Cunha e Silva Filho
Estamos em pleno domínio do mundo entrelaçado com a rapidez
instantânea dos fatos e notícias –
uma inflação de notícias verdadeiras ou fake (para dar um tom de uso corrente
do termo no mundo atual) a que com muito custo tentamos digerir ou digerir mal porque a tônica da
pós-modernidade em que estamos engolfados
é a pressa e seu complemento, a realização hic et
nunc. Os dias, os segundos, os minutos, as horas, as semanas, os meses e os anos passam numa vertiginosa rapidez que
nos provocam perplexidade. Por que tanta pressa? “Festina lenta,” diz uma máxima latina. Não vamos morrer
amanhã literalmente.
Então,
por que tanta afobação, “passageiro
da agonia” dos tempos que correm?
Que mal existe em, pelo telefone, ou, o
que é mais usado, pelo celular,
comunicar-nos uma informação a um receptor distante ou dele recebermos uma instrução
apressada que mal dá tempo de captar
algumas palavras? Repetindo, direi mais:
o mundo não vai acabar amanhã. Você não
vai receber um prêmio milionário de um bilhete de loteria.
Pra que a pressa? Devagar, que chegaremos lá.
O jovem de hoje quer por força estabelecer-se
mal saído da puberdade. É preciso ter
tudo: muito dinheiro, casa própria, um carrão, uma mulher bonita uma vida de luxo. Calma, companheiro de viagem. A vida não é isso o que pensa a sua
pressa. Há protocolos a cumprir, tempo
de preparação e tempo de
amadurecimento e de realizações
benéficas.
Se
pensar profundamente no título daquele grande romance de Ernest Hemingway (1899-1961)– The sun also rises (1926) - , você verá que a
coisa não é tão fácil assim. Dê tempo ao tempo, pois, se for crente em Deus, verá que ao céu não chegaremos
com tanta pressa e avidez de tudo conquistar
tão cedo assim não é o melhor conselho que se pode dar mocidade.. Relaxe, relaxe, relaxe. Você tem a
vida pela frente. Os franceses dizem: “Il y a temps pour tout,
pour le travail, pour le plaisir.”
Nem só de pão vive o homem.
Tempos modernos, pós-modernos, terceiro
milênio – tudo converge para a ideia e a fetichismo da pressa, do chegar logo, de ser o primeiro, o mais
belo, o mais inteligente, o mais sábio. Ora, pensando bem,
o último adjetivo demanda tempo, maturidade,
estudos, dedicação e um
espírito aberto, livre
e sem as amarras e os
modismos que cercam a juventude apressadinha e afoita nos seus projetos, nas suas conquistas pessoais
e profissionais. Calma, que Inês é morta. Tudo tem seu tempo e hora. Só a eternidade não tem pressa. O mundo não se fez num só dia mas em
seis segundo as Escrituras. Terá Deus cometido um grande engano
de cálculo? Quem sabe...
Talvez Deus devesse tê-lo feito em mais
tempo. A pressa é inimiga da perfeição e não há ser tão cheio de defeitos como o homem. E essa má qualidade é responsável por tantos
desencontros e incompreensões entre as pessoas sem distinção de
credos, raça e línguas. Por
isso, foram providenciais para a
melhoria do ser humano, desde o nascimento, a
criação e desenvolvimento da cultura,
do saber, das instituições sociais e
políticas quando bem conduzidas
por homens probos.
Por que tamanha pressa, projetos
a serem feitos do dia para a noite, se os podemos realizar
com mais calma, com mais
precisão e solidez? Não,
seguramente, a pressa, sobretudo, nos moços, não é uma virtude mas uma
defeito e esse defeito pode leva-lo
à decisões erradas de que , mais tarde, se
arrependerá de tê-las tomado.
Somos seres incompletos, somos uma obra in progress. A certa altura da vida isso é bem perceptível de compreender,
mas, então, não há mais tempo para um
regresso às origens de nosso aprendizado na vida. Reverter o percurso existencial
é-nos impossível. A vida anda para
a frente no tempo e no espaço. Essa incompletude é uma fato
inconteste. Daí que a plenitude da vida não passa de uma vã
ilusão, de um ledo engano, de
um passo errado ou de uma escolha que nos levará àqueles dois caminhos propostos
no poema de Robert Frost (1874-1963), “The road
not taken”(1916).
Julgo que é nesta fase de opções de dois caminhos que reside uma grande parcela dos acontecimentos de nossa existência, assim
como a dura realidade
que se põe diante de nós: o que
conseguimos conquistar, uns com mais facilidade e menos tempo, outros com mais sacrifícios e mais tempo, ou,
como diria o meu pai, com “sangue, suor e lágrimas.” É neste ponto que uma via
de possibilidade se nos abre pela frente: o mundo além da vida, a dimensão
transcendental, a espiritualidade,
a vida eterna sob as bênção de Deus ou sob as malhas tenebrosas
do Inferno, este sem nenhuma
possibilidade de remissão porquanto virou vazio
e nada. Aos eleitos a promessa de uma nova vida no caso de serem cristãos ou espiritualistas. Aos espíritas, a
reencarnação, abrindo também uma possibilidade de aperfeiçoamento pessoal em outras dimensões da vida.
A
mocidade não quer pensar nessas
coisas invisíveis. Acredita no presente, no viço, na força, na energia
física e mental, na alegria de ser jovem
e parecer eterno enquanto dura. No
entanto, o sentido profundo da incompletude persiste no homem amadurecido e descrente das ilusões passadas. Há uma obra abissal
de Tristão de Athayde (Alceu Amoroso Lima,1893-1983) que discute
todas as fases da existência humana: Idade,
sexo e tempo – Três aspectos da psicologia humana. (Rio de Janeiro:
Livraria José Olympio Editora, 1938).
O livro do pensador católico e grande crítico literário, a meu ver, tem
ainda muitas lições de vida a oferecer o
leitor de hoje. Em alguns
aspectos, é claro, envelheceu,
uma vez que foi escrita para o
momento em que viveu, anos 1930, a sua contemporaneidade.
Contudo, como toda grande obra bem
pensada, e com os recursos do conhecimento
e bibliografia daquela
época, o livro tem algo que
se projeta além do seu tempo e é
justamente na visão avançada
do autor, ao refletir
sobre as fases da vida humana, que ele mantém certa validade de abordagem
dos temas ali ventilados por um grande escritor.
Não é com tanta pressa dos dias de hoje que os jovens e a mocidade resolverão seus problemas
pessoais e suas inquietações de conquistar, açodadamente
um lugar ideal que os leve ao que se chama felicidade do mundo material. Para que tanta pressa, jovem,
se sabe que tem todo um caminho a
percorrer a seu favor?
"Só a eternidade não tem pressa" (Francisco da Cunha e Silva Filho)
ResponderExcluirSelecionei essa bela frase do seu texto "Por que tanta pressa".
Estamos, de fato, numa corrida avassaladora, onde, no mais das vezes, se colhe apenas atropelos
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirQue bom,Tere Tavares que tenha visualizado o meu Blog.Que gentileza a sua de pinçar uma frase que deteve a sua atenção.Esse Blog que mantenho desde 2009. Ele é o meu espaço literário, o meu fórum diante do leitor em qualquer parte, Às vezes, há artigos que escrevi em inglês. Porém, logo abaixo do texto, forneço a tradução. Há também inúmeros poemas traduzidos por mim. Sou um tradutor não profissional. Nada ganho com isso, mas faço com prazer. Há quem aprecie algumas traduções. Outros há que fazem ressalvas a algumas traduções. São poucos. Os leitores quase que não comentam. Fico, contudo, feliz se pelo menos leem os meus textos.Se gostar, pode seguir-me. É só ver do canto direito desta página, o espaço para os procedimentos de seguidor e leitor.Vou visitar também seu Blog. Muito obrigado pela deferência e pela paciência de me ler.Abraços do Francisco da Cunha(Cunha e Silva filho). Os dados sobre mim e livros editados se encontram no resumo do curriculum vitae do lado direito desta página.
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