sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Mensagem ao 2º Salão do Livro de Amarante (SALIAMAR) a ser realizado de 28 a 30 de novembro de 2019 e a minha homenagem a Cunha e Silva, meu pai (1905-1990) Em 29 de November de 2019






Meus estimados amigos e conterrâneos de Amarante:
   

      Antes de tudo, gostaria de agradecer, “ab imo pectore, ” ao grupo de organizadores do Salão do Livro de Amarante pelo honrosa escolha de, nesta edição, escolher, como um dos homenageados ilustres, a figura de meu saudoso pai, o professor, jornalista, ficcionista (no gênero da novela e do conto), memorialista, crítico bissexto e, finalmente, poeta dedicando-se, a partir dos 60 anos, a esta forma de poema fixo chamada soneto, modalidade de poema praticada até hoje pelos maiores poetas ocidentais. Os demais escritores homenageados nesse Evento foram Da Costa e Silva, Clóvis Moura e, Nasi Castro Para o Evento foram convidados os ilustres escritores piauienses , membros da Academia Piauiense de Letras (APL), Elmar Carvalho, poeta, ficcionista, memorialista e ensaísta, e Reginaldo Miranda, historiador e pesquisador piauiense.
     Cunha e Silva, de quem herdei, com muito orgulho, o mesmo nome e a quem prestei tributo dando igualmente a meu filho mais velho o mesmo nome, nasceu em Amarante, Piauí a 03 de agosto de 1905. Nessa cidade de poetas que também se orna com a antonomásia de “Atenas Piauiense” em razão de, neste torrão natal, ter aqui nascido um bom número de figuras proeminentes nos campos da literatura, sobretudo de poetas celebrados, alguns até nacionalmente, como o nosso poeta maior piauiense, Da Costa e Silva e de outras áreas da vida pública, como governadores, deputados, juristas, prefeitos, vereadores, professores, historiadores, senadores, cientistas, escultores, pintores, entre outras atividades que exigem talento e vocação.
     Maior honraria não poderia acontecer a meu pai como esta da qual me muitíssimo me orgulho como filho deste berço e como filho do ilustre amarantino. Meu amado pai, Cunha e Silva, certamente do céu de Amarante “...se há um céu sobre a terra...”, aqui me utilizando do famoso soneto “Amarante, incluído numa das obras poéticas dacostianas, o criativo e festejado livro Zodíaco (1917).
Para mim, a grande contribuição de meu pai, no tocante à vida educacional de Amarante, foi ele haver fundado, em 1932, o famosíssimo Ateneu Rui Barbosa, nesta terra querida e sempre louvada em prosa e verso, no qual, sozinho, lecionou até 1947, quando se estabelece em Teresina como professor no Liceu Piauiense e, mais tarde, no também famoso Ginásio “Des. Antônio Costa,” dirigido pelos irmãos Magalhães, Professor Melo Magalhães e Professor Domício Melo Magalhães.
A permanência de meu pai como proprietário do Atenu Rui Barbosa foi um epoch making. Era um “ professor nato,” como se autodefiniu numa grande e longa entrevista, concedida à Revista Educação, Hoje. (Teresina:Secretaria de Educação do Estado do Piau, Ano III– Nº 6 –revista trimestral, 15/10/198, p.17-22), Essa entrevista é fonte indispensável para entender o seu papel de eminente educador tanto em Amarante quanto em Teresina.
    Orgulhava-se de seu Ateneu e afirmava que tinha tido sorte, pois dessa escola foi professor de futuras ilustres figuras da vida nacional, como Francelino Pereira, Eduardo Neiva, Dirceu Arcoverde, entre outros ex-alunos e nas diversas áreas do conhecimento humano. Na sua atividade docente em Teresina, prestou um memorável concurso público para professor catedrático de Historia do Brasil da Escola Normal Antonino Freire. Estava eu ali presente na década de 50 do século passado e assisti, bem menino e embevecido, à sua defesa oral. Foi aprovado com brilho. Meu pai, não sei por que razão, sempre me levava a ocasiões importantes de sua vida pública, como foi a sua posse como diretor do renomado Liceu Piauiense, realizada no Palácio de Karnak.
   O seu discurso de posse do cargo de diretor do Liceu foi, como sempre, eloquente, porquanto era um orador de peso e de improviso desde os tempos de Amarante, onde o consideravam o orador de eventos sociais e culturais.
   Cunha e Silva teve um educação esmerada, primeiro em escola de Teresina, depois, no Rio de Janeiro, cidade que tanto admirava, no Colégio Salesiano “Santa Rosa,” em Niterói. Finalmente, do Salesiano de Niterói foi para o Seminário de Lavrinhas, em São Paulo, da mesma ordem religiosa, onde foi concluir o noviciado para, em seguida, estudar em Turim, Itália. Desistiu da carreira eclesiástica. Voltou ao Rio e, finalmente, para Amarante – ponto de partida para a docência, primeiro como professor do Ginásio Amarantino, cujo diretor era o ilustre futuro renomado historiador Odilon Nunes e, mais tarde, como fundador e professor do Ateneu Rui Barbosa. Nesse tempo, já dava os primeiros passos vitoriosos no campo do jornalismo, onde, em Teresina, iria dar continuidade à carreira de professor e jornalista. Jornalista intrépido, independente, combativo em artigos assinados e em artigos de fundo.
    Não quero cansar esta seleta assistência com uma Mensagem mais prolongada. Entretanto, desejo apenas assinalar um campo de sua atividade intelectual, no qual Cunha e Silva alcançou o merecido sucesso: o jornalista político doutrinário, segundo o definiu o ilustre jurista piauiense Cláudio Pacheco, Professor-assistente do historiador Pedro Calmon na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, depois, denominada Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
     Era um vocacionado para a escrita em jornais revistas piauienses e bem assim para um jornal de São Luís, O imparcial e uns poucos artigos para o jornal Diário de Notícias, do Rio de Janeiro Seus primeiros artigos datam de 1928, escrevendo para o jornal O Floriano, da cidade do mesmo nome. No jornalismo, Cunha e Silva também se destaca na sua veia crítico-satírica. Era um polemista indiscutível, um demolidor como foi exemplo a sua breve e famosa polêmica com um dos mais eminentes intelectuais piauienses de todos os tempos, A. Tito Filho.
      Estimados conterrâneos, esta homenagem dirigida ao meu pai muito regozija o meu mundo interior povoado fartamente de memórias felizes ou tristes, cuja origem vem da minha forte inclinação ao sentimento da saudade, razão pela qual escrevi o meu mais recente livro, Apenas memórias (2016), um livro de reminiscências que vão de Amarante a Teresina e desta ao Rio de Janeiro, onde resido há longos anos. Pois bem, meu pai, é figura bem presente naquele livro e aparece em vários passos da obra.
      Para concluir essa Mensagem, diria que meu pai atingiu mais notoriedade dos piauienses quando passou a produzir no campo literário e ensaístico. Daí resultaram as seguintes obras legadas à inteligência piauiense: A república dos mendigos (Rio de Janeiro: Gráfica Editora Ltda, 1984), com apresentação e orelhas da minha autoria.; Copa e cozinha, sátira política, misto de ensaio político e memorialismo ( Teresina: Academia Piauiense de Letras/ Projeto Petrônio Portella,1988, que teria o prefácio de Tristão de Athayde (Alceu Amoroso Lima), porém, por uma razão ou outra, não se concretizou, embora o grande crítico e pensador católico carioca me tivesse prometido; Gatos de Palácio (s.d), cujos originais se perderam na voragem do tempo. Trata-se de uma corrosiva sátira sobre a vida política piauiense; A odisseia do cativeiro do Brasil ( Tese, 1952); O papel de Floriano Peixoto na obra da proclamação e consolidação da República (Tese, 1957).
      Cunha e Silva, por sua incomensurável contribuição à imprensa do Piauí (Talvez tenha sido o jornalista brasileiro que mais produziu artigos publicados numa trajetória ininterrupta de seis décadas) por sua atividade docente e pelo seu mérito de intelectual do tipo humanista, versado em vários campos do saber, foi acolhido, em 1975, para imortal da Academia Piauiense de Letras, cadeira nº 8, tendo sido recebido por A. Tito Filho, em cujo memorável discurso de recepção exaltou as qualidades de meu pai na oratória, no jornalismo e no magistério público e particular. Neste último lecionou francês (inclusive, para minha alegria e vaidade justa, foi o meu professor dessa disciplina no curso ginasial) por muitos anos no citado Ginásio “Des. Antônio Costa.” Meu pai, por seu turno, no seu discurso de posse na APL, mais uma vez, produziu uma notável peça literária, na qual se podem reconhecer o seu vasto conhecimento, sobretudo nas áreas da história, sociologia, geografia, filosofia, línguas(latim, francês e italiano) ciências políticas e de grande leitor da literatura, quer nacional,  quer universal.
      Espero que meus conterrâneos presentes ao Evento aproveitem a lição e o exemplo de Cunha e Silva e se orgulhem de o terem como ilustre amarantino, cujos restos mortais jazem no Cemitério desta cidade. Que todos os participantes desta festa da cultura de Amarante sejam bem-vindos ao Salão do Livro de Amarante e que os trabalhos apresentados pelos participantes tenham um excelente resultado. Viva Amarante! Viva Cunha e Silva! Um abraço fraterno do Cunha e Silva Filho

terça-feira, 26 de novembro de 2019

SEM ELA, SEM GRAÇA



                                                 Cunha e Silva Filho

        Ela me deixou sem avisar. Maldade dela! Sempre a encontrava, lá no fundo do longo corredor. Atiçando-me como um canto de sereia para Ulisses. Antes mesmo de morar no bairro, já se encontrava lá. Todos gostavam dela, acredito Era mesmo a personagem central. Por ela ia sempre lá vê-la, falar com ela e com ela me deleitando. Por que me deixou sem ao menos me comunicar, sem uma palavra, um bilhete, um e-mail, um msg ou mesmo um brevíssimo aviso no Zapp?
       Mas não, deixou-me órfão, me magoou muito, me fez sofrer o desespero de uma perda querida. Nunca vou entender nada disso que estou falando ou pensando ou escrevendo. E nem adianta berrar, gritar, reclamar. Não me ouvirão nem me darão justificativa da sua ausência súbita, em forma de ruptura definitiva, sem adeus nem nada. Apenas me deixou desconsolado, tamanho era o sentimento de amor que me ligava a ela.
Tenho, desde então, sentido muito a sua falta. Dor de cotovelo me assalta o peito, o coração, tudo. Olho pra aquele fundo do longo corredor e não a vejo mais. Sumiu como um disco voador. Não se faz isso com alguém que nos ama, que nos procura sempre naquele mesmo lugar disposto a dialogar e trocar carinhos. Quanta saudade já tenho dessa ausência amada!
       Há tempos que tinha contato com ela, uns dezoito anos, no barato. Mas, ela, sozinha, me abandonou sem aviso prévio, segundo já comentei atrás. Não me lembro dia do primeiro encontro, mas me lembro que era assíduo com o meu encontro. Nem mesmo sei definir o meu amor a ela. Ela conversava comigo, mas sempre sem deixar nenhuma deixa de que também gostava de mim ou pelo menos tinha alguma atenção a mim e à minha frequência de encontros, sobretudo aos sábados.
      Não nego que perdi outras com o coração entrecortado de dor. Oh, com tenho sofrido cm essa perdas em lugares de que gosto tanto, como o Centro do Rio! E nessa parte fundamental do Rio, foram muitas, algumas mais velhas, outras velhíssimas, algumas bem estruturadas, belas mesmo.
Mas as perdi pra sempre e só me resta o lamento, sem poder fazer nada contra quem foi culpado de as afastar de mim sem dó nem piedade. As perdas foram tão duras que me abalaram o meu interior pra sempre. Sem volta nem ressurreição. Página virada com fim infeliz. Me pergunto: por que me deixaram assim tão melancólico e sem ânimo?
       Foi maldade pura contra mim e os meus sentimentos volúveis. Certo que as amei quase por igual, dependendo da duração dos laços amoroso, das afinidade, da intensidade recíproca. Mas como dói a ausência, a solidão, o abandono, o adeus sem aviso !
      Só Deus sabe a dor da perda. Pensei que ela sempre estaria ali me esperando para um novo encontro e pronta a me mostras bons livros, novidade de publicações, se bem que eu mesmo gosto de ir ás estantes, sobretudo as de línguas, de literatura, de ensaios. Com ela comprei muitos livros de alta qualidade. Certo que alguns pesavam no meu bolso de professor.
      Só em vê-la sorrido pra mim, me deixava pra cima. . Conversando com ela, as tristezas diminuíam e meu coração batia forte, talvez mesmo muito mais do que o dela, pois amor é, às vezes, uma ambiguidade por toda a vida.Ninguém sabe com certeza se é amado ou se é uma ilusão de ótica. O sentimento navega por mares nunca navegados.
     Contudo, com essa perda e as anteriores, me vejo mais abatido, casmurro, sem ânimo, nem mesmo com aquela antiga vontade álacre de ir ao encontro dela. Passo por lá e não a vejo mais. Só saudades, solidão. Sem ela, sem graça. A vida prossegue. Parece- me que foi tudo sonhos da minha frágil imaginação. Li há muitos anos num livro de francês uma frase que tem relação com o que venho relatando: “On ne badine pas avec l’amour.” Não me lembro quem foi o autor da frase. A frase todavia, tem suas razões: “Não se brinca com o amor”. Caso alguém o faça, vai se dar mal com o sentimento e a dor, sobretudo da perda ou solidão de um dos dois lados.
     Voltemos a ela. Sim, nesse caso que se deu comigo fui eu quem deu provas de amor maior e dedicação e assiduidade e carinho e sinceridade. Brinquei com o amor e ele me deixou vazio e na solidão sem fim. Por outro lado há que explicar ao leitor as razões dessa tristeza e solidão: aquele pronome “ela!, que empreguei nessa história não é o que pensou meu coautor. Eu vinha me referindo, em todo o texto, ao fechamento da Livraria Saraiva no Shopping da Tijuca. O resto V. já sabe. Bom dia, leitor, nesta ensolarada manhã de novembro e com uma leve brisa refrescante soprando no meu rosto, na varanda da minha moradia.

sábado, 16 de novembro de 2019

TRADUÇÃO DO POEMA "MOTHER TO SON", DE LANGSTON HUGHES ( 1902-1967)"




Mother to  son
Well, son. I’ll tell you:
Life for me ain’t been no crystal  stair.
It’s had tacks in it.
And splinters,
And boards torn up,
And places with carpet on the floor –
Bar
But all the time
I’se been a-climbin’ on,
And reachin’ landin’s,
And turnin’ corners,
And sometimes goin’ in the dark
Where there ain’t  been no light.
So boy, don’t turn back.
Don’t you set down on the steps
”Cause  you finds its kinder hard.
Don’t you fall now –
For I’se still going’, honey,
I’se still climbin’,
And life for me ain’t been no crystal stair.

De mãe pra filho
Bem, meu filho, presta atenção:
Pra mim a vida não tem sido uma  escada de cristal.
Nela só
Montes de coisas,
Farpas,
Tábuas arrancadas
E lugares sem tapetes no barzinho
Da sala.
Mas  no batente tou  o  tempo todo,
Com tentativas de superação,
De alcançar metas.
De sair de aperturas,
De por vezes caminhar nas trevas
Onde não  há luz.
Assim, menino,  nada de andar pra trás.
Não fica inerte nos degraus
Por achar isso tudo  duro demais.
Não desiste  na primeira tentativa –
Pois ainda tou no batente, meu anjo,
E a vida  não tem   sido uma escada de cristal.
                                        
                                                        (Trad. de Cunha e Silva Filho)