segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Afazeres e agruras de um pesquisador


                                                                      
                                                         Cunha e Silva Filho


            O final de um ano   é motivo  de  lançar  um olhar  para o que  fizemos  ou deixamos de fazer no cotidiano apressado  do  homem  contemporâneo. Como  os assuntos são  múltiplos e nos apontam para tantas direções, para tantos ângulos  da vida, me limitarei aqui  ao tema das leituras, e aí  se incluem os variados  tipos: o jornal(Folha  de São Paulo, O Globo, a  revista (entre  outras, a Presença, do Conselho  Estadual  do Piauí), a internet, na qual  posso  ressaltar o Gutemberg Project e, last but not  least,  o livro  sobretudo. Quanto ao  último, devo  afirmar que  deixei a desejar: empilharam-se  livros  de diferentes   assuntos, cujas  leituras  assumo comigo  o  compromisso  de fazer no  próximo ano,
         No entanto, num tipo de livro  me detive com maior intensidade, visto que se correlaciona com  uma pesquisa. na  área da crítica  literária. Até julho  do  próximo ano,   estarei  afundado  em leituras  teóricas afuniladas  para  a crítica literária e para a filosofia, história, teoria literária e história literária.
Não é tarefa  fácil  ler  centralmente a  obra  de dois  críticos   brasileiros, Álvaro  Lins e Afrânio Coutinho. Difícil tarefa  porque  temos  o compromisso  intelectual de  ler e, em   algumas situações, reler  praticamente  todo  o grosso  das  obras de cada autor e, além disso,   as leituras de dois  autores  reenviam,  por sua vez,  para outras leituras cruzadas,  para  outros   críticos,  outros ensaístas,  outros  estudiosos,  nacionais  ou  estrangeiros,  traduzidos  ou  no  original.
 Um tema   nuclear como  objetivo  de  desenvolvimento  demanda  uma  mobilização   de leitura  de natureza  transversal, uma vez que nenhum  assunto, tema ou  recorte  de um estudo   se  restringe   ao  insulamento  das obras de autores  selecionados,  por  exemplo, de dois autores,  mas  abre  um   canal  para uma constelação de leituras   paralelas, um feixe de  remissões  a uma  multiplicidade  de  autores, ou seja,  é uma abertura  a um diálogo com  vozes   múltiplas  e  por vezes  diversificadas   em relação  ao  objeto  da  pesquisa. Ou seja,  estudar aspectos  atinentes  à crítica  literária de dois  autores é penetrar  no  domínio da metacrítica e, por isso,  seu   alcance  é universal tanto quanto   estudar  a  literatura  em si.
Outra dificuldade,  encontrar  as obras–chaves às vezes  difíceis de serem  encontradas  nos sebos,  nas livrarias  virtuais,  na  internet.  A gente  tem até que  contar  com  a boa vontade de alguns amigos  que  nos ajudam  a encontrar  um livro   que  não  achamos. Outras vezes,   o autor   cita obras que aparecem  na relação das  obras  completas, mas  na verdade  não chegaram a serem  editadas. Eu mesmo  estou vivendo  um momento  desses,       
Estou  procurando  uma obra  de Álvaro Lins, de título  Girassol em vermelho e azul, que, segundo  anunciara o próprio autor, em  livros publicados pelas  Edições  de Ouro, seria    editada,  em  1963 pela Civilização  Brasileira. Por sinal,  os estudos   que aparecem  nos livros das Edições de Ouro não passavam  de  capítulos  de obras  anteriormente   publicadas com  outros  títulos.   A algum  provável  leitor  e admirador  daquele   crítico  que  tenha  conhecimento de um exemplar  da  citada  obra, peço,  através desta   coluna,  que me  dê alguma  indicação  ou  lugar  onde  possa adquirir   aquela   obra. Esta  forma de  publicar partes de capítulos  de obras  antes  saídas a lume  por  outras  editoras,  em   estudos  ou artigos  que,  originalmente,  provinham   de reunião e seleção de  artigos  ou   estudos    em  Suplementos   Literários,   embaraça   o trabalho do pesquisador,  como   bem  ressaltou   a  professora  e ensaísta  Adélia Bezerra de Meneses Bolle num  estudo  de muita  penetração  sobre o pensamento  crítico de Álvaro Lins.
O curioso  é que numa  obra   de Lins ele remete  o leitor  para  a referida  obra, que, segundo suas palavras,  seria  uma  espécie de  documentos   complementares por meio de cartas  dirigidas  a autores  por  ele  lidos e analisados durante  o largo  período em que militou  na imprensa,   principalmente no  antigo  Correio da Manhã, no  Rio de Janeiro.
Outra dificuldade do pesquisador  é com artigos   publicados em  periódicos, revistas dos anos  1940, 1950 e   1960.Neste caso,   a única  saída  é recorrer à Biblioteca Nacional, à Academia  Brasileira  de Letras ou até entrar em contato com  os  descendentes  ainda vivos   do autor, ou mesmo a depoimentos  de  pessoas que  ainda  estão  vivas e  sobre as quais  sabemos  que  tiveram  contato  mais direto  com  o  autor  pesquisado.
Não está  também   descartada a  possibilidade  de  deslocamento  a  outros  lugares  do país  onde   possamos   fazer   pesquisa. 
No  caso de Afrânio Coutinho,  tem-me sido mais fácil  a pesquisa,  já que  posso contar  com  vários  fontes  aqui  no Rio de Janeiro e eu  mesmo   consegui,graças à gentileza do filho  do crítico,  o  professor  Eduardo Coutinho, da UFRJ,   a maior parte  dos  livros-chaves.
Um  última dificuldade  que  o pesquisador  arrosta neste país  é não  ser algumas  vezes  contemplado com   grandes   instituições de apoio financeiro ao  pesquisador, como  a CAPES  e o CNPq, uma vez que  o número de bolsas  liberadas   é muito  restrito   e a seleção  pode não ser  tão   justa assim. Pesquisar   às suas   expensas  é coisa de  louco  porquanto  se gasta  o que  não se tem  durante  a fase   de levantamento  de dados,  de  aquisição  de livros,  de uso  da internet,  da compra   de material  de impressão,  de  tinta  de  computador, deslocamento  para   diferentes  lugares do   domicílio do  pesquisador e até, segundo  frisei antes,  para outros  estados  da  Federação,  onde se possa  coletar    subsídios de vária  natureza  para  a pesquisa em andamento.
 



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