Cunha Silva Filho
Vim a saber sobre o Pe. Júlio Albino Correia ao
entrar em contato com os livros da biblioteca
de meu pai, a qual dispunha de um exemplar de uma
das inúmeras obras didáticas para
o ensino do inglês, An English method,
daquele estudioso da língua inglesa. Essa era a única do
autor que meu pai possuía na sua biblioteca. Ao vir para o Rio de Janeiro, trouxe
o volume comigo. Porém, em Teresina, já
otinha lido quase por completo. Concluí a leitura aqui no Rio. O exemplar, em
dois volumes num só tomo, que tenho data de 1939, 14ª edição, Imprensa Moderna,
Ltda, Porto, 408 p.
Aquele livro traz a assinatura de meu pai (quanta saudade
ao olhar para a sua letra manual, ainda mais
bonita e firme do que com um pouco de diferença que mostrava na velhice!Costumava assinar assim: F. Cunha e Silva. Naturalmente
foi feita no tempo em que lecionava em Amarante, no seu
conceituado colégio Ateneu Rui Barbosa. Nas primeiras páginas da
lições elementares, há marca nas páginas a lápis e umas a tinta,
à página 18. Mesmo dando aulas para o
nível primário e preparatório, ele ensinava
aos alunos noções de inglês e
francês. Não dominava o inglês como o fazia com o francês, o italiano, que estudara bem com os salesianos em Niterói e no Seminário
da ordem salesiana em Lavrinhas
São Paulo. Conhecia bem o latim,
porém não tenho certeza se dominava o
grego. Mas, voltemos a falar sobre o Pe.
Júlio Albino Ferreira e seu An English
Method.
A
grande novidade dessa obra era que, já nos anos 1930, o autor demonstrava
boa atualização metodológica no
ensino do inglês, tanto é que trazia a novidade do Alfabeto Fonético da International Phonetic Association. Logo no início da obra, o
autor informa que os sinais do alfabeto fonético tinham sido
gravados em disco gramafone
pelo professor Mr.
John Opie, professor de inglês da Universidade de Coimbra.Era um
conquista para aqueles tempos o
ensinar-se inglês com o recurso do
aprendizado do valor dos símbolos
fonéticos, tarefa que de se ocupa o Pe. Albino Ferreira a elucidar criteriosamente nas primeiras
páginas da obra.
Nessas páginas explicadas em português, o autor inclui exercícios para os estudantes se familiarizarem com os
símbolos que serão parte integral ao
longo do livro, i.e., para cada
texto de uma lição, ao lado
direito aparece todo o texto escrito
em símbolos fonéticos. No início,
eu achava estranhos aqueles símbolos que
só seriam proveitosos quando
fossem dominados pelos seus valores falados em consonância com os
sons do fonemas consonantais e
vocálicos.
Não dispondo
do disco em gramafone,
seria muito difícil ler a
parte dos textos em símbolos fonéticos. O
curioso foi que nunca mais em outro
livro didática compulsado por mim
eu via aqueles símbolos da IFA. Só, na coleção da série de livros
do professor A. J. Hald Madsen, American English Series, revi
o uso dos símbolos fonéticos. Por
sinal, tive a honra de ter tido o Madsen
como professor de fonética inglesa na Faculdade de Letras da UFRJ. Já
fiz referência a esse ilustre
professor no meu livro Apenas
memórias ( 1a. ed. Rio de Janeiro: Quártica, 2016, 304 p.). Madsen era dinamarquês, e fora consultor de língua inglesa no
Consulado Americano. Era baixo, atarracado,
muito corado e irradiava
simpatia. Anos depois, em escola municipal, trabalhei com outro livro dele mais atualizado às conquistas da linguística para o ensino de
línguas modernas. Já estávamos
atravessando a época da
introdução do estruturalismo, da
gramática transformacional, da
linguística aplicada ao ensino do inglês, de novos abordagens para
o ensino de idiomas após a fase “translation method,” do “direct
method” já bastante
empregados por professores brasileiros, tendo à frente o Colégio Pedro
II (Externato), o Colégio Militar do Rio de Janeiro
e outros estabelecimentos de ensino
privado de ponta.
O English method do Pe. Albino já se utilizava do direct method misturado, nas
fases mais elementares, com o que
se denominou de “semi-direct method.”
Este último utilizava-se da
gramática explicada em português
enquanto o primeiro estudava a gramática
explicada em inglês, quer dizer, a aulas eram ministradas em inglês, sem o
recursos da tradução. A prática oral, da conversação era ainda reduzida. O velho método da
tradução-versão ia ficando para trás, embora muitas escolas , durante
anos, ainda empregasse a tradução
e o ensino de gramática feito
em língua vernácula. Os cursos de idiomas de maior prestígio, IBEU, Cultura Inglesa, por muito
tempo vinham usando a abordagem do
“direct method.” Os livros didáticos escritos
por brasileiros ou estrangeiros também
seguiam esse método, se bem
que de forma híbrida.
Os
dois volumes, num único livro do An English method, compreendiam quatro
partes, sendo as duas primeiras
dedicadas ao primeiro volume e as duas últimas ao segundo volume.
Somente a partir do segundo volume é que
as lições são redigidas em inglês, ou seja, tanto os textos de leitura inicial quanto a gramática e os
exercícios de gramática. As dificuldades
quanto aos textos e ao estudo gramatical
eram dosadas desde as mais elementares até as mais adiantadas.
Deve-se ressaltar a variedade
de textos contidos na obra, que iam de textos dissertativos, narrativos,
de conversação, até uma soma enorme de textos, sobretudo poéticos, assim como adivinhações,
provérbios humor, abrangendo um
amplo espectro de assuntos da vida cotidiana, culturais,
históricos, geográficos, bíblicos (compreensível numa obra escrita por um sacerdote) incluindo orações
cristãs mais conhecidas, como
rezar o Pai Nosso, a Ave Maria, a Salve Rainha, o Sinal da Cruz.
A
obra An English
method, ainda naquela época, marcou
a presença de um grande cultor da língua
inglesa, um estudioso alicerçado na
leitura dos melhores foneticistas,
estrangeiros e brasileiros, como Daniel Jones, H. E. Palmer, Dr. Isaías A. de
Almeida, e Pe, Luiz Gonzaga Van Woesnik. Já nos anos 1930 sabia
valorizar o conhecimento da
fonética como da maior relevância a um professor de línguas,
conforme podemos ver na epígrafe de H. E. Moore abrindo o prefácio do Pe, Júlio
Albino à 14ª edição: “(...)_ and it can
be said, without hesitation, that a non-phonetic teacher is out of date.” Como
lexicógrafo, seus dicionários
receberam grandes elogios de eminentes
professores de importantes universidades, como Raymond Weeks (Universidade de
Colúmbia, Nova York), A.C.L Brown (Universidade de Illinois), Professor C. H. Grandgent (Harvard University, Cambridge,
Mass), Professor Geddes ( (Boston), entre outros.
Observa-se,
no entanto, que um volume espesso como o livro em análise ressente-se de maior e
melhor organização na
distribuição de uma gama de assuntos e mesmo de certa
redundância no estudo da
gramática que poderiam ser mais
sistematizados e apresentados com maior economia.
Por
outro lado, vale assinalar que
obras didáticas da época em que foi escrito o An English method repetiam esse
mesmo esquema assistemático e
rebarbativo, assim como também me parecem
exageros em alguns livros
didáticos de línguas modernas atuais a
profusão de matéria
colorida na apresentação a dos
textos, numa certa mistura e
confusão visuais que atrapalham, de
certa maneira, a alunos se professores.
Isso é muito comum no material
de livros didáticos estrangeiros
que empregam o chamado “Communicative approach,” o qual hoje esta prevalecendo.
Por
razões pedagógicas e para fins práticos,
bons autores didáticos brasileiros
escreveram obras práticas para o ensino do inglês e de outras línguas, à margem
de approaches linguísticos de ponta. Preferiram ensinar
idiomas, sobretudo, o inglês,
usando do artifício da chamada “pronúncia
figurada” ( marked pronunciation). Assim os fizeram, por exemplo, M. de Oliveira Malta, com o conhecido O inglês tal qual se fala no presente J. L. Campos Jr. no livro How to learn English (Como se aprende inglês), embora os outros livros neste último autor já predomine o "direct metod."Não
os reprovo por isso, uma vez que eu
mesmo fui beneficiado por eles. Se bem que por tais recursos menos científicos o aluno
saia falando com algum sotaque,
com o tempo e em contato com falantes nativos, irão seguramente melhorar
o desempenho oral da língua estrangeira. Isso ocorria
muito no ensino de línguas no
interior onde o contato com nativos
era muito escasso, mesmo para o
professor.
Hoje,
com a difusão do emprego de fitas, discos do tipo em vinil, CDs, vídeos, (antigamente eram os discos reproduzindo conversações da língua falada por nativos), tais deficiências são facilmente sanadas, até porque, com o desenvolvimento do computador e da internet, ainda mais
fácil se tornou o ensino de idiomas
para todos o que amam
aprender mais de uma língua, além
da possibilidade à disposição do
público de canais de TV a cabo levando aos lares de outros países várias línguas ao vivo, filmes, programas
diversos, notícias. Com tudo
isso, tornou-se mais fácil
melhorar o conhecimento de idiomas
estrangeiros.
Ora,
acredito que se os livros didáticos
fossem mais simples na
apresentação da matéria a ser aprendida, sem perder a profundidade e a importância da abordagem, lucrariam muito
mais alunos e professores.
O Pe.
Júlio Albino Ferreira nasceu em Portugal em 1868 e faleceu em 1934( breve informação
biobibliográfica do Pe. Albino colhida no Dicionário prático ilustrado, em 3 volumes, Lello & Irmão Editores, Porto,
1963). Além de autor sobre o ensino do inglês, contando-se 15 obras, foi
escritor. Suas obras foram sempre
bem recebidas pela crítica especializada nacional e internacional,
inclusive os dicionários de inglês-português e português-inglês que produziu.
Pe. Albino Ferreira morou muitos anos na Inglaterra e tornou-se, em
Portugal, um emérito
conhecedor do idioma de Shakespeare. Na minha próxima postagem, farei uma tradução de um pequeno
texto em inglês do Pe. Júlio
Albino Ferreira. Por fim, na minha biblioteca,
consegui adquirir mais algumas
obras desse festejado autor. Sua
validade atualmente serviria mais a
pesquisas acadêmicas, com vistas a
estabelecer comparações entre
métodos antigos e modernos na história do livro didático para o ensino de idiomas no Brasil.
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