Cunha e Silva Filho
A globalização é em essência, contraditória, com aspectos positivos, com outros negativos e até hilários. Entre a riqueza e a miséria, a nobre nação de Lincoln vai se virando aos arrancos das marés. Basta dizer que, segundo um artigo de Vinicius Torres Freire ( “Cenas da miséria americana”, Folha de São Paulo, 26/08/2012), “Mais ou menos um de cada sete americanos depende de assistência do governo federal para comer.” Essa é uma contradição. Uma outra seria a alegação de que o país continua sendo a nação mais poderosa do mundo.
Ora, além de ser uma outra contradição, ainda se definiria como uma tragédia, a de seus ricos, inclusive seus parlamentares republicanos, não se importarem com os seus patrícios, o que, neste ponto, se igual ao Brasil. Contudo, há um lado hilário, é quando o articulista citado fala dos benefícios da “renda média” de US$783,00 das famílias que fazem parte do programa “Food Stamps” (cupons de comida), auxílio social correspondente mais ou menos ao nosso “Fome Zero,” benefício idealizado pelo presidente Roosevelt em 1939.
A chamada linha de pobreza americana como dado oficial é de US1.542, tendo por base uma família de três pessoas. Convertendo tudo isso em reais vê-se o quanto os pobres ou miseráveis brasileiros estão distantes em desvantagem dos americanos “pobres” e “miseráveis.”
De acordo com informações do artigo são aproximadamente 46,5 milhões de americanos que estão contemplados neste programa. Desde 2007, os pedidos de auxílio cobertos pelo “Food Stamps” cresceram 70%.
Como é tudo isso possível numa sociedade de multimilionários que convivem com uma parte imensa da população sem condições de ter plano de saúde (Medicare) condigno ou se o tem, graças ao governo de Obama, é modesto e insatisfatório. Mas, enquanto Obama do partido democrata ainda consegue fazer alguma coisa do muito que prometeu no discurso de posse, os republicanos, pela voz de alguns de seus parlamentares, pouco estão se lixando para os benefícios públicos de que, bem ou mal, o atual governo concede aos americanos necessitados. Os republicanos, repito, querem cortes maciços nestes programas de natureza assistencial.
Pagando menos imposto de renda do que a classe média, a alta burguesia americana não está nem aí para os desafortunados. Impregnados de individualismo, pelo grande valor que dão ao dinheiro e ao lucro, os americanos, em geral, não podem mesmo apoiar os altos gastos de programa de alimentação concedido aos menos favorecidos. Por isso, Obama tem ainda um grande trunfo nesta segunda corrida à presidência dos EUA. Desde a crise aguda da bolha imobiliária, estopim para outros retrocessos na economia americana, dentre os quais o desemprego e o empobrecimento da sua população de renda média ou mínima, chances há ainda para o seu segundo mandato apostando que existem ainda meios de encontrar saídas para uma melhoria da vida dos americanos.
Se Obama contornar o fosso de desigualdade crescente entre pobres e ricos, mantendo cada vez mais baixos os índices de desemprego e conseguindo para os despossuídos alguns ganhos de ajuda social, ser-lhe-á possível tentar implantar uma mudança de consciência coletiva se lograr sensibilizar os americanos para entenderem que a riqueza da nação e sua segurança dependem da união de todos os segmentos da sociedade numa luta comum para a conquista da paz social, a qual só se concretizará caso haja uma mudança de consciência nacional de um povo formado de diferentes etnias e de diversidades culturais.
Até mesmo pela sua condição de mestiço, Obama seguramente tem convicção de que não deverá decepcionar o povo americano. Não seria bom para a imagem que os negros e mestiços faziam a princípio do primeiro presidente não branco dos EUA. Poderia assim ser interpretado como uma derrota da capacidade política da raça negra para dirigir os destinos do povo americano. Abriria, assim, um precedente negativo, que ninguém desejaria para a nação americana.
Um país da sua magnitude geográfica e de alto alcance científico-tecnológico há de encontrar uma solução democrática, como, ao longo de sua história, tem sido, sobretudo internamente, já que, em política externa tem sido responsável pela inimizade que criou com a sua política considerada imperialista , principalmente na Ásia e no Oriente Médio. Esta posição ainda privilegiada o país não poderá deixar escapar. Mas, somente conseguirá atingir metas econômico-financeiras favoráveis se persistir na direção da diminuição de desigualdades sociais e fizer um pacto suprapartidário, no qual os mais ricos devem ceder espaço econômico e de condições melhores de vida do povo americano.
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