desviou  radicalmente dos   princípios de  formação  ideológica  voltados sobretudo para os desfavorecidos. Reconheço, sim, alguns pontos positivos, melhorias  dos excluídos e outros benéficos sociais   fundamentais da vida de grande parcela  dos brasileiros  que historicamente viveram na   pobreza  absoluta,  como, de certa forma,  ainda vivem alguns patrícios nossos nesse país de dimensão continental.
       Por outro lado,  fazer algo de bom  para  uma minoria,não é o suficiente se   o partido  escolhe, a certa altura da era Lula,  o caminho  mais execrável possível: o da  falta de ética,  o da  roubalheira,   o  da compra de  aliados  para se sustentar, a todo o custo, no poder  o dos inúmeros escândalos  enlameando as raízes  éticas da formação do PT.
        Com isso,  o partido  dos trabalhadores   debandou-se para  a politicagem mais nauseabunda e cínica  de que se tem notícia,  na qual  tudo valia  para que   o petismo se perpetuasse no  poder.
        Por outro lado, quem, em sã consciência,  vai  negar o holocausto,   os crimes de Hitler,  de Mussolini, de Fidel Castro, de Franco, de Idi Amin,  de Mussolini, de Salazar,  de Bashar Al-Assad, de Pinochet, do stalinismo, do Estado Novo getulista,  dos excessos e da ditadura  militar no Brasil, da forma nefasta e criminosa do governo  Bush II e outros tantos  crimes de ditadores e tiranos pelo mundo afora, sem falar de novas formas    de extrema violência de grupos terroristas  que estão  assolando  a paz intera até de países  antes tranquilos?  E essa  selvageria  só abrange certa parte da contemporaneidade  de séculos mais  próximos de nós.

    Diante dessas  ponderações,   a minha pergunta  final é: quem pode, sem paixão nem  fanatismo,  nem tampouco  oportunismo  criminoso afirmar que o governo do PT  seja hoje o que   foram  os seus fundamentos históricos, éticos,  ideológicos ? 

segunda-feira, 21 de março de 2016

Tradução do poema "La fuite du temps", de Pierre Ronsard ( 1524-1585)





La Fuite du Temps

                                  

Quand je suis vingt ou trente moois
Sans retourner em Vendomois,
Plein de pensées gababonde,
Plein d’um remords et d’um souci,
Aus rochers je me plains ainsi,
Aux bois, aux antres et aux ondes.

Rochers, bien  que soyez âgés
De trois mille ans, vous ne changez
Jamais ni d’état ni de forme;
Mais toujours ma jeunesse fuit,
Et la vieillesse que me suit
De jeune en  veillard me transforme.

Bois, bien   que perdiez les ans
En hiver vos cheveux mouvants
L’an d’aprês que se renouvelle
Renouvelle aussi votre chef
Mais le mien ne peut derechef
Ravoir sa perruque nouvelle.

Antres, je me suis vu chez vous
Avoir jadis verts les genoux,
Le corps plus dur,
Et les genoux, qui n’est le mur
Qui froidement vous environne.

Ondes, sans fin vous promenez,
Et vous mener e ramenez
Vos flots d’un cours que ne séjourne;
Et moi, san  faire long séjour,
Je m’en vais de nuit et de jour,
Au lieu d’où plus on ne retourne.


INEXORÁVEL TEMPO

                                                          Pierre Ronsard

Quando distante fico de Vendomois,
Durante  vinte ou trinta meses,
Cheio de pensamentos errantes,
Pleno de remorsos e de inquietações,
Aos rochedos, aos bosques, às cavernas
E às ondas meus queixumes apelo.

Ò rochedos,  posto que tenhais  uma vida
De três mil anos, nunca vos  modificastes
Nem a forma nem o lugar que ocupais.
Quanto mais me fogem  os verdes anos
Tanto mais me perseguem os anos
Transformando-me de jovem em velho.

Ò bosques, conquanto todos os anos
 Percebais,  a cada inverno,
Da tua esvoaçante  folhagem  a queda
No ano    seguinte tudo se renova,
Inclusive também vossa folhagem.
Dos  meus cabelos o antigo viço não recobre

Ò cavernas, convosco  outrora já estive.
Juvenis  meus joelhos  então eram.
Ágil o  corpo, a mão possante,
Agora,  porém,  ainda mais  duro meu corpo  está.
 Igualmente, os meus joelhos não são iguais
À parede  que friamente vos envolve.

Ò ondas,  infinitamente  conduzi e reconduzi
Vossas águas a um  destino 
Que alcançar não  posso,
E eu, sem que um lugar  seguro  consiga ter,
Um dia, ou noite, 
Partirei  sem mais voltar.


                                    (Trad. de Cunha e Silva Filho

quarta-feira, 16 de março de 2016

Desdobramentos políticos e ilegalidade no Executivo




                                    Cunha e Silva Filho


         Após a gigantesca  manifestação em conjunto dos estados  do país no domingo passado, em protestos  acirrados e patrióticos  contra o atual governo federal e mormente contra o  segundo mandato da presidente Dilma, a politicagem crônica  e a corrupção  em larga escala, colocando na berlinda os denunciados pela Operação  Lava-Jato,  é muito provável  que esse governo de plantão não consiga sobreviver  até o final do mandato de Dilma. Pode-se aventar  a hipótese de que  se encontra ela encalacrada  e não resista às pressões populares ainda que  tenha  convidado  o ex-presidente Lula para exercer uma pasta num dos ministérios.
         A rejeição da sociedade ao governo Dilma é de tal magnitude  que o próprio  alicerce do PT  está prestes  a ruir. Bastaria  uma debandada  da maioria  da bancada do  PMDB para que ela  não contabilize  o mínimo de votos caso  o processo  legal de impeachment prospere. Se, por outro lado,  a situação  dela se agravar  no sentido   ético    como chefe do Executivo, tudo indica que sua  permanência no Palácio do Planalto não  chegará   ao término  do mandato. Está cada vez mais  sozinha  como ficou  Nero na sua derrocada na Roma antiga após a carnificina  contra os cristãos.
       Outro escândalo  envolvendo agora mais um ministro, o Aloysio Mercadante,  conhecido palaciano  muito próximo à presidente, ora  apanhado  em gravações comprometedoras nas delações de Dalcídio  do Amaral,  recrudesce anda mais  a ligação  ambígua daquele  ministro com a corrupção  que  se alastra   por todos  os  poros do petismo, sistema partidário que,   com lei e sem lei,  quer  porque quer, a todo custo,  perpetuar-se no  poder.
    Já o fato  inusitado de a  presidente Dilma  convidar  o Lula para ser ministro  complica  ainda mais  a situação do seu governo uma vez que, assim agindo, ele indiretamente   faz gol contra a sua condição  de cidadão  sob investigação  da Justiça em que pese a nova  condição  do cargo beneficiando-o com  foro  privilegiado – uma excrescência  legal e contraditória ao mesmo  tempo.
         A situação  da Corte Suprema ficará  delicada ainda mais   caso tenha  que  dar andamento  aos processos  penais    contra  o ex-presidente, sobretudo agora  depois que a voz da sociedade  clama a fim de que Lula seja julgado  por supostas prevaricações contra  o dinheiro  público, sobretudo   provenientes  da Petrobrás e de grandes empreiteiras.
         A  gravíssima situação econômica  brasileira  tem, no seu  epicentro,   os contínuos desvios  do dinheiro público destinados a bancar campanhas milionárias tanto de Lula quanto de Dilma  e outros   políticos mediante  impatrióticos conchavos   feitos entre o PT  e as grandes  empreiteiras com o uso  indiscriminado de propinas, superfaturamento,  lavagem de dinheiro, formação de  quadrilhas  e outras   falcatruas  que provocaram rombos  astronômicos,  especialmente  na Petrobrás.
        Ora, a drenagem  continuada  de dinheiro  público  para sustentar vitórias do PT  para parlamentares  e  sobretudo campanhas presidenciais, a gastança desordenada do governo federal  terminaram  por minar  os recursos  orçamentários destinados  à saúde,  segurança,  educação,  transportes e a outros setores  do governo  federal, afora  uma montanha de dinheiro  para fins sociais   eleitoreiros e demagógicos  com  o objetivo de  dar ao governo  uma falsa imagem  de promover a inclusão  social  livrando  o país da extrema  miséria. Até certos limites,  os benefícios sociais  são válidos num programa de  qualquer governo. 
         Entretanto, quando  esse mesmo governo pretende  melhorar  a situação social  de seu povo e ao mesmo  tempo  enriquecer seus principais membros através de   cambalachos,  o lado  positivo  se apaga com a  degradação moral. Ao  utilizar-se desse esquema espúrio,   se  esquece o governo  de que  irá  também  prejudicar  o país no que tange  ao desenvolvimento  de sua indústria, do seu comércio interno e externo, das médias,  pequenas  e micro-empresas. 
      Esses setores,   por seu turno,   sofrerão  grande perdas   de receitas. Em outras palavras, os níveis médios  e baixos da  população  sofrem  grandes  abalos  nos seus orçamentos domésticos. Os governos federal, estaduais e municipais  arrecadam  menos.Quer dizer,  a estrutura   econômico-financeira  involui e provoca  grandes  prejuízos ao país e retrocessos irrecuperáveis  em todos os sentidos e com consequências, infelizmente,  duradouras
     Os mais  desfavorecidos  são muito penalizados com o mencionado  esquema  regido pelo binômio benefício social-corrupção. A burguesia, a alta  burguesia e a elite econômica  perdem mas não perdem muito, pois ainda têm poder de compra e capacidade de investimentos. Com os ativos públicos em queda,  o  governo determina   aumentos  escorchantes  nos produtos,  na cesta básica, nos juros do crédito.
       Com vendas  em declínio, sobretudo as classe médias – barômetro  da economia  nacional -  começam  a reduzir  os seus gastos -   sobretudo os supérfluos – o comércio, a indústria, os serviços perdem receita e provocam  o desemprego, a carestia, o aumento dos juros dos quais  o Brasil  é um campeão no mundo, a recessão,  a inadimplência, o fechamento  das lojas, das fábricas, das indústrias. Enfim, o caos econômico se  instala. A moeda forte,  o dólar oscila com tendência mais de subir do que de descer.  
     Daí se pode deduzir  com facilidade que, na medida em que a  política   se corrompe, sofre abalos   em sua  credibilidade, hoje em baixíssimo ou zero  nível de aceitação  pela sociedade. A economia  acompanha lado a lado  esse descontrole. As contas  públicas,  o endividamento  interno junto aos  bancos  privados,  a instabilidade  governamental, tudo isso entra  na composição  de um  estado  desagregador provocado pela  imoralidade  pública, produto  da corrupção  sem limites  e pela  absoluta  descrença  da sociedade  nas diversas  instituições da máquina do Estado. Esse o sombrio momento  presente no país.
    A se ver pelo nefasto  evoluir  dos acontecimentos,   no que tange ao sistema  político  brasileiro, a entrada  do Lula como  protagonista,   em cargo de alta relevância, vai propiciar  ou uma  adesão submissa  e pusilânime  ao poder  presidencial,  ou  um afastamento   em massa dos partidos aliados do governo Dilma. O que não será bom  para ela.
    Ora, ao assumirem porventura uma posição arriscada, a da submissão e servilismo  oportunista,   os  políticos  brasileiros  que derem as costas aos anseios, reclamos e palavras de ordem sobejamente  demonstrados nas manifestações de domingo passado,     tais como  “Fora Lula!” e “Fora Dilma!,” estarão  selando   a sua derrocada  política  em próximas  eleições e sabe lá o que vai  acontecer com essa  pobre nação desvalida.
   Continuo a sublinhar  isso: o país só tomará uma caminho certo  e prudente se o conjunto de sua  população (de letrados, semi-letrados, analfabetos  funcionais, analfabetos puros ) se revestir de civismo  e patriotismo. A Educação  será  o grande pilar para uma mudança efetiva   de  uma mentalidade   ignorante para a conscientização  e maior   politização  da sociedade.
   Se persistirem a imoralidade política, os escândalos, as denúncias  de corruptos,   sucumbiremos  num precipício funesto. Que  Deus tenha  misericórdia dessa Nação! 


Nota: Já tendo  finalizado a redação deste  artigo, agora mesmo me vem pela televisão um inesperado  pronunciamento à imprensa  de dona  Dilma  anunciando o nome do ex-presidente Lula para o cargo de ministro da Casa Civil. No entanto,  as minhas   posições  expendidas  neste artigo  praticamente   não justificam  alterações  na escrita.

segunda-feira, 14 de março de 2016

E agora, presidente Dilma?





                                             Cunha  e Silva Filho


         As urnas apuradas  para o segundo mandato deram à presidente  Dilma Rousseff  uma pequena margem de um número  maior de votos do que o seu  concorrente, Aécio. Não perdemos muito com o fracasso  do Aécio Neves. No entanto,  com a senhora  Dilma novamente no Alvorada logo logo descobrimos que tinha havido algo  muito estranho no seu programa de governo, quer dizer,  a presidente  nos prometeu mundos e fundos no discurso de posse  e ainda levantou  uma bandeira  ousada  e até alvissareira com um lema que impactava  o setor  da Educação brasileira: “Pátria Educadora.” Todos ficamos  aguardando esse grande passo, o de priorizar a educação no país.
      Entretanto,  aquele lema, nos seus primeiros dias do novo mandato, foi substituído  por  um programa de governo  que veio em cheio  na contramão do que havia prometido na campanha e nos debates  para conquistar  o eleitorado.  Medidas  econômicas  foram  baixadas de tal  sorte que  as promessas de campanha  ficaram  deixadas para trás.
     O engodo logo se tornou  patente. Teríamos  um  governo  autoritário, com determinações no setor da economia que, nos primeiros meses, puseram a descoberto um estado  caótico da situação real nesse setor. Viera de imediato  uma bateria de aumentos de preços em vários setores, em seguida, o arrocho salarial do funcionalismo  público  federal,  a dívida  pública  gigantesca,  os juros altos,   os problemas graves no setor energético, a gastança incomensurável e, finalmente, o que é  pior,  o envolvimento  do governo  Lula e, por tabela,  o da própria Dilma, com a corrupção, vindo à tona  com a Operação Lava-Jato. O que reduziu  drasticamente a popularidade do petismo e do governo Dilma foi a questão ética desdobrada  nas denúncias   que se acumulavam desde o  governo Lula com o ”Mensalão,” o “Petrolão” e as investigações profundas  e continuadas  da Lava-Jato.
     Outros fatores foram, ademais, fortes  complicadores: o desgoverno  da presidente  Dilma em vários flancos, o econômico (dívida  interna espantosa, gigantismo  dos ministérios, recessão,  desemprego,  alto custo de vida),  o político  (promiscuidade  do  do PT  com  a chamada  base aliada sob  a prática   do “toma lá da cá”), o social (escalada da violência em conjunção com a  impunidade  gritante, sucateamento  dos setores da saúde pública, da educação, dos transportes etc.).
   Todo   esse conjunto desviante da normalidade   de um bom gerenciamento do Estado Brasileiro  desencadeou  a aversão  de parte  bem significativa da sociedade civil  ao governo  Dilma e ao partido  principal que lhe dá   apoio e orientação, o PT. Por outro lado,  a queda   vertiginosa  do governo Dilma se deu mais  pela dimensão ética - cumpre  reiterar -  que lhe faltou  desde sobretudo  o segundo  mandato com a mencionada   quebra de promessas e da sonegação, por  motivos  meramente eleitoreiros, de dados financeiros à  sociedade brasileira. Ou seja, o povo se viu traído por Dilma, por suas  promessas  mentirosas. Creio que a sua queda  partiu daí.
   A grande prova  da extrema rejeição do governo Dilma, do lulupetismo e do descrédito  do povo em geral  pela classe  política  teve seu  ponto mais alto nas manifestações em massa ocorridas  ontem em todo o país. Foram protestos  gigantescos, sobretudo,   em São Paulo e Rio  de Janeiro, contra  o desempenho  quase zero da  presidente, contra a corrupção implicando  mortalmente o governo federal jamais vista  em toda a história  do país. Mesmo no exterior, as manifestações foram duras  contra o governo Dilma.
     Essa maciça manifestação nacional contra Dilma indicia, a par das evidências   insofismáveis de que o brasileiro não deseja  mais a sua  continuidade  no poder, novos desdobramentos  em direção  ao seu impeachment, visto que não é possível que  um presidente  ainda deseje persistir  no poder  sem  a aprovação  da maioria do  povo e tendo em vista   o descalabro  geral  de um governo  que se esfarela a olhos vistos.
     Nem adianta  apontar  novas  formas   de governo, como um semi-parlamentarismo ou semi-presidencialismo, porque, se assim acontecesse,  a raiz do problema  persistiria  com  a corrupção  que ronda  o poder  do Planalto  com  novas  investigações  da Lava-Jato e novos  personagens  corruptos que irão se somar  aos já existentes  e presos.
    Se não se corta o mal pela raiz,  o câncer da corrupção  governamental  vira metástase e aí a situação   de Dilma  tenderá a ser o isolamento tanto dos partidos que a apoiam quanto do que resta   do desmoralizado  e decadente  PT.

       Os milhões de  brasileiros  que saíram às ruas  não mais  dão nenhuma crédito ao governo Dilma. Essa  posição da sociedade civil  é mais do que suficiente para que   a presidente  possa  vir a ter  a alternativa de   dois desfechos trágicos e de extrema  solidão:  a renúncia ao segundo  mandato ou, contra a sua  insistência em  permanecer no cargo, o impeachment conduzido por vias democráticas e conforme a legislação vigente. O Brasil, recordo,  não é uma pequena república  sul-americana, nem tampouco uma   Síria. É um país que ainda tem assegurada a normalidade  democrática e os seus três  poderes ainda estão sob   a proteção  constitucional. 

sexta-feira, 11 de março de 2016

O Elogio dos Blogs




                                     Cunha e Silva Filho




   Conversando  com a minha   esposa, ela,  de repente,  me  soltou  esta afirmação:“Você, Francisco, nunca imaginou que, um dia,  seria um viciado em computador.” Você, algum dia,  imaginaria  que haveria esse  notável e utilíssimo  meio de se comunicação com o Brasil,  o mundo, os continentes  e que muita gente  ficaria lendo, ainda que uma só vez,  um texto seu?” Não lhe respondi, apenas olhei para ela com um sorriso.É claro que   ela se referia aos blogs.
     A primeira vez que me deparei com o termo blog foi num texto em inglês falando  justamente dessa forma  de  comunicação  virtual. De início,  nada entendi o que fosse  um blog, para que serviria. O texto falava sobre a aplicabilidade do blog e, para um leigo como eu em assuntos de usos da mídia virtual, tudo me parecia confuso. Esse texto  teria que trabalhar numa das minhas alas de inglês na seção chamada Prevest. Do Colégio Militar do Rio de Janeiro. O Prevest é uma seção destinada a preparar os alunos  do ensino médio aos vestibulares no país. Se não incorro em erro, ela se subdividia em  turmas de humanas,  biológicas   e tecnológicas. Como professor de língua estrangeira, me reservavam as turmas  de humanas.
    Confesso que o texto me era algo  problemático para  discutir com os alunos  porque não atinava ainda com  a natureza real  do que fosse um  blog. Inclusive, serei franco, achava que blogueiro era para  alguém desocupado  que  usava esse meio digital para escrever  sobre  si mesmo sem nenhuma preocupação de maior  importância.Quer  dizer,  o blog, conforme definia o texto em inglês,   pelo menos para mim,  só foi bem entendido quando resolvi   ter o meu próprio blog batizado de “As ideias no tempo,”  através dele venho  escrevendo meus textos desde 2009.O título foi tirado do livro de título homônimo As ideias no tempo, publicado,  pela Gráfica do Senado em convênio com a Academia Piauiense de Letras (APL), em 2008.
    Não sei quem  primeiro  teve a ideias de chamar   de blog a esse meio de comunicação, hoje  a forma mais  democrática que  tenho para transmitir minha   ideias  sobre o que penso  da vida,  dos homens,  da cultura,  do mundo. Sinto-me à vontade nesse grandioso  fórum  de debates,  de dialogo, ainda que por vezes silencioso, com o me pais e com o mundo. Neste sentido, o meu blog é o meu exercício imediato de me comunicar com os outros, independente  das fronteiras   continentais.
      Mais do que o jornal, a  revista, o livro, o blog para mim  é uma espécie de cátedra, cujo titular  tem, sim,  compromissos  éticos com o público, ao  exercer sua atividade escrita  sem as aprovações,  os interditos,  as chancelas,  as avaliações  que outros meios de  transmissão de notícias e de conhecimentos  impõem ,  por vezes,  injustamente  a um escritor. Meu único  compromisso, na  realidade,  é com  o saber, a opinião livre das peias  da  censura  e dos critérios  ideológicos,  comerciais,  de grupos   culturais ou acadêmicos, mito presos a  os seus regulamentos de toda a sorte. 
       O meu blog é uma ágora pelo qual perpassam minhas ideias, minhas idiossincrasia, meus  defeitos, minhas qualidades e minhas limitações. Por isso, assumo as responsabilidades que me cabem  dentro  do conceito mais amplo que  tenho sobre liberdade de expressão e de visões  culturais. Até agora,  nunca me senti cerceado quanto ao que  tenho  publicado nesses últimos  quase sete anos  na condição de blogueiro – termo que,  intimamente não me agrada em razão de subjetivamente associá-lo a algo que pertencesse a um  categoria  inferior  de usuários  da escrita  virtual. Isso, contudo,  é um preconceito meu arraigado por razões que não sei  explicar.
      De uma coisa tenho certeza, tudo que publico  no me blog  é a expressão mais clara do meu pensamento  intelectual e, por ter o blog essa característica  de liberdade,  de autonomia,  de responsabilidade ética, é que  me fortalece a vontade de dar continuidade a esse locus  do qual  tenho colhido algumas alegrias  conquanto não sejam muitas.
    No meu blog discuto questões de amplo espectro, algumas  muito polêmicas, outras  mais amenas,  outras  mais  dirigidas  a um  público mais restrito. O que me leva a essa continuidade é a minha vontade de me  comunicar –reitero – com as pessoas, o meu país e o mundo, incluindo aqui  a possibilidade de opiniões contrárias  às minhas.
   O papel de um  escritor é ser verdadeiro consigo mesmo. Não é a de um mistificador, mas de um  homem/mulher que  tem que dar  satisfação ao que eticamente julga ser construtivo  e  útil à coletividade. Pode mudar de opinião? Pode, mas essa redefinição de seus princípios só será  feita por amor à verdade, à justiça e à cultura no sentido mais lato possível. Dessa postura moral não me afastarei um milímetro. 
     A condição do escritor é de se expor, de ter coragem e de ter “personalidade”  -   a palavra “mágica,” segundo a definição de Cassiano Nunes (1921-2007),  um  eminente   ensaísta,  crítico  literário, poeta  e grande conferencista, ex-professor de literatura da Universidade de Brasília, com quem tive o prazer de trocar uma brevíssima e proveitosa ( para mim) correspondência.


quinta-feira, 10 de março de 2016

Non fare niente



                           Cunha  e Silva Filho


      Vou colocar meu pensamento em suspensão. Apagar  por momentos  o que me possa chatear, o que me possa ser  aborrecimento, me largar à toa,  procurar o nada, o não refletido,  o não mentado.
       Podem até   darem  – não  me aborrecerei com vocês -  o nome que quiserem:  alienação,  não me importismo,  sei lá, não tou nem aí.  Desta forma,  não abro o jornal,  nem   vou pro computador. Chega de notícias, de más notícias,  de insoluções,  de lengalenga,  de empurra pela barriga. De vai não vai. De leis e contra-leis, brechas  e  chicanas, de recursos e não recursos. De Supremos que acolhem e não acolhem. Que voltam atrás. Descaminhos, louvaminhas,   xingamentos,  amigos partidos.
      Tanto faz. Tudo se quer mudar para ficar no mesmo, na sarjeta de sempre, na impunidade, na violência galopante do menor  na prática do crime  abominável e impune.   Pode ser. Pode não ser. Fastio de tudo. Até tenho vontade de dizer, ainda que doa a muitas sensibilidades que não gostaria de ferir,  de todos, mas todos mesmo: o mundo,  o meu país,  a minha vida, a vida alheia, as alteridades. Ainda sob suspensão do pensamento,  das ideias, quero embarcar em outra canoa, diferente,  absurdamente diferente, de uma canoa furada que ninguém deseja para si.
     Quero, porém, a luminosidade da verdade,  quero o sol,  a lua,  as estrelas,   o espaço sideral  sem Apolos da NASA,  sem nada. Quero  o céu limpo,  límpido, cor de neve,  com uma leve e breve  brisa   farfalhando   as folhas  de um  pé de  manga bem em frente de minha casa, digo melhor,  apartamento.  Quero a história, a geografia,  a filosofia,  os estudos  sociais, as religiões, as diversidades culturais, linguísticas. Não quero, porém, a fome, a ditadura, os maus políticos, as guerras civis. Do mundo quero apenas a paz.
     Quero o silêncio dos escritores fazendo suas obras,  dos leitores  sem pressa de que fala um  filósofo  italiano,   Nuccio   Ordine. Quero a solidão,  não dos justos, porque para mim seria muita pretensão, mas a solidão dos nostálgicos,  dos que não têm pejo de afirmar que amam o passado em todas as suas formas desde que não deixem de aí  incluir as artes, as ciências  desenvolvidas  pro bem da humanidade,  a que cura os enfermos,  crianças,  jovens, adultos  e idosos. Quero aquele momento do velho personagem de Guimarães Rosa (1908-1967), que vai  para a “terceira margem do rio,” quiçá,   único caminho que poderia  encontrar  para sumir  das contingências da existência.
       Quero a paz interior,  um dia só para mim como, numa  velha crônica,  já afirmei em momentos  de escapismo  semelhante a estes. E aqui não poderei   deixar de  omitir  a Pasárgada bandeiriana, a solidão intelectual  de Álvaro Lins (1912-1970),  a beleza eterna de Keats,   o entendimento  profundo da alma humana, de Shakespeare e, contraditoriamente,  o “pessimismo irônico" de Machado de Assis (1939-1908) as aporias de Fernando Pessoa (1888-1935),  a anoranza sentimental  da poesia galega, a vontade  de partir  de  Cesário Verde (1855-1886), a picardia malandra  dos contos de João Antônio (1937-1996),  o amor  das prostituas de Jorge Amado (1912-2001). Quero tudo isso e muito mais contanto que seja  para o bem de todos.
     Quero  os poetas  de todas as latitudes, principalmente  do século  XIX, sem  vanguardismos,  sem  obscuridades,  no eu falado   e confessado  sem medo de ser feliz, pueril,  lacrimoso, bombástico, naîve, sem  vergonha de ser, por momentos,   passadista.Quero a arte sem tempo e sem  lugar definido. A arte em si,  a Arte, arte.
     Ainda com o pensamento em suspensão,   quero apenas  viver a vida alegre,  em liberdade plena,  molhado com os primeiros  pingos de uma chuva  amiga e acolhedora, sem  provocações de enchentes nem  destruições de rios e de cidades do meu  Brasil. Quero mais a ficção do que os fatos, toscos  fatos  regidos  pela  enunciações  objetivas  e burocráticas como a atmosfera dos textos kafkianos, recriada  superiormente pelo autor de O processo. Quero a clarté dos franceses, não o romance  à Alain  Robbe-Grillet. Quero o romance de personagens de carne e osso(Agripino Grieco (1888-1973),com personagens que  nos transmitam  a “vida” da vida. Quero as humanidade  dos livros e dos autores, já que em muitos essa combinação  do “possível” não se coaduna com  o autor  considerado  em sua  identidade de registro em cartório. 
    Antônio Candido, certa feita,  ou melhor, em certo texto não  teórico, deixou  escapar  uma afirmação  sobre   conceitos  teóricos e realidade literária, numa  análise de um escritor brasileiro que lida  com as camadas pobres da  sociedade, e me lembro de que  tocava na questão de dar nomes aos  bois, ao chamar de “autor’ o escritor, sem as novidades terminológicas   que  embaralham  tantos  os conceitos  que passamos  a  assimilá-los  apenas a partir  das incansáveis  abstrações  conceituais  complexas.  
   O fare niente desta crônica  tem  esse objetivo meio  atrapalhado,  meio gauche,   confuso, meio salada, meio caótico,  meio  contraditório, meio tudo, num caldeirão de  visões e de ideias,  cuja finalidade é  de, por momentos,  me livrar da realidade  madrasta que, no país,  tanto nos pesa  nos ombros já cansados pelos anos e pela   experiência acumulada  dos desastres e das misérias humanas, cujo foco,  deixo claro,  tem seu epicentro  no  Brasil de agora.  Não deixei ainda de colocar  entre colchetes os meus pensamentos e divagações. Tenham calma comigo, que chego lá.   
    Conversando com um médico  dos bons,  ele me  confesso  essas verdades simples e sem  subterfúgios: O Brasil é um país-continente,  com muita riqueza,  onde a felicidade poderia  encontrar seu lugar, com todo o mundo fazendo a sua parte, de forma  honesta e bem feita.  Bastaria isso.
     O que o estraga são os políticos que temos e observei com atenção que ele não fez ressalvas. “- Upa! Upa! meu pensamento” (poema  “O carrossel fantasma”) - diria  o poeta Da Costa e Silva (1885-1950). Despertei e o colchete se abriu e aqui volto à realidade.
     Na rua,  o perigo, de que fala Roberto DaMatta. Tenhamos, pois,  cuidados. “A morte nos cerca de todos os lados” sentenciou  Rui Barbosa (1849-1923), na obra José Bonifácio)) e “viver é perigoso”(novamente Guimarães Rosa), o que se aproxima da fala de um personagem de João Antônio: “Viver é brabo.” (conto “Dedo Duro”).

         



domingo, 6 de março de 2016

Por que o lulopetismo está ruindo?




                                             Cunha e Silva Filho



        Se fizermos uma retrospectiva da história do petismo no país, com certeza teríamos que reconhecer duas etapas sintomaticamente diferentes e contraditórias  1) a ascensão do Lula com o sucesso de um governo  que se propôs  reduzir o número gigantesco dos excluídos sociais - pedra de toque do programa ideológico do Partido dos Trabalhadores; 2) a queda paulatina, por razões de imoralidade pública, que o próprio  petismo   desencadeou com uma série de  escândalos  contabilizados pelo partido, cuja liderança esteve sempre enfeixada nas mãos do líder  de estofo  populista  e salvacionista, esperança e admiração que passaram a alimentar  a mentalidade  das classes desprotegidas de norte a sul no Brasil.
           Essa posição   privilegiada  em que  se manteve no primeiro e até no segundo mandato rendeu-lhe dividendos enormes a ponto de ser chamado por líderes  internacionais de um presidente  que conseguiu  tirar os brasileiros da miséria e de mesmo  realizar uma mobilidade social  pela qual as classe mais pobres   ascendessem  a níveis de classe médias.
      Sua liderança  no exterior  subiu às alturas, sendo até  recebido pela rainha  Elisabeth  II  da Inglaterra e de ter se tornado, em universidades do país e bem assim  em mais de uma universidade no exterior, doutor honoris causa. Sociólogos, historiadores   europeus  não perderam  tempo de reconhecer   méritos  incontestes no líder popular  brasileiro. O presidente Obama o chamou, não sei se por sutil ironia,  de “o cara.” Um intelectual  brasileiro  sobre ele escreveu  um livro. Sua carreira política vitoriosa  o transformou em filme.
      Lula  era a garantia  de um  governante  respeitado sobretudo pela esquerda, quando ele mesmo  nunca foi  esquerdista (e ele próprio o confessou) nem tampouco  nunca  leu Marx. Entre o professorado de universidades públicas  granjeou fama e poucos são  os docentes  universitários até hoje que não lhe rendem  tributo e lhe  reconhecem  a  importância na história  política brasileira. O motivo dessa preferência me escapa ao entendimento.
       Carismático, - alguns cientistas políticos  não gostam desse qualificativo -,  bom orador das massas,   inteligente, astuto, conhecedor privilegiado dos bastidores do sindicalismo nacional, ganhou experiência como parlamentar  Juntou todo esse cabedal  prático  e terminou  vencendo uma eleição (2002) para o  cargo mais alto da Nação, a Presidência da República, passando a ser o 35º presidente do país. 
      Sua estrela foi  crescendo. Ao atingir seu  ponto mais alto, no segundo mandato, algo estava a caminho  na contramão  do seu estrelismo. O partido, posto que ainda fortalecido e com boa popularidade junto às pesquisas de opinião, ainda  lhe permitia boa  margem de credibilidade nas camadas mais  populares da sociedade, sobretudo no Nordeste,  onde sempre obtinha   altíssimo ativo nas urnas.
      Contudo,  algo novo se acrescentou a uma biografia de causar inveja a todos os presidentes brasileiros, conforme   se pode constatar numa simples pesquisa do seu currículo e de bibliografia  sobre Lula. Esse novo  acontecimento  foi o que se chamou escândalo do “Mensalão,” um tsunami que atingiu frontalmente   membros  do alto escalão do presidente Lula,  a começar do seu chefe da Casa Civil, José Dirceu,  acusado  de práticas ilícitas de natureza financeira junto com outros membros do governo. De resto,  o  primeiro tiro contra o governo Lula foram  as denúncias  do deputado do PTB, Roberto Jefferson, sobre um  esquema de propinas nos Correios. Entretanto,  Lula saiu ileso desse incidente.
     Ao escândalo do Mensalão, o país se defrontou com outro não menos  grave e danoso  às finanças do país, o Petrolão,   no qual estavam  implicados  altos funcionários da Petrobrás  acusados de desvios  vultosos de dinheiro  da Estatal  sob formas  de propinas, quer dizer, um conluio criminoso  entre  empresários  e governo federal.
      Contudo,  foi com a chamada Operação Lava Jato, instrumentalizada numa série de etapas de investigações do Ministério Público, tendo à frente a sua condução  capitaneada pelo  juiz Sergio Moro que a situação  do  ex-presidente Lula se complicou de vez que   evidências cada vez mais  comprometedoras apontavam em direção ao ele e a membros de sua família como envolvidos em práticas de lavagem de dinheiro e em outros indícios   de supostas práticas   ilícitas  advindas  de dinheiro da Petrobrás.
    A Operação Lava Jato, ademais, segundo se tem  noticiado nas diversas mídias,  tem alavancado   um conjunto de denúncias  de desvios do dinheiro  público provenientes   de transações contratuais  fraudulentas  regadas  a propinas   entre o governo  federal  e  grandes empresas brasileiras, como a Oderbrecht, a AOL,   a Camargo Correa, entre outras, fatos esses ocorridos desde os mandatos de Lula e continuados  no governo Dilma.
    As diligências   levadas a cabo pela Polícia Federal têm  sido de extraordinária importância na condução  das etapas  da Operação Lava Jato culminando com  a mais recente,  denominada de Aletheia, colocando a situação  do ex-presidente Lula numa saia justa   ao ponto de ter sido conduzido coercitivamente   a depor numa  delegacia da Polícia Federal.
     Após  ter dado seu depoimento, o ex-presidente,  em fala à imprensa,  mostrou-se profundamente  enfraquecido,  dando claros  sinais de apavoramento e de alguém  que foi  colhido em flagrante delito. Sua fala não convenceu a quem o ouviu. A voz  estava frágil,  sua fisionomia abalada,  dir-se-ia até que o medo nele se plantou  à flor da  pele. Talvez esse seja o início de seu  ocaso  político, dele não restando  mais  nenhuma altivez diante de tantos   denúncias e delações de empresários, por último, das declarações do senador Delcídio  do Amaral, ex-líder do governo Dilma, que seguramente  o   deixarão  traumatizado  para sempre. O véu da fantasia  lhe foi retirado pela força da Lei. Dificilmente, creio, depois dessa experiência constrangedora, que   o populista  Lula terá mais  algum  gesto  de maior    destemor ante  o vexame de ser levado  a prestar  esclarecimentos  sobre falcatruas  gravíssimas que lhe pesam sobre os ombros.

   Veio até tarde  - enfatizo -   esse passo da  Justiça sobre denúncias de  malversações  que há tanto tempo vêm sendo  feitas por  grande jornalistas e pela imprensa em geral. Desta vez, não pôde escapar do interrogatório ao  qual só respondeu  com evasivas sobre desonestidade  praticadas durante seus mandatos ao afirmar que nada sabia dos escabrosos  males vindos a público e  de seguidas  desídias financeiras  já investigadas   há tanto tempo. O mito do grande  líder dos pobres  é uma pálida e melancólica página virada da História da política  brasileira dos últimos  tempos. O outra lado de prestação de contas ao Ministério Público  cabe ao periclitante  destino  da  governante atual -  uma espada de Dâmocles sobre a cabeça de Dona Dilma..

quinta-feira, 3 de março de 2016

É Tempo de Humanismo




                                             Cunha e Silva Filho


            Está no Brasil  um filósofo italiano Nuccio Ordine, da Universidade de Calábria que publicou um livro, A utilidade do inútil, saído pela Ed. Zahar, em tradução de Carlos Bombassaro. De acordo com a reportagem que li no Globo,  Caderno Prosa, (27/02/206), Ordine  veio fazer palestra  no Centro  Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e fará hoje estará na Coppe (UFRJ), naturalmente  discutindo suas ideias expostas no mencionado  livro.
         O que me despertou a atenção  da presença desse filósofo, aliás,  segundo a reportagem de Leonardo Cazes acompanhada de um entrevista, foi o tema instigante  e, a meu,  decisivo  para  o debate atual  num país como o  nosso que enfrenta também um  leque de  desafios  relacionados  à visão do filósofo italiano  sobre  a realidade   brasileira e seus reflexos nas  práticas sociais nossas tão  agudamente  voltadas  para  os erros e os desvios   apontados  por Ordine.  É curioso  anotar que  estudioso   não escolheu  logo  os  departamentos  de filosofia  nem outras  instituições   diretamente   ligadas  à presença de um   filósofo, por exemplo os curso de letras,  artes,  os centros  voltados  para  os estudos sociais, políticos de comunicação. Não custa  compreender essa sua estratégia,   de resto,   bem  empregada.
          Segundo a entrevista, Ordine se define – pelo menos é o que deduzo de suas palavras -   como  um filósofo   que almeja  atingir  o nó górdio  das relações entre a dimensão humana, para ele tão desprezada na contemporaneidade, no  Ocidente (Europa, sobretudo) e a avassaladora corrida para o “lucro,” o interesse “utilitarista das pessoas em si e do sistema capitalista que, segundo ele,  caminha para a “autodestruição.” Sobre esse tema, da minha parte,  já escrevi  alguns artigos., publicados em jornais,  livro e blogs.               
          Ora, enquanto a  maior parte  das sociedades e sistemas de governos   que só valorizam  o dinheiro, o vil metal,   estiver  em ação,  o ser humano  tenderá a sofrer as consequências  dessas  opção desastrosa, porque comporta um tipo de  civilização,  cujo ideal  é ganhar mais e mais, sem se importar com valores  dignos de  apreço e intemporais: a amizade, a união, o respeito à vida, à natureza, à ética de comportamento individual e social, i.e., valores que  jamais seriam   nocivos à continuidade da espécie humana, juntamente com  outros, como  dar importância   ao desenvolvimento e ao cultivo das letras, das artes, da filosofia, e não  abrir mão do desenvolvimento científico direcionado ao aperfeiçoamento e bem-estar das sociedades do presente e do futuro. Daí o filósofo querer se comunicar com o mundo acadêmico  das ciências   e da tecnologia.
        Ordine toca num outro ponto  crucial ao afirmar  que o “perigo’ de nossos governos no tocante a verbas  destinadas ao desenvolvimento  dos saberes de cunho  humanístico  não se encontra   meramente na redução do aportes financeiros canalizados     às ciências  humanas, mas também  na redução das verbas  alocadas ao que chama de “ciência fundamental.”  Enfatiza o filósofo que “humanidades e ciências” devem se unir. Daí provavelmente  mais uma outra razão de  buscar  um diálogo aberto  com  o mundo acadêmico  dos cientistas.                         
           O professor da Universidade de Calábria assume, assim, a sua postura de lutar  por um  humanidade  na qual o capitalismo exacerbado não enseje a sua própria  destruição e  os fundamentos  de valores  caros e fundamentais  ao mundo: a solidariedade,  a celebração, o cultivo   das artes  não utilitárias e  um freio que  deveria   ter os descaminhos  através da caça tresloucada  pelo dinheiro como fetiche de uma humanidade que se desumaniza na medida em que  assimila  um pecado   imperdoável – o egoísmo,   a busca do ter e o esquecimento  da convivência  feliz entre os homens.
         Lamenta ainda que a  Europa esteja  dando as costas para a Grécia – país do qual  viria  quase  toda a riqueza e sabedoria nos campos da literatura, das artes  em geral, das ciências. Como, pode-se inferir de sua entrevista,  jogar tudo isso fora e, em lugar disso,  voltar-se  para  o fetiche dos negócios,  dos bancos, dos investimentos,  dos bens materiais sem limites  e sem consciência de suas consequências danosas à humanidade?
          O título do livro resume  bem o que nos aguarda a sua leitura. Aliàs, o manifesto a favor do humanismo exposto no livro já se tornou, conforme  diz a reportagem,  um best-seller na própria  Europa. Oxalá não seja apenas uma leitura a mais.
         O importante seria que as suas premissas  tocassem no fundo do coração  das pessoas, dos governos, dos políticos,  dos empresários, dos religiosos das pessoas, enfim, que  nunca é fastidioso  repisar  a volta dos  valores humanísticos,  do espírito comunitário, da prática do bem e dos respeito aos bens imateriais. Por mais rasa que seja a mensagem de uma obra,  o que não  deve ser o caso do livro desse  filósofo,  sua importância deve prevalecer e suscitar  reflexões  profundas  na mentalidade dos homens em suas múltiplas atividades.
         Ordine recordando  o valor inestimável dos tempos da Renascença, acentua com  propriedade   que autores como Giordano Bruno,  Erasmo e Galileu Galilei tiveram  uma  compreensão  tão vasta  da “cultura” e  da “unidade  europeia” que as suas ideias foram  além do seu tempo e do  espaço do continente europeu de então. Tornaram-se  universais na compreensão da posteridade. Resta a nós, de todos os lugares e do tempo atual  envidarmos esforços que tornem  os homens cada vez mais afastados  das incertezas do simples  lucro  que as ilusões  materiais  pensam  ser o caminho  certo. Longe disso, muito longe disso.