terça-feira, 30 de outubro de 2012

No coração do capitalismo













Cunha e Silva Filho



A bonita e simpática correspondente brasileira da Globo News, visivelmente preocupada, procura, no entanto, passar – sem o conseguir - a tranquilidade , ou melhor, a frieza e objetividade das notícias sobre o Furacão Sandy. O desastre está iminente. Vem mesmo.

As autoridades americanas, governadores, prefeitos, o próprio Presidente Obama esquecem os problemas comuns de governo  e se concentram no  maior de todos os problemas  que agora  enfrenta uma nação tão poderosa, amada e odiada, bela e lugar de tantos sonhos americanos e de bem-estar oferecido pela “Terra da Oportunidade”, salvação de tantos imigrantes, melting pot universal onde convivem pacificamente pessoas de diferentes culturas, onde se ouve falar uma multiplicidade de idiomas. Quer-se referir àquele Furacão com ventos catastróficos, chuvas torrenciais, mar encapelado com ondas altíssimas a ponto de saírem das margens e se arrastarem por ruas de Nova Iorque.

Toda a cidade de Nova Iorque assemelha-se  a uma cidade-fantasma. Nas suas ruas, vemos barricadas e outras artefatos de proteção. O centro nervoso está entregue às baratas. Todos corrrem para lugares mais seguros,. As água do mar inunda alguns metros das ruas. A bela cidade, a Big Apple, está triste e desolada, porque se o que ela detesta é não ver suas ruas apinhadas de pessoas de toda a parte. Até a Bolsa de Valores deixou de funcionar ontem, hoje, e talvez ainda não funcioná amanhã. Tudo está paralisado. As ruas,  escuras, A Times Square, sempre movimentadíssima e glamurosa, está molhada e sozinha. As pessoas, parece-me,   não  quererem  acreditar no que estão vendo acontecer   na bela cidade, metrópole do mundo, sonho de todos os turistas. Só alguns homens e mulheres da imprensa internacional são vistos, encapuzados, molhados, friorentos, fazendo alguma possível transmissão ao mundo, como os nossos corajosos correspondentes que enfrentam ainda no cumprimento do dever os riscos a que estão sujeitos em qualquer momento da reportagem.

O rio Hudson está também bravio, aumentando as águas. A Estátua da Liberdade, do alto, ofuscada pela ventania gigantesca, ainda dá algum sinal de vida. Nova Iorque é o coração do mundo, nos negócios, no lazer, no turismo, nas viagens de estudantes estrangeiros, na esperança de imigrantes procurando uma chance de trabalho, difícil nestes tempos bicudos de uma economia abalada.

Não gosto de filmes que retratam uma Nova Iorque apocalíptica. Ideia sem graça e que nada contribui para a grandeza da cidade. Nova Iorque foi feita para a alegria, a vida cultural, para seus espetáculos na Broadway, ou off   Broadway. Nova Iorque foi feita para o sorriso, a alegria, o encantamento. Nunca teve nem terá vocação para o isolamento, o fantasmagórico, a solidão. Nova Iorque precisa de gente muita gente, de turistas, muitos turistas, de pessoas que querem visitar inúmeros lugares importantes.

Seus prédios imponentes, seus edifícios e arranha-céus luminosos, suas ruas elegantes, seus bares e restaurantes, sua segurança , tudo convida à diversão e ao lazer.

Certamente, o Furacão Sandy há de arrefecer sua fúria e deixará em paz Nova Iorque e outras partes devastadas da costa americana. Sei também que os acts of God têm algum sentido de lição aos homens: a de que os homens, em toda a parte do mundo, devem ser mais humanos e mais humildes e, olhando-se interiormente, perceberem quão pequenos somos todos na face da Terra que, por sua vez, é um pingo de areia no Universo. A palavra Sandy tem um sentido que vai mais fundo na nossa imaginação. Em inglês, sand, quer dizer areia, e Sandy, um adjetivo, arenoso, cheio de areia. Não é isso significativo, leitor? O que é a areia senão o isolamento, a destruição, o esfarelamento, o desaparecimento de tudo o que a cultura artificial pode construir?  O  termo areia está associado a castelo, castelo de areia, algo que se faz e se desfaz em segundos, ou algo com que se sonha de grandioso e , de repente, se perde entre nossos dedos.

Nova Iorque, de alguma forma, poder-se-ia chamar de centro do mundo pela sua importância em vários e múltiplos aspectos de sua vida e de suas funções como megalópole. E, por ser assim, é que, metonicamente, o que nela acontece tem repercussão imediata no resto do planeta.

Espero que, no momento em que escrevo estas linhas, alguma coisa tenha melhorado nas cidades americanas atingidas violentamente pelas forças da Natureza.

Tudo que está acontecendo nos Estados Unidos é oportunidade para reflexão sobre a questão do cuidado que o homem deve ter com a Terra. Já é tempo de parar com tanta depredação no planeta, em geral devastação ambiental  visando ao lucro, à cupidez, ao desregramento desencadeados pela sede incontida de acumulação de riqueza  a qualquer preço, seja pelos países como governos, seja por homens individualmente, de todos os setores da atividade humana, e sobretudo dos que fazem do dinheiro, dos negócios, a maior razão da existência. Sejamos mais sensatos, não somos individualmente, o umbigo do mundo. Há muitas terras no planeta com povos famintos, sem instrução, sem saúde, sem nada, clamando por socorro permanente. Isso, em toda a parte, inclusive no Brasil.

Creio que a humanidade dará um passo melhor em seu convívio universal quando os egoísmos forem diminuídos e mesmo apagados do coração das pessoas. Dirão que sou um sonhador, um uópico, um nefelibata como diziam dos poetas simbolistas. Não, nesta altura da minha vida, eu teria mais inclinação pela casmurrice, pela desesperança, pelo pessimismo, se levasse em conta o que de repugnante tenho visto e sabido do que andam fazendo os homens no planeta nos mais diversos segmentos da vida social, ou seja, na política, na vida pública, no comportamento social, nas relações interpessoais.

A não ver toda a sordidez que se nos apresenta o palco da existência, seríamos uns Cândidos ainda mais ingênuos do que o personagem de Voltaire (1694-1778). Vejo, finalmente, a harmonia do planeta como uma decorrência da felicidade sincera entre os homens, entre os homens e a Natureza, sem todo esse arcabouço de alta e nefasta burocracia huxleyana ou mesmo os olhos onipotentes orwellianos da sua exagerada dependência tecnológico-científica e hipertrofiada confiança de que ele, só ele, pode enfeixar, em suas mãos prepotentes e babélicas, o destino de vida e morte da humanidade.



quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O crime ronda o país




Cunha e Silva Filho



Se a parte está no todo, o todo está na parte. Apesar desta formulação que nos lembra um sermão de Vieira, basta um exemplo de mais uma tragédia no cenário interno de uma república de estudante no Jardim Botânico para que reitere o fato de que o atual momento do país evidencia uma das fases mais violentas por que está atravessando a sociedade brasileira. Não é só no Rio, é em São Paulo, nas cidades do interior, nas capitais dos estados.Trágica pandemia de crimes de todas as espécies, de todos os níveis, de todas as crueldades.

Um jovem e promissor estudante cearense, José Leandro Pinheiro, é mais uma vítima de assassínio no Rio de Janeiro. Foi encontrado morto com golpes de facada no seu quarto que dividia com um outro estudante.Vem, agora, uma reflexão, morei aqui no Rio em república de estudante na tempo de preparação para o vestibular e a com vivência que tive com meus colegas de quartos era a melhor possível, com muita amizade e camaradagem, distante, pois, dos perigos de hoje enfrentados pela juventude e pelo próprio clima de hostilidade vivido por nossa juventude. Tão bons foram aqueles tempos que me deixaram lembranças gratas e perenes!

José Leandro, conforme informações da imprensa, foi aluno exemplar da Universidade Federal do Ceará. Transferiu-se paro Rio a fim de cursar o mestrado na área de matemática no respeitado IMPA (Instituto Nacional de Matemática  Pura e Aplicada). Segundo ainda depoimentos tanto da família quanto de colegas, o jovem mestrando era pessoa inteiramente devotada aos estudos. Não tinha vício, era bem estimado por seus colegas que lhe elogiavam a inteligência e as atitudes. Sua morte, ainda sob investigação, aponta para um mistério, não obstante um colega com quem compartilhava moradia, já tenha sido apontado como um suposto autor do crime.

Filho de uma professora do interior do Ceará e de um trabalhador rural, o brilhante estudante teve precoce cortadas e abruptamente cortas  todas as esperanças que nele depositavam os país, os amigos e por certo também os professores e colegas de mestrado. Naturalmente, tudo indicava que faria o doutorado na mesma grande instituição. Todo esse futuro lhe foi negado pela assustadora agressividade. Não, não foram mãos humanas que perpetraram tal homicídio hediondo. Não posso crer que tanta insânia possa vir de um suposto companheiro de quarto do estudante. Queira Deus que não tenha sido ele, porque seria mais do que abominável.

Assim como fizeram com José Leandro, outras tantos crimes macabros têm vitimado jovens de ambos os sexos promissores, com a vida toda pela frente.

Novamente, não posso deixar de falar no componente da impunidade que grassa no país, nas leis brandas, nas chamadas penas progressivas, nos indultos imerecidos, nas liberdades concedidas a celerados de alta periculosidade. Não se está fazendo justiça no país.

Nossos jovens estão morrendo, sem proteção, sem socorro, sem a aplicação da Lei com maiúscula. Como anda o Código Penal ainda em vigor e já caduco para a complexidade dos tempos modernos? Quando iremos resgatar a confiança em nossos legisladores e aplicadores de penas? Quando iremos tomar medidas severas e justas para adolescentes que matam outros adolescentes, crianças, adultos e idosos,  à vezes atae os próprios  pais? 

Quando iremos atualizar o Estatuto da Criança e do Adolescente? Como irão dosar as sentenças de adolescentes que usam de armas de fogo para matar inocentes em todos os lugares, em casa, na rua, nas estradas, nas lojas, nas farmácias, nos shoppins e outros  lugares?   Quem irá efetivamente para a cadeia, cumprir a pena na sua inteireza para os casos de crimes bárbaros e horripilantes? Que tipo de pena capital deveríamos ter em nosso país?

Obviamente, não estou pensando apenas naquela velha ideia que já virou uma espécie de consenso segundo o qual só pobres, pardos e negros irão para o xadrez. Estou pensando, sim, na prisão para o criminoso independente de raça, credo religioso e condição social. A segregação dos facínoras de todos os naipes do convívio da sociedade brasileira deve ser igual e universal.

Não deve haver complacência, sob hipótese alguma, para os infratores de quaisquer delitos e sobretudo  para os  criminosos cruéis. Tudo na legislação criminal deve ser atualizado e endurecido, tais como “habeas corpus”, liminares e quejandos.

Os órfãos, os pais que perderam filhos por mãos assassinas, as esposas que perderam os maridos, os avós que perderam os netos, os noivos que perderam as noivas, os namorados que perderam as namoradas, os amigos que perderam os amigos. Enfim, as famílias brasileiras estão chorando e as suas  lágrimas  não secam por serem brotadas de crimes recorrentes neste vasto país ainda vivendo a plena impunidade.

A tragédia de José Leandro soma-se, assim, às milhares de famílias de  vítimas  de crimes nefandos que clamam por justiça imediata e à altura do desenvolvimento alcançado pelo país em tantas áreas.Pouco adianta progresso material se desacompanhado de avanços no campo da segurança individual e coletiva. Desta coluna quero levar à família do jovem matemático os meus sentimentos de pesar, que, como no sermão de Vieira, não são tão-somente meus, mas de todo o povo brasileiro.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Malala: o direito à educação







                                                        Cunha e Silva Filho


 Corajosa, determinada,  amadurecida  embora tão jovem, Malala Iousufzai, uma paquistanesa de  quinze anos,  quase uma criança,   foi à luta. Não se deixou  intimidar  pelas ameaças de talibãs que dominam  a região em que ela morava com  a família. Sabia o que queria,  ou seja,  queria estudar, exercer seu direito  de  sair da barbárie para a civilização, como lembrou  o comentarista  internacional  Carlo Rossi, da Folha de São Paulo.
               Esta adolescente com  cabeça  de adulta  responsável , espécie de  pequeno  Gandhi de saia,  por  desejar  um direito  inalienável de qualquer  criança, o de estudar, de desenvolver suas  capacidades  intelectivas,  de  sair da escuridão da  ignorância para  a iluminação   do saber, direito   consagrado  universalmente, Malala  enfrentou os inimigos   obscurantistas e  segregadores  culturais,  os  terroristas  e  sanguinários  talibãs, facção  terrorista  e fanática, que não reconhece  o direito  de as mulheres   estudarem.  Num mundo  desenvolvido  em todas  as  áreas do saber  humano,   constitui  um crime  contra  a  pessoa  da mulher  impedi-la de  ter uma formação escolar.  Foi o que  tentaram fazer com a pequena  e bela  Malala, e o fizeram  de forma  covarde,   praticando contra ela um atentado que quase  lhe tirou a vida. Fico imaginando  o que não deve ter  passado essa adolescente para driblar   seus perseguidores na sua  destemida   luta  contra a estupidez  dos bárbaros. Escondendo-se,  correndo,  despistando,  mascarando-se, tudo  fez  a pequena  paquistanesa para  não cair  nas mãos  assassinas  dos terroristas.
A peqeuna líder  conseguiu  ser acolhida  na Inglaterra,  onde  faz   ainda tratamento  do atentado  que sofreu, quase deixando-a  com  sequelas  no cérebro. Esta menina  torna-se, assim,  um símbolo  da  ousadia  de uma  adolescente  para  conquistar  seu direito  à educação.  Oxalá, na Inglaterra  consiga  desenvolver   suas  potencialidades  a  fim de  melhor  lutar  em defesa  da igualdade  feminina de seu  país, não só no que  tange  ao direito de estudar mas também   a todos os direitos  que  os homens  têm  na sociedade civil.
Líder nata,   com atributos  que  a tornaram  da noite  para o dia uma  personalidade  mundial, Malala precisa  de todo  o apoio dos   países   livres no sentido de  propiciar-lhe  condições  de  dar continuidade  aos seus  propósitos  de  disseminar   a educação  para  ambos os sexos,  em todos  os níveis e de assim   contribuir  para a região  de sua  terra natal,   não só no campo da escolaridade  obrigatória  mas também de elevar  o nível  de consciência  política, social e cultural   de seu  país,  hoje ainda tão conturbado  por conflitos  de  ordem  geopolítica.  Ela  há de encontrar   uma lugar  de destaque  como   protagonista   da  paz  e das  as  questões   sociais  e  políticas  de  seu    país. Posso errar,  mas Malala  ainda  poderá   fazer  muita coisa  útil  em defesa  de um Paquistão  livre  do terrorismo  e de outras ameaças que  pairam   sobre  os céus desse  país.
Acredito que  nenhum  país  há de ficar   indiferente  à luta  dessa  adolescente, ainda  hospitalizada em Londres, ainda cheia  de  marcas de ferimentos,   porém    tendo demonstrado   estar  em plena lucidez e ansiosa  por receber  o carinho   de todos e por todos  os meios  de comunicação.
Torçamos,  portanto, pela  felicidade  desta  jovem, por sua   pronta  recuperação.  Malala  é um grande exemplo de   destemor, de valentia,    de  maturidade  precoce já revelados    em tão  tenra idade. E tais  atributos  prendem a nossa curiosidade,  o nosso   interesse, e principalmente fazem  dela  uma  pessoa querida e amada  por todos aqueles  que  prezam  a igualdade  entre  homens e mulheres. Seu nome   torna-se sinônimo de   união entre as mulheres,  de paz entre os homens e de  combate  contra  o terrorismo, o fanatismo religioso  e  o  preconceito em todas as escalas  de sua miséria  e destruição.

                                                                 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Erraram os meus prognósticos




Cunha e Silva Filho



Nos jornais do mundo inteiro, nas tevês, talvez nas redes sociais, nas revistas de projeção o que continuamos presenciando impotentes (o que pode fazer um simples blogueiro mortal?) é a superior força do Mal contra o Bem, sem trocadilhos maniqueístas de minha parte, não sei do leitor, já que cada leitor tem lá suas opiniões convergentes ou divergentes. Mas o massacre na Síria prossegue ainda com força por parte dos facínoras do poder imposto àquele país – terra arrasada, ruínas da humanidade.

Dentro do possível e do impossível, tentou-se, por vias pacíficas, encontrar uma saída. De nada adiantaram os enviados da ONU, do seu Conselho de Segurança, das críticas e repúdios de autoridades de países como os Estados Unidos, que, por estarem mais mergulhados nos seus próprios problemas econômicos e de saúde, parecem ter dado as costas para os mortos, vítimas de assassínios oficializados e fardados. Não adiantou que a Turquia fechasse o seu próprio espaço aéreo impedindo que aviões russos transportassem armamentos para seu aliado, a Síria. Lá, impassível, diabólico, permanece o ditador, ditando ordens para matar. Só o poder lhe importa e de seu sinistro grupo de asseclas, base aliada da cumplicidade áulica da desumanidade sem freios.

As cifras são já uma enormidade, uma montanha de inocentes mortos. Morte da cidade pelas explosões indiscriminadas e mortes de opositores e da sociedade civil. Parece que os órgãos internacionais de segurança só têm olhos pra a grave crise econômica afetando covardemente - espécie de guerra monetária – que está matando socialmente algumas nações europeias mais afetadas, Espanha Portugal e a velha Grécia, cujos deuses mais conspícuos também parecem que para ela deram as costas.

A União Europeia não foi criada para desunir as nações-membros, mas para ajudar nos momentos cruciais de dificuldades financeiras, tais como os enfrentados atualmente por aqueles países. Impor ajuda milionária de euros a esses países com economias esfrangalhadas à custa de sacrifícios das populações sem poder de barganha, de voz própria, é ato de extrema covardia dos donos do poder. Produzir desemprego, fazer cortes de salários e, absurdamente, ainda aumentar tarifas e impostos que irão recair sobre a sociedade já cambaleada, é insustentável e desumano. Caso de polícia.

Por que, não se preveniram os governos locais gastadores e perdulários, senão corruptos, junto com a União Européia, contra as consequências que estão aí infernizando milhares de vidas? O povo de cada nação prejudicada não é culpado desse estado de coisas no campo de sua economia. Uma pergunta é oportuna a esta altura dos acontecimentos: os membros dos governos afetados pela gravíssima crise não perderam suas regalias, seus gastos, suas mordomias, seus salários.E esta postura dos governos é igual para todas as nações. São, por si sós, “direitos inalienáveis”, parte indivisível dos grupos do poder, em Estados democráticos como em Estados autocráticos.O Leviatã é causa pétrea, direito divino, intocável. Ai de quem o afronte. O destino da vítma não é difícil de prever...

Da mesma forma, a elite econômica, o alto capital, do país, os milionários ou multimilonários, os grandes investidores que podem globalizar seus lucros fora das fronteiras do martírios autoritariamente impostos a essas sociedades, continuam e vão continuar fazendo suas viagens, suas reuniões tanto na União Europeia quanto no FMI, bem vestidos e bem alimentados, falantes e sorridentes, até parecem que estão no Paraíso.O povão, não. Este, em cada país solapado, das autoridades só tem recebido bombas de gás lacrimogêneo, cassetetes, spray de pimenta, empurrões, socos, pontapés, prisões injustas nas manifestações contra as injustiças praticadas contra seus direitos de empregados, funcionários e pensionistas.

Será que policiais nesses países de crise estão sendo cortados nos seus direitos salariais, de pensões, de aposentarias? Creio que não. As armas são o poder da força bruta contra os fracos e humilhados e elas não têm coloração política. Agem por automatismos, são peças robotizadas criadas pelos sistemas de governo de todos os gostos ideológicos. A selvageria é tão grande que ontem um senhor de sessenta e cinco anos, numa manifestação em Atenas, não suportando as pressões policialescas, teve um ataque cardíaco em plena manifestação contra o governo. Então, o que poderiam fazer os cidadãos injustiçados e oprimidos? Ficar calados e passar fome e dificuldades, amargar as determinações autoritárias dos governos incompetentes e perdulários? Permanecer calados diante da tirania econômica é dar mais poderes discricionários a esses arremedos de democracias esfarrapadas e irresponsáveis.

A questão econômica e a questão da guerra civil se imbricam e não são estanques. A Síria pede socorro ao mundo, grita a sua dor dos mortos e ofendidos, perde sua configuração político-institucional, transforma-se no caos, no vazio de desgoverno. Suas cidades estão devastadas. Para qualquer canto que olhemos, só destroços vemos consternados. Os mortes, aos milhares, estão espalhados, muitos provavelmente insepultos debaixo de escombros. Não concebo como países do porte da Rússia, China e Irá ainda têm dado apoio por armas ou por declarações a toda essa carnificina de que a Síria é vítima. Tempos apocalípticos, visões dantescas, fedendo a holocausto e trazendo às nossas consciências as mais tristes e sombrias lembranças das duas guerras mundiais, do Vietnã, enfim, de todas os conflitos bélicos sofridos pela humanidade. E pensar que alcançamos tantas conquistas de ordem técnico-científica. Tantas contradições é forte demais para a consciência dos que aspiram por um mundo melhor, porém tão ainda distante de nossos desejos e prognósticos. Erraram meus prognósticos   quando ainda vejo a  quase indiferença das nações desenvolvidas  e em desenvolvimento com respeito à  questão síria.


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Tradução de um poema de Stéphane Mallarmé ( 1842-1898



Renouveau





Le printemps maladif a chassé tristement

L’hiver, saison d’art serein, l’hiver lucide,

Et dans mon être à qui le sang morne préside

L’impuissance s’étire en un long baillement.



Des crepuscules blancs tièdissent sous mon crâne

Qu’un cercle de fer serre ainsi qu’un vieux tombeau,

Et triste, j’erre après um revê vague et beau

Par les champs ou la sève immense se pavane.



Puis je tombe enerve de parfums d’árbres, las,

Et creusant de ma face une fosse à mon rêve,

Mordant la terre chaude ou poussent les lilas,



J’attends, en m’abîmant que mon ennui s’élève

- Cependant l’Azur rit sur la haie et l’éveil

De tant d’oiseaux, e n fleur gazouillant au soleil.



Primavera



Enfermiça, tristemente, a primavera expulsou

O inverno, estação da arte serena, o inverno lúcido.

E o meu ser, a quem o sangue preside abatido,

A impotência, num longo bocejo, se espreguiçou.



Sob o meu crânio se amornam alvos crepúsculos

Que em círculo de ferro encerra um túmulo velho.

Triste, perambulando, após um sonho, vago e belo

Pelos campos onde a seiva imensa se adorna.



Depois, abatido, caio de perfumes d’árvores, cansado,

E, um obstáculo cavando da minha face a meu sonho,

Mordo a terra quente na qual crescem lilases.



Afundando-me, espero que meu tédio cresça

- Entretanto, ri o Azul sobre a sebe e o despertar

De tantos pássaros, ao sol gorjeando em flor.





                                                               (Trad. de Cunha e Silva Filho)

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O perigo é a rua e viver é perigoso







Cunha e Silva Filho




Na campanha política para prefeito do Rio, que acompanhei pela tevê e pelo jornal, há um tema que não foi debatido com toda a urgência que merece: a violência. Estou pensando que as autoridades não estão dando o real peso a esta questão que  delas exige prioridade máxima. É bom que se ressalte não   serem o Rio e São Paulo apenas  os dois estados em que a violência chegou a proporções alarmantes e sem precedente na história social de nosso país.O mal se arrasta pelo país inteiro.

A sociedade, que está sofrendo toda espécie de violência, não se uniu como um todo a fim de mobilizar seus membros a reivindicar firmemente dos governos providências efetivas que façam com  que a violência caia para níveis aceitáveis.

Assaltos em ruas, em praças, em residências, em bancos, nas capitais, no interior, seja em que nível social for, são ações criminosas diárias que não vêm tendo a mesma intensidade de repressão à altura pelos órgãos policiais. Não queremos paliativos, ações pontuais, que nada resolvem e, ao contrário, ainda mais açulam a sede de perversidades, de atos de covardia e de ações ousadas realizados pelos facínoras. É preciso sem delongas reverter este quadro epidêmico de selvageria. Não foi gratuito o título deste artigo tirado de duas  frases separadamente, uma de Roberto DaMata, e outra de Guimarães Rosa (1908-1967), respectivamente, de um conhecido antropólogo e de um genial ficcionista brasileiro. Não pretendo exagerar na dose, mas a verdade é que as pessoas não podem andar sozinhas, à noite, sobretudo, nas grandes capitais brasileiras, tendo como os dois centro mais violentos São Paulo e Rio de Janeiro.

Ultimamente, até para a polícia tem sido arriscado, haja vista o crescente número de policiais que estão sendo assassinados na capital paulista. O fato é que o brasileiro evita sair muitas vezes para alguns lugares, mesmo para o centro, com receio de ser assaltado nas ruas, na saída de bancos, em bairros metropolitanos, nos subúrbios, espaços que se transformaram em perigo potencial. Só esperamos que os governos  não venham na verdade só  fechar a porta da criminalidade, com aparato bélico até das Forças Armadas, quando estiverem bem próximos dos dois grandes eventos de que o país será anfitrião, a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Devem agir agora, com  urgência, e não esperar  por aqueles  eventos de grande  porte. Não só os turistas nacionais e estrangeiros merecem ter segurança nesses eventos. A segurança das pessoas terá que ser preocupação permanente, constante, quer dizer, sem sofrer solução de continuidade.

Os reis estão nus e nãos se aperceberam de sua nudez. Provavelmente, porque têm forte segurança que os protegem já que moram em palácios cercados de guardas e de armas, como nos tempos dos senhores feudais, dos vis bandidos que pululam em todos os cantos das cidades e, sobretudo do Rio de Janeiro e de São Paulo.

As UPPs , instaladas pjelo governo do Rio de Janeiro, e outras formas de repressão contra o crime, são bem-vindas – não há como negar - , mas não são ainda a palavra final, a vontade política e corajosa de as autoridades de segurança, de a presidente da República e dos governadores e prefeitos, todos juntos equacionarem metas e estratégias de combate ao crime organizado, e a outros tipos de crimes praticados por bandidos ou pequenos grupos isolados. É óbvio que as Forças Armadas poderão ser grandes parceiros , pelo respeito que têm junto ao povo, no sentido de darem apoio logístico e de equipamentos de combate à alta criminalidade.

Entre as ações que teriam efeito mais imediato mencionaria as seguintes:

1) Determinar-se que a polícia militar e a civil entrem em ação, com a a presença nas ruas, nos bairros, fazendo-se presentes e ostensivas, inibindo qualquer ousadia de bandidos nos diversos lugares onde possam aparecer para infernizar a vida normal da população;
2) Formular estratégias de combate mediante a perseguição sem trégua nos gargalos por onde passam as armas pesadas ou leves de criminosos. Neste caso específico, fortalecer aas nossas fronteiras com os países vizinhos, assim como fiscalizar pesadamente os limites entre os estados e municípios, com o trabalho  da polícia militar de cada estado  e o suporte da polícia rodoviária federal;
3) Combater intensamente o tráfico de drogas, desbaratar as milícias, moralizar os presídios, dificultando que criminosos perigosos tenham acesso a armas e a aparelhos de comunicação com asseclas fora dos presídios;
4) Valorizar os policiais, dando-lhes salários compatíveis com a alta missão social que lhes cabe cumprir, melhorando a qualidade da formação do militar, com exames de seleção rigorosos nas questões de competência e comportamento moral, incorporando somente os melhores, os que demonstrarem real vocação para esta atividade. Os policiais precisam  de ser estimados pelas comunidades e para alcançarem este prestígio somente a atuação deles indicará quem são os melhores.

A sociedade civil não está mais suportando tantos atos criminosos ceifando m ilhares de inocentes e indefesos. Os criminosos não tão numerosos que até parece que vivemos num estado permanente de guerra civil. Crianças jovens, adultos, velhos estão sendo vítimas fatais da criminalidade em todo o país, especialmente nos estados do Rio de Janeiro, com um saldo mais negativo para São Paulo, naturalmente por ser uma metrópole maior.

Um país não pode apenas limitar-se a atingir níveis econômicos maiores, nem melhorar  unicamente o nível de pobreza.Um país melhor tem que aprimorar-se em vários outros  aspectos de sua  estrutura  governamental: educçaão, saúde,  transporte, moradia,  lazer etc.
No caso do tema central  deste artigo, cumpre também aos governantes olharem para os mecanismos utilizados pelos poderes da Justiça federal e estaduais, i.e., cabe aos diversos órgãos do judiciário o mesmo empenho na luta contra a criminalidade, através dos ministérios públicos e de toda a máquina disponível do judiciário. Se o combate for eficiente e por tempo indeterminado, com a pressão da sociedade civil e diversas organizações auxiliadoras na luta contra o crime, dificilmente chegaremos aos níveis de excelência atingidos pelos países com uma vida em sociedade muito mais segura do que a nossa. Cabe finalmente, aqui lembrar o a papel de relevo que deve ter os legislativos estaduais e o federal na elaboração de leis que venham atualizar novos mecanismos que redundem numa mais eficiente punição para os criminosos.

A palavra de ordem que vejo na atual situação de desespero da sociedade brasileira é endurecimento das leis contra os diversos graus de delinquência. Refiro-me particularmente, com os crimes hediondos praticados por adolescentes. As leis precisam ser mais rigorosas . As punições devem ser aplicadas e os marginais devem cumpri-las, eliminando-se as benesses de que hoje se auferem o sentenciado brasileiro, seja de que nível social for. Os juristas que estão atualizando o Código Penal Brasileiro não podem deixar de ter toda essa complexidade ocasionada pelos novos tipos de criminalidade surgidos com a modernidade.

Uma sociedade tão violenta em que se transformou a sociedade brasileira de nossos dias, merece tratamento diferenciado e envolvendo todos os recursos técnicos e humanos de que já dispomos. O que é necessário é pô-los em prática e com enorme responsabilidade de toda a máquina do Estado brasileiro.Cumpre dar respostas às questões aqui afloradas,  às sugestões de um simples articulista, que não é um expert em questões criminais, mas que é alguém que está sempre preocupado com o bem-estar de seus concidadãos. Os perigos e os riscos pertencem a todos e podem atingir a todos indiscriminadamente.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

A vitória das abstenções na eleição brasileira


Cunha e silva Filho


A vitória das urnas de um candidato, em muitos casos, não, passa da vitória do poder do dinheiro, privado ou  público, sobre o eleitor.Algo, contudo, está mudando para melhorar: os eleitores, em massa, nestas eleições municipais brasileiras deram já o primeiro sinal de insatisfação com as coisas da política. Foram milhares de ausências de eleitores desta vez. Isso, pelo menos, nos sinaliza para uma situação inusitada.

De tanto verem cair o nível de confiança dos candidatos ou de candidatos que, por este motivo, ficaram sob suspeita de corrupção ou péssima administração nas prefeituras, o eleitor brasileiro comporta-se como gato escaldado, i.e., não confia em quase ninguém, desinteressou-se pela política e, se fossem consultados, em plebiscito, talvez escolhessem o voto facultativo e não o obrigatório, como está ainda em vigor na legislação eleitoral brasileira.

Há uma ideia corrente entre nós segundo a qual não se tem mais confiança nos políticos mais velhos, o que é uma falácia. Ser candidato jovem não significa ser bom candidato que tenha metas novas, modernidade de visa, competência e talento para a política com P maiúsculo. O que faz de um candidato um bom político é preparo, competência, tino administrativo, amor à democracia e caráter com a res publica. Esses são atributos que independem da idade .

Num país como o nosso, cuja história republicana nos últimos anos passou por mudanças drásticas que lhe fizeram mal e por presidentes que,  de uma forma e outra, prejudicaram o povo brasileiro, seja por corrupção, seja por autoritarismo, seja ainda por um tipo de desenvolvimento fragmentado, ou seja, praticando um governança que se pode avançar economicamente, por outro lado, ainda mantém velos ranços da política de conluios abertos ou de portas fechadas, sem, desta forma, permitir transparência com os compromissos democráticos ainda a serem alcançados pelo sistema presidencialista. Para conquistar o apoio de seus diverso partidos, o presidente, o governador ou o prefeito usa de tantas formas de cooptação que, no fundo, descaracterizam o significado autêntico dos partidos políticos. Ora, coligações oriundas de diversas correntes ideológicas se enlaçam tão intimamente que o resultado configura uma absoluta ausência de unidade orgânica e coerência na práxis da política.

Para piorar ainda mais a vida política brasileira, no governo do PT, passamos por vexatórios exemplos de falta de valores éticos imprescindíveis ao  país. O exemplo do “Mensalão”, envolvendo práticas ilícitas de fazer política mediante o concubinato entre o público e o privado a fim de conseguir maioria de votação para projetos do governo é a evidência mais cristalina de quanto ainda estamos distantes de uma maioridade política entre nós. Negar o “Escândalo do Mensalão”, guardadas as devidas proporções de estrago moral das instituições brasileiras, seria como negar um fato histórico como o Holocausto, além de ser uma insensatez e crime de lesa-pátria. Se neste escândalo estava em jogo o dinheiro do Erário Público, ou seja, do povo brasileiro, através de transferências de dinheiro de bancos públicos para pagamento de propinas ou para até mesmo enriquecimento ilícito por cometimento de crime de peculato, fica problemático ou mesmo constrangedor não punir os responsáveis principais pelos crimes alegados. A absolvição dos indigitados principais será considerado um golpe terrível para a nossa democracia.

Quiçá por isso é que o absenteísmo nas urnas tenha sido tão grande este ano. O fato de alguém anular seu voto na cabine, ou votar em branco são insofismáveis provas de descontentamento do eleitorado pelos políticos brasileiros. São estas circunstâncias que deverão ser pesadas pela nossa Justiça Eleitoral e sobretudo pelos nossos governantes.

O grande sinal de enfado do nosso povo pelos políticos já foi assim indicado. Nosso políticos precisam, portanto, ponderar suficientemente sobre outros componentes negativos que contribuem para a descrença nos políticos são os problemas crônicos que a sociedade civil está duramente sofrendo – em todos os níveis sociais -, ou seja, nas áreas da segurança das pessoas, com violência pipocando em todos os cantos do país, com mortes de inocentes, sequestros, assaltos, em casa ou na rua, com vítimas fatais, violência contra a mulher, alguns graves problemas ligados à saúde pública, aos transportes de massa (violência de motoristas andando em alta velocidade e pondo em risco a vida dos passageiros, aumento do custo de vida, das tarifas públicas e privadas, aumento extorsivo dos planos de saúde a ponto de se tornarem um gargalo no bolso dos usuários.

Se, no setor privado, e em algumas governos estaduais e municipais, os funcionários têm algum pequeno aumento salarial, no governo federal, entretanto, muitos setores do funcionalismo estão sem aumento há, pelo menos dois anos. Ora, isso é uma flagrante injustiça contra os funcionários, como são exemplos os professores do ensino médio federal e universitário.

Por outro lado, o legislativo, o executivo e o judiciário recebem seus polpudos aumentos, sobretudo os deputados e senadores que determinam os seus próprios aumentos salariais e suas regalias que, somadas, constituem elevadíssimos salários! O povo, indignado com razão , está vendo este escândalo e desperdício de dinheiro do contribuinte e dos que pagam impostos de renda ou os impostos embutidos nas tarifas, nas compras de todos os itens possíveis.

Tudo isso não será mais do que suficiente para explicar a indisposição da sociedade com os políticos, com a presidente da República e o consequente afastamento, segundo referi,  de milhares  de eleitores das urnas? Festejar a vitória das eleições é muito fácil, mas refletir profundamente sobre os gravíssimos problemas nacionais subjacentes aos gritos de vitórias de candidatos reeleitos não me parece razão para os requebros de roda de samba e hipocrisia populista de todas as cores ideológicas. Como tem sido fácil enganar um povão de baixo nível de consciência política. O poder de plantão sabe disso e faz a festa.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Tradução de um poema de Samuel Taylor Coleridge (1772-1834)





WORK WITHOUT HOPE*





All Nature seems at work. Slugs leave their lair—

The bees are stirring—birds are on the wing—

And Winter slumbering in the open air

Wear on his smiling face a dream of Spring!

And I the while, the sole unbusy thing,

Not honey I make, nor pair, not build, nor sing.



Yet well I ken the banks where amaranths blow

Have traced the fount whence streams of nectar flow.

Bloom, O ye amaranths! Bloom for whom ye may,

For me ye bloom not! Glide, rich streams, away!

With lips unbrightened, wreathless brow, I stroll:

And would you learn the spells that drowse my soul?

Work without Hope draws nectar in a sieve,

And Hope without an object cannot live.



O TRABALHO SEM A ESPERANÇA





Inteira movimenta-se a Natureza. As lesmas suas tocas deixam.

Movimentam-se as abelhas – os pássaro voos alçam –

E o Inverno, dormitando ao ar livre,

Exibe, no sorriso do rosto, de Primavera um sonho!

Enquanto isso, eu apenas algo inútil represento.

Mel não faço, nem caso, nem crio, nem canto.



Sei, contudo, que as margens, nas quais amarantos desabrocham,

A fonte encontraram, da qual fluem os arroios.

Desabrochai vós, ó amarantos! Desabrochai pra quem puderdes.

Pra mim, não desabrochais! Ricos arroios  pelo vosso curso deslizai!

Com lábios ofuscados, caminho com desgrinaldada fronte.

Entenderíeis os encantos que minha alma entorpecem?

O trabalho sem a Esperança néctar extrai numa peneira.

Sem um objetivo a Esperança morre.



                                                                                       (Trad. de Cunha e Silva Filho)

Nota do tradutor:  Poema escrito em 21 de fevereiro de 1825.

sábado, 6 de outubro de 2012

Carly Silva: um inesquecivel e grande mestre universitário





Cunha e Silva Filho





Das minhas memórias – as boas – da universidade, do tempo da graduação, uma ficou inesquecível e, por isso me foi grata e me serviu tanto na formação acadêmica. Esta se configurou na alegria e prazer de ter conhecido o professor Carly Silva, da cadeira de língua e literatura inglesa. Carly Silva era professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, assim como da Universidade Federal Fluminense. Não era dos quadros da Faculdade de Letras da UFRJ, onde estudei e dele fui aluno.

Provavelmente viera lecionar na UFRJ como professor visitante de língua e literatura inglesa. Costumo dizer que ele foi uma espécie da salvação minha, no bom sentido do termo, já que havia sido reprovado com a professora anterior da disciplina que ele iria ministrar, Fundamentos da Cultura Literária Inglesa (Funding, era a sigla). Disciplina importante por todos os aspectos, pelas mãos de Carly Silva descobri o quanto sua abordagem, sua didática e sua figura de scholar infundiram em mim uma saudável e nova visão do conhecimento do início da  formação da literatura inglesa, cujo tema mais relevante foi o estudo analítico do famoso poema “Beowulf”, escrito no final do século IX, considerado o poema mais antigo da literatura inglesa

Diferente da professora anterior, nas aulas de Carly Silva – muitas vez elevadas a quase conferências, graças à ampla visão e aos recursos intelectuais do professor, - pude plenamente compreender a natureza desse poema guerreiro que narra as lutas sangrentas entre o guerreiro Beowulf, que dá título ao nome do poema, e o monstro desprezível chamado Grendel – criatura “meio diabo, meio homem”, na expressão de John Burguess Wilson, monstro que há muito tempo vinha aterrorizando o rei Hrothgar de Jutland. Grendel, atacava a Sala de Festas do Palácio e arrastava os guerreiros de Hrothgar, devorando-os cada vez que invadia o Palácio do rei. Neste ponto, entra em cena o herói e guerreiro Beowlf , vindo da Suécia para ajudar Hrothgar contra as incursões sangrentas de Grendel e da horrenda mãe deste. A vitória ficou com Beowulf.

O professor Carly tinha o hábito de realizar exames orais previamente marcados, nos quais os alunos eram submetidos da posição de suas carteiras a responder a questões propostas pelo grande mestre.

Tanto me animei com ele que ainda aproveitei a sua passagem pela Faculdade para com ele fazer mais dois cursos, um de gramática inglesa, com estudos da orações substantiva, adjetivas e adverbais, uso do infinitivo, do gerúndio e do particípio terminando com um estudo avançado sobre indirect speeech, ou como outros querem, reported speech, e outro, de literatura, desta vez o curso versando sobre a poesia romântica inglesa.

Não preciso afirmar que o curso de poesia romântica foi de excelente nível, reafirmando as qualidade de Carly Silva como conhecedor exímio de literatura inglesa. Aliás, ele combinava duas coisas que nem sempre vêm juntas num mesmo docente: era um mestre de alta qualificação tanto regendo língua inglesa quanto literatura inglesa.

Foram ótimos os momentos das aulas em que  ele analisava , com maestria e clareza ímpar, poemas de Wordsworth, Coleridge, Shelley, Keats e Byron. Na Faculdade de Letras, situada na época na Avenida Chile, Centro do Rio, Carly Silva foi meu professor nos idos de 1969 e 1970. Das suas aulas  eu tinha muitas anotações valiosas sobre essas análises, porqanto  ele falava pausado e,  com  bom esforço e habilidade,  pude copiar comentários  para futuras   pesquisas. Infelizmente,  essas anotações, assim como  as provas  escritas que ele nos devolvia com a nota  respectiva,  não pude  guardar, tendo sido  provavelmente  perdidas  nas muitas  mudanças de residências que  fiz.

Era era tão estimado por alunos que um colega meu, o Paulo Frederico, aluno brilhante, uma vez, em sala com outra professora do departamento de inglês e literatura, pôs-se a defendê-lo a respeito de um assunto que veio à baila sobre pronúncia de professores de inglês da nossa Faculdade. Uma professora, talvez por vaidade ou mesmo inveja, afirmara alguma coisa sobre a pronúncia do professor Carly Silva que absolutamente não se coadunava com a verdade dos fatos. Meu citado colega, sem papas na língua, lhe retrucou com firmeza: “O professor Carly é modelo de pronúncia britânica, professora, além de ser abalizado mestre.” Eu, da minha parte, com orgulho partilhava da opinião do meu colega de sala.

Terminados os meus cursos de bacharel e licenciado, jamais perdi de vista o interesse pelo professor Carly Silva que, por sinal, tinha sido igualmente professor, na UERJ, de um velho amigo meu, o professor Walter Alves Pinto, professor aposentado de língua inglesa, estadual e municipal, e também um grande admirador do mestre da UERJ.
 Durante  um bom  tempo, Carly Silva  escreveu sobre questões gramaticais da língua inglesa para a excelente revista Contato, editada pela CESGRANRIO, revista hoje extinta, da qual li vários trabalhos do ilustre mestre, que guardo nos meus arquivo, infelizmente sem ter a coleção completa.

Sei que publicou, entre outros trabalhos, Gramática transformacional: uma visão global. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1978, uma bem elaborada gramática inglesa, para nível adiantado, de título English Grammar: Essentials of English grammatical structure. Rio de Janeiro: Sistema CLC, 1982; A basic reference Grammar of English, 199, 298 p. Desta ultima não consegui dados editoriais.

Sobre a posição   intelectual do mestre, convém ressaltar que é membro da Academia Brasileira de Filologia (Membro Honorário do Quadro Especial). Foi professor Titular da Universidade Estadual do Rio e Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal Fluminense.Hoje está aposentado.

Anos atrás, segundo me informaram, foi vencedor de um concurso sobre estudos de literatura inglesa, com isso ganhando um bolsa de estudos na Inglaterra concedida pelo governo britânico.

Carly Silva é um professor com experiência completa, an accomplished teacher/professor  no rigor do termo, visto que lecionou nos vários níveis de ensino até atingir a privilegiada posição de Professor Titular. Por todos estes títulos, ele se coloca, assim, numa posição de alto nível de docência universitária, ao lado de outros professores brasileiros que deram tudo de si para melhorar e orientar o ensino brasileiro de língua estrangeira, prestando uma proeminente contribuição à educação nacional.
Sua passagem na Faculdade de Letras da UFRJ muito honrou essa universidade e a todos nós que tivemos a sorte e o privilégio de termos sido aluno dele.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O eleitor brasileiro: um indeciso





Cunha e Silva Filho





Uma vez, um padre brasileiro, após a liturgia da missa, afirmou pela tevê o seguinte: “Votem no candidato certo!” Minha mulher, então, fez a seguinte pergunta para sim mesma ou para quem a ouvisse: “E quem é, afinal, o candidato certo? Diz o Novo Testamento, pela boca de Cristo: “Amai o próximo como a ti mesmo.”. “Mas, quem é meu próximo?”, disse um homem da multidão.

Eis uma boa pergunta, difícil, contudo, de ser respondida. Os eleitores, durante um período determinado pelo Tribunal   de  Jusitça Eleitoral, assiste à desacreditada “Propaganda Eleitoral”, que alguém com espírito engraçado e malicioso - e com certa razão - a chamou  uma vez de programa humorístico. Dizem as más línguas que, grande parte do povão, e aqui incluo no bolo os diversos níveis sociais e culturais de telespectadores, logo que aparece o “obrigatório’ programa eleitoral, pega de um controle remoto e muda de canal, ou melhor, muda para os canais de assinatura a fim de se livrar de uma parte do programa eleitoral que não passa de mentiradas de alguns candidatos.

Seria o programa um mal necessário? Mesmo com todas as mentiras que não mais são engolidas pelo telespectador mais politizado, já é hora de o Tribunal Eleitoral repensar uma outra forma de realizar a propaganda eleitoral. O mínimo que ela pode fazer para o telespectador até hoje é uma amostragem do variado nível de qualificação dos candidatos. Os eleitores, peneirando cuidadosamente alguns candidatos melhores, vão aos poucos anotando algumas ideias colhidas das apresentações de cada um deles, assim como o nome do partido e o nº do candidato a prefeito e a vereador. Talvez, sob este ângulo, a propaganda eleitoral de alguma maneira sirva para a orientação do eleitor.

Em assuntos de política, de religião e de escola de samba, o ingrediente de fanatismo, de cegueira ainda impera e dita alguma direção para o eleitor. Entretanto, por ser imbuído de fanatismo, de parcialidade, de gosto individual, de simpatia pessoal, é que entra a figura do indeciso.

Os partidos brasileiros são numerosos, as siglas embaralham o eleitorado. Candidatos de partidos diferentes apresentam por vezes  os mesmos programas, os mesmos projetos, as mesmas ideias. Tudo isso confunde a cabeça do eleitor e, por serem mostrados num programa televisivo, já por si só maçante, o eleitor indeciso, fica num mato sem cachorro, perdido que está em concepções diferentes de visão política que, divulgando ideias e correntes ideológicas, mais embarafustam a mente cansado do trabalhador ou de outro indivíduo de profissões variadas. Em síntese, o eleitor mergulha no seu mundo interior tentando buscar alguma coerência a que possa se agarrar para fazer uma opção de um candidato menos desastroso para dirigir sua  cidade e sua Câmara Municipal.

Num contexto nacional em que decide no Supremo Tribunal Federal o destino do famigerado “Escândalo do Mensalão,” com a perspectiva de ainda o eleitor votar em candidato “ficha suja”, fica, por conseguinte, difícil fazer-se uma escolha menos traumática de alguns candidatos.

Uma coisa me parece certa, o eleitor bem intencionado fica remoendo mais ou menos nestes termos: este candidato é bom mas não tem experiência político-administrativa. Este outro está fazendo uma boa administração mas, politicamente, é ligado a políticos e governantes sobre os quais pesam suspeitas de corrupção. Direita, esquerda, centro, extrema direita, extrema esquerda, moderados, neoliberais, democratas sociais, anarquistas, são formas ideológicas que, cada vez mais, se esvaziam de seus princípios originais. De teorização ideológica estamos cansados. Queremos governos que se comprometam com a democracia social na prática, não na teoria nebulosa e sem pés fincados no chão do Brasil.

A profissionalização rasteira e nauseabunda tornou-se a regra no conjunto da política nacional. Nossos homens públicos, com raras exceções , só visam ao poder e às benesses que irão receber na condição de mandatos e de cargos legislativos. A oligarquia ainda se mantém forte num país politicamente provinciano como é o nosso.

Se nosso políticos exercessem sua atividade sem as regalias pantagruélicas próprias do Estado brasileiro, é provável que a Câmara Federal, o Senado, os governos estaduais, os deputados, as prefeituras, os vereadores sumissem como fumaça e as eleições se tornassem um enredo tragicômico de um  romance de  José Saramago (1922-2010). Daí que estão repletos de mediocridades e até de analfabetos e oportunistas os nossos poderes constituídos, que nos envergonham como brasileiros.

O brasileiro, eleitor indeciso, ainda vota em alguém em troca de favores ou porque o candidato é amigo de um amigo de um amigo, de um amigo, numa corrente contínua que me lembra o poema dummondiano “Quadrilha”, fazendo-se, é claro, as devidas modificações semânticas, mas sem retirar o lado irônico da afirmação e estendo-a não para as coisas do “amor,” mas da miséria de nossa  politicalha. Que venham as eleições, mas junto delas eleitores de bem e amantes da democracia brasileira. Amém!