Cunha
e Silva Filho
Existem dois tipos de serviços de saúde no país: a dos que podem ter
planos de saúde privada e dos pobres, dos que não podem pagar um
plano e, portanto, têm, caso
adoeçam, o atendimento em geral precário
do serviço público.
Há algumas décadas,
a saúde pública brasileira
tinha alto padrão de atendimento, com médicos competentes
e de larga experiência, formados
por universidades estaduais e federais, com professores bem-formados, com ingresso através de rigorosos exames de vestibular aos cursos médicos. Ainda não havia a proliferação de faculdades de medicina de baixo nível de formação, como em geral
acontece com grande parte de faculdades de medicina particulares
espelhadas pelos grandes
centros urbanos
Criei meus filhos
sendo tratados por médicos do setor público, o antigo INPS. Ainda nem se falava em planos privados. Com o tempo, o atendimento
da medicina pública foi caindo de
nível até chegar a esta
estagnação deplorável em que se
encontra hoje, com hospitais
mal equipados, mal administrados, onde falta tudo, até os bons médicos de outrora.
Para ser um bom médico,
o candidato tem, primeiro, que ter vocação, habilidade
para lidar cm pessoas
doentes, estar bem informado
do desenvolvimento da medicina
dos países adiantados, ser
estudioso da bibliografia atualizada
no campo da medicina, realizar
cursos de aperfeiçoamento na sua área,
frequentar congressos nacionais e internacionais e ter um espírito
devotado à nobre profissão de médico, de médico que nem de longe
possa ser imbuído do sentido de lucro, de mercantilismo ao lidar
com a sua profissão.
Pessoalmente,
já conheci bons médicos, pacientes, cuidadosos, empáticos que na verdade se interessam pelos pacientes e desejam curá-los, que é o objetivo mais caro ao
médico, sem o qual ele não estará
eticamente cumprindo à risca o
juramento de Hipócrates (460-370
a . C.), o pai da Medicina.
Se alguém pretende
cursar medicina para fazer da
profissão somente riqueza não se tornará
nunca um médico à altura do juramento que faz no ato de cerimônia de
formatura.A vaidade, a presunção, a falta de afabilidade junto aos pacientes
jamais levarão ao aperfeiçoamento do médico. Além disso, deve ter profunda conduta ética, rigor
em dar o diagnóstico, responsabilidade,
integridade e comprometimento com
a vida dos que estão aos seus cuidados.
O país precisa com urgência, - atenção ministério da
Educação! - de repensar a formação dos médicos
brasileiros, só permitindo o
ingresso aos cursos de medicina àqueles
que estão intelectualmente preparados em
todos os aspectos que envolvem a sua formação científica,
exigindo a obrigatoriedade
de cada acadêmico passar pela
residência médica nos melhores
hospitais e institutos de medicina, além de um
criterioso exame de provas orais e prática junto ao CRM.
Não pode haver leniência com
uma profissão que lida com a vida humana.
Ontem, leitor,
uma criança de quatro anos faleceu
em São Paulo. Ela
estava com apendicite já em ponto de ser operada, o que lhe foi negado por
culpa da negligência e irresponsabilidade médica, que não lhe deu diagnóstico
correto, numa peregrinação em quatro
hospitais. Em cada um, a criança não
conseguiu fazer exames
adequados para conclusão
do que sofria. Eis aí mais um
caso flagrante do descaso de médicos e de gerenciamento hospitalar provocando
óbito desnecessário, numa ação criminosa
contra os direitos de uma criança
que não são respeitados no país.
Configura o incidente um crime contra
um inocente por parte de
profissionais e, por extensão, das autoridades responsáveis pela saúde pública
brasileira. A amargurada confissão do pai de Anderson, este é o nome
da criança, é das mais pungentes que ouvi nos últimos anos. Chorando, o jovem pai de Anderson, compartilhando sua
dor imensa com a jovem mãe da criança,
é o retrato de um protesto
justo por uma situação de impunidade e de solidão vivenciadas pelo casal. O choro e as palavras
de indignação contra o abandono
a que foi relegada a criança nos
recintos dos hospitais sem que em nenhum deles
fosse dado o diagnóstico correto para o mal-estar do pequeno
Anderson, é mais um lastimável número de uma elevada e sempre crescente estatística
de mortes de crianças e adultos
por falta de atendimento na rede pública do país.
Enquanto os
pensamentos atuais do governo federal, à
frente a Presidente Dilma Rousseff, se voltam prioritariamente para os gastos astronômicos com Copa
Mundial, com as Olimpíadas, com
viagens a países a preço de ouro, com hospedagens nos melhores hotéis do mundo e com outras nababescas despesas com alimentação em luxuosos restaurantes para atender regiamente
a enorme comitiva presidencial, a população
modesta do país morre à míngua por falta
de bons médicos, de bons
hospitais e de respeito pelo brasileiro.
Não há como fugir ao truísmo: -Este não é
um país sério.