sexta-feira, 1 de setembro de 2017

A CONTRIBUIÇÃO DO Pe. JÚLIO ALBINO FERREIRA AO ENSINO DA LÍNGUA INGLESA




                                                                Cunha   Silva Filho


           Vim a  saber sobre o Pe. Júlio Albino Correia ao entrar em contato com os livros da biblioteca  de meu pai, a qual  dispunha  de um exemplar  de uma  das  inúmeras obras didáticas para o ensino do inglês, An English method, daquele   estudioso  da língua inglesa. Essa era a única do autor  que meu  pai possuía na sua  biblioteca. Ao vir para o Rio de Janeiro, trouxe o volume comigo. Porém, em Teresina,   já otinha lido quase por completo. Concluí a leitura aqui no Rio. O exemplar, em dois volumes num só tomo, que tenho data de 1939, 14ª edição, Imprensa Moderna, Ltda, Porto, 408 p.
         Aquele livro  traz a assinatura de meu pai (quanta saudade ao olhar para a sua letra manual, ainda mais   bonita e firme do que com um pouco de diferença que mostrava  na velhice!⁢Costumava assinar  assim: F. Cunha e Silva. Naturalmente foi  feita no tempo em que  lecionava em Amarante,  no seu  conceituado colégio Ateneu Rui Barbosa. Nas primeiras páginas da lições  elementares,  há marca nas páginas a lápis e umas a tinta, à página 18. Mesmo  dando aulas para o nível primário  e preparatório,  ele ensinava   aos alunos  noções de inglês e francês. Não dominava  o inglês como  o fazia com o francês,  o italiano, que estudara bem  com os salesianos em Niterói e  no Seminário  da ordem salesiana  em Lavrinhas São Paulo. Conhecia bem  o latim, porém  não tenho certeza se dominava o grego.  Mas, voltemos a falar sobre o Pe. Júlio Albino Ferreira e seu An English Method.
         A grande novidade dessa obra era que, já nos anos 1930, o autor  demonstrava  boa atualização metodológica no  ensino do inglês, tanto é que trazia a novidade do Alfabeto Fonético da International Phonetic   Association. Logo no início da obra, o autor informa  que  os sinais do alfabeto fonético  tinham sido  gravados em disco  gramafone pelo  professor  Mr.  John Opie, professor de inglês da Universidade de Coimbra.Era um conquista para aqueles tempos  o ensinar-se inglês com o recurso  do aprendizado do valor  dos  símbolos  fonéticos, tarefa  que de se  ocupa o Pe. Albino Ferreira  a elucidar criteriosamente nas primeiras páginas  da obra.
         Nessas páginas explicadas em português,  o autor inclui exercícios  para os estudantes se familiarizarem com os símbolos  que serão  parte  integral ao  longo  do livro, i.e.,  para cada  texto  de uma lição, ao lado direito aparece  todo o texto  escrito  em símbolos fonéticos.  No início, eu achava  estranhos aqueles símbolos que só  seriam proveitosos  quando  fossem  dominados pelos seus   valores falados  em consonância  com  os sons do fonemas  consonantais e vocálicos.  
        Não dispondo do disco  em  gramafone,  seria muito  difícil  ler  a parte dos textos  em símbolos fonéticos. O curioso  foi que nunca  mais em outro  livro didática  compulsado  por mim  eu via  aqueles  símbolos da IFA. Só, na coleção da série  de livros  do professor A. J. Hald Madsen, American  English Series, revi  o uso dos símbolos  fonéticos. Por sinal,  tive a honra de ter tido o Madsen como  professor de fonética  inglesa na Faculdade de Letras da UFRJ. Já fiz referência a esse ilustre  professor  no meu livro  Apenas memórias ( 1a. ed. Rio de Janeiro: Quártica, 2016,  304 p.).  Madsen era dinamarquês, e fora consultor de língua inglesa no Consulado Americano. Era baixo, atarracado,  muito corado e irradiava  simpatia. Anos depois, em escola municipal,  trabalhei com outro  livro dele mais atualizado  às conquistas da linguística para o ensino de línguas modernas. Já estávamos  atravessando  a época da introdução do estruturalismo,  da gramática   transformacional, da linguística aplicada ao ensino do inglês, de novos abordagens   para  o ensino de idiomas após a fase “translation method,”  do “direct  method” já bastante   empregados  por professores  brasileiros, tendo à frente o Colégio Pedro II (Externato),  o Colégio Militar do Rio de Janeiro e outros estabelecimentos  de ensino privado de ponta.
      O English method do Pe. Albino já se utilizava do direct method misturado,  nas  fases mais  elementares, com o que se denominou de  “semi-direct method.” Este último  utilizava-se da gramática  explicada em português enquanto  o primeiro estudava a gramática explicada em inglês, quer  dizer,  a aulas eram ministradas em inglês, sem o recursos da tradução. A prática oral, da conversação era ainda  reduzida. O velho método da tradução-versão  ia ficando  para trás, embora muitas escolas , durante anos,  ainda empregasse  a tradução  e o ensino de gramática  feito em  língua  vernácula. Os cursos  de idiomas de maior  prestígio, IBEU, Cultura Inglesa,  por muito  tempo  vinham usando a abordagem do “direct method.” Os livros didáticos escritos  por brasileiros ou estrangeiros também  seguiam  esse método, se bem que  de forma híbrida.
     Os dois volumes, num  único livro do  An English method, compreendiam  quatro partes, sendo as duas primeiras  dedicadas ao primeiro volume e as duas últimas ao segundo volume. Somente a partir do segundo volume  é que as lições  são  redigidas em inglês,  ou seja, tanto os textos  de leitura inicial quanto a gramática e os exercícios  de gramática. As dificuldades quanto aos textos e ao estudo gramatical  eram dosadas  desde as mais  elementares até as mais  adiantadas.
      Deve-se ressaltar  a variedade  de textos contidos na obra, que iam de textos dissertativos,  narrativos,  de conversação, até uma soma enorme de textos, sobretudo   poéticos, assim como  adivinhações,  provérbios  humor,  abrangendo um  amplo espectro   de assuntos  da vida cotidiana,  culturais,   históricos, geográficos,  bíblicos (compreensível numa obra escrita por um sacerdote) incluindo  orações  cristãs mais conhecidas,  como rezar o Pai Nosso, a Ave Maria,  a  Salve Rainha,  o Sinal da Cruz. 
      A obra  An English method, ainda naquela época,  marcou a presença de um  grande cultor da língua inglesa, um estudioso  alicerçado na leitura  dos melhores foneticistas, estrangeiros e brasileiros,  como  Daniel Jones, H. E. Palmer, Dr. Isaías A. de Almeida, e Pe, Luiz Gonzaga Van Woesnik. Já nos anos  1930 sabia  valorizar  o conhecimento da fonética  como  da maior relevância a um professor de línguas, conforme podemos  ver na epígrafe  de H. E. Moore abrindo o prefácio do Pe, Júlio Albino  à 14ª edição: “(...)_ and it can be said, without hesitation,   that a non-phonetic   teacher is out of date.” Como lexicógrafo,  seus dicionários receberam   grandes elogios de eminentes professores de importantes universidades, como Raymond Weeks (Universidade de Colúmbia, Nova York), A.C.L Brown (Universidade de  Illinois), Professor C. H.  Grandgent (Harvard University, Cambridge, Mass), Professor Geddes ( (Boston), entre outros.
       Observa-se, no entanto,  que  um volume espesso como o livro em  análise ressente-se de maior  e  melhor organização  na distribuição  de uma gama de  assuntos e mesmo  de certa  redundância no estudo  da gramática que poderiam ser mais   sistematizados e apresentados com maior economia.
      Por outro lado,  vale  assinalar que  obras didáticas da época em que foi escrito o  An English method  repetiam esse mesmo  esquema assistemático e rebarbativo, assim como  também  me parecem  exageros  em alguns  livros didáticos de  línguas modernas atuais a profusão  de  matéria  colorida  na apresentação a dos textos, numa certa mistura  e confusão  visuais que atrapalham, de certa maneira,  a alunos se professores. Isso  é muito comum no  material  de livros didáticos estrangeiros  que empregam  o chamado  “Communicative  approach,” o qual hoje esta prevalecendo.
    Por razões pedagógicas e para fins práticos,  bons autores  didáticos brasileiros escreveram  obras práticas  para o ensino do  inglês e de outras línguas,  à margem  de approaches  linguísticos    de ponta. Preferiram  ensinar  idiomas, sobretudo,  o inglês, usando  do artifício da chamada “pronúncia figurada” ( marked  pronunciation). Assim os fizeram, por exemplo, M. de Oliveira Malta, com o conhecido O inglês tal qual se fala no presente  J. L. Campos Jr.  no livro  How to learn  English (Como se aprende inglês), embora os outros livros  neste último autor já predomine o "direct metod."Não os reprovo por isso,  uma vez que eu mesmo  fui beneficiado  por eles. Se bem que  por tais recursos menos científicos  o aluno   saia falando com  algum sotaque, com o tempo e  em contato com   falantes nativos, irão seguramente  melhorar  o desempenho  oral  da língua estrangeira. Isso ocorria muito  no ensino de línguas no interior  onde o contato  com nativos  era muito escasso, mesmo  para  o professor.
     Hoje, com a difusão  do emprego de  fitas,  discos do tipo em vinil, CDs, vídeos, (antigamente eram os discos   reproduzindo  conversações da língua   falada por nativos), tais   deficiências são  facilmente sanadas, até porque,  com o desenvolvimento  do computador e da internet,  ainda mais  fácil se tornou     o ensino  de idiomas  para todos  o que  amam  aprender  mais de uma língua, além da possibilidade  à disposição do público  de canais de  TV a cabo levando aos lares  de outros países  várias línguas  ao vivo, filmes,  programas  diversos,  notícias. Com tudo isso,  tornou-se mais   fácil  melhorar  o conhecimento de  idiomas  estrangeiros.
     Ora,  acredito que se os livros didáticos  fossem mais   simples na apresentação da matéria a ser aprendida, sem perder a profundidade  e a importância da abordagem, lucrariam muito mais alunos e professores.
   O Pe. Júlio Albino Ferreira nasceu em Portugal em 1868 e faleceu em 1934( breve informação biobibliográfica do Pe. Albino  colhida no Dicionário prático ilustrado, em 3 volumes, Lello & Irmão Editores,  Porto,  1963). Além de autor sobre o ensino do inglês, contando-se 15 obras,  foi  escritor. Suas obras  foram sempre bem recebidas  pela crítica  especializada nacional e internacional, inclusive os dicionários de inglês-português e português-inglês que produziu. Pe.  Albino Ferreira morou  muitos anos na Inglaterra e tornou-se, em Portugal,  um  emérito   conhecedor do idioma de Shakespeare. Na minha próxima postagem,  farei uma tradução de um  pequeno  texto em inglês  do Pe. Júlio Albino Ferreira. Por fim, na minha biblioteca,  consegui  adquirir mais algumas obras desse festejado autor.  Sua validade atualmente  serviria mais a pesquisas   acadêmicas,  com vistas a   estabelecer comparações  entre métodos antigos e modernos na história do livro didático  para o ensino de idiomas no Brasil.
       

        

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