segunda-feira, 23 de julho de 2018

À GUISA DE UMA BREVE ANÁLISE DO POEMA "DESTINO?" DE MADALENA FERRANTE PIZZATTO






                                                                        

                                                                 Cunha  e Silva Filho





DESTINO ?



Um ramo primaveril,
pleno de muitas flores
enche com perfume o ar.



Aí, um vento invernal
despe o florido ramo.
Reveste o chão de cores,
num tapete matizado.



Sem nenhuma piedade,
este perverso vento,
muda o destino do ramo.

( de Madalena Ferrante Pizzatto )





         O que logo me chama a atenção no poema “Destino?” é o seu título em forma de interrogação. Assim,  ele   próprio me dá alguma pista  em direção a uma    das possíveis leituras da composição. Sabe-se que uma interrogação pode tanto ser uma forma   retórica lançada ao receptor tanto quanto  uma dúvida mesmo  sobre o destino  do ser humano.      

         Trata-se de uma dúvida    sobre   algo que todos nós podemos compreender  como naturais  acontecimentos na vida do ser humano contra os quais nada podemos fazer  por estar  relacionada a acidentes ou condições  determinadas  da existência natural  ou  transcendente que s escapam  do nosso controle e da nossa vontade. Como exemplos mais relevantes  podiam-se citar  o nascimento  e a morte.

         No   poema, a metáforas  do “ramo  e do” vento,  da quais a do vento instaura  um sentido antitético  e, portanto, desumanizado,  são os dois elementos que sustentam semanticamente   o arcabouço do poema.   Daí   o sujeito lírico   falar de “perverso vento,” reforçado negativamente  por outro sintagma   nominal – “vento invernal” e  por todo um verso da terceira estrofe  “Sem nenhuma piedade.” Ora, o surgimento imprevisível  do vento desfavorável  pode  interromper, a qualquer momento da vida  de cada um de nós,  a possibilidade da felicidade plena. Por outro lado, observe-se que, numa primeira camada  significativa    do poema,   tem-se   como referência  básica  no conjunto   da mensagem   do poema  a referência literal entre  as duas estações  sucessivas e opostas  nos seus traços  de mudanças  da Natureza  da  paisagem   do ano: a primavera e o inverno.

      Não devemos  descurar  uma observação dos dois últimos  versos  do terceto (Reveste o chão de cores/  num tapete matizado)  da segunda estrofe que destoam   no que tange  ao sentido disfórico  e antitético  do todo dessa estrofe e sinalizam um estado de neutralidade entre o significado de oposição equilíbrio versus desequilíbrio. Poder-se-ia   aventar aqui  uma terceira via  de entendimento   do tema  pendular    felicidade versus infelicidade, ou seja, vale repetir,  equilíbrio versus desequilíbrio; Mesmo se  levando  em conta  a negatividade das  segunda e terceira  estrofes,  nesse dois versos   se abre um luz  que talvez corresponda a um estado  de aceitação  dolorida embora,  da ausência  plena  da  felicidade.     

     Ou seja, a metáfora do “vento” corresponderia, mutatis mutandis,  àquela “pedra  no meio do caminho” drumommondiana.  Representa  o acidente ou os acidentes do percurso, da travessia  existencial,   de cada indivíduo na Terra, dos quais nenhum  indivíduo  escapa    enquanto vivente. As fases   da vida, infância,  adolescência,  mocidade, maturidade e  velhice  são sucessivas a menos que um “vento perverso” venha mudar  esse percurso. A segunda estrofe semanticamente   se opõe à primeira.

    A primeira estrofe  figura,   pois,  o presente  em estado de tranquilidade,    quer dizer,  a  situação  de equilíbrio vivencial, enquanto a segunda estrofe   rompe com essa estado  de positividade. Convém observar que  o percurso  em geral do ser humano  transcorre entre   o equilíbrio e o desequilíbrio, i.e., não existe felicidade  completa, mas instantes  ou períodos de bem-aventurança, assim como pode haver  ainda  períodos longos  e inaceitáveis de  anormalidade, por exemplo,  nas situações  de catástrofes naturais ou  guerras  entre nações. O que significa que não  há a possibilidade  de  a existência  ser   vivida como um  mar de  rosas, sendo, por conseguinte,  a condição  humana  precária, imprevisível e finita.

    Por fim, há que considerar-se o artesanato   da construção do poema  estilisticamente  falando. Gostaria apenas de mencionar um  recurso de estilística fônica (aliteração) que  podemos depreender na leitura  da linguagem  em si  dessa composição poética:  a) Na primeira estrofe, a incidência do fonema / p/, remetendo à primaveril/pleno/perfume ; b)Na     segunda e terceira estrofes, a incidência do fonema  /v/, remetendo a vento/ invernal/reveste, um oclusivo  surdo e um fricativo sonoro. Desse modo, se constata que  a camada fônica dos versos  acompanha  o traço  de oposição semântica  do poema   em exame. 

NOTA DO COLUNISTA : MADALENA FERRANTE PIZZATTO é goiana. Economista e poeta. Pertence à Academia de Poesia do Paraná, Cadeira 33, à União Brasileira de Trovadores - Curitiba - Pr., e ao Centro de Letras do Paraná. Atua também na Oficina Permanente de Poesia, em Curitiba. Tem participado de várias antologias. Obra publicada: Entre sonhos e poesias. Algumas de suas trovas e poemas foram premiados em concursos.



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